capítulo 14

Capítulo 14 – O Jogo Começa

O luto era um som abafado dentro do peito de Evelyn. Não vinha em lágrimas. Não vinha em gritos. Vinha em silêncio. Um tipo de dor que se arrastava, corroendo a pele por dentro como ácido.

Clara estava morta.

E agora, Evelyn também.

Não a Evelyn que amava as ruas, a luz atravessando janelas quebradas, o toque da câmera em seus dedos. Aquela havia morrido com a amiga, junto ao corpo descoberto na escura sala do depósito.

O que sobrou estava sentado diante de Damian, olhos fixos nas telas do sistema de segurança, e uma decisão feita.

— Quero começar — disse ela, a voz fria.

Damian virou lentamente.

— Começar o quê?

— O jogo. A guerra. A vingança.

Ele a estudou por alguns segundos. Não havia mais hesitação nela. Nem medo. Apenas o vazio. Um buraco aberto que ele conhecia bem.

— Não tem volta depois disso.

— Já não tinha antes.

Damian assentiu. Puxou uma pasta preta do cofre embutido na parede. A jogou sobre a mesa. Dentro, havia cinco fotos. Cinco rostos. Cinco alvos.

— Esses são os responsáveis pela célula que ordenou a morte de Clara. Cada um com um papel. Um deles mandou. Outro escondeu. Outro executou. E os dois restantes são pontes para nomes ainda maiores.

Evelyn passou os olhos sobre cada foto. Rosto por rosto. Uma mulher loira, um homem obeso de terno, um jovem com cicatriz no pescoço. Pessoas que pareceriam normais na multidão. Invisíveis para o mundo.

Mas ela os via.

E queria vê-los cair.

— Qual deles primeiro?

Damian sorriu de lado.

— A pergunta certa seria: como primeiro?

Ela ergueu os olhos.

— Me ensina.

---

Os dias seguintes foram diferentes. Evelyn mergulhou em um treinamento intenso, muito mais psicológico do que físico. Damian a ensinava como observar sem ser vista. Como identificar mentiras nos gestos mais sutis. Como manipular sistemas, usar tecnologia, criar alibis.

— O segredo da guerra moderna — dizia ele — não é força. É invisibilidade.

Ela ouvia. Absorvia. Aprendia rápido. À noite, lia os arquivos sobre os alvos. De dia, praticava.

Era meticulosa.

Fria.

Damian observava com admiração e um temor silencioso. Ela estava indo rápido demais. Afundando fundo demais.

Como ele.

---

O primeiro alvo era o mais exposto: Marina Vilela, advogada de fachada, responsável por lavar o dinheiro das operações. Evelyn a encontrou pessoalmente numa feira de arte. A mulher sorria, falava alto, fingia gostar de quadros que não entendia.

— Ela financia o tráfico de informações, de armas, e de gente — explicou Damian, escondido em um ponto cego, observando.

— O que fazemos com ela?

— Vamos assustá-la. Mostrar que sabemos. Que não há mais paz.

Evelyn não hesitou.

Foi até o carro de Marina, sozinha. Discretamente, abriu o porta-luvas e deixou um envelope. Dentro, a foto de Clara. No verso, uma frase escrita com caneta vermelha:

> "Ela morreu. Você é a próxima."

Ao se afastar, Evelyn sentiu o coração disparar. Não de culpa. Mas de euforia.

Marina saiu da feira meia hora depois. Entrou no carro. Ao ver o conteúdo, empalideceu. Ficou estática por segundos, então acelerou e sumiu.

Damian, que assistia tudo de longe, murmurou:

— Começou.

---

À noite, de volta ao apartamento, Evelyn bebeu vinho e ficou em pé diante da janela, observando a cidade lá embaixo. Damian a observava de longe. Ela estava diferente.

— Você não vai me perguntar se foi certo o que fizemos? — ele disse.

— Foi necessário.

— E se isso fizer você se perder de vez?

Ela virou-se, segurando a taça.

— Eu já estou perdida, Damian. Só estou aprendendo a andar no escuro.

Ele se aproximou. Parou a centímetros dela.

— Isso não te assusta?

— Sabe o que me assusta? Voltar a ser fraca. Voltar a ser espectadora da minha própria vida enquanto os outros decidem quem vive e quem morre ao meu redor. Isso sim me assusta.

Ele a puxou para perto.

— Você está diferente.

— Você me refez.

— Eu te estraguei.

— Me libertou.

E o beijo que veio depois não foi como os anteriores. Não havia dor, nem raiva. Era puro fogo. Uma aliança selada com o sabor da vingança na boca.

---

Na manhã seguinte, Marina Vilela foi encontrada em seu apartamento, em choque, dizendo à polícia que estava sendo perseguida por fantasmas. Pediu proteção. Pediu escolta.

Mas ninguém levou a sério.

No final da tarde, foi atropelada em frente ao próprio escritório.

Morto instantânea.

— Não fomos nós — disse Evelyn, ao ver a notícia.

— Não. Mas alguém estava observando a mesma lista que a gente.

Ela olhou para Damian.

— Infiltrados?

— Ou rivais. Tem mais gente querendo a cabeça da organização. O caos atrai predadores.

— E a gente?

Damian sorriu.

— Somos lobos. Mas com nome e endereço.

---

Naquela noite, Evelyn dormiu nos braços dele.

Mas não sonhou com amor.

Sonhou com o próximo rosto da lista.

E com o gosto de ferro que vinha depois da morte.

Mais populares

Comments

Gloria Katia Baffa

Gloria Katia Baffa

Ela quer se vingar morte da amiga. Não percebendo que está igual a ele

2025-04-16

0

Ver todos

Baixar agora

Gostou dessa história? Baixe o APP para manter seu histórico de leitura
Baixar agora

Benefícios

Novos usuários que baixam o APP podem ler 10 capítulos gratuitamente

Receber
NovelToon
Um passo para um novo mundo!
Para mais, baixe o APP de MangaToon!