Capítulo 14 - Vai Ficar Tudo Bem! (Enzo)

Narrado por Lorenzo Moretti.

O telefone tocou assim que entrei no hospital. Suspirei, sentindo o peso do dia inteiro sobre mim, mas atendi.

— Pronto.

— Lorenzo.

O tom frio do outro lado da linha fez meu sangue gelar. Reconheci a voz de imediato: meu tio, pai de Lucca.

— Eu soube do que aconteceu. — ele continuou, sem emoção. — Quero que mande o corpo dele para a Itália. Ele será enterrado aqui, junto da família.

Fechei os olhos e apertando o celular. Respirei fundo antes de responder:

— Não.

Houve um silêncio do outro lado.

— Como assim, não?

— Lucca queria ser enterrado ao lado da Emilly. Eles eram a família um do outro. Ele nunca aceitaria ser separado dela, nem depois de morto.

Meu tio bufou.

— Ele era meu filho! Você não tem o direito de decidir isso!

Minha mandíbula se contraiu.

— Ele também era meu irmão. E ele confiou isso a mim. Você o abandonou quando ele mais precisava. Não tem o direito de decidir nada agora.

Desliguei antes que ele pudesse responder.

Me permiti alguns segundos para respirar e voltei a andar.

Quando cheguei à enfermaria, Ruby estava sentada ao lado de Dayse, segurando sua pequena mão. A garotinha dormia profundamente, os cachos espalhados pelo travesseiro.

Ruby me viu e acenou discretamente antes de se levantar e caminhar até mim.

— Ela acordou depois que você saiu. Chorou muito. Mas agora conseguiu descansar.

Assenti, sentindo um nó na garganta.

— Obrigado por ficar com ela.

Ruby sorriu de leve.

— Não há de quê.

Hesitei por um momento antes de perguntar:

— O que você está fazendo aqui? Você mora em Londres.

— Vim ver meu pai. — ela respondeu. — Ele torceu o tornozelo tentando pegar uma penca de bananas.

Pisquei algumas vezes, confuso.

— Uma penca de bananas?

Ela deu de ombros.

— É, ele tem dessas.

Por um segundo, um riso escapou da minha garganta.

Foi a primeira vez que ri desde que tudo aconteceu.

Mas logo a realidade voltou a me atingir com força.

Ruby percebeu e pousou uma mão no meu braço.

— Lorenzo, eu sinto muito. De verdade.

Assenti e me sentei em um dos bancos do corredor. Minhas pernas estavam fracas, como se todo o peso da dor finalmente tivesse me alcançado.

Ruby se sentou ao meu lado e ficou em silêncio, esperando que eu falasse.

E eu falei.

— Isso está me matando. — confessei, minha voz falhando. — Lucca e Emilly eram minha única família aqui. Sempre cuidamos um do outro. Quando chegamos a Londres, fizemos um acordo legal. Se algo acontecesse comigo, Lucca seria meu tutor. Se algo acontecesse com ele, eu seria o responsável pela família dele.

Passei as mãos pelo rosto, sentindo a umidade quente das lágrimas que eu estava tentando segurar.

— Agora eu tenho que assinar a liberação dos corpos, preparar o funeral... e a Dayse.

Minha voz falhou quando mencionei o nome dela.

— O que vou fazer com ela?

Ruby me olhou com tristeza nos olhos.

— Não tem ninguém da família da Emilly?

Balancei a cabeça.

— Ela era filha única. Os pais morreram quando ela era adolescente. E a família do Lucca... — apertei os punhos. — Ele me fez prometer que, se algo acontecesse, eu nunca deixaria a Dayse nas mãos deles. Eles nunca aceitaram o casamento dele com Emilly porque ela era de uma família humilde. Quando ele foi para Londres, eles o descartaram. Ele sempre me disse que, se um dia algo acontecesse, era para eu cuidar dela.

Ruby ficou em silêncio por alguns instantes, absorvendo minhas palavras.

— Você já cuidou de muitos casos assim, não é? — ela perguntou.

Assenti, soltando um riso amargo.

— Sim. Crianças órfãs, disputas familiares... Mas nada disso me preparou para ser eu o responsável.

O peso da responsabilidade caiu sobre mim como uma avalanche.

Senti meu peito apertar.

As lágrimas, que eu tanto tentei conter, finalmente escaparam.

Me odiei por isso.

Mas Ruby não disse nada.

Apenas me puxou para um abraço.

No início, fiquei rígido. Não estava acostumado a me permitir fraquejar.

Mas, quando ela murmurou um simples “Vai ficar tudo bem”, algo dentro de mim cedeu.

Abracei-a de volta.

E, pela primeira vez desde que tudo aconteceu, senti que talvez eu não estivesse tão sozinho quanto pensava.

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