DESVENTURAS DE JANE

Uma semana se passou após o triste desfecho de Samuel Monteiro

Nesse meio tempo, Jane, ainda não sabia da confusão envolvendo o seu nome.

Estava seguindo para mais um dia de trabalho e  após andar vários quilômetros, ficou na parada de ônibus. 

Ao  pegar a condução, que estava lotada,  espremeu-se entre as pessoas. Nem se importava mais com aquela situação  diária. Viver assim era melhor que a sua realidade hostil no sul do Maranhão, trabalhando de sol a sol para ter o que comer no final do dia.

Mesmo com restrições financeiras, em Belém, conseguia ajudar seus pais e os dois irmãos menores que trabalhavam na roça.

Com pensamentos no passado, o tempo foi passando até chegar ao seu destino. Não demorou muito para notar que os seus colegas de trabalho estavam do lado de fora do restaurante, lendo um cartaz. Alguns revoltados, outros tristes.

Com o coração acelerado, aproximou-se nervosa e constatou que ela e os outros perderam o emprego. Ficou sem chão naquele instante. 

O dono do restaurante sumiu e deixou apenas o cartaz no portão,  decretando falência. Trêmula, juntou-se aos outros no desespero de estar desempregada e não possuir carteira assinada.

Algumas lágrimas foram inevitáveis, porém não tinha o hábito de ficar parada.

— Pessoal, precisamos ir à justiça! Se ele não tem como nos pagar com dinheiro, que seja com os bens, pois não podemos ficar no prejuízo! 

— Você tem razão,  Jane! Vamos logo resolver isso! — Alguém respondeu e então, unidos, procuraram os órgãos de direito para conciliar a situação. 

Depois de conseguirem pelo menos a promessa de que tudo seria resolvido, os colegas despediram-se de Jane, que voltou para o seu minúsculo apartamento de três compartimentos e com poucos móveis.

Abriu a geladeira e não tinha muita coisa: metade de um biscoito, uma laranja e um caixa de leite quase vazia. 

Pelo menos teria algo para se alimentar naquele dia. Não sabia como seria nos outros dias. A menos que falasse com Vivian, novamente.  

Com receio, teria que pedir sua ajuda provisoriamente até encontrar outro emprego. Engolindo o orgulho, ligou para ela.

— Vivian! Oh, querida, preciso falar com você!

A prima deu um suspiro de impaciência, audível para que Jane entendesse que ligara em hora imprópria.

— Não demore, pois já vou fazer a lipo.

— O quê? Mas como?

— Ah, queridinha, eu falei pra você que o meu coroa é sensacional!

Jane estava impressionada com a rapidez que ela arranjara o dinheiro.

— Como conseguiu convencê-lo?

Ela deu uma risada sarcástica antes de responder:

— Liguei desesperada para dizer que a minha casa pegou fogo! Ele acreditou!

 — Vivian, isso o que fez é desprezível! Como você  devolverá o dinheiro?

— Bem, ele me pediu em casamento e eu aceitei!

— Olha, agora você se encrencou de vez… Espero que esteja mentindo pra mim sobre isso… 

— Estou falando sério, Jane!

Com tom de descrédito, disse para a pima:

— Tá bom… E quando será?

Novamente Vivian gargalhou.

— Você é louca? Claro que não vai rolar! Era semana passada!

— Meu Deus! Louca é você… Como pôde fazer uma coisa dessa?

Vivian suspirou.

— Já estou até arrependida. Ele agora não sai do meu pé! Estou a ponto de broqueá-lo!

( Vivian não sabia ser Miguel, em vez do pai)

— No lugar dele eu faria a mesma coisa! O que está acontecendo?

— Bem, ele tá me ameaçando agora, viu? Disse que sou forçada a casar com ele!

— Eita, prima, a casa caiu! E agora? O que vai fazer?

—  Assim que fazer a lipo, vou direto para a casa da minha amiga. Vou ficar com ela até a poeira baixar! Se o coroa vier, não vai me encontrar!

— Vivian, hoje em dia é muito fácil encontrar alguém… Tome cuidado, pois pode parar na cadeia… Sinceramente,  agora fiquei preocupada!

Dando pouca importância ao fato, ela respondeu:

— Samuel só está chateado porque percebeu que caiu num golpe. Não acontecerá nada. Tenho certeza que ele não vem atrás de mim e se vier, não vai me encontrar!

— Então tá… Sua maluca! Mas isso não é certo! Você está usando o pobre senhor! Quantas vezes já falei que você ainda vai se dar mal?  — Jane a repreendeu.

— Que nada, sua bobinha! É merecido!  Quem manda ele não se pôr no seu lugar?  Tem 60 anos, minha filha! Idade para ser meu avô…Mesmo assim fica me assediando!

Vivian deu um risinho e perguntou:

— Falando nisso, o que você queria mesmo?

Diante das novas circunstâncias sobre Vivian, Jane preferiu não comentar sobre seu dia desastroso. Respondeu:

— Nada… Só queria conversar mesmo!

— Tá… Vou indo, prima! Estão me chamando aqui. Serei uma nova Vivian!

— Boa sorte aí, viu?

— Valeu! Não me procure tão cedo, tá?

Ela encerrou a chamada. Não conhecia ninguém mais trapaceira que a prima. Só não sabia a quem recorrer agora. Sentia uma leve dor de cabeça só de preocupada com a sua situação.

Ouviu batidas na porta. Já conhecia aquele toque repetido e que a assustava todo final de mês. 

Foi até lá e deparou-se com Benedita, a dona do apartamento.

A fisionomia dela era fechada, como se não estivesse interessada em desculpas esfarrapadas. Com voz firme, disse:

— Oi, Jane! Vim buscar o pagamento do aluguel. Você já deve "dois meses"!

Jane percebeu que ela frisou a última frase. Não tinha outro jeito, tinha que falar a verdade.

— Sinto muito, fiquei desempregada hoje e não sei direito o que vão fazer conosco, mas vou dá um jeito…

— De novo sem dinheiro?  Isso, você falou na vez passada! Não vou mais aceitar!

— Por favor, escuta… — Jane implorou.

— Você tá pensando que sou idiota, mulher? Quer aluguel de graça,  mas vive nas farras, tenho certeza!

— Não, Benedita, pelo amor de Deus, escuta! Vejo se consigo o dinheiro  até amanhã,  tá?

À mulher considerou a proposta, com a mão no queixo.

— Pode até ser, mas não vou abrir mão depois disso! Se não conseguir, será despejada!

— Ok! Resolverei isso! Muito obrigada!

A mulher retorceu os lábios com descrença.

— Já nem estranho mais tipo de gente como você. Espero que resolva até amanhã! Boa noite!

A mulher a olhou de cima a baixo com desprezo e saiu.

Jane fechou a porta e encostando-se nela, escorregou para o chão,  abraçando as pernas, desamparada. Não sabia como resolver tanto problema ao mesmo tempo. Só um milagre a livraria do seu infortúnio!

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