A primeira noite sem a lua chegou como uma avalanche de trevas. O céu estava completamente negro, sem uma única estrela, como se o universo tivesse se fechado ao redor da terra. A alcateia, que outrora confiava no brilho suave da lua para guiá-los, agora caminhava às cegas pela floresta envolta em sombras. O som das folhas sob suas patas e o sussurro do vento eram seus únicos companheiros.
Auron, sempre à frente, sentia a escuridão de forma diferente. Não era apenas a ausência de luz; havia algo mais, uma presença, como se a própria noite estivesse viva e observando-os. Ele podia sentir a sombra dentro de si crescendo, agitando-se, como se estivesse à beira de tomar controle. Mas ele resistia, se lembrando das palavras da lua.
— Mantenham-se juntos, — ele rosnou para a alcateia, a tensão visível em sua voz.
— Este é o início da escuridão que enfrentaremos. Não podemos permitir que o medo nos separe.
Os lobos, apesar de temerosos, confiaram nas palavras de Auron. Formaram um círculo, buscando conforto na presença uns dos outros. Mas mesmo ali, entre seus irmãos e irmãs, a sensação de estarem sendo observados persistia. Era como se algo, nas sombras, estivesse à espreita, aguardando o momento certo para se revelar.
Nas profundezas da floresta, um som distante começou a ecoar. Era algo baixo, gutural, e parecia vir de todos os lados ao mesmo tempo. Os lobos levantaram suas cabeças, atentos, tentando discernir a origem. Auron estreitou os olhos, seus sentidos alertas. Esse som... não era um predador comum. Não era algo que eles conhecessem.
— Sigam-me. — Auron disse, começando a avançar em direção à origem do som.
Enquanto eles seguiam adiante, a floresta parecia se deformar, as árvores tornando-se sombras distorcidas e as trilhas desaparecendo sob seus pés. Não era a floresta que eles conheciam. Era como se a escuridão estivesse dobrando o próprio espaço, criando um labirinto vivo. Cada passo dado os afastava mais do familiar.
— Auron, isso não é certo, — disse Lira, uma das lobas mais sábias da alcateia. — A floresta... parece estar brincando conosco.
Auron não desacelerou. Ele sabia que Lira estava certa, mas algo o puxava para frente. Aquele som, aquele chamado, era irresistível. E então, sem aviso, o som cessou, deixando um silêncio absoluto, quebrado apenas pelo som das respirações pesadas dos lobos.
Eles pararam, formando um círculo novamente, com Auron no centro. A escuridão os envolveu, sufocante, palpável. Por um momento, parecia que até o tempo havia congelado, até que, de repente, uma sombra começou a se mover entre as árvores, espreitando.
— Quem está aí? — Auron rosnou, suas garras cravando no solo.
A sombra deslizou para a frente, e então, diante deles, apareceu uma figura. Não era um animal. Não era algo que eles conhecessem. Era uma criatura formada puramente de trevas, seus olhos brilhando como brasas no vazio. A criatura caminhou lentamente em direção a eles, sem emitir um único som.
A alcateia recuou instintivamente, mas Auron permaneceu firme. Ele encarou a criatura, seus olhos fixos nos dela.
— Você sente isso, não sente? — a criatura sussurrou, sua voz como o vento que atravessa um túmulo.
— A escuridão dentro de você... está crescendo.
Auron não respondeu. Ele sabia que a criatura estava certa. Desde o início desse ciclo de escuridão, ele podia sentir a sombra dentro de si ficando mais forte, mais difícil de controlar.
— Quem é você? — ele perguntou, sua voz baixa e ameaçadora.
A criatura riu, um som oco e sem vida, que reverberou pela floresta.
— Eu sou a sombra que sempre esteve à espreita. Aquele que observa desde os confins da noite.
— Sou o que você se tornará, se ceder ao chamado.
— Você não é diferente de mim, Auron. A sombra está em você. Sempre esteve.
A alcateia olhou para Auron, confusa e assustada. Seria verdade? Estaria seu líder sucumbindo à escuridão que agora os envolvia?
— Você está enganado, — Auron rosnou.
— Eu aceito a escuridão, mas ela não me controla. Eu a uso para proteger minha alcateia.
A criatura se aproximou ainda mais, seus olhos ardendo com uma intensidade terrível.
— Por quanto tempo, Auron? — a criatura sibilou.
— Por quanto tempo você acha que pode resistir? A sombra não pode ser controlada para sempre. Mais cedo ou mais tarde, ela consome tudo. E você... será meu.
O silêncio caiu sobre o grupo. Os lobos observavam, inseguros do que viria a seguir. Mas antes que a criatura pudesse dar mais um passo, Auron avançou. Com uma força que parecia vir das profundezas de sua alma, ele saltou sobre a criatura, suas garras cravando no vazio de sua forma sombria.
A criatura riu, mesmo enquanto se dissipava em fumaça negra.
— Nós nos encontraremos novamente, Auron, — sussurrou a voz, antes de desaparecer completamente.
O silêncio voltou, mas desta vez, era mais pesado. Auron respirava fundo, seu corpo tenso, sabendo que aquela batalha estava longe de acabar. A sombra dentro dele não era mais algo distante. Era real, e estava mais próxima do que nunca.
— Vamos voltar, — ele disse, sua voz firme.
— Precisamos nos preparar. A verdadeira escuridão ainda está por vir.
A alcateia seguiu seu líder, mas algo havia mudado. O que quer que fosse aquela criatura, havia plantado uma semente de dúvida. Auron podia sentir o peso da sombra sobre si, e sabia que, em breve, teria que fazer uma escolha. Entre a luz e a escuridão.
E desta vez, a lua não estaria lá para guiá-lo.
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Atualizado até capítulo 22
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