— Os bombeiros conseguiram apagar o fogo, impedindo que o incêndio se espalhasse pela estação, mas os estragos, até o momento, custarão bilhões aos cofres públicos. Como podem ver, metade da estação quebrou e afundou no rio Hudson, levando consigo vários contêineres. Os mergulhadores trabalham para encontra-los...
— Deveríamos enviar um presente de agradecimento a Matthew? A inteligência dele e de seu grupo é invejável – Khan questionou Huan, ironizando, ao mesmo tempo em que diminuía o volume da tv.
— Ainda me pergunto o que ele estava fazendo lá. – Huan comentou sem olhar na direção do irmão. Mesmo ele estando na sua frente, seus olhos davam prioridade para a tela do tablet que tinha em mãos. Lia alguns dos muitos e-mails da empresa, e outros referentes a pedidos de contrato com o grupo Fantasma Negro.
— O de sempre... Aumentar a força interna.
— Não sabemos até onde as habilidades inatas dela vão, nem se é mesmo capaz de causar o que dizem que pode.
— Pensar não é o forte de Vacchiano. – Mencionou, alinhando a túnica branca simples e sem mangas que vestia. Faltava menos de uma hora para chegarem no Reino dos Descendentes de Ogun, e da última vez em que tinha estado no lugar, por pouco não havia morrido de calor. Como um lugar podia ser tão quente?
— Os Sacerdotes da Ordem entraram em contato. Pediram nosso trabalho no caso do contêiner, mas, tive que recusar... Estamos muito ocupados com as invasões dos demônios em nosso território.
Khan riu.
— É realmente uma pena.
— Está preparado? Será um homem casado em poucas horas. – Lembrou.
— Por incrível que pareça... Sim. – Mencionou, fitando a janela do jato particular.
— Ela realmente mexe com você, não é?
— “Mexer” é uma palavra simples. Ela é a única que pode me matar, mas também é a única capaz de me fazer sentir vivo. Tem algo mais irônico que isso?
— É perturbador.
— Exato. É assim que me sinto. Diferente de Beleth, que age como uma “cadelinha” quando estou perto dela.
Huan riu.
— Se o objetivo era esse, quem a enviou deve estar muito satisfeito.
— Ou não faz ideia do que fez.
Tirando os olhos do tablet pela primeira vez, Huan encarou o irmão mais velho.
— A devoção dele beira a obsessão. Minha mente é inundava pelas merdas dele.
— Que tipo de merda estamos falando?
Khan encarou o irmão, analisando se era prudente revelar. O sedativo calava Beleth por um tempo, mas percebeu que desde a primeira vez que viu Aiyê, o efeito dele era anulado de imediato quando estava perto dela. Ela era como um veneno, se espalhava por seu organismo de forma rápida e letal, o entorpecendo, inibindo suas habilidades. Tornando-o vulnerável, e como um louco, ele implorava para que ela o matasse lentamente.
Teria que aumentar a dose se quisesse evitar consequências desastrosas. E mesmo que não gostasse de se sentir daquela forma, exposto, precisaria falar para Huan.
Passando a mão esquerda pelos cabelos, desviou o olhar para a janela do jato novamente.
— Das que fodem com a moral de qualquer um. – Confessou de forma contida. Não se aprofundaria em detalhes, e seu irmão não lhe pressionaria. Guardaria para si o desejo doentio de Beleth em emergir de sua pele, apenas para saciar os desejos obscenos que nutria por Aiyê.
Não facilitaria as coisas para ele.
Avistando o Reino dos Descendentes de Ogun, encoberto pelas montanhas rochosas e distante de onde os turistas acreditavam ficar o berço sagrado da humanidade, Khan teve a atenção roubada pelas cores chamativas que se espalhavam por todo o território.
Construído dentro das próprias montanhas, o reino trazia uma aparência ancestral, mas tinha seu charme. Os grandes salões e corredores exibiam grandes pilares, que mostravam desenhos detalhados sobre cada uma das entidades da cultura Yorubá, assim como também contavam a história por trás das conquistas do panteão.
O piloto avisou que faria a aproximação, e em resposta, Huan lhe passou a segunda dose do sedativo daquele dia.
— Aumentei a dose, por precaução. – Avisou.
Amarrando a liga em seu próprio braço, Khan a segurou com a boca e aplicou o líquido azul em si mesmo. Devolvendo tudo para Huan, assistiu seu irmão guardar as coisas na maleta.
Seria o primeiro a chegar, como noivo era seu dever. Seu pai viria logo depois, acompanhado de suas duas esposas e o filho mais novo. Cheng. Como seu conselheiro, ainda que fosse da família, Huan o acompanharia na chegada e nas visitas que faria aos templos dos Deuses.
Assim que o jato pousou e Khan pisou em solo Yorubá, o ar quente e abafado subiu, fazendo seu nariz secar. Dentro do palácio o ar esfriaria um pouco mais, devido a umidade da vegetação. Mas, ainda assim, seria quente.
