16 • Protelar

Para quem não desejavam ser descobertas, nós duas nos arriscamos de uma maneira insana, eu diria. Estávamos no terraço do prédio, meu corpo apoiado no parapeito enquanto Antonella me levava a um lugar bem mais alto que aquele edifício, com sua língua enlouquecedora.

Ofegante, puxei ela para que ficasse de pé e beijasse meus lábios novamente.

— Isso é uma completa loucura — falei em seus lábios.

— Por isso você gosta. — Senti seus dentes mordiscando meus lábios. — Adora e teme minha intensidade na mesma proporção.

— Talvez... — Sorri notando o passear de seus olhos por meu rosto.

— Preciso voltar, me despedir dos convidados. Me espera no hotel.

— Não posso.

— Por que não? — Ela afastou-se com o cenho franzido.

— Já é tarde e o David...

— David? Já se passou quase um mês desde que falou sobre pedir o divórcio.

— Não consegui — confessei.

— Como não? Não me diga que desistiu porque nos afastamos.

— Não! — Arrumei meu vestido, me afastando da beirada. — Eu só... Não queria ter que lidar com tudo ao mesmo tempo.

— Até quando vai ficar esperando o melhor momento? Sabe que ele pode nunca chegar.

— Antonella... — Eu não queria toda uma pressão. — Não quero discutir sobre isso agora.

— Não é uma discussão, quero apenas entender.

— Eu também gostaria de entender seu casamento com Stella, no entanto... — Dei de ombros.

— Até quando, Brandon? — Seu tom e olhar eram perturbadores.

— Melhor você descer.

— Vai ficar brincando de casinha...

— Vou embora.

Quando cheguei em casa David estava assistindo a um jogo na TV. Segui para o quarto onde tirei a maquiagem e tomei um banho. Quando saí do banheiro, usando camisola, ele já me esperava na cama onde deu duas batidas. Eu sabia exatamente quais suas intenções. Vinha evitando há semanas, mas estava ficando cada vez mais difícil fugir.

— Não me diga que está cansada de novo — disse ele.

— Eu estava em um evento...

— Sabe quanto tempo faz que não transamos?

Sentei na cama, de costas para ele que me surpreendeu passando os braços ao redor de meu corpo.

Eu precisava de uma desculpa, mas naquela altura não havia. Só me restava ser sincera.

— Meu amor — falou antes de beijar meu pescoço. — O quê está acontecendo?

— Talvez a pergunta seja o quê não está acontecendo. — Me soltei de seus braços, ficando de pé. — Não sinto mais... — Busquei palavras.

— Tesão? Voce perdeu o tesão por mim? — Ele ficou de pé. — Eu entendo que...

— Entende? — Franzi o cenho. — Como assim entende?

Que tipo de homem era tão compreensivo ao ouvir aquele tipo de coisa?

— Você passou por muita coisa. Perdeu alguém com quem convivia todos os dias. Teve que cuidar da sua mãe. Trabalha bastante e nem sempre posso te acompanhar a eventos. Minhas reuniões de negócios não colaboram muito e acabam fazendo com que nos desencontremos. — Ele segurou em meus ombros. — Todo casamento tem crises, afinal. Vamos superar isso juntos.

Eu fiquei sem reação enquanto David me abraçava e acariciava minha cabeça.

— Podemos apenas... Dormir agora?

Mesmo sabendo que precisava, eu não sabia como dar início a uma conversa sobre divórcio. Também não queria tomar aquela iniciativa justo quando voltei a me aproximar da editora. Parecia até que o motivo da separação era ela. Mesmo que apenas eu estivesse ciente da verdade, minha própria consciência me acusava.

Nos dias seguintes, mergulhada em trabalho, me peguei diversas vezes pensando na forma que Antonella falou naquela noite.

Então ela se importa?

Desde então ela dominou meus pensamentos.

— Parabéns pela entrevista. — Stella jogou a versão impressa da Muse magazine sobre minha mesa. — Quatro páginas? — Ela riu sentando na cadeira à minha frente. — Você não só caçou Antonella em Londres, como também seduziu ela a esse ponto.

— Seduzi? — Franzi o cenho, sentindo uma pontada de medo ao ouvir aquela frase.

— Seus encantos seduzem a todos, Alexia. Desde que te conheci não houve nada que você não conseguisse.

Relaxei um pouco entendendo que ela não dizia aquilo da forma que pensei inicialmente.

— Não tem nada a ver com encantos, Stella.

Levantei para sair e no mesmo momento meu celular sobre a mesa tocou. Meus olhos foram para o visor onde avistei o nome de Antonella. Peguei o aparelho tão rápido que quase o deixei cair.

— Vou almoçar — anunciei já saindo da sala.

Atendi o telefone apenas quando percebi que estava em uma distância segura.

— Lembra-se daquele meu amigo ao qual visitamos as obras na galeria? — perguntou a editora assim que atendi. — Ele acabou de voltar de viagem. Falei sobre você e deseja conhecê-la. Que tal um jantar hoje a noite?

— Hoje? — Vasculhei minha mente, me certificando de que não havia marcado nada.

