...Mensagens...
...Marcela*: "Falta tão pouco. Meu coração tá a mil! Você vem, não é?'*...
...Alice*: "Poxa amiga, estou tão enrolada com o trabalho."*...
...Marcela*: "Não Alice, você não pode fazer isso comigo! Vai ser o dia mais feliz da minha vida e você não vai tá aqui? Nós fizemos tantos planos juntas."*...
...Alice*: "Tudo bem Ma, vou tentar dar um jeitinho de estar com você nessa."*...
...Marcela*: "Muito bem! Você é tão importante quanto o Pedro nesse momento."*...
Entre minhas aulas, passeios para fotografar e as pessoas mortas, eu trocava mensagens com Marcela. Tudo o que mais queria era estar com ela quando os gêmeos nascessem.
Já havia passado quase 7 meses desde que me mudei para o casarão. Durante esse tempo, também analisei possíveis motivos de meu pai ter desaparecido, afinal isso se tornou importante para mim, porque segundo Charlotte, se ele voltasse eu estaria livre por um bom tempo. Mas nem eu ou ela tínhamos uma pista sequer.
Certa manhã, ao abrir as cortinas, me deparei com o céu nublado. De algum modo eu sabia que algo ia acontecer. Tinha marcado um trabalho, o primeiro trabalho sério desde que minha vida virou de ponta cabeça, por isso me obriguei a colocar os pés para fora do casarão naquele dia feio, mas quando de fato saí na rua, eu logo notei não estar mais no Rio e sim de volta a São Paulo.
— Você precisa ir a um lugar — falou Charlotte, surgindo diante de mim.
— Onde? — perguntei, temendo ouvir o que diria, mas ela não disse nada, apenas estendeu a mão que eu olhei, sem saber ao certo o que fazer.
— Ainda teme?
— Não. — Segurei a mão dela com firmeza e num piscar de olhos estávamos em outro lugar.
Especificamente um hospital.
— Oh meu Deus! — Arregalei os olhos ao me dar conta do quê se tratava. — Os bebês vão nascer? Não é cedo?
Mesmo não obtendo resposta, sorri de alegria. Rapidamente saí a procura de alguém que me informasse, mas antes que eu chegasse em algum médico ou enfermeira, avistei Marcela no fim do corredor.
— Ma! — gritei antes de correr até ela. — Você não devia estar... — Analisei ela e meu sorriso morreu pouco a pouco. — Não...
— Alice...
— Não! — Dei um passo atrás. — Por favor, não...
— O que eu faço?
Naquele momento senti meu mundo quebrando em mil pedacinhos. Meu corpo simplesmente desabou ali, no chão frio, no meio daquele corredor estranhamente silencioso.
Eu só conseguia me perguntar, por quê? Por que ela? Por que naquele momento?
— Não é justo! — gritei. O choro, que até então estava entalado na garganta, vindo com força total. — Isso não é justo.
— Tá doendo tanto. — Ouvi ela dizer.
Eu não conseguia olhar para ela, não conseguia encara-la, mas a presença de Charlotte ao se aproximar me deixou consciente do que vinha a seguir, por isso levantei rapidamente.
— V-você vai... — perguntei a ela, só então encarando Marcela que parecia de fato sentir uma dor insuportável.
— Ela não quer, Alice — disse Charlotte que tinha o olhar fixo na outra.
Eu também não queria, mas já estava naquele trabalho a tempo suficiente de saber que era o certo a fazer.
— Não! Você quer, não é? Ma? — Me sentia uma estúpida egoísta dizendo aquilo, mesmo sabendo que era de fato o certo. — Marcela?
Meu coração parecia se rasgar de dentro pra fora.
— Você não pode ficar — falei em um fio de voz.
— Eu mal os vi, Alice — disse ela.
Eu não precisava ter algum poder sobrenatural para sentir sua dor naquele momento.
— Eu me vi e não conseguia sair. E quando finalmente consegui, eles já tinham os levado. Eu não entendo...
— Olha, eu vou ver eles. Vai ficar tudo bem! O Pedro vai cuidar de tudo, eles vão ficar bem. Você foi incrível, com certeza deu o seu melhor, mas agora precisa ir. A Charlotte vai tirar essa dor que você tá sentindo e vai ficar bem, ok?
— Não quero ir a lugar algum, quero ficar com eles...
Ela negou várias vezes com a cabeça, se afastando. E eu temi que fizesse exatamente o que fez, desapareceu.
— Charlotte, faz alguma coisa — gritei desesperada. — Charlotte?
— Ela não pode ficar perto deles — falou o que eu já imaginava. — Mas eu não posso fazer nada, Alice.
— Como não? Convence ela! Faz ela mudar de idéia ou só tira tudo de uma vez e manda ela embora. — Voltei a chorar copiosamente. — Eu nunca imaginei algo assim. Nunca imaginei perdê-la. Tá doendo tanto, tanto. Parece que vou sufocar...
Charlotte segurou minha mão de repente e não estávamos mais no hospital, mas sim no alto de um prédio, onde o vento era muito forte.
— Só você pode fazer isso por ela, Alice. Mas antes precisa se recompor.
— O que eu faço?
— Em relação a partida dela não há o que ser feito agora, mas você pode convencê-la a se manter distante das crianças.
— Você sente isso? Me apoiei na mureta de proteção. — Você pode tirar essa dor de mim agora?
