Estou chegando

 

 

 

_ Roberto calcula absurdamente tudo que vai fazer e consegue fazer isso em um estalar de dedos. Sei que ele está chegando, até seis horas faltam quase duas. Não quero tirar a atenção dele, por isso não mando mensagem a cada cinco minutos, mas não evito me perguntar a todo momento se ele está bem.

_ É verdade! Mas saiba que pelo que conheço dele posso te dizer que está sabendo se virar. E a Júlia?

_ Verdade! Ela ainda não me respondeu! Vou ligar!

    Marina pega o telefone e liga para Júlia.

_ Oi? Como vão as coisas por aí?

_ Estou quase chegando aí! Achou que eu iria perder o melhor da festa ?

_ Você bebeu ou sua voz está assim por outro motivo?

_ Bebi um pouquinho! Nada que afete meu raciocínio lógico.

    Se fosse em outro momento Marina teria tecido alguma brincadeira, ou até mesmo acompanhando um bom papo de bebida. No momento o que Marina pensa é em manter sempre o foco, isso a decepciona um pouco.

_ Júlia! Você está dirigindo embriagada? Não sabe que pode perder sua vida em um acidente?

_ Relaxa! Nessa altura isso não é uma opção muito ruim. Agora teremos que andar todos encapuzados dos pés as cabeças com medo de sermos mordidos. Aí eu pensei que se eu não tomar minha bebida favorita, estiver junto dos que eu amo e aproveitar, o que faria?

       Júlia dirige com a mão direita no volante e a esquerda para fora do carro esbanjando uma garrafa de espumante. No banco do passageiro Bartolomeu com sua coleira azul, parecendo uma camisa apertada.

_ Só chegue logo!

_ Tô quase aí! Cinco ou seis quadras agora. Ou mais? Não! Perdi a banca de jornal vermelha. Já achei, Três quadras agora.

_ Graças a Deus! Vou desligar então.

    Marina desliga. Júlia encerra a ligação jogando o celular no banco de trás. Ela para no sinal vermelho distraída, dois homens se aproximam do carro anunciando assalto. Assim que Júlia percebe a arma sua atenção é desviada para o gato, Ela o pega, solta-se do cinto de segurança e abre o carro lentamente com Bartolomeu no colo. Os dois entram rapidamente e arrancam o carro ao sinal verde, tudo antecipadamente cronometrado por eles.

_ Que filhos da puta! Ainda bem que estou perto!

    Talvez inclinada a embriaguez sua falta de espanto seja questionável. Júlia permanece inabalável, para ela realmente agora tudo é lucro. Ela caminha um pouco e chega na casa.

_ Cheguei! Olá crianças! Que desenho é esse?

_ Tia!

    Natália levanta e a abraça. Cumprimenta o gato com carinho no pescoço.

_ Nunca fui muito fã dessas coisas de ficar assistindo desenho! Sempre gostei de estar no quintal mexendo em tudo  do que estar parada vendo essas mentiras de fadas e tudo mais! Sabia que as princesas da vida real morrem secas se forem esperar pela água de amor do homem? Eles estão dormindo? São quase cinco horas da tarde ainda. Eles acordaram muito cedo né?

_ Sim tia! E também não fazem ideia de nada ainda.

_ Faz sentido! Eu bebi um pouquinho, essa garrafa até aqui mais ou menos, o resto foi Bartolomeu. Roubaram meu carro com a mala recheada, acredita? Onde está sua mãe?

_ Na cozinha!

_ Vamos lá! Deixem eles dormindo.

    Ambas se dirigem para cozinha.

_ Eu sinceramente espero que não estejam falando mal de mim!

_ Ué? Você não disse que estava de carro? Veio a pé por quê?

_ Assim que desliguei nossa chamada fui abordada por dois homens armados que levaram meu carro e todas as bebidas na mala! Bolsa, celular, tudo. Mas olha aqui eu não fui levado.

    Júlia segura as patas de Bartolomeu fazendo ele de fantoche a gesticular.

_ Não acredito! Como consegue estar assim calma?

_ Você fala isso é porque não sabe o tanto que venho xingando eles até aqui! Mas passou! Quero saber de Roberto, não me respondeu ainda. Antes de sair de casa perguntei se ele estava chegando, não acha que a essas horas já deveriam ter chegado? Liguei várias vezes mas parece que está desligado.

_ Tem razão! Acha que devo ligar para ele?

    Paula fica pensativa quanto a possibilidade de Roberto não conseguir chegar. Ela sabe que a hora é crucial. Natália fica esperando um possível veredito a seguir  e acredita que alguém precisa tomar uma atitude qualquer.

_ Tem como alguém me dizer quando vamos começar a discutir sobre como sairemos de casa? Possivelmente o pai deve estar preocupado demais tentando chegar, e quando ele chegar precisamos já ter tudo decidido! Mas nós estamos aqui sem perspectiva alguma. Temos que estar prontas!

_ Tem razão Natália! Vamos separar algumas coisas caso a coisa fique feia. Você me ajuda a achar?

_ Sim tia. Vamos na garagem.

    Elas dão as mãos e seguem para os fundos da casa.

 

_ Aqui tia! Nesse armário que ficam as ferramentas, essa porta está travada. Temos que colocar o pé debaixo, segurar a maçaneta empurrando para cima e pronto!

_ Vejamos! Martelos, facões, fico com o pé de cabra. Temos um machado, isso é bom! Agora temos foices ou alguns cabos de madeira para que possamos fazer umas pontas? Sei lá! Gosto de pensar que algo longo possa ajudar muito.

