Na manhã seguinte, despertei com uma sensação peculiar de expectativa que me impeliu a levantar um pouco mais cedo do que o habitual. Um leve formigamento de antecipação percorria meu corpo enquanto me dirigia ao banheiro. A ideia de que o dia seguinte seria marcado por um evento tão significativo para mim não me deixava esquecer nem por um instante. Finalmente, perderia minha virgindade. Era uma emoção tão intensa que transbordava de mim, mal conseguia contê-la dentro do peito.
Enquanto escovava os dentes, deixei minha mente mergulhar nas fantasias e expectativas que havia nutrido por tanto tempo. Sonhos de romance e paixão que me envolviam em um mundo onde eu era a protagonista de uma história de amor perfeita. Mas essa perfeição tinha suas condições, suas expectativas preestabelecidas. Não era apenas uma questão de experiência, mas de aparência. Eu queria que fosse com alguém belo, alguém que se encaixasse no padrão de beleza que eu idealizava. Um garoto branco, de olhos azuis, com uma aparência jovial que contrastasse com a minha própria negritude.
Refletindo sobre isso, percebi que essas preferências estavam enraizadas em minha busca por validação e aceitação. Eu via nos homens brancos e bonitos a chave para me sentir desejada e importante, uma forma de elevar minha própria autoestima ao alcançar o que considerava ser o ideal de beleza.
No entanto, essa busca pela perfeição estética me fazia confrontar minhas próprias contradições. Eu, uma mulher negra, reproduzindo padrões de beleza eurocêntricos que marginalizavam minha própria identidade racial. Era um paradoxo que eu ainda não estava pronta para confrontar totalmente.
Enquanto esses pensamentos tumultuavam minha mente, fui interrompida por uma voz masculina chamando pelo meu irmão.
— Terê?!
Era André, amigo de Terêncio, que havia aparecido em nossa porta.
— O Terêncio não está em casa. Algum recado? — perguntei, tentando esconder a impaciência que começava a surgir dentro de mim.
Achava que alguns amigos dele sabiam que ele estudava pela manhã, até perceber que o intuito de André estar ali era outro.
— Você tem namorado? — Ele perguntou, audacioso.
— Não, não tenho? — respondi, sentindo um misto de desconforto e curiosidade em sua pergunta tão direta.
Como eu iria ter? Os homens fugiam de mim como se eu tivesse alguma doença contagiosa. Percebi as segundas intenções do André, através daquela fala.
— O que você acha da gente ficar? — indagou-me, preocupado com a minha resposta.
André era um rapaz simpático, com seu jeito despretensioso e sorriso gentil, mas eu não conseguia evitar a sensação de que ele não passava de uma sombra pálida em comparação ao brilho intenso que eu procurava. Carlos Ferdinando, com seu nome pomposo e aura de mistério, ocupava meus pensamentos de maneira avassaladora. Ele era o padrão pelo qual eu me guiava, o homem dos meus sonhos, o alvo do meu desejo mais profundo. E, ainda assim, ali estava André, tentando se destacar em meio ao meu universo particular.
— Desculpa, mas não vai rolar — recusei, receosa.
Ao recusar sua proposta com um misto de desculpas e receio, senti o peso da minha própria hesitação. Não era apenas André que se confrontava com a rejeição; eu também me via diante da minha própria escolha, ciente das minhas expectativas e anseios. Mas por mais que eu lamentasse magoá-lo, não poderia simplesmente ignorar a voz da razão que ecoava dentro de mim.
— Mas..., por quê? — questionou, com um olhar tristonho.
Seu semblante cabisbaixo me atravessou como uma flecha, perfurando minha consciência com um misto de culpa e compaixão. Era como se ele implorasse por uma explicação, por um motivo que pudesse aplacar a dor da rejeição.
— Porque não tenho interesse em você, e eu já estou gostando de outra pessoa — expliquei, deixando escapar um suspiro pesaroso que se misturava com o peso da verdade.
Apesar de minha sinceridade, não pude conter a onda de compaixão que me invadiu ao observar a expressão desolada de André. Ele parecia genuinamente apegado a mim, e aquilo me fez questionar se minha decisão não estava sendo excessivamente cruel. No entanto, eu sabia que não seria justo continuar uma relação baseada em sentimentos unilaterais, especialmente quando meu coração já pertencia a outro.
Enquanto ele absorvia minhas palavras, pude sentir a tensão no ar, como se cada sílaba proferida reverberasse com o peso de nossos dilemas internos. André parecia devastado, não tanto pela rejeição em si, mas pela própria incapacidade de conquistar meu afeto. E, no fundo, eu também me sentia culpada por ser a causa de sua dor.