— Não me diga que precisa chegar cedo em casa para ficar fazendo sala para seu marido.

— Estarei lá, Venturi.

— Ótimo.

— Mas posso saber o quê exatamente falou sobre mim? — perguntei curiosa.

— Apenas coisas boas, Brandon.

Sorri, me encostando na parede do corredor, enquanto ouvia ela pronunciar meu sobrenome em seu tom de voz que conseguia me fazer arrepiar.

— Nos vemos mais tarde — afirmei antes de desligar o aparelho e suspirar baixando a cabeça, tentando entender aquela reação boba de meu corpo ao ouvi-la pelo telefone.

Depois do almoço voltei ao trabalho onde precisei sair para encontrar uma estilista e colega de longa data.

— Alexia Brandon — anunciou Valentina Lorran, ao me ver entrar no ateliê. — Afinal quando foi a última vez que nos encontramos?

— Antes de você ir dominar Paris, talvez. — Sorri abraçando ela rapidamente. — Como vão os preparativos para o lançamento de sua nova coleção? Tudo certo com as modelos?

— Por enquanto tudo perfeito — afirmou, me puxando para um canto. — Fiquei sabendo sobre a perda recente em sua agência e confesso ter ficado chocada. Jamais imaginei que Beatrice trabalhava para você.

— Ah... — Fiquei um tanto sem jeito de tocar naquele assunto. — Você a conhecia?

—  Ela era uma estrela há anos atrás e sumiu do meio. Na verdade, sumiu do mapa, reaparecendo apenas agora com essa notícia trágica. Mas o que me choca é você ter empregado a ex esposa de seu marido.

Fui pega de surpresa ao saber que ela se atentou a aquele fato.

Parecia questão de tempo até a polícia, que estava investigando o caso, me apontar como uma suspeita em potencial.

Naquele momento gradeci mentalmente por Antonella ter me convencido a comparecer ao no leilão naquela noite.

— Esse assunto é um pouco delicado para mim — falei.

— Eu entendo querida.

Valentina me lançou um olhar terno que me deixou ainda mais sem graça, mas o momento foi interrompido pelo vibrar de meu celular.

David me enviou mensagem avisando que a mãe estava chegando no fim da tarde e pretendia passar o fim de semana conosco. Seu pedido para que fizesse companhia a ela até que ele pudesse estar em casa foi como um balde de água fria em meus planos.

Enviei uma mensagem para a editora, dizendo apenas que surgiu um compromisso de última hora.

Quando cheguei em casa encontrei Megan em meu quarto, com as roupas lavadas de David em mãos, prestes a guarda-las no closet.

— Ensinei sua empregada a lavar as camisas dele, direitinho — dizia ela com um sorriso enquanto colocava as peças no cabide e eu apenas cruzei os braços, parando na porta do closet, observando. — Você nunca aprendeu. Eu sempre tentei te ensinar a fazer o melhor pra ele, mas parece que fez tudo de mal gosto.

Minha vontade era perguntar se a Beatrice fazia melhor que eu.

— Seu trabalho sempre veio em primeiro — continuou ela. — É uma pena, Alexia. Meu filho sempre se doou muito a esse casamento. Até seguiu carreira em um novo ramo com a esperança de que a segurança da advocacia te fizesse mudar de idéia sobre filhos. Mas pelo visto...

Eu quase revirei os olhos, mas apenas respirei fundo antes de falar:

— Tenho meu próprio negócio e tempo. Não depende apenas do que seu filho faz ou deixa de fazer, pelo que ele mesmo deseja. Eu nunca escondi o fato de não desejar ter filhos tão cedo.

— Já são quase dez anos. Está esperando o quê?

— Veio até aqui para me questionar sobre o que desejo ou não para a minha vida?

— Meu filho quer filhos. Eu quero netos. Se não deseja, porque não fala logo de uma vez? Fica usando desculpa de tempo, trabalho, isso e aquilo.

— Escuta aqui, Megan....

— Encontrei vocês — disse David chegando de repente. — O que fazem aqui no closet, mnhast duas princesas? — Ele segurou em meus ombros por trás e beijou meu rosto.

— Oi meu filho — falou a mãe com um sorriso.

— Fiz uma reserva para nós em um restaurante ótimo.

Eu ainda não tinha digerido tudo o que ouvi de minha sogra. Ela costumava gostar de cobrar, mas daquela vez parecia ainda mais focada em me tirar do sério.

Nada daquilo me atraia. Eu não queria filhos e não queria viver tentando me dar bem com a mãe dele para grada-lo, como sempre fiz. Tudo o que sempre encarei como parte da nossa vida juntos, naquele momento, me irritava absurdamente. Não havia como viver daquele jeito.

No entanto, eu estava protelando ter aquela conversa com David.

Novamente guardei tudo o que tinha para dizer e nós três seguimos para o restaurante, onde assim que sentamos, meus olhos caíram sobre Antonella, sentada a poucas mesas de distância.

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Comments

Nataly Lopes

Nataly Lopes

acho que esse David apronta alguma,

2022-12-21

6

Maria Andrade

Maria Andrade

agora vai rolar treta

2022-12-21

1

Ver todos

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