Capítulo 2 | Um estranho muito irritante - parte II

Anastácia se virou, abruptamente cobrindo seu rosto com os antebraços. A pancada veio forte, fazendo-a rolar sobre a terra solta e morder os lábios pela dor intensa.

— Covarde! — A curandeira murmurou cerrando os dentes.

O homem encarou-a. As feições desproporcionais, sujas e não-humanas lembraram a jovem de um animal de circo. O circo abandonado pelo capeta. Comparar a aparência do verme em sua frente... Oh não, ela deveria parar de pensar, estava ofendendo o verme. O pedaço de madeira, agora quebrado, foi atirado em direção a Anastácia.

A curandeira impulsionou seu corpo para frente em uma cambalhota, desviando do objeto e levantando-se com o impulso. O homem não recuou, ele correu para cima. Anastácia odiava admitir, mas era difícil lidar com o físico do brutamontes, principalmente quando a mão encardida de terra e barro circundou seu pescoço, pressionando-a contra a parede do beco.

Buscando alívio do aperto, a jovem segurou-se com uma mão, aplicando sua força sobre pulso descoberto do homem, a outra desceu até a faca presa abaixo das camadas do vestido amarelo. Ela faria. Anastácia cortaria prazerosamente a carótida daquele infeliz e assistiria o sangue jorrar rapidamente. A poça do líquido vermelho se misturaria com a terra formando uma espécie de argila vermelha. A cena seria bela. No entanto, ela não podia, precisava se controlar, tarefa difícil esta enquanto sentia o ar não chegar a seus pulmões.

Ela pensou nas opções, era fácil escapar, poderia fazê-lo graciosamente. Porém, para seu azar, em um piscar de olhos seu pescoço estava livre.

Anastácia observou o homem nojento ser lançado como um saco de batatas no chão. Antes que pudesse se mover, o braço usado para sufocá-la estava torcido sobre as costas do homem enquanto o outro era segurado acima da cabeça, a palma aberta cravada no chão.

O agressor estava completamente imobilizado, seu rosto desprezível pressionado sobre o solo. Sob suas costas, dificultando a respiração, estava o joelho do """salvador""" de Anastácia.

Imediatamente, a jovem deslizou até o chão, fingindo uma pesada crise de tosses. Lágrimas se formaram em seus olhos enquanto assumia o papel de dama frágil e assustada. Suas roupas e cabelo eram uma bagunça, quem quer que fosse o homem que imobilizava o covarde, não faria perguntas.

— Senhorita, está bem?

Ou talvez fizesse, mas essa pergunta era clássica, fácil de responder. Anastácia levantou seu olhar, encarando-o. Ele vestia um conjunto verde-escuro, não haviam detalhes chamativos, apenas a corrente dourada do relógio de bolso se destacava em meio as peças monótonas. Os olhos verdes miravam Anastácia, o cabelo escuro contrastava com a pele clara, poucas mechas teimosas caiam sobre a testa do homem. A curandeira não podia saber ao certo a cor dos fios, estava escuro demais, ela julgou que estariam em algum lugar entre castanho-escuro e preto.

E, estava completamente errada, eram vinho. No minuto em que um mísero resquício de luz entrou em contato os fios se mostraram vermelhos, a cada segundo tornando-se mais intensos.

— Sim. — Anastácia levantou-se, ela bateu as camadas do vestido e a poeira se levantou no ar. Então, a jovem apontou para a sacola a poucos metros deles. — Isso, ele roubou de uma amiga.

O homem suspirou, ignorando os infinitos xingamentos do ladrão.

Os lábios de Anastácia se curvaram em um sorriso vitorioso enquanto observava o ladrão desistir de escapar. Ela andou em direção à sacola, fazendo questão de "por acidente" pisar sobre a mão do bandido.

— Desculpa! Não era a intenção. — Anastácia carregou sua voz com falsa culpa.

— Não? — O ruivo destinou um olhar confuso para ela, uma de suas sobrancelhas elevadas.

A curandeira riu baixo, o som era doce e agradável e o único resquício de alegria naquele beco. Ela abaixou-se, tomando a sacola para si; tentou mover seus lábios para dizer algo, mas novos passos chamaram sua atenção. Enfim, a guarda da cidade se aproximava. Dois soldados mal encarados estavam poucos metros de distância de ambos.