_ Vou fazer um também. Quero ficar com esse facão! Como faço para manter escondido comigo?

_ Você pode pendurar na altura do quadril e esconder por dentro da calça. Se preferir podemos fazer uma adaptação atrás de uma mochila, você poderia esconder o cabo rente sua cervical, cobrir com o cabelo. O negócio é sempre esconder.

_ E como você vai esconder o pé de cabra?

_ Dou um jeito. O importante também é não esquecer de manter mais opções. Tenha pelo menos três objetos escondidas em lugares diferentes e a cereja do bolo fica na sua manga.

    Júlia segura o braço direito de Natália e dobra parte de sua manga para fora. Pega um estilete, levanta a lâmina fazendo um corte vertical em relação ao comprimento.

_ Agora pegamos essa serra e quebramos! Esse pedaço você esconde aqui!

    Júlia empurra o pedaço de serra com o dedão, fazendo que fique presa  em uma simples virada.

_ Obrigado tia! Tem mais facas na cozinha.

_ Me diga! O que você acha disso tudo?

_ Eu só quero sair daqui logo. Alguma coisa me diz que não estamos seguros nessa casa. Meus irmãos me preocupam muito, principalmente Maria.

_ Seu pai vai chegar logo! Com certeza vamos sair daqui, pegar a estrada e as coisas irão se normalizar em breve. Além do mais! Vou fazer o que puder para te ajudar com eles no que for preciso.

 

    Roberto conseguiu tirar o carro da mãe da garagem, para sua surpresa ela tem cuidado melhor, seus conselhos para deixa-lo ligado as vezes por certo tempo afim de manter a bateria em funcionamento lhe surtiu algum efeito. Dona Eliana acredita que irá comemorar uma data especial, Roberto consegue conter sua enorme preocupação mesmo com tudo que teve que passar, até mesmo agora, quase  para chegar um quilômetro de distância do pedágio da ponte. Responde as inúmeras perguntas feitas pela mãe em variados momentos, quase cem por cento de suas respostas são automáticas. Contudo relembrar as passagens de outros tempos tem lhe sido útil no momento, reduz seu nível de preocupação que a essa altura parece como um panela de pressão chiando. Há um homem no carro ao lado direito em discussão efervescente ao telefone, Roberto  apenas o vê em suas expressões de raiva entre altas gesticulações e pancadas no volante. No carro da esquerda duas mulheres que desenvolvem um assunto qualquer, parece interessante devido seu nível de entrosamento, ambas parecem bem compenetradas em algo importante a ser decidido. Na frente um senhor de cabelos brancos, aparentemente irritado coloca a cabeça por diversas vezes para fora.

_ Mamãe! Preciso que espere no carro. Tenho que saber o porquê de estarmos parados a tanto tempo.

_ Mas é sempre assim meu filho!

_ Não a essa hora! Não sem o carro andar nada por quase meia hora.

    Embora os letreiros acusem um acidente na altura da saída do pedágio, algo em seus pensamentos advertem um perigo maior. Ele volta para o carro sem nenhuma informação, apenas sente que precisa ir andando.

_ Mãe! Temos que ir andando. Na descida pegamos um carro.

_ Você ficou louco?

_ Estou prestes a ficar! Vejamos o que pode estar causando isso.

    Roberto pega o celular para verificar se há algo que justifique essa demora. Fica assustado ao ver que seu aparelho não tem bateria.

_ Droga! O carregador ficou no meu carro. Como vou fazer para me comunicar com Marina? Ela pode achar que aconteceu o pior!

_ Calma! Você está agitado desde que me abordou na rua. Meu filho? Está acontecendo alguma coisa que eu não saiba?

_ Não mãe. É que...

_ Já sei! Você está traindo sua esposa!

_ Continue tentando!

_ Não são horas para brincadeiras. Me diga o que está acontecendo agora!

_ Temos que sair da cidade por um tempo e ver como tudo irá se desenvolver. Não sei se você ouviu falar sobre um surto de doença...

_ Bobagem! Isso não passa de preocupação. Um bando de desinformados!

_ Pensei que fosse. Marina conseguiu informações do hospital, você não vê o jornal?

_ Não entendi!

_ Uma hora irá entender! Só preciso que confie em mim.

_ Eu confio meu filho! Eu só acho que quando não estamos pensando com calma, acabamos agindo por impulso...

_ Já sei!

Roberto abre a porta do carro novamente e bate na janela do carro ao lado. O homem que ainda discute ao celular pede para alguém do outro lado da chamada esperar e abre o vidro.

_ Desculpe interromper sua conversa. É que o meu telefone está sem bateria nenhuma e eu preciso avisar que estou a caminho. O senhor não teria um carregador para emprestar, eu já te devolvo.

    O homem não responde nada. Apenas pega o cabo com adaptador para carros, entrega e fecha o vidro.

   _ Obrigado!

    Roberto entra no carro, conecta o celular. Solta uma boa quantidade de ar pela boca expressando seu alívio.

_ Agora sim!

 

    Marina e Paula discutem sobre divisão de pessoas e bolsas por carro.

_ Temos o seu carro, o de Roberto e o meu. Sempre digo que carros espaçosos são os melhores, agora temos a prova da minha certeza. Vou com Roberto e as crianças, temos bom entrosamento, creio que saberei acalma-los.

    Júlia e Natália chegam na cozinha.

_ Ficar com a mamãe pode ser complicado, mas sei que posso! Quero que deixe o Gustavo comigo. Eu sei que pode parecer loucura, mas Natália e eu cuidaremos dele. Você precisa ir com a Paula por questão de segurança.

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