SICAF KAFA Ou CABEÇA 𝟗𝟎% QUENTE

SICAF KAFA Ou CABEÇA 𝟗𝟎% QUENTE

Episódio 1

Episódio 1

"Antes de estar aqui, vivia nos EUA morando com Sule!"

Bato os pés no chão enquanto discuto com minha mãe, abordando assuntos que já conversamos milhares de vezes.

"Murat"

Pausou, exalando o ar que saía de suas narinas, preparada para prosseguir com seus sermões.

"Sei o quanto difícil foi para você deixá-la. Mas você precisa se recompor! Quantos anos se fazem? 8?"

Pressiono a mandíbula para tentar esconder o que estou realmente sentindo.

Em vez de expressar tudo que se passa em minha mente, pressiono-a ainda mais contra meus dentes já frágeis; sinto como se fossem quebrar devido à tensão.

"Você realmente não ouviu nada do que eu disse, não é?"

Elevo meu tom, pressionando minhas palmas nas mãos tentando conter o tremor constante.

Minhas mãos tremeram desde meu último e recente episódio de semântico. Em situações estressantes, elas também tremem. Como forma de escapar, assisto às poucas fitas da minha antiga vida que gravei. Algumas com a participação de minha esposa.

Pergunto-me se ela estaria em paz com minhas atitudes recentes, ou se ela apareceria para me dar um sermão. Um riso imediato escapa de mim diante dessa possibilidade impossível.

"Vou para o quarto"

Digo ao passar por ela, apressando meus passos enquanto ouço seus resmungos atrás de mim.

Sei que pareço um pouco egoísta demais; estávamos discutindo o meu passado, e o que eu teria ou não que efetuar não é mais problema meu e nem dela, afinal é passado.

Antes do início do toque de recolher e após nossa discussão, minha mãe insistiu para que eu fosse ao mercado comprar mais sabonetes lacrados.

"Precisamos de mais sabão"

Ela disse na porta, dando uma tragada em seu cigarro.

Reviro os olhos lentamente, soltando o ar que estava aprisionado em meus pulmões seguido de uma risada curta e sarcástica.

Isso a irritou muito, a dirigindo a cometer os mesmos atos que eu havia feito.

"Não precisamos disso"

Digo ríspido, calçando meus sapatos. Ela rapidamente encolhe os ombros, sentando ao meu lado.

"Precisamos de mais sabão!"

De repente ela aumentou o tom da voz, assustando-me um pouco. Nossa relação estremeceu com o passar do tempo, e conviver com ela desse jeito me deixou mais estressado do que nunca.

"Tá bom! Tá bom!"

Levanto-me de meu assento, olhando-a alavancar o cenho, suas sobrancelhas falhas se movimentando condizentes aos seus olhos me encarando raivosamente me fez desistir de reagir.

Vendo minha reação, ela jogou o dinheiro na mesa e virou-se de costas, a fumaça seguindo-a.

Com os fones sobre minha cabeça, eu saio de casa. Observo as horas em meu relógio de pulso marcando exatas 14:30, enquanto divago em minha mente.

Ao passar pelo antigo ponto de ônibus, vejo uma mulher sentada, concentrada em sua leitura. Aperto os olhos, tentando observá-la de longe.

A bela mulher parecia focada no que realizava no momento, rindo para si própria. Movimentava lentamente seus olhos para as palavras postas naquele objeto que segurava.

Murat imaginou-se naquele posto, caminhando até ela, conversando com ela, tocando-a. As fantasias sobre ela, os vários lugares que poderiam imaginar estar juntos, percorreram na cabeça de Murat, crescendo rapidamente as perguntas sobre a mesma. Esse sentimento brotando no fundo do coração, considerado irreconhecível durante anos por Murat, brotara no seu coração novamente?

O mesmo não reconheceu a si próprio, caindo na realidade de que a moça nunca iria olhá-lo. Apesar dessa personalidade carrancuda que ele é, no fundo de sua mente, o sentimento de ser amado e amar permanecia novamente escondido, mas presente em algum canto do seu coração.