O ruivo levantou-se, junto do ladrão.

— Façam seus trabalhos decentemente. — Com um empurrão, o bandido foi jogado aos soldados. — Não deixem cidadãos fazerem seu serviço.

Sem palavras de defesa, os homens arrastaram o desgrenhado - os apelidos para o bandido sem ofender animais estavam se esgotando na mente de Anastácia - pelo beco.

O bandido retornou a xingar, fazendo a jovem coçar seu ouvido direito. Irritante.

A atenção de Anastácia retornou a si mesma ao sentir um tecido pesar sobre seu ombro. Com sua mão livre, ela ajustou o casaco, encarando atentamente o ruivo já há passos de distância.

— Seu vestido está rasgado. — Ele parou e, por cima do ombro, encarou a sacola roubada que a jovem segurava. — Pode devolver isso para sua amiga.

— E isso seria gentil da parte dele, não?! — Retornando a conversa com sua irmã, Anastacia bateu contra o balcão.

Natasha, por reflexo, segurou o vaso de flores, impedindo que o vidro se espatifasse no chão.

— Ana, isso foi gentil da parte dele. Que vergonha seria se uma dama andasse por aí com o vestido rasgado! Que sofrer chacota por onde passar!? — Um olhar cortante da mais velha correu para a mais nova. — Até agora o único problema que encontrei foi você querendo cometer um assassinato a luz do dia!

— Irmã! — Anastácia gritou. — Fale baixo!

Após contorcer sua expressão, o olhar de Natasha suavizou, bem como seu tom:

— Por que isso não foi gentil da parte dele?

— Ele insistiu em me trazer até aqui, até aí sem problemas. A não ser o fato dele com toda aquela! Aquela!

— Aquela o que Anastácia! Desaprendeu a falar?

— Aquela pompa! Até ele dizer aquilo com toda aquela pompa! — Anastácia preparou suas cordas vocais, o mais grave e rouco que pode ela entoou: — Se vai salvar algo ou alguém, trate de garantir que não vai precisar envolver terceiros.

Os lábios de Natasha se curvaram em um sorriso suave enquanto lentamente o ar escapava por suas narinas.

— E isso mexeu com seu pequeno ego.

— É evidente que sim! — Anastácia circulou o balcão até chegar ao ponto inicial. — Por isso eu vou fazê-lo engolir essas palavras! Eu não precisava de nenhuma ajuda, ele se intrometeu nos assuntos alheios!

Enfim, Natasha organizou todas as flores no bendito vaso. Se sua irmã decidisse bagunça-lo, como ela jogaria a mais nova na frente da roda de uma carruagem!

— Ao menos sabe o nome dele?

— Isso é uma boa questão! Preciso descobrir.

— Sim, sim! Quando descobrir me fale. — Natasha revirou os olhos e retornou ao seu laboratório tão rápido como o diabo foge da cruz. Irritada, ela bateu a porta atrás de si e gritou, já abafado pela madeira: — Preciso agradecê-lo!

Franzindo o cenho para o vácuo que sua irmã deixou, Anastácia sorriu brincalhona. Propositalmente, ela moveu cada uma das flores, bagunçando o trabalhoso arranjo da mesma forma que bagunçaria a vida daquele belo homem. Ela apenas precisava de um nome e seria como um tornado.

