Capítulo 14 – A União das Sombras

A escuridão tomou Auron de forma repentina, mas ao contrário do que ele esperava, não houve dor. O silêncio que caiu sobre ele era profundo, como se todo o mundo ao redor tivesse se afastado. Seu corpo parecia dissolver-se no ar, seus sentidos expandiam-se para além da carne e os ossos que o mantinham preso à terra. Ele não estava mais limitado por fronteiras físicas. Ele se tornara parte da sombra, uma presença invisível, sentindo tudo ao seu redor.

Ele podia ver a floresta abaixo de si, seus companheiros lobos dormindo em meio à vastidão da noite. Mas ele não estava mais entre eles, ao menos não como antes. Ele era a sombra que se movia entre as árvores, a brisa sutil que roçava as folhas, o manto escuro que cobria o céu. Ele estava em todos os lugares e em nenhum ao mesmo tempo.

A alcateia, no entanto, parecia sentir sua ausência. Os lobos acordaram inquietos, farejando o ar, procurando seu líder. Eles sentiam que algo estava errado, como se a própria essência de Auron estivesse distante, embora ele estivesse presente de uma forma que jamais poderiam perceber.

A lua não havia retornado. O eclipse continuava, e a escuridão era total. Auron, agora parte desse véu, observava tudo com um entendimento novo. Ele não estava mais amarrado ao mundo físico, mas sua alma ainda carregava o fardo do que ele deixara para trás. E, dentro dessa nova forma, ele sentia uma presença maior. Uma consciência antiga, profunda, que o envolvia.

— Bem-vindo à sombra, Auron. — a voz ecoou em sua mente, poderosa e familiar. Era a mesma que ouvira antes, durante o eclipse, mas agora parecia mais próxima, como se falasse diretamente de dentro dele.

— Eu sou o ciclo, agora? — ele perguntou, sua mente flutuando naquela vastidão escura.

— Ainda não completamente. Você se entregou, mas ainda há algo que precisa ser feito.

— A sombra não é um destino final, mas uma passagem.

— A luz que deseja retornar precisa de um guia, e esse guia… será você.

Auron sentiu a profundidade das palavras. A sombra não era apenas uma prisão, mas uma ponte, uma jornada para algo maior. Ele não seria apenas o guardião da noite, ele se tornaria a força que traria a luz de volta. Mas para isso, precisaria aceitar completamente sua nova natureza e compreender o poder que carregava.

— Como posso guiar a luz, se agora sou parte da escuridão? — ele perguntou, sentindo a estranheza da dualidade em que se encontrava.

— A luz e a escuridão são um só, — a voz respondeu com paciência.

— Você não pode ter uma sem a outra. A sombra só existe porque há luz para ser ofuscada, e a luz só é percebida por causa da escuridão que a rodeia. O ciclo se completa quando ambos se entendem. E você está destinado a ser esse equilíbrio.

Enquanto essas palavras ecoavam em sua mente, Auron começou a sentir algo novo. A lua, que antes estava oculta, agora pulsava em algum lugar distante, como se tentasse emergir das profundezas. Seu brilho lutava contra a escuridão, e Auron sabia que ele precisava ajudá-la.

— Auron, — a voz continuou, — há uma última coisa que deve ser feita.

— A sombra dentro de você não é uma fraqueza, mas um poder. E esse poder precisa ser unido à luz para que o ciclo se complete. Você deve voltar ao lugar onde viu a lua pela primeira vez. Lá, a decisão final será tomada.

A clareira onde a gigantesca árvore havia caído. Aquele era o ponto de origem, o local sagrado onde sua conexão com a lua fora forjada. Auron sabia o que devia fazer, e sua nova forma etérea o conduziu rapidamente através da floresta, voando como uma brisa invisível entre os troncos e galhos.

Quando chegou à clareira, a cena era assombrosa. As árvores ao redor pareciam mais altas e escuras do que nunca, como se tivessem sido transformadas pelo eclipse. O vazio deixado pela árvore caída agora era um abismo profundo, um ponto de conexão entre os mundos.

A luz fraca da lua tentava surgir através do eclipse, lutando contra a escuridão absoluta que a dominava. Auron, em sua forma sombria, aproximou-se do centro da clareira, sabendo que o momento decisivo estava à sua frente.

— Para completar o ciclo, — a voz ecoou novamente, — você deve unir a sombra e a luz dentro de si. Não como opostos, mas como partes complementares do todo.

Auron fechou os olhos — ou o que restava de sua percepção física — e mergulhou fundo em seu ser. Ele encontrou a escuridão dentro de si, aquela que o havia consumido e transformado. Mas dentro dessa escuridão, havia também um brilho. Um fragmento da luz que ele sempre seguiu, a memória da lua, a promessa de sua volta.

E foi ali, no centro da clareira, que Auron compreendeu completamente sua missão. Ele não era apenas o lobo que caçava a luz; ele era a fusão entre ambos os mundos. E com esse entendimento, ele permitiu que a sombra e a luz se unissem dentro de si.

O céu começou a mudar. O eclipse, que antes parecia inabalável, começou a vacilar. O brilho da lua intensificou-se, rompendo a escuridão. As sombras ao redor da clareira se dissiparam, e a luz banhou a terra novamente. Mas não era uma luz comum; era um brilho suave, delicado, como se a lua e a noite tivessem se fundido em uma dança eterna.

Auron, agora uma figura que transcendia as formas mortais, olhou para o céu e viu a lua em todo o seu esplendor, mas ela era diferente. Ela não mais o chamava com a melancolia distante de antes. Agora, ele era parte dela, e ela, parte dele.

E assim, o ciclo se completou.

A escuridão e a luz, unidas pela força de um lobo que ousou acreditar que havia mais na vida do que apenas sobreviver.

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