O sol da manhã invadia meu quarto pelas frestas da cortina, espalhando uma luz dourada que contrastava com o frio que ainda sentia por dentro. Dormi pouco depois da conversa com Damian. Suas palavras continuavam ecoando na minha mente: "Não tente apagar a dor, Lilian. Ela é a única coisa que te lembra que você ainda sente alguma coisa."
Levantei-me lentamente, com o corpo pesado e a mente cheia de pensamentos que eu não conseguia organizar. O aroma de café fresco veio da cozinha, misturado com o cheiro salgado do mar que nunca parecia desaparecer por completo.
Depois de um banho rápido, vesti um short jeans, uma camiseta branca simples e prendi o cabelo em um coque desleixado. Ao descer as escadas, encontrei tia Sofia na cozinha, impecável como sempre, com um vestido leve e cabelos perfeitamente arrumados. Ela cortava frutas com uma delicadeza que parecia coreografada.
— Buongiorno, Lilian. Dormiu bem? — perguntou com um sorriso suave, mas seus olhos analisavam cada detalhe do meu rosto.
Assenti, forçando um sorriso.
— Sim, um pouco.
Tia Sofia era o tipo de pessoa que parecia carregar o peso da perfeição. Sempre elegante, sempre no controle. Ela tentou ser acolhedora desde o primeiro dia, mas havia algo na maneira dela uma distância sutil, como se estivéssemos em mundos paralelos mesmo sob o mesmo teto.
Sentei-me à mesa enquanto ela me servia uma xícara de café.
— Sebastian deve chegar só para almoço. Ele passou a noite fora com alguns amigos — comentou casualmente, como se isso fosse parte da rotina.
Sebastian. O outro enteado dela. O oposto de Damian, pelo que eu conseguia perceber. Enquanto Damian exalava um ar de mistério e indiferença, Sebastian parecia ser feito de luz, com seu sorriso fácil e uma simpatia natural que fazia as pessoas gravitar ao redor dele.
Não respondi. Apenas mexi o café, observando o líquido escuro girar na xícara.
Depois do café, decidi explorar um pouco o jardim da mansão. O terreno era imenso, com caminhos de pedra ladeados por oliveiras e flores exóticas que eu não reconhecia. O cheiro da maresia era forte, e o som das ondas quebrando contra as rochas ao longe era quase hipnótico.
Segui o mesmo caminho da noite anterior, passando pela piscina até o muro de pedra onde eu tinha chorado minhas dores. O mar estava calmo, cintilando sob o sol da manhã. Sentei-me novamente, abraçando os joelhos, tentando encontrar alguma paz.
Mas, claro, a paz não durou muito.
— Você gosta desse lugar, hein? — a voz familiar, rouca e carregada de ironia, me fez virar rapidamente.
Damian.
Ele estava encostado em uma coluna, com o cabelo ainda mais bagunçado do que na noite anterior, vestindo uma camiseta preta e jeans desbotados. Os olhos cinzentos pareciam mais claros à luz do sol, mas mantinham aquele brilho indecifrável.
Suspirei.
— Talvez porque seja o único lugar onde eu possa ficar em paz.
Ele arqueou uma sobrancelha, se aproximando com passos lentos e despreocupados.
— Isso é um insulto? — perguntou, parando ao meu lado e olhando para o mar.
— Se você quiser que seja.
Ele riu baixo, um som que parecia mais verdadeiro do que o da noite anterior.
— Você é mais interessante do que eu pensava.
Revirei os olhos, mas não consegui conter um leve sorriso. Damian tinha esse efeito estranho irritante e fascinante ao mesmo tempo.
Ficamos em silêncio por alguns instantes, observando o horizonte. O vento bagunçava meu cabelo, e eu o deixei assim, sem me importar.
— Você sempre lê à noite? — perguntei, lembrando da cena dele com o livro e o uísque.
Ele deu de ombros.
— Às vezes. Os livros têm mais a dizer do que as pessoas.
— Depende das pessoas.
Damian me lançou um olhar rápido, avaliador.
— Talvez. Mas, até agora, não conheci muitas que valessem a pena ouvir.
Houve um peso nas palavras dele, algo que parecia mais profundo do que simples arrogância. Como se houvesse uma história ali, algo que ele não queria ou não sabia como compartilhar.
Antes que eu pudesse responder, ouvi passos vindo do jardim. Quando me virei, vi Sebastian.
Ele era o oposto de Damian em tudo. Cabelos loiros dourados pelo sol, sorriso fácil e uma energia vibrante que parecia iluminar o lugar. Usava uma camiseta branca simples e bermuda jeans, mas mesmo com essa simplicidade, parecia saído de uma revista.
— Ciao, Lilian! — Ele acenou, se aproximando com um sorriso caloroso. — Finalmente te encontrei. Você está se escondendo?
Damian soltou um suspiro baixo e se afastou um pouco, cruzando os braços enquanto observava em silêncio.
— Só… aproveitando a vista — respondi, sorrindo de volta para Sebastian.
Ele se sentou ao meu lado no muro de pedra, seus olhos azuis brilhando sob o sol.
— A vista é incrível, mas acho que você faz companhia melhor do que o mar — disse, piscando de forma charmosa.
Eu ri, balançando a cabeça. Sebastian era carismático de um jeito natural, o tipo de pessoa que fazia você se sentir à vontade instantaneamente.
Damian, por outro lado, parecia uma sombra ali perto, observando em silêncio, a mandíbula tensa.
A tensão entre eles era palpável.
— Estávamos apenas conversando — Damian disse de repente, sua voz carregada de algo que eu não conseguia identificar.
Sebastian deu de ombros, indiferente.
— E agora estamos os três conversando. Melhor ainda.
Eu me senti no meio de uma disputa invisível, embora não soubesse exatamente o porquê.
— Vocês dois sempre fazem isso? — perguntei, rindo nervosamente.
Damian me lançou um olhar breve, um sorriso sarcástico nos lábios.
— Fazer o quê?
— Transformar o ar em gelo.
Sebastian riu alto, batendo levemente no meu ombro.
— É só o jeito do Damian. Ele adora ser o "cara misterioso e sombrio".
Damian revirou os olhos e se afastou, caminhando de volta para a mansão sem dizer mais nada.
Fiquei observando enquanto ele desaparecia pela porta, sentindo uma pontada estranha no peito.
Sebastian me olhou, o sorriso mais suave agora.
— Não se preocupe com ele. Damian é... complicado.
Eu assenti, mas no fundo sabia que havia mais ali. Mais do que Sebastian dizia, mais do que Damian deixava transparecer.
E, por algum motivo que eu ainda não entendia, eu queria descobrir o que era.
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Atualizado até capítulo 75
Comments
Onilda Furlan
muitos mistérios
2025-03-16
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