Capítulos
1 Prólogo
2 Capítulo 1 | Um estranho muito irritante
3 Capítulo 2 | Um estranho muito irritante - parte II
4 Capítulo 3 | Uma estranha muito familiar
5 Capítulo 4 | Os irmãos
6 Capítulo 5 | A raiz da coincidência
7 Capítulo 6 | Enfim, a coincidência
8 Capítulo 7 | Aquele labirinto de folhas
9 Capítulo 8 | O verde pode ser uma cor viciante
10 Capítulo 9 | Problemas de terceiros, ou não
11 Capítulo 10 | Captain Harry Roderick
12 Capítulo 11 | Três irmãs e uma distração
13 Capítulo 12 | Você está em todo o lugar?
14 Capítulo 13 | Uma rainha em seu trono improvisado
15 Capítulo 14 | A escuridão brilha
16 Capítulo 15 | A garota acometida pela praga
17 Capítulo 16 | Você não sabe o quão bela pode ser.
18 Capítulo 17 | As vítimas
19 Capítulo 18 | A Rosa e a Erva Daninha
20 Capítulo 19 | Croissants
21 Capítulo 20 | O mundo não é gentil com muitos
22 Capítulo 21 | Campo de dente-de-leão
23 Capítulo 22 | Quiçá apenas o início
24 Capítulo 23 | A bagunça de tintas
25 Capítulo 24 | O casal feliz
26 Capítulo 25 | Para você minha mão está sempre estendida
27 Capítulo 26 | Não sentir é diferente de não demonstrar
28 Capítulo 27 | Até amanhã | +18
29 Capítulo 28 | Mocinhos e piratas
30 Capítulo 29 | Ninguém deveria sofrer assim
31 Capítulo 30 | O fim?
32 Capítulo 31 | Uma pequena curiosidade
33 Capítulo 32 | Obrigada por se importar
34 Capítulo 33 | Família
35 Capítulo 34 | Eu te amo mais do que um dia imaginei que seria capaz
36 Capítulo 35 | Eu vou ficar bem
37 Capítulo 36 | Sangue
38 Capítulo 37 | O Conde de Misty Bossom
39 Capítulo 38 | O fim de uma aflição
40 Capítulo 39 | Três dias
41 Capítulo 40 | A chuva trás boa sorte
42 Capítulo 41 | As chamas consediam luz e calor
43 Capítulo 42 | Felicidade
44 Capítulo 43 | Para que o meu querido...
45 Capítulo 44 | Covardia
46 Capítulo 45 | Final
47 Capítulo 46 | Epílogo
48 FIM
Capítulos

Atualizado até capítulo 48

1
Prólogo
2
Capítulo 1 | Um estranho muito irritante
3
Capítulo 2 | Um estranho muito irritante - parte II
4
Capítulo 3 | Uma estranha muito familiar
5
Capítulo 4 | Os irmãos
6
Capítulo 5 | A raiz da coincidência
7
Capítulo 6 | Enfim, a coincidência
8
Capítulo 7 | Aquele labirinto de folhas
9
Capítulo 8 | O verde pode ser uma cor viciante
10
Capítulo 9 | Problemas de terceiros, ou não
11
Capítulo 10 | Captain Harry Roderick
12
Capítulo 11 | Três irmãs e uma distração
13
Capítulo 12 | Você está em todo o lugar?
14
Capítulo 13 | Uma rainha em seu trono improvisado
15
Capítulo 14 | A escuridão brilha
16
Capítulo 15 | A garota acometida pela praga
17
Capítulo 16 | Você não sabe o quão bela pode ser.
18
Capítulo 17 | As vítimas
19
Capítulo 18 | A Rosa e a Erva Daninha
20
Capítulo 19 | Croissants
21
Capítulo 20 | O mundo não é gentil com muitos
22
Capítulo 21 | Campo de dente-de-leão
23
Capítulo 22 | Quiçá apenas o início
24
Capítulo 23 | A bagunça de tintas
25
Capítulo 24 | O casal feliz
26
Capítulo 25 | Para você minha mão está sempre estendida
27
Capítulo 26 | Não sentir é diferente de não demonstrar
28
Capítulo 27 | Até amanhã | +18
29
Capítulo 28 | Mocinhos e piratas
30
Capítulo 29 | Ninguém deveria sofrer assim
31
Capítulo 30 | O fim?
32
Capítulo 31 | Uma pequena curiosidade
33
Capítulo 32 | Obrigada por se importar
34
Capítulo 33 | Família
35
Capítulo 34 | Eu te amo mais do que um dia imaginei que seria capaz
36
Capítulo 35 | Eu vou ficar bem
37
Capítulo 36 | Sangue
38
Capítulo 37 | O Conde de Misty Bossom
39
Capítulo 38 | O fim de uma aflição
40
Capítulo 39 | Três dias
41
Capítulo 40 | A chuva trás boa sorte
42
Capítulo 41 | As chamas consediam luz e calor
43
Capítulo 42 | Felicidade
44
Capítulo 43 | Para que o meu querido...
45
Capítulo 44 | Covardia
46
Capítulo 45 | Final
47
Capítulo 46 | Epílogo
48
FIM

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