A moça percebeu que um homem a olhava intensamente e decidiu retribuir. Seus olhos se encontraram, e um sentimento incomum foi formado naquele olhar fazia-o permanecer parado ali.

A mulher não entendeu o motivo dele estar parado ali e apenas sorriu docemente, mostrando seu sorriso mais genuíno. Um sentimento de curiosidade sobre o homem a corroeu por dentro, querendo saber mais sobre o tal.

"Estou esperando o ônibus"

Fechou o livro, dizendo entre risadas discretas. Murat a viu sorrir, e vê-la sorrir o fez tão bem internamente que quis imitá-la também, sentindo-se pronto o suficiente para falar.

"Este ponto parou de funcionar faz um tempo"

Murat retribuiu o sorriso, respondendo. A mulher arqueou as sobrancelhas, surpresa pela retribuição.

Sempre que tentava conversar com alguém, era evitada. Talvez por parecer estranha.

A mulher de cabelos pretos observava cada movimento dele. Sua pele branca parecia levemente corada pelo sol.

Suas roupas - calça jeans, camisa laranja, casaco por cima do tecido e botas marrons - combinavam com o clima.

Comparando com as roupas que Murat estava usando ela estava incrivelmente bem vestida para o clima.

Antes que pudesse dizer algo, Murat lembrou-se do pedido de sua mãe e acelerou seus passos, deixando a mulher com quem tinha conversado sozinha.

Murat balançou levemente a cabeça, pensando na mulher que acabara de conversar. Ela talvez imaginasse o pior sobre ele deixando-a sozinha. Ele se questionou se teria a chance de vê-la novamente, para talvez explicar seu comportamento inesperado.

Andando apressado em direção ao supermercado, verificou mais uma vez o relógio, que agora marcava 15:00. Murat sentiu os pulmões falharem por um minuto; não estava acostumado a correr. Especialmente por um mísero objeto tão simples.

Olhando para os lados da estrada, a loja apareceu na visão periférica de seus olhos. Suspirou pesadamente soltando todo o ar que ainda tinha dando graças aos céus por finalmente tê-la encontrado.

Cruzando a rua, uma plaquinha de alerta dizia: "fones de ouvido obrigatório."

Tocando a porta de aparência questionável um calafrio percorreu, da cabeça aos pés.

Murat ajeitou seus óculos, adentrando no local. Todas as pessoas ali estavam com os fones sobre os ouvidos. Logo que entrou, uma mulher de aparência bem vívida o encarou por um longo tempo. Suas vestimentas eram simples e perguntou para si próprio se havia algo de estranho nele ou na aparência dele para a mulher olhá-lo daquele jeito.

Olhando as prateleiras, Murat ficou impaciente, pressionando a mandíbula.

Passou pouco tempo e ouviu-se um menino questionar a mãe sobre o por que eles estavam demorando tanto para irem embora.

Enquanto percorria por cada prateleira, ouvia a mãe repreendendo o filho por não estar com os fones.

Uma idosa, com um lenço floral amarrado no cabelo prateado, bloqueia o caminho nas estantes de sabão, falando coisas confusas, suas mãos enrugadas tremendo levemente, como se a idade trouxesse histórias que ela queria compartilhar.

"Ah não..."

Murat pressionou os fones contra seus ouvidos, tentando ao máximo abafar a fala da mulher em seu ouvido. Sentia uma sensação de sua cabeça esquentando e um zumbido ensurdecedor tomava conta de todo seu cérebro.

"Uma disparatada!"

Dizia um homem em alto tom, estremecido entre o carrinho de compras apertando firmemente seus fones.

A mente de Murat percorria todos os devaneios possíveis, pensando se talvez seria descoberto por alguém. Sua condição super especial o tornava cada dia mais infeliz. Desejava não ter isso, desejava viver e disparatar na hora que o destino permitisse.

"Meu filho, ponha isso!"

A mulher de mais cedo falava para o filho, com uma voz trêmula, temendo o pior caso o filho não colocasse os malditos fones.

