capítulo 10

Capítulo 10 – “O Primeiro Beijo”

O silêncio após a violência era quase ensurdecedor.

Damian limpava o sangue das mãos com um pano branco, que já não era mais branco. Evelyn, sentada à beira do sofá, olhava para ele como quem encara algo inevitável. Não havia mais recuo. Não havia mais negação. Ela havia atravessado a linha e estava do outro lado, onde o mundo era feito de sombras e decisões que não podiam ser desfeitas.

O relógio marcava três e quarenta e dois da manhã.

O corpo dela ainda tremia, não de medo, mas de adrenalina. O cheiro metálico da pólvora ainda pairava no ar.

— Eles sabiam onde eu estava — disse ela, por fim, a voz baixa.

— Sabem mais do que deveriam — respondeu Damian, sem tirar os olhos do pano. — E agora vão querer saber o quanto você sabe.

— Eles me querem morta?

Ele a encarou.

— Eles querem o que eu sou incapaz de dar. E agora você faz parte disso. Então, sim. Eles vão tentar.

Ela respirou fundo. O coração acelerado, os pensamentos embaralhados.

— Você matou os três?

Damian assentiu.

— Um deles era César.

Ela congelou.

— O mesmo que me encontrou na casa do político?

— Ele nunca saiu da mira. Eu só precisava de um motivo legítimo.

— E invadir minha casa foi suficiente?

— Tocar você é sempre suficiente.

O silêncio se estendeu entre eles. Damian deixou o pano sobre a mesa e aproximou-se devagar. Sentou ao lado dela. As mãos ainda manchadas. O olhar... vulnerável. Pela primeira vez, Evelyn viu algo humano ali. Um cansaço. Uma exaustão antiga.

— Você não pode proteger o tempo todo — ela disse. — Não sozinho.

Ele não respondeu.

— Se você me quer nesse jogo, Damian... então me ensine as regras.

— Evelyn...

— Não me proteja da verdade. Me fortaleça com ela.

Ele a olhou, sério. Como se enxergasse além das palavras. Além da carne.

— Você não é feita para esse mundo.

— Então me refaça.

Um silêncio intenso caiu de novo. Mas dessa vez, havia uma tensão diferente. Densa. Intensa. Quente.

Evelyn se aproximou.

Devagar.

Sem hesitação.

Sem o peso do trauma. Sem a urgência da sobrevivência.

Não era medo. Nem impulso.

Ela queria.

Seus dedos tocaram o rosto de Damian. Ele fechou os olhos por um instante, como se não acreditasse no toque. Como se fosse algo que não lhe pertencesse.

Mas ela o puxou para si.

E o beijou.

Pela primeira vez, não foi ele quem tomou. Foi ela quem deu.

E o beijo foi calmo. Preciso. Sem violência, sem batalha. Um beijo que não pedia permissão, mas também não exigia rendição. Foi um selo. Um pacto.

Damian correspondeu.

Mas havia algo novo nele. Um cuidado. Um medo disfarçado.

Quando se separaram, ele encostou a testa na dela.

— Se você continuar... não haverá volta.

— Eu sei.

— Vou te mostrar tudo. Mas não posso garantir que vai gostar do que vai ver.

— Já vi sangue. Já vi morte. O que mais você acha que pode me destruir?

Ele sorriu, cansado.

— Eu.

Ela não respondeu.

Apenas pegou a mão dele.

E apertou.

O dia amanheceu lentamente, e pela primeira vez em semanas, Evelyn dormiu. No sofá, aninhada contra Damian, com o corpo dele ainda tenso, mesmo em repouso. Ele não dormia. Não podia. Ficar vulnerável era um luxo que ele não se permitia.

Mas vê-la ali, confiando nele, mesmo sabendo de tudo que ele era... isso era um tipo de sono que ele jamais sonhou ter.

Quando ela despertou, algumas horas depois, Damian já havia preparado café. Tinha feito isso com as mãos nuas, sem luvas, como se estivesse tentando reconectar com algo humano.

— Eu não como pela manhã — disse ela, entrando na cozinha.

— Não é por você. É por mim — respondeu ele, colocando uma xícara diante dela.

Ela sorriu.

— Você está tentando parecer normal.

— E estou falhando miseravelmente?

— Um pouco.

— Que bom. O mundo normal é patético.

Ela bebeu o café. Forte. Amargo. Como o gosto que ele deixava nela.

— Qual o plano agora?

Damian puxou uma pasta preta sobre a mesa. Dentro, documentos, fotos, mapas e uma lista com sete nomes.

— Esses são os líderes da célula da organização que ainda estão ativos. Todos eles estiveram envolvidos em operações de controle e eliminação de testemunhas. Todos sabem de mim. Todos agora sabem de você.

— E o que fazemos?

— Um por um.

Ela assentiu. Mas então viu algo entre os papéis. Uma foto.

Uma mulher.

Jovem. Bonita. Loira. Olhos muito parecidos com os de Damian.

— Quem é essa?

Damian hesitou. O rosto perdeu cor.

— Minha mãe.

Evelyn olhou para ele, surpresa.

— Pensei que ela estivesse morta.

— Está. Para o mundo. Mas viva... para eles.

— Como assim?

Ele respirou fundo.

— Ela foi a primeira isca. A primeira mulher usada pela organização para capturar homens como eu. Só que ela se apaixonou por um dos alvos... meu pai. Tentou fugir. Tentou se esconder. Pagou o preço.

Evelyn tocou a foto com delicadeza.

— E você ainda procura por ela?

— Eu procuro vingança. Mas se encontrá-la... ainda não sei se a abraço ou se a deixo onde está.

Ela fechou a pasta, devagar.

— Vamos atrás deles.

— Não precisa ser agora — ele disse. — Você pode voltar. Fingir que nada disso existiu. Eu limpo seu nome. Te dou nova identidade. Um novo começo.

— E você?

Damian sorriu. Frio.

— Eu continuo sendo o fim.

Ela se aproximou de novo. E beijou-o. Pela segunda vez.

Dessa vez, foi mais forte. Mais certo.

— Então vamos até o fim — sussurrou ela.

E ele soube, ali, que havia perdido. Porque quando Evelyn o beijou por vontade própria… ela o prendeu com mais força do que qualquer corrente.

E não havia mais escapatória.

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Gloria Katia Baffa

Gloria Katia Baffa

Ela quer saber muitas coisas. Vai entrar num túnel escuro sem volta por amor por ele.

2025-04-16

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