— Posso — disse ela e virei para encara-la. — Mas não o farei.
— Por que não?
— Porque é justamente o que sente, que te torna humana.
— Eu acho que cansei de ser humana — funguei, tentando secar as lágrimas. — Você disse que meu pai estava pronto para se livrar dos sentimentos. Agora eu também estou.
— É diferente...
— O quê é diferente?
— Não farei isso.
— Por que não? — gritei, indignada com aquela resposta.
— Não farei isso com você, Alice. Seus sentimentos, sejam eles bons ou ruins, é tudo o que tem. Se eu fizer isso.... Você vai acabar deixando sua amiga vagando por aí. — Ela se calou e nós ficamos nos encarando, sem nada dizer, por um tempo que julguei ser bem longo.
— Você se importa?
Ela então esboçou uma reação, algo que eu nunca tinha visto antes. Em seu rosto e olhar havia uma clara confusão.
Eu sabia que estava errada ao pedir aquilo. Não era certo ser tão covarde e egoísta, deixando minha amiga naquela situação.
...(...)...
— Alice, você não vai acreditar — dizia Laura, correndo em minha direção assim que entrei na propriedade. — O que aconteceu? Você tá com uma cara péssima, parece até que encontrou um espírito maligno.
— Não me fala nessas coisas, Laura — alertei, levantando uma mão na direção dela, sem parar de seguir meu caminho até a porta principal.
— Espera, você precisa ver uma coisa.
Ela sumiu e fiquei me perguntando onde eu deveria ver a tal coisa.
— Desculpa, esqueci que você não pode vir comigo assim.
Seguimos até o jardim morto, atrás da casa, onde ela correu e se agachou. E em meio a todas aquelas folhas secas, algo se destacava.
— Um sinal de vida — disse apontando. — Consegue ver? Tão verde que até parece brilhar.
Me aproximei um pouco mais.
— Você tá conseguindo, Alice. O jardim tá ganhando vida!
Me agachei ao lado dela.
Eu queria muito estar animada com aquilo, mas tudo o que fiz foi chorar.
Me peguei contando tudo o que aconteceu e fui reconfortada por Laura, como seria por minha amiga. Era inacreditável que naquela altura da vida eu estava recebendo conselhos de um fantasma.
— Ela vai vir até você, não precisa se preocupar — dizia. — Olha, quando aconteceu comigo, estava muito confusa, tudo o que queria era ficar ao lado do meu marido. Minha primeira lembrança é dele chorando enquanto os paramédicos levavam meu corpo. Quando vi o seu pai, a princípio eu não quis vir com ele, mas depois de algum tempo, que eu não sei ao certo quanto porque o tempo aqui parece não funcionar direito, eu simplesmente me deixei ser puxada por essa força que me fez vir parar aqui.
— Você devia ter ido...
— Eu não queria. E ainda não quero! Seu pai me explicou que eu não poderia ficar perto dele, caso contrário me tornaria um espírito maligno e traria desgraça para nós dois. Você vai ter a chance de contar isso a sua amiga e vai ficar tudo bem.
— Mas... Mas eu não queria que ela tivesse morrido — lamentei entre lágrimas, sentando no chão molhado.
Ela ficou em silêncio por um tempo enquanto eu chorava.
— Você disse que pediu pra Charlotte tirar sua dor?
Funguei, tentando parar choro, confirmando sua pergunta.
— Eu acho que ela nunca recusaria — disse e franzi o cenho olhando ela que ficou de pé. — Antes de você chegar, tinha um velho que ficou algumas décadas aqui, ele costumava contar coisas sobre a Charlotte e o seu pai, para os outros que chegavam. — De repente ela apareceu ao meu lado, seu rosto próximo ao meu enquanto falava de forma dramática. — Ele disse que um dia seu pai pediu justamente isso. Ela o fez sem piscar! Mas sabe o que é pior? O velho contou que viu tudo, que Charlotte passou dois segundos inteiros com a mão no peito como se estivesse sofrendo ao absorver todo aquele sentimento.
— Dois segundos?
— Não sei bem se foi isso que ele disse, minha memória não é mais a mesma. Mas o que importa é que, imagine só você pegar todos os sentimentos, principalmente a dor de alguém para si. Eu não o faria nem mesmo se ajoelhassem, mas ela não tem sentimentos, não teme a dor, mesmo já tendo sentido tantas vezes a dos outros. Ela também não liga se você sente ou não algo, mas como servo, acredito que seja melhor alguém que não sente. Não é mesmo? Então por que será que dessa vez ela se recusou? — Laura me analisou de perto, me obrigando a afastar um pouco o rosto. — Isso é muito estranho.
— Pra mim só prova que ela não liga! — Fiquei de pé. — Mas no fundo eu também não queria isso. Não posso ser como ela que não se importa com o que os outros sentem.
— Será que um dia alguém também tirou os sentimentos dela?
Tentei não pensar sobre aquilo, afinal já tinha meus próprios problemas preenchendo cada espaço de minha mente.
Virei para sair, mas me deparei justamente com Charlotte e ao seu lado estava Marcela.
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Atualizado até capítulo 34
Comments
Nataly Lopes
cada vez mais emocionante,continua autora
2022-11-21
3
Cleidiane Oliveira
QUERO MAIS ........
2022-11-21
1