A chegada

O barco estava ancorado, as velas balançando suavemente com a brisa noturna, quando a família chegou. Enzo, Cesare e Pietro eram homens imponentes, com uma presença que inspirava respeito imediatamente. Era impossível não notar o caráter nobre em seus gestos e olhares, algo além da força física, uma espécie de honra que parecia emanar deles naturalmente.

As mulheres que os acompanhavam eram duas, ambas bem, mas com um ar distante, como se suas mentes estivessem em outro lugar, refletindo sobre o motivo real de estarem ali. As crianças – ou melhores, jovens – eram, na verdade, três adultas já, todos com uma postura firme e madura, mais do que aparentavam à primeira vista. Eles se apresentavam com uma educação impecável, sorrir com aquela atenção calculada, falando em detalhes, como se tentassem a aliviar a tensão do momento. Homenagear um bom homem, diziam. A despedida de Rafael, um gesto de carinho.

Uma delas, no entanto, se destacou. Havia algo de diferente em seu olhar, algo que me chamou a atenção de imediato. Uma intensidade escondida por trás do sorriso gentil. Uma energia inexplicável que me fez sentir uma vontade súbita de abraçá-la. Foi uma sensação estranha, até irracional, mas imediatamente reprimida. Não era o momento para isso, nem o local. E, acima de tudo, aquela atração não deveria existir, pelo menos não para mim. Então, fiz o que qualquer homem faria: tentei seguir a noite, focando no que importava.

Enquanto o barco cortava as águas tranquilas, Pietro e Cesare se aproximaram para conversar. Queriam saber se seria possível se aproximar de algumas das ilhas abandonadas ao longo. Respondi afirmativamente, tentando dar um tom descontraído à conversa, dizendo que, com as luzes certas, tudo se tornava possível. Mas o ambiente estava prestes a mudar, e a noite, que até então parecia tranquila, logo tomaria outro boato.

O som de tiros cortou a calma da noite, estilhaçando o ar. Eles eram altos, rápidos, e vinham de algum ponto não muito distante, ecoando pelas colinas.

Os homens não hesitaram. Pietro e Cesare mandaram as mulheres para dentro do barco e imediatamente pegaram suas armas. O movimento foi rápido, ensaiado, como se soubessem exatamente o que estava acontecendo.

Eu, por instinto, entendi que aquilo não era um simples acidente. Era uma emboscada. Os tiros não foram ali por acaso. Era uma armadilha, estavam tentando nos pegar, ou estavam nos enviando uma mensagem de retaliação. Mas contra quem? Essa dúvida corroía minha mente enquanto eu me preparava para o que seguiria.

O ataque aconteceu tão rapidamente que, quando percebi, o caos já estava instaurado. O som dos tiros reverberava pelo ar, e os ecos de disparos se misturavam com o crepitar das chamas que começaram a tomar o convés.

Fogo e fumaça surgiram do nada,  envolvendo o barco em um pesadelo instantâneo.

— Isso foi armado, barco não pega fogo assim — falei.

— Vamos evitar que entrem no barco, precisamos salvar elas — falou Cesare.

Homens armados, com máscaras e camuflagem, invadiram o espaço, subindo a bordo com uma precisão assustadora. Eu pude ver os contornos de suas sombras no brilho das chamas, e logo, mais tiros cortaram o ar, fazendo com que todos se abaixassem, buscando abrigo.

Os homens gritaram ordens, e o barulho dos passos e das vozes era abafado pela fumaça espessa. O fogo se espalhava rapidamente, consumindo as velas, as cordas, e o que quer que estivesse ao alcance.

As mulheres estavam tossindo, envoltas pela fumaça densa, lutando para respirar. O pânico tomou conta delas, e não era difícil perceber que seria impossível para os três homens levarem todas juntas.

Eu sabia o que precisava fazer. Corri até o local onde o bote estava preso, meu coração batendo forte, tentando controlar a adrenalina. Não havia tempo a perder. Comecei a baixar o bote, movendo-me com a rapidez que a situação exigia. O barco estava literalmente pegando fogo. Tiros ainda ressoavam ao fundo, e eu podia ouvir os gritos e a confusão crescente.

Enquanto eu me aproximava para pegar a jovem, que mais ouvi ser chamada de Belinda, meu sangue gelou. Um homem, com uma violência indescritível para uma menina tão linda e delicada, a segurava pelo pescoço, seus dedos apertando de forma implacável, deixando-a sem fôlego.

Ela estava começando a perder a consciência, seu rosto ficando pálido e seus olhos se fechando. Sem pensar duas vezes, corri em sua direção e arranquei o homem de cima dela, empurrando-o com força para o lado. O impacto foi suficiente para afastá-lo, mas ele não desistiu. Só não era tempo para ele.

Olhei para trás e vi que as mulheres estavam em um estado crítico. O pânico e a fumaça impossibilitavam para qualquer um de nós levá-las a salvo. A decisão foi difícil, mas não havia escolha. Eu a olhei uma última vez, vendo a vida escorrendo de seu rosto, e disse com firmeza:

— Levarei a jovem, peguem elas e vamos para o bote.

Os homens assentiram, compreendendo a necessidade. A situação não era simples, mas não havia outra opção.

Corri com Belinda até o bote, seus braços inertes caindo ao meu lado. A jovem desmaiada em meus braços. No instante que empurrei o bote para a água, ouvi a explosão. Um estrondo devastador, e o barco, nossa única chance de fuga, foi engolido pelo fogo.

As chamas subiram para o céu, iluminando a noite de forma grotesca.

O barulho da explosão ainda estava no ar quando, instintivamente puxei Belinda comigo para longe do fogo, seus pais estavam no bote e torcia para que tivessem conseguido fugir.

 A água gelada nos engoliu imediatamente com a força das ondas nos arrastando.

Com um esforço desesperado, tentei manter a jovem fora da água, embora o cansaço já começasse a dominar meu corpo. A correnteza puxava com uma força imensa, levando-nos sem piedade. A visão se turvou, a exaustão me consumindo, mas eu sabia que precisava mantê-la viva, que, por alguma razão, ela era a única coisa que eu poderia salvar.

Lentamente, o cansaço tomou conta de mim. A última lembrança que eu tinha antes de sucumbir ao sono era de colocar Belinda sobre um pedaço de escombro flutuante, tentando protegê-la da correnteza segurando firmemente sua mão. E então, a escuridão tomou conta, enquanto as águas me arrastavam, e tudo o que restava era a incerteza do que viria pela frente.

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Comments

Solange Lopes

Solange Lopes

mais mais mais por favor autora atualiza mais capítulos

2025-01-21

3

Márcia Jungken

Márcia Jungken

com certeza foi o escroto do Andreas que mandou explodir o barco 🤔🤔

2025-04-04

0

Dulce Rodrigues

Dulce Rodrigues

Emboscada!! Andreas tramou tudo com precisão...🤬😡

2025-03-26

0

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