A Guarda Dourada do Rei formava duas fileiras, uma de cada lado, fazendo uma espécie de barreira pelo caminho que passaria. Eles eram enormes, tanto em tamanho quanto em massa corporal, e por um momento Khan se perguntou se teria força física para enfrentar alguns deles em um duelo amigável. Seria um bom desafio. Ele era forte, mas seu porte não chegava nem perto do daqueles soldados. Estava curioso, muito tinha se ouvido sobre a Guarda Dourada do Rei Zaire. Diziam que eram resistentes como rochas. Queria testar.
A sua frente, a poucos metros, o Rei e os Príncipes – Daren e Taiwo – o esperavam. Adornados com colares de contas coloridas, mesclavam as peças com as de ouro puro que exibiram como acessórios. A imagem dos três carregava a força do Reino na postura imponente, com um filho de cada lado, o Rei sorria satisfeito.
As vestes brancas e azul anil os diferenciava dos servos e dos demais que circulavam pelo palácio.
— Bem vindo, meu filho. A partir de hoje, nosso Reino também é seu. – Zaire o cumprimentou com um anúncio. Ambos os braços estavam abertos, um gesto que expressava muito sobre seu povo acolhedor.
— Majestade. – Khan fez uma reverência, sendo seguido por Huan. – Príncipe Daren, Príncipe Taiwo. – Tornou a fazer uma reverência, mas assim que voltou a postura normal, se deparou com o Rei a centímetros dele.
Colocando ambas as mãos em seus ombros, ele sorriu largamente.
— Vamos conhecer o Reino, e pedir bençãos aos orixás, pois tenho certeza que Olódùmarè já os cobriu com suas bençãos.
Khan sorriu.
Entendia as ações do Rei em relação a filha, não as julgava. Porém, particularmente, faria diferente. Os princípios de seu clã eram proteção e fidelidade a família, e isso ele seguiria à risca. Não importasse quem, se tentasse prejudicar a ele ou aos seus, Khan o esmagaria como um inseto.
Dessa forma, eles seguiram para o templo de Ogun.
A cada pilastra que passavam, o Rei lhe explicava a que história aludia as ilustrações. Khan ouvia a tudo com atenção e interesse, apreciava uma boa arte ancestral. Huan por vezes brincava, dizendo que ele parecia ter pertencido a outro tempo, pois, para sua idade, não era muito comum.
Independente de classe social, jovens eram jovens. No entanto, Khan sempre gostou de musicas clássicas, teatro, ópera... Era culto e cortês como um lorde, mas também podia ser exigente e inflexível como um autocrata. O desejo agridoce dos Anciãos do clã Sun Yee On, por quem alimentavam sentimentos antônimos, roubava as atenções onde quer que fosse.
Ainda que inibisse sua energia, deixando-a quase nula, os efeitos dela causavam certo alvoroço. A mistura incomum de seu sangue e alma, que se mesclavam com o Daemon, o tornava o centro de atenções. Khan odiava isso, embora usasse para benefício próprio algumas vezes.
Os olhares de cobiça, inveja e obsessão o causavam repulsa.
Entretanto, quando esbarrava em sentimentos livres dessas energias ruins, se permitia apreciar a companhia. Era o que fazia naquele momento.
Vez ou outra questionava o Rei sobre detalhes que havia tido contato por meio de seus estudos, por algum motivo tinha se debruçado mais do que precisava sobre a cultura Yorubá.
Prontamente, o Rei satisfazia as suas dúvidas. Por esse motivo a visita aos templos tinha se prolongado mais do que o imaginado. Após entregar a espada que havia feito com as suas próprias mãos para Ogun, seguiram aos demais templos, apressado sempre por Huan, que agora mais atento ao relógio, o fazia seguir à risca os compromissos. O Rei e os Príncipes o deixaram logo após lhe entregarem os seus presentes. Armas. Com as quais os impressionou por saber manusear cada uma.
Ao ser questionado pelo Príncipe Daren, se teria uma favorita, Khan respondeu:
— Na verdade, não. Aprecio todas, porque não faz diferença. Eu sou a verdadeira arma, elas são apenas instrumentos. – Sua resposta fez o Rei gargalhar. No entanto, percebeu o desconforto do Príncipe Daren. Sentia a hostilidade dele, mas a ignorou durante todo o percurso. Não queria estragar aquele dia soltando farpas com aqueles que logo seriam sua família.
— Desse jeito será você a entrar por último, e não a noiva. – o seu irmão ironizou.
— Cale a boca e me dê a garrafa de água, antes que eu morra.
Rindo, Huan o entregou a garrafa.
— Certo, última parada? – Perguntou fechando a tampa da garrafa.
— Consultar o vidente e vestir seu Traje.
— Ótimo! Não aguento mais sentir o cheiro do meu suor.
Huan ria a cada frase do irmão, o calor parecia o incomodar mais que qualquer coisa. Para quem estava fadado ao inferno, era no mínimo irônico.
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Atualizado até capítulo 74
Comments
LadySillver34
kkkk, rsrs eu ja achando que Khan era um...
e agora confusa 😕, não é?
2024-04-02
1
LadySillver34
kkk será o chamado " inferno de 🔥??
2024-04-02
2
Delha Ribeiro
Caramba então ele não pode realmente tocar nela por causa do demônio que vive dentro dele e que é sedado constantemente?🤔😱😱😱😱
2024-04-03
1