capítulo 04 - futuro desejado

No dia seguinte, o despertador tocou, e Vitória sentiu o peso da madrugada mal dormida. Ficou enrolando por dois minutos antes de finalmente desligar o alarme.

— Droga, devia ter dormido mais cedo... — murmurou.

Senta-se na cama, coloca suas pantufas de panda roxo — que não combinavam muito com ela, mas estavam em promoção e eram fofas — e segue para o banheiro. Depois de lavar o rosto e escovar os dentes, prepara um sanduíche de presunto, queijo, tomate e alface, acompanhado de um café.

Vestiu um look confortável e elegante, misturando um estilo clássico com um toque moderno: uma camisa branca de mangas longas levemente folgada, sob um colete de tricô cinza escuro. A calça preta de cintura alta e corte flare alongava sua silhueta, e os sapatos brancos equilibravam o visual. No cabelo, um coque despojado, com alguns fios soltos ao redor do rosto. Em vez de bolsa, uma mochila preta prática para levar os materiais da aula.

Antes de sair, decidiu ligar novamente para a tia. Agora, na Coreia era de tarde, e no Brasil, provavelmente era início da manhã. Jorel provavelmente já estava se arrumando para ir à escola.

O telefone chamou, e a tia atendeu com um sorriso:

— Oi, Vitória! Já indo pra aula?

— Sim, só queria saber como vocês estão. O Jorel já acordou?

— Acordadíssimo! Olha só ele escovando os dentes.

A solicitação de chamada de vídeo apareceu, e Vitória aceitou. Lá estava Jorel, em pé sobre uma cadeira para alcançar melhor a pia, escovando os dentes com energia. O pijama azul-claro, com estampas de foguetes e estrelas, já estava um pouco amassado, resultado de ele ter rolado na cama antes de finalmente ir escovar os dentes. Seu cabelo loiro e ondulado continuava ligeiramente bagunçado, com algumas mechas caindo sobre a testa.

A boca cheia de espuma tornava impossível entender o que ele tentava dizer, resultando apenas em murmúrios embolados e pequenas bolhas escapando pelos cantos dos lábios.

Vitória riu.

— Jô, que dentes mais limpos! Acho que vou ficar cega de tanto brilho! — brincou.

Ele sorriu orgulhoso, mostrando os dentes brancos para a câmera. Conversaram mais um pouco, rindo e se despedindo antes que ele saísse para a escola.

Vitória guardou o celular e seguiu para a aula. O campus estava mais tranquilo do que ela imaginava, mas, ao mesmo tempo, o ambiente carregava uma energia vibrante, como se estivesse sempre em movimento, como um rio que nunca parava de fluir. O prédio moderno e minimalista refletia a cultura organizada da Coreia, algo que ela começava a admirar, mas também a questionar.

As aulas eram desafiadoras, principalmente porque o idioma ainda era uma barreira, mesmo após tanto tempo morando ali. Ela passava a maior parte do tempo observando os professores e tentando entender o máximo possível. Às vezes, se pegava pensando em como seria a vida de seu irmão, Jorel, quando ele finalmente chegasse à Coreia. Será que ele se adaptaria tão bem quanto ela? Será que conseguiria compreender a cultura e a língua de uma forma tão natural quanto ela?

Vitória se sentou em seu lugar habitual, no fundo da sala, ao lado da janela, onde o sol da manhã fazia com que a vista de Seul ficasse ainda mais impressionante. O céu estava limpo, e as ruas abaixo estavam cheias de pessoas indo para o trabalho, suas figuras pequenas, mas ocupadas. Ela se pegou imaginando quantas histórias aquelas pessoas tinham, cada uma com seus próprios sonhos, desafios e trajetórias.

Ela sentiu um leve toque no ombro, e ao virar, encontrou uma de suas colegas de classe, Soo Jin, sorrindo para ela. Soo Jin era uma das poucas pessoas com quem ela conseguia conversar em coreano sem se sentir completamente perdida. Sua amizade, embora recente, já parecia sólida. Elas começavam a se comunicar não apenas através das palavras, mas também através dos gestos, sorrisos e olhares compreensivos.

— Oi, Vitória! Como você está? — Soo Jin perguntou, em um tom amigável.

— Ah, estou bem. Só cansada mesmo. Não consegui dormir muito ontem, estava pesquisando sobre algumas coisas para o meu irmão... — Vitória respondeu, tentando disfarçar o cansaço em sua voz.

Soo Jin a olhou com um interesse genuíno.

— Jorel, certo? Como ele está? Eu lembro de você me falar dele na última vez. Ele é tão fofo! — Soo Jin disse, sorrindo.

— Sim, ele está ótimo. Só que... — Vitória hesitou por um momento. — Ele não está aqui comigo, ainda está no Brasil. E eu realmente me preocupo com a adaptação dele quando vier para cá. Não sei se ele vai se acostumar bem.

Soo Jin pensou por um momento antes de falar.

— Eu entendo, Vitória. Eu me senti um pouco assim quando me mudei para Seul também. Mas, com o tempo, tudo se encaixa. E ele vai ter você, certo? Isso faz toda a diferença.

Vitória sorriu, aliviada pelas palavras da amiga. Não estava sozinha nesse processo, mesmo que a saudade de seu irmão fosse algo que a consumisse.

O professor entrou na sala, e todos se acomodaram. Vitória, embora atenta à aula, se pegou novamente pensando no futuro. Quando Jorel chegasse, seria ela quem teria que guiá-lo, protegê-lo, e, acima de tudo, garantir que ele se sentisse acolhido em um lugar tão diferente de tudo o que ele conhecia. Ela estava disposta a fazer isso, mas uma parte dela ainda se perguntava: seria o suficiente?

Ela olhou pela janela novamente, observando a vida lá fora. Sabia que, assim como o rio que fluía, ela também estava em movimento. Só precisava continuar seguindo, com paciência, força e determinação.

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