Assim que abriu a porta de seu quarto, foi engolido vivo pelo olhar de reprovação de sua mãe. O cheiro de sangue que exalava a fez enrugar o nariz, a expressão de nojo aumentava enquanto o olhava dos pés à cabeça. Não disse nada, apenas apontou na direção do banheiro.
Respirando fundo, ele seguiu para o banheiro sem olhar para a cama. O som forçado da respiração de Aiyê ecoava no quarto, e isso foi suficiente para tirá-lo do efeito anestesiado em que se encontrava.
Poderia ter tomado banho no centro de treinamento, mas precisaria separar roupas para levar. Sair em missão para a Ordem nunca levava apenas um dia, e internamente agradecia por isso. Não queria ficar em casa vendo Yê daquela forma. Carregaria a culpa por um longo tempo, se é que um dia se perdoar.
Seu pai tinha razão, a cegueira por Aiyê estava minando sua percepção. Não entendia porque estava se sentindo daquela forma, mas, depois do que a dama de companhia o havia confessado, notava que era algo muito comum em se tratando dela.
Enquanto a água quente caia em seu corpo, vinda de todos os lados dos chuveiros, relembrava as palavras da garota. Algo em Aiyê atraia a todos, o que explicava viver trancada, e ser odiada pela Rainha e suas filhas. Chamava mais atenção que elas, e isso as afetava onde mais doía. No ego.
No entanto, o perigo ia além dessa superficialidade. Lugar algum seria seguro, nem no clã, nem mesmo a seu lado. Levando em consideração que Beleth babava, desejando lamber o corpo de Yê inteiro toda vez que estava perto. Lembrar disso o levou as memórias do que estava prestes a fazer antes de toda aquela merda estourar.
Balançou a cabeça, tentando limpar a mente, mas ainda conseguiu ver a si mesmo lambendo o seio dela.
Com a respiração oscilando, abriu os olhos. Que porra tinha dado nele? Estava alto com algo que não fazia ideia, e havia perdido totalmente o filtro. O auto controle que o acompanhava tinha se fragmentado. Havia dito e feito coisas que nunca sequer imaginou, agiu por puro instinto e nem mesmo podia culpar Beleth, pois ele havia desaparecido de sua cabeça naquele momento.
Era dela?! De onde tinha tirado aquela besteira?! O que aquele cerimonialista tinha dado pra ele beber?!
Irritado, fechou os chuveiros e saiu do box, antes que começasse a afundar nas lembranças e chegasse em partes que alimentasse ainda mais o desejo do monstro dentro de si.
Vestiu seu uniforme tático, separou algumas roupas para levar, as colocou em sua bolsa de viagem e saiu do quarto sem olhar para a mãe. Assim que passou pela porta, sentiu algo puxar sua bolsa e seu corpo. Virou, encontrando Shu Ian. A mulher o encarava com uma das mãos na cintura.
— Vai trabalhar? Hoje?! – O fitava incrédula.
— É a Ordem, por um motivo bem pessoal, não podemos dizer não.
Ela revirou os olhos.
— Que seja! – Se aproximando dele, segurou seu rosto com ambas as mãos. Por ser um pouco mais baixa que ele, Khan teve que se curvar. – Tome cuidado, sim?
— Eu sempre tenho. – Riu.
— Estou falando sério, Liang Khan.
— Eu sei, mãe. Vou ter cuidado.
— Ótimo. – Disse, o soltando. – Façam uma boa viagem.
Como se não se importasse, deu as costas a ele e entrou no quarto novamente, fechando a porta na sua cara. Toda vez que saia a trabalho para a Ordem ela se sentia daquela forma. Ele era totalmente proibido de usar as habilidades de Beleth, por motivos óbvios. Mas, não importava, ele era mais que aquele verme do inferno!
A equipe escolhia as armas que levariam, quando chegou na central de treinamento. A partir daquele momento deveriam esquecer os nomes e adotar os codinomes, pois seriam nada mais que sombras. Huan era o único autorizado a mostrar a identidade e o nome. Dali em diante seria o chefe deles, e era um tanto engraçado vê-lo nessa posição, pois sua personalidade mudava drasticamente.
— Tiger! – O chamou, fazendo um sinal com a mão. – Protocolos... – Mencionou, assim que se aproximou. Balançava uma coleira de inibição de magia. Se sentia um cachorro toda vez que tinha que usar aquela merda.
Abaixando um pouco o uniforme que cobria seu pescoço, permitiu que Huan a colocasse. Ele conferiu o funcionamento das runas, e deu um tapa em seu ombro.
— Escolha suas armas, seu capacete já tá ali. – Mandou, apontando para a mesa onde seu material estava. Lhe dando as costas, saiu para conferir os outros soldados.
O uniforme e o capacete tático eram iguais para todos, cobria o corpo e o rosto inteiro, modificava o tom da voz, e era totalmente preto. Uma forma de torna-los ainda mais anônimos. Nada que fosse pessoal, ou que facilitasse um possível reconhecimento, deveria aparecer.