Mas então, em meio ao turbilhão de pensamentos que inundava minha mente, uma verdade desconfortável começou a emergir. Uma verdade que eu sempre havia tentado ignorar, mas que agora se impunha diante de mim com uma clareza inegável. Eu era preconceituosa. Preconceituosa contra aqueles que não se encaixavam nos padrões estéticos e sociais que eu havia internalizado desde pequena.
Enquanto refletia sobre minhas próprias motivações, não pude deixar de confrontar a dura realidade de minhas próprias crenças arraigadas. Eu me considerava superior, digna apenas dos melhores pretendentes, enquanto relegava André ao status de 'não digno o suficiente'. Era uma verdade brutal, mas que eu não podia mais ignorar.
Com um aperto no peito, observei André se afastar, suas costas curvadas sob o peso da decepção. Talvez não fosse apenas comigo que ele estivesse desapontado, mas consigo mesmo, por ter alimentado falsas esperanças em relação a alguém como eu. E enquanto ele se distanciava, deixando para trás os resquícios de nossa breve interação, eu me via confrontada com a urgente necessidade de confrontar meus próprios preconceitos, antes que eles continuassem a moldar o rumo de minha vida de maneira irreversível.
A tarde avançava lenta, como se o tempo esticasse cada segundo até o limite. Era o momento crucial, o instante em que tudo poderia mudar, em que minhas esperanças e desejos se entrelaçavam em uma dança de expectativas e incertezas. Senti um frio na barriga, uma mistura de nervosismo e excitação, enquanto me preparava para o que viria a seguir. Peguei meu tablet, o fiel companheiro que guardava os segredos do meu coração, e confirmei o encontro com Ferdinando.
Eu: Oi, já podemos dar início ao nosso encontro? — perguntei, minha voz carregada de esperança e anseio.
Sua resposta veio rápida, como um sopro de alívio em meio à minha crescente ansiedade.
Ferdinando: Sim, te espero aqui 2 horas da tarde — respondeu ele, de imediato.
Mal podia acreditar que o momento tão aguardado estava finalmente chegando. Dentro de mim, uma tempestade de emoções se formava, cada pensamento girando em torno da figura enigmática de Ferdinando. Ele era o homem dos meus sonhos, a personificação de tudo o que eu almejava, e agora, finalmente, eu estava prestes a estar ao seu lado.
Eu: Tudo bem. Eu não vejo a hora de estar com você — declarei, uma onda de alegria transbordando em minhas palavras.
Mas então veio o golpe, uma faca afiada cortando através das minhas esperanças e sonhos.
Ferdinando: Mas deixando claro que não quero nenhum tipo de compromisso com você. Vamos só ficar, apenas, sem nenhum comprometimento — enfatizou ele.
O tom daquelas palavras soou diferente, como se uma sombra tivesse coberto o rapaz gentil e doce que eu conhecia. Essa mudança de atitude me incomodou profundamente. Por um breve momento, a ideia de desistir passou pela minha mente, mas reprimir esse impulso seria como admitir uma derrota injusta depois de tanto esforço para ficar com o garoto que eu gostava. Não era hora de recuar.
Seus termos ecoaram em meus ouvidos, suas palavras penetrando minha mente com uma mistura de desapontamento e resignação. Por um momento, fiquei paralisada, processando a inesperada reviravolta em nossos planos. Mas então, com um esforço tremendo para conter minha decepção, assenti, engolindo em seco enquanto tentava disfarçar a desilusão que me consumia por dentro.
Eu: Entendi... — respondi, minha voz vacilante, lutando para manter a compostura diante da sua condição.
Por dentro, uma tempestade de emoções se agitava, uma mistura tumultuada de frustração e determinação. Eu havia imaginado nosso encontro de tantas maneiras diferentes, cada uma delas repleta de promessas de amor e felicidade. E agora, diante da frieza das suas palavras, eu me via confrontada com a realidade nua e crua: Ferdinando não compartilhava dos mesmos sonhos que eu.
Mas apesar da decepção que ameaçava me consumir, uma chama de determinação ainda ardia dentro de mim. Se ele queria apenas uma relação casual, então assim seria. Eu não permitiria que suas palavras me derrubassem. Eu era mais forte do que isso, mais do que ele jamais poderia imaginar. E se ele queria apenas uma aventura passageira, então eu estaria disposta a jogar o seu jogo, mas com as minhas próprias regras.
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Atualizado até capítulo 35
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