Um tiro que mudou tudo.

Peguei um táxi, o silêncio no carro era agoniante e a bagunça cortava a noite, eu não conseguia parar de tremer. Minhas mãos suavam, meu peito subia e descia descontrolada. Olhei pelo retrovisor várias vezes, esperando ver carros pretos surgirem na escuridão para me arrastar de volta.

Meu coração pulou quando o taxista limpou a garganta e disse:

— Para onde, senhorita?

Minha mente girava. O aeroporto. Eu preciso ir o mais longe possível.

— Aeroporto. Agora.

Minha voz saiu rouca, presa pelo pânico.

O homem franziu o cenho no espelho, mas não questionou. A cidade passando em borrões de luz e sombras pela janela, mas eu não conseguia enxergar nada além do que havia deixado para trás.

Luigi, caído no chão. O sangue manchando a camisa. Seus olhos escuros, ainda me desafiando.

Minhas unhas cravaram na saia do vestido.

Ele está morto?

Engoli em seco, sentindo meu estômago embrulhar.

Se estiver, eu não posso mais voltar.

Se estivesse vivo… também não.

O táxi parou na entrada do aeroporto. Peguei um amontoado de notas amassadas e joguei no banco antes de saltar apressada. Cada passo me fazia sentir como se tivesse um alvo nas costas.

Eu preciso sumir.

Joguei meu celular em uma lixeira. Meu nome, minha vida, minha história… tudo ia morrer ali.

Mas eu ainda não estava segura.

Os voos eram caros. Meus documentos puderam ser rastreados. E se Luigi estivesse vivo? Ele controlava tudo. Ele me encontraria.

Então, preciso do outro plano.

Sai do aeroporto, correndo até o píer. Os barcos estavam ancorados, balançando na água escura. Alguns homens descarregavam caixas, enquanto um pequeno grupo de mulheres conversava próximo a uma embarcação enferrujada.

Respirei fundo, ajeitei os cabelos e me aproximei.

— Oi… — Minha voz falhou.

Eles se viraram. Uma mulher mais velha, com olhos cansados e pele queimada de sol, me analisou.

— Tá perdida, menina?

— Eu... preciso sair daqui. Para qualquer lugar.

Ela estreitou os olhos.

— Qual é o seu nome?

Hesitei.

— Clara.

— Para onde vai, Clara?

— Para onde esse barco for.

Ela riu, cruzando os braços.

— Isso aqui vai para o outro lado da cidade, uma área pobre. Só transporte de trabalhadores. Não é pra turistas.

— Eu não sou turista.

Ela estreitou os olhos.

— E tem dinheiro?

Meus dedos apertaram o pequeno pedaço de notas que eu tinha.

— Não muito. Mas… preciso recomeçar.

A mulher trocou um olhar com as outras, depois deu de ombros.

— Se não tiver medo de trabalhar duro, pode vir.

Engoli em seco, sentindo o coração acelerar.

Eu estava fugindo. Eu estava começando do zero.

Mas enquanto subia no barco, uma voz ecoava na minha mente.

“Você nunca vai se livrar de mim.”

A madeira do barco rangia sob meus pés enquanto me acomodava em um canto discreto. As mulheres ao redor conversavam em voz baixa, avaliando-me com olhares curiosos.

A mais velha, que parecia ser a líder, me lançou um olhar demorado antes de perguntar:

— Sozinha no mundo, é?

Assenti, apertando as mãos no colo.

— Não tenho ninguém.

Uma delas, uma morena de cabelos curtos, assobiou.

— Então caiu no lugar certo, garota. Todo mundo aqui tá fugindo de alguma coisa.

A mais velha acendeu um cigarro, soltando a fumaça devagar.

— Olha, temos duas opções para você: ou trabalha na fábrica descarregando caixas, ou tenta a sorte na boate.

— Boate? — franzi a testa.

Uma morena riu.

— Você tem cara de quem nunca pegou no pesado. Talvez consiga trabalho funcional, bebida ou dançando.

Meu estômago revirou. Eu não sabia o que era pior.

Antes que eu pudesse responder, senti um arrepio gelado subir pela espinha. Um instinto estranho me fez olhar para o píer.

E foi aí que os vi.

Homens de terno, conversando com um dos trabalhadores do porto.

Eles vieram me buscar.

Meu sangue gelou.

A líder notou minha expressão e seguiu o meu olhar.

— Conhece aquelas caras?

Meu coração disparou. Meu corpo reagiu antes mesmo da minha mente.

Eu pulei na água.

Ela me engoliu, meu corpo mergulhou no gelado tirando meu fôlego. O som abafado do mar envolveu meus ouvidos, e por um segundo tudo sumiu.

Mas eu não podia parar.

A água salgada estava congelante, mas eu não parei. Eu não poderia. Eu sabia que se fizesse, tudo acabaria ali, naquele instante. Eles estavam atrás de mim. Eu pude sentir, até mesmo quando meus músculos obtiveram a combustão de exaustão.

Com a força que me restava, nadei até a terra mais próxima, onde uma pequena faixa de areia se estendia. A dor nas minhas pernas quase me fez parar, mas o medo de ser encontrado me impeliu a continuar.

Cheguei à margem.

Me arrastei até o chão, jogando meu corpo cansado na areia fria, sem forças para me levantar. O cansaço tomou conta de mim como uma onda implacável.

Eu não sabia onde estava, mas isso era um pouco importante.

Com a mente nublada e o corpo exausto, fechei os olhos. O mundo parecia desaparecer, os barulhos se tornaram distantes, como se o mar tivesse me engolido de vez.

E, então, apaguei.

O frio da terra contra a minha pele e o som da brisa foram as últimas sensações que eu tinha, até que, finalmente, a escuridão me envolveu completamente.

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Comments

Jucileide Gonçalves

Jucileide Gonçalves

É bem corajosa, mas de que adianta correr tanto se vai ser encontrada de qualquer jeito.

2025-04-04

0

Euridice Neta

Euridice Neta

Caramba, corajosa ela pular no mar gelado, mais não vai conseguir fugir ele não vai deixar....

2025-03-12

0

Arlete Fernandes

Arlete Fernandes

Nossa que aventura ela está tendo e vai sofrer um bocado!

2025-04-08

0

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