Capítulo 18

...Isaac Castellani...

O barco deslizava silenciosamente pelo mar, e, pela primeira vez desde aquela nossa conversa, parecia estarmos realmente aproveitando. Aylme estava mais tranquila do que de costume, e por algum motivo, isso me deixou desconfortável. Era como se, de repente, ela estivesse aceitando nossa situação com uma serenidade que eu não conseguia compreender, quando eu queria que toda essa situação chegasse logo ao fim. É só eu conseguir o que quero, e não precisarei mais ficar preso nesse casamento.

Quando voltamos ao hotel, a tranquilidade entre nós ainda persistia, mas havia algo mais além da calma. Algo que eu não queria nomear.

— Vai pedir o jantar no quarto ou no restaurante? — perguntei, enquanto caminhávamos pelo saguão.

— No quarto — respondeu ela, sem hesitar. — Não estou com paciência para posar de esposa perfeita hoje, e nem ter que te aturar.

Sua resposta deveria ter me irritado, mas, em vez disso, senti um sorriso se formar no canto dos lábios. Não respondi, e seguimos nossos caminhos. Ela entrou para o quarto dela e eu para o meu.

Mais tarde, enquanto lia e-mails no meu quarto, tentando afastar qualquer pensamento que não fosse relacionado ao trabalho, ouvi uma batida na porta.

Abri para encontrá-la ali, usando um vestido simples que deixava os ombros à mostra. Ela parecia diferente. Não relaxada, exatamente, mas havia algo menos defensivo nela.

— Preciso de ajuda com o minibar — disse, como se fosse um pedido casual, mas havia algo nos olhos dela que me fez hesitar por um segundo.

— O minibar?

Ela revirou os olhos.

— Sim. Está emperrado. Vai ajudar ou não?

— Estranho que nesse quarto, as coisas sempre ficam emperradas. Não acha?

— Vou chamar outro para olhar.

— Não precisa, eu vou.

Suspirei e a segui até o quarto dela.

Essa mulher vai me enlouquecer.

O problema era mínimo, algo que qualquer pessoa poderia resolver com um pouco de paciência. Em poucos segundos, destravei o minibar, e, quando me virei para avisar, percebi que ela estava mais perto do que eu esperava.

— Você sempre faz tudo parecer tão fácil — comentou ela, o tom levemente provocativo, mas com algo mais subjacente.

— Porque é fácil — respondi automaticamente. — Você que dificulta as coisas.

Ela riu, e, pela primeira vez, o som não parecia carregado de sarcasmo. Algo no jeito que ela inclinou a cabeça, o brilho em seus olhos… Aquilo me desarmou.

Antes que eu pudesse pensar melhor, meus instintos assumiram. Peguei ela de surpresa, puxei ela pela cintura e inclinei-me para beijá-la.

O beijo foi intenso, inesperado, e muito mais real do que deveria ser. Não era uma encenação, não era parte do acordo. Era só ela, com seus lábios quentes e macios contra os meus, e eu, incapaz de resistir à proximidade daquela tentação de pernas.

Por um momento, não pensei em nada. Não havia contrato, nem responsabilidades. Apenas a sensação do toque dela e o som de sua respiração acelerada.

Quando me afastei, percebi que estava ofegante, como se aquele momento tivesse consumido toda a minha energia. Ela me olhava com uma mistura de surpresa e algo mais que eu não conseguia identificar.

— Olha só, você beija muito bem, quando quer. — Provocou ela, com a respiração acelerada, enquanto ria na minha cara.

— Tenho boca para isso e muitas outras coisas — falei irritado.

Senti que falhei, droga.

Minha mente entrou em alerta. Esse casamento era um contrato, um acordo. Eu estava começando a cruzar limites que nunca deveriam ser ultrapassados. E para piorar, ela estava fazendo pouco da minha cara.

— Mas foi um erro — respondi rapidamente, minha voz mais dura do que pretendia.

O brilho nos olhos dela desapareceu instantaneamente, substituído por uma frieza que me atingiu como um soco.

— Um erro?

A palavra pairou no quarto, pesada e cheia de frieza. Eu não conseguia responder. Passei a mão pelos cabelos, tentando organizar meus pensamentos.

— Arrume suas coisas — disse, finalmente, com a voz firme. — Estamos indo embora amanhã.

— O quê?

— A lua de mel acabou. Não há motivo para prolongar isso.

Ela cruzou os braços, me olhando com incredulidade.

— Por causa de um beijo? Sério? Vai fazer isso só por causa de um beijo?

— Isso não é um problema seu. Apenas esteja pronta às 10h

Eu sabia que estava sendo frio, mas era o único jeito de manter as coisas sob controle.

— Você é inacreditável — disse ela, balançando a cabeça antes de virar as costas e caminhar até a janela.

A vontade de me justificar era forte, mas me forcei a sair do quarto. Eu precisava de espaço, de tempo para entender o que acabara de acontecer.

De volta ao meu quarto, sentei-me na cama e passei as mãos pelo rosto.

Eu nunca deveria ter beijado Aylme. Não importava o que senti naquele momento, era um erro. Ela era parte de um contrato, uma peça temporária na minha vida, e, no final disso tudo, seguiríamos caminhos opostos.

Mas, por mais que tentasse justificar, não conseguia tirar o gosto dela dos meus lábios ou a sensação do corpo dela perto do meu. Preferia que ela comesse alho todos os dias, assim não cairia na tentação de beijá-la.

“Controle-se, Isaac,” murmurei para mim mesmo, tentando afastar o calor que ainda sentia.

A noite parecia interminável. Tentei focar no trabalho, revisar e-mails, qualquer coisa para ocupar a mente. Mas cada vez que fechava os olhos, a imagem dela voltava. O toque dos lábios, a surpresa no olhar dela depois.

Por que ela tinha esse efeito sobre mim?

Suspirei e fui até a varanda. A noite estava calma, o som das ondas quebrando ao longe. Tentei usar o ambiente para clarear os pensamentos, mas foi inútil.

A verdade era simples: Aylme estava começando a ocupar um espaço em minha mente que eu não queria que ela ocupasse. Esse casamento deveria ser uma farsa, algo puramente prático. Mas, de alguma forma, ela estava transformando isso em algo mais complicado.

Eu precisava de distância.

Decidido, voltei para dentro e comecei a arrumar minhas coisas. Amanhã estaríamos longe daqui, e eu poderia recuperar o controle da situação.

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