"Ervilhas têm buracos pequeninos, sabe por quê? Os aviões possuem hélices, com o poder de percorrer milhares de quilômetros. Maçãs são vermelhas e carros são de ferro. Óculos são feitos de ferro, assim como os meus pés de colágeno."

A idosa chegava perto do menino falando coisas opostas umas das outras.

Murat tirou seu fone e encaixou-os nas pequenas orelhas do pequeno garoto. O menino, no mesmo instante, o olhou assustado.

Os sons das catracas se fechando no meio da loja assustaram todos, inclusive o garotinho, encolhido nas próprias pernas, soluçando, chamando o nome da mãe.

O desespero angustiado da mãe, tomada por lágrimas, vendo seu filho naquele jeito, sem poder fazer nada, estava desesperada pedindo por ajuda à mulher da cabine ao lado, que tinha a expressão do rosto caída, observando a mulher chorar de joelhos, implorando pelo seu filho.

A mulher na cabine de cabelos tingidos de ruivo tentava todos os botões da grade, mas nenhum funcionava. O que deixava o rapaz de olhos verdes apreensivo. Seu coração pulsava em compasso com a incerteza da situação.

Não poderia ficar por muito tempo ali, arriscou-se muito por abdicar de seus fones, - dando-os ao garoto, e agora ajudaria o mais rápido possível o menino.

Sua ânsia era sair dali despercebido. A pressão em sua cabeça fez com que ele cambaleasse por um momento, começando a sentir o sangue borbulhar dentro de sua cabeça.

A mãe do menino chamou os outros que estavam do lado oposto para ajudá-la a levantar a cerca protocolar. O esforço era mútuo, mas não foi suficiente para sequer levantá-la.

Murat foi até lá, ajudando as pessoas do outro lado da grade. As pessoas o olhavam com desdém e apreensão, esperando que ele manifestasse seus sintomas.

Na primeira oportunidade, em um pequeno espaço, o menino passou com pouca dificuldade saindo correndo para os braços da mãe chorando.

Por um momento, Murat se sentiu aliviado, logo depois sendo entorpecido pela quentura de sua cabeça. A mulher agradeceu, fazendo um leve aceno cabeça, e abraçou seu filho novamente.

Murat percebeu que a mulher não havia dado os fones ao seu filho. Talvez ela tenha posto pequenas massinhas de pão nos ouvidos do garoto e nem percebeu.

Antes de fabricarem fones, as pessoas tinham o costume de colocar massas de pão sobre o ouvido. Diziam que prevenia contra surdez, gripe e o semântico.

Em alguns casos, este método funcionou, mas em outros o efeito aconteceu ao contrário do previsto, ajudando mais a doença e resultando em mais casos na cidade.

Tudo aconteceu tão rápidamente em sua mente, e a dor de cabeça piorou como lava de um vulcão. Sentia os olhares aterrorizados das pessoas e temia ser denunciado ao ICV. A dor se intensificou e ele teme que alguém perceba.

Com medo de que isso acontecesse, saiu cambaleando em seus próprios passos e logo encontrou o sabão nas prateleiras.

Pegou rapidamente um pacote, sentindo o plástico escorregar. Olhou para a mulher no balcão que estava lendo, que o olhou de volta, havia uma tristeza em seus olhos, parecia que ela já havia passado por uma situação semelhante.

Parecia que seus olhos perguntavam se ele estava bem.

Não podia dizer nada, afinal, o senso comum predominante da cidade afirmava que era melhor evitar o contato visual com alguém por muito tempo.

Dirigiu-se ao caixa e pagou pelo sabão. A atendente nem sequer o olhou, evitando o contato visual. Ela colocou o produto dentro de uma sacola e empurrou na direção dele. Ele rapidamente saiu da loja, pela entrada lateral aliviado por escapar daquele lugar.

Um vento gelado atingiu seu rosto. Trazendo um leve arrepio em seu corpo. Tinha um longo caminho a percorrer até chegar em casa, mas dessa vez estava feliz em ter conseguido o que precisava apesar do turbilhão de sensações que o acompanhou.

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