Olhando para a mão esquerda, Khan fitou a aliança por um momento. Tinha esquecido de tirá-la quando estava no closet. Deslizando o polegar sobre ela, a tirou guardando em um dos muitos bolsos do uniforme e se voltou para suas armas.
Foco!
O arsenal tomava um galpão inteiro no subsolo, o acesso era exclusivo ao Fantasma Negro, e as armas existentes nele tinham sido todas desenhadas por Khan. Eram únicas, e apenas de uso do grupo. Por esse motivo, era impensável perder uma única bala. Ainda que não repetissem o uso delas, não era prudente deixar um projétil solitário por aí.
— Ei coelhinho, tá atrasado! – Yang gritou, chamando a atenção de todos para Cheng, que de headphones, sequer o ouviu. Khan ouvia o chiado de Godzilla do Eminem no último volume. Mastigando um chiclete, ignorou a todos e foi até o balcão escolher suas armas. Percebendo sua presença só depois de guardar as armas em sua maleta, tirou os fones e o encarou.
— Sua esposa quase morreu e você vai trabalhar?
— Cuide da sua vida, Bunny. – Khan simulou duas orelhas com os dedos indicador e médio, movimentando-os como se fizesse aspas.
Cheng riu.
— PRONTOS? – Huan gritou, sua voz ecoou pelo galpão.
— SIM SENHOR!
— Então vamos, já estamos atrasados! E se eu ouvir alguém falando prenome, vai ter que aprender a voar, entenderam?!
— SIM SENHOR!
Passando por Cheng, Huan deu tapa na cabeça dele.
— Tire essa merda, e cospe esse chiclete! – Mandou, estendendo a mão.
— Mas, vamos passar horas naquele Y-20! – Contestou, pelos fones, claro.
— E vai fazer o que com seu capacete, Rabbit?
— Temos mesmo que usá-los dentro do avião?
— Tá me zoando? Volta pra sua mãezinha, ela vai adorar ficar olhando pra essa sua cara feia!
— Tsk! - Estalando a língua, Cheng arrancou o headphone e o arremessou no balcão de armas. Cuspiu o chiclete na mão de Huan e o encarou. – Babaca! – Provocou, dando as costas. Seguiu o grupo para o jato, colocava o capacete enquanto andava, a raiva evidente em cada movimento.
Huan olhou para Khan, o sorriso largo de satisfação, mas balançava a cabeça negando. O mais novo não se acostumava nunca com as regras.
— Vê se descansa um pouco, ok? Não sei se vamos ter tempo pra isso lá. – Recomendou, enquanto jogava o chiclete do irmão no lixo e limpava a mão com um lenço.
— Hum. – Apenas resmungou. Se sentia acabado, a mente cheia. Não queria pensar em nada, apenas desligar, mas tinha medo de fechar os olhos e relembrar coisas que só o deixariam mais cansado.
Foi assim durante toda a viagem, não conseguiu pregar o olho um único momento, sua mente povoada por Aiyê e todos os problemas que ela trazia. Não devia se apegar, se aproximar, ou mesmo sonhar em ter um casamento normal. Não era essa sua intenção, mas a atração que sentia por ela ameaçava destruir todos os seus planos.
Precisava ficar longe, e se esforçaria o máximo para isso. Independente do que ela o fizesse sentir, não podia se deixar levar, principalmente por ter acesso as baboseiras que Beleth alimentava. Ela estava fadada a morte, e ele seria tragado junto se não agisse rápido. Usaria aqueles dias para se desintoxicar, e voltaria a ser o que sempre fora. Calculista.
Assim que o Y-20 pousou na pista, o carro blindado foi tirado para levá-los até a Sede da Ordem. Nova York era um caos, mas o prédio comercial “comum” dos Sacerdotes era o verdadeiro inferno na terra. A mistura de energia dos seres daquele lugar era capaz de atordoar, ou mesmo matar um humano a quilômetros de distância. Porém, no momento que se pisava próximo dele, a energia de qualquer Descendente era anulada.
O que pouco importava para o Fantasma Negro. Fora Khan, o esquadrão só utilizava o poder de combate com as armas que levavam, e as artes marciais. Seu poder estava na brutalidade com que agiam, e não em magia. Jamais mostrariam suas habilidades inatas a eles. Embora a relação fosse considerada “amigável”, se expor dessa forma era o mesmo que dá um tiro no próprio pé.
Estavam lá apenas para duas tarefas: invadir a base do inimigo, e prendê-lo para os Sacerdotes.
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Atualizado até capítulo 73
Comments
Delha Ribeiro
vai sonhando a saudade e ainda pior 🤭🤭🤭🤭🤭🤭
2024-04-04
1
Delha Ribeiro
deve sim se apegar, se aproximar,se apaixonar enfim a gente que kkk🤭🥰
2024-04-04
1
Delha Ribeiro
🤣🤣🤣🤣🤣🤣🤣
2024-04-04
1