CAPÍTULO 7

A dor no meu flanco não diminuía. Cada respiração que eu tomava fazia meu corpo reagir como se estivesse sendo cortado por mil lâminas. Mas eu não deixaria isso me parar. Não agora.

Ronan estava ao meu lado, os olhos fixos em mim com uma expressão de preocupação. Ele estava agachado, a mão suavemente pressionando um pano contra meu ferimento para estancar o sangue, e apesar de sua aparência calma, pude ver a tensão em seus ombros. Aquele homem não estava acostumado a situações como essa, mas ele não estava hesitando, nem parecia amedrontado.

Eu podia sentir o cheiro do seu suor misturado com a terra e o sangue no ar. Ele se movia com a confiança de alguém que sabia o que estava fazendo, mas também havia uma fragilidade no modo como ele tocava minhas feridas, como se fosse fácil quebras as peças de um quebra-cabeça frágil.

— Isso vai ajudar — ele murmurou, olhando para mim, seus olhos escuros carregados de algo que eu não queria decifrar.

Eu não respondi. O silêncio estava pesado entre nós, mas, de alguma forma, era mais confortável do que qualquer palavra. Eu me deitei um pouco mais, apoiando-me nos arbustos, o filhote ainda enrolado no pano que eu havia amarrado em minhas costas.

De repente, uma onda de cansaço me atingiu, e eu senti como se estivesse indo para um lugar distante. A dor me enredava e me puxava para uma escuridão que parecia tentadora. Não que eu quisesse morrer — mas a ideia de escapar dessa luta, dessa vida, me parecia mais simples do que continuar. Eu fechei os olhos, tentando afastar o peso da sensação de impotência.

Foi quando ouvi a voz de Ronan novamente, suavemente, mas com uma firmeza que não parecia se abalar.

— Você quase morreu lá. Eu… pensei que você estava… Eu pensei que não ia conseguir se salvar.

Eu não pude evitar o riso fraco que escapou dos meus lábios, apesar da dor.

— Eu também pensei que ia morrer. Damian... ele era muito mais forte do que eu. Não tinha como derrotá-lo.

Ronan suspirou, seu tom carregado com algo que eu não conseguia identificar.

— Nunca vi alguém tão forte quanto você, Kaela. Não vou mentir, foi por pouco. Mas você lutou. Lutou com tudo. Eu... eu não sei o que pensar sobre isso. Não sei como você conseguiu.

Eu olhei para ele, sem poder esconder o sorriso irônico que surgiu em meu rosto.

— Você é maluco, sabia? Se arriscando assim por mim. O que espera? Que eu vá retribuir de alguma forma? Isso é um caminho sem volta, Ronan. Nós estamos fadados à morte. Não tem como fugir disso.

Ronan olhou para mim, seu olhar intensamente focado. Ele não respondeu imediatamente, e por um momento, a única coisa que eu conseguia ouvir era o vento suave nas árvores ao redor. O filhote mexeu-se em meu pano, e Ronan lançou um olhar furtivo para ele.

Ele respirou fundo, como se a resposta já estivesse dentro de si e ele estivesse apenas decidindo se deveria compartilhá-la ou não. E quando falou, sua voz estava mais suave, mas com uma segurança inconfundível.

— Eu não me importo com o que vem depois. Tenho um bom pressentimento sobre você, Kaela. E quando te vi lutando… Tive certeza que não é uma pessoa ruim e que valhe a pena ser ajudada.

Ele se inclinou um pouco para mais perto, seus olhos focados em mim de uma forma que fez meu coração disparar, ainda que eu tentasse ignorar.

Mas, em vez de responder, desviei o olhar, sentindo-me desconfortável com a vulnerabilidade que ele trazia para a mesa. Porque, se eu fosse honesta, eu já estava me apegando a ele. E não era algo que eu pudesse permitir.

— Você está maluco mesmo — murmurei, quase sem saber o que mais dizer.

Ele apenas deu um pequeno sorriso, aquele tipo de sorriso que dizia que ele estava absolutamente convencido do que estava dizendo, mesmo que fosse a maior loucura do mundo.

O filhote, com seus olhos grandes e inocentes, se mexeu mais uma vez, chamando minha atenção. Eu olhei para ele, e, por um instante, me perguntei por que aquela criatura estava em minha vida. Eu não tinha nenhum motivo concreto para mantê-lo. Não sabia se ele era valioso para alguém, ou se só estava ali por pura coincidência.

Eu olhei para Ronan, e em sua expressão havia uma pergunta não respondida, algo que ele ainda tentava entender.

— Você ainda está se perguntando por que estou fazendo isso, não é? — perguntei, minha voz grave, mas cansada. — Porque, se for por causa do filhote, você pode esquecer. Não tenho ideia do que ele é, nem quem ele é. Mas fiz minha decisão. Não vou entregar. Eu vou até o fim.

Eu não sabia ao certo porque essas palavras saíram com tanto poder, mas eu sentia a decisão profunda dentro de mim. Não ia desistir. Não importava o que acontecesse, eu não iria entregar o filhote, não ia permitir que eles o usassem para algo que eu não compreendia. E não, não era porque eu queria ser uma heroína. Era porque eu sabia que, se eu o entregasse, não seria só ele que estaria perdido. Eu estaria perdida também.

Ronan olhou para mim, seus olhos escuros refletindo uma tristeza que ele não disfarçava mais.

— Então até o fim — ele disse em voz baixa, mais para si mesmo do que para mim. E, por um instante, eu vi nele a mesma determinação que queimava dentro de mim.

Era uma decisão tomada. O caminho era incerto, e talvez não tivéssemos um futuro brilhante à frente. Mas, naquele momento, éramos aliados, e, por mais que tudo ao redor estivesse desmoronando, havia uma força crescente entre nós, algo que não podíamos mais ignorar.

E enquanto o filhote se aninhava no pequeno pedaço de pano, em minha mente, uma única palavra ecoava: sobreviver.

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