CAPÍTULO 4

O silêncio entre nós era profundo, denso, quase palpável. A lua brilhava acima de nossas cabeças, iluminando a floresta ao nosso redor com um brilho prateado, mas, mesmo com a beleza ao nosso redor, nada parecia mais importante naquele momento do que o peso daquilo que eu estava prestes a revelar.

Ronan estava ao meu lado, limpando as lâminas e cuidando das feridas superficiais, mas eu sabia que ele sentia a tensão no ar, sabia que alguma coisa estava prestes a quebrar.

Eu olhei para ele, meu peito apertando. O coração batia rápido e o nó na minha garganta só aumentava. Ele havia me salvado, lutado ao meu lado e até se arriscado por mim, sem sequer saber quem eu era de verdade. Mas tudo estava prestes a mudar.

— Ronan… — Minha voz estava trêmula, mais do que eu gostaria que estivesse. Ele levantou os olhos para mim, com aquele olhar calmo, esperando. — Eu preciso te contar a verdade. A verdade sobre quem eu sou. O que sou.

Ele não falou nada, apenas assentiu, e eu pude ver que ele sabia que algo estava me corroendo por dentro. Ele esperou. Eu sabia que ele não ia me julgar. Ele não faria isso. Mas, mesmo assim, estava com medo.

Suspirei, e as palavras começaram a sair mais rápido, como se eu estivesse tentando me livrar de um peso que me esmagava.

— Eu não sou quem você pensa que sou, Ronan. Eu não sou apenas uma ômega comum. Não fui criada para ser "mansa", "calma" e "submissa". — Eu ri sem humor, um riso sem alegria. — Eu fui forçada a ser, mas nunca consegui me encaixar nesse molde. Meu sangue… — Olhei para minhas mãos, tremendo levemente. — O que sou está marcado nele.

Ele me observava, sem uma palavra, e isso me dava a coragem que eu precisava para continuar.

— Fui rejeitada. Rejeitada por todos. E, você sabe… quando isso acontece, não há mais para onde ir. Aquele homem… o alfa que estava comigo, ele… ele não queria mais me ver. E não era só o fato de eu ser uma ômega. Era o meu espírito, Ronan. Eles não queriam uma ômega que não soubesse se submeter. Não queria uma ômega que não se calasse.

Eu senti um nó na garganta. Não era fácil falar sobre isso. Não era fácil encarar a dor que ainda existia dentro de mim.

— Então… eu fugi. Fugi sozinha. E foi assim que sobrevivi. Eu me escondi nas sombras. Aprendi a ser invisível, a não ser um alvo. Aprendi a lutar porque era tudo o que me restava. A única coisa que eu sabia fazer era lutar pela minha vida. E, quando eu finalmente comecei a acreditar que estava segura, apareceu o Lycan King, e tudo se virou de cabeça para baixo. Eu não sei o porquê eles vieram atrás de mim.

Minha voz vacilou, mas eu continuei, como se estivesse tentando exorcizar os demônios que me perseguiam.

— Esse ataque… Eu sou o alvo deles. E não entendo o motivo. Não acho que seja porque abandonei a minha matilha, que diferença faria para o Lycan King? Não. Há algo mais. E mesmo se fosse só isso… Eu não vou voltar. Eu não pertenço a lugar nenhum.

As palavras saíram mais pesadas do que eu imaginava. Eu estava dizendo a ele o que eu sempre havia guardado dentro de mim, a dor de ser rejeitada, de não ter um lugar onde fosse aceita. E, no entanto, ele continuava ali, em silêncio. Sem interromper. Sem fazer perguntas. Apenas me ouvindo. A maneira como ele me olhava agora… era quase como se ele estivesse absorvendo tudo o que eu estava dizendo, sem pressa de formar uma opinião.

Eu precisava daquilo. Eu precisava que alguém visse o que eu carregava.

— Eu não sou fraca — falei finalmente, tentando me convencer mais do que a ele. — Não sou uma ômega comum que aceita ser colocada em uma gaiola. Não importa o que eles façam, eu não me deixarei ser domada.

Ronan me olhou nos olhos, com a mesma calma de sempre, mas havia algo mais agora. Algo em seu olhar que eu não sabia como descrever. Ele não parecia surpreso. Não parecia assustado. E, acima de tudo, ele não parecia com pena de mim.

— Você… você não é fraca, Kaela. Eu nunca pensei isso. — Sua voz era baixa, suave, mas carregava uma sinceridade que me fez prender a respiração. Ele fez uma pausa, e depois continuou, sem pressa, como se estivesse ponderando suas palavras com cuidado. — O que você é, Kaela, é forte. Muito mais forte do que a maioria dos alfas que eu já conheci. Eles se escondem atrás de suas regras, de suas máscaras de poder. Mas você… você não esconde quem é. Você não se dobra.

Eu olhei para ele, sem palavras. Não sabia o que dizer. Ele simplesmente não entendia. Eu… não sabia se queria ser forte, se isso era o que eu desejava ser. Eu só queria ser aceita. Queria parar de lutar. Queria um lugar onde eu pudesse respirar sem sentir o peso do mundo me esmagando. Mas Ronan estava lá, oferecendo palavras que eu não sabia como receber.

— Eu não te julgo, Kaela — ele continuou, mais baixo agora, como se estivesse tentando não me assustar. — Eu… eu não sou você. Não sei o que é viver como você viveu. Mas o que eu sei é que… você não precisa carregar esse peso sozinha. Não precisa ser invisível o tempo todo.

Eu balancei a cabeça, tentando afastar as palavras que começavam a fazer sentido demais. Não… não podia ser assim. Eu não podia me permitir confiar. Não podia me permitir precisar de ninguém. Não novamente.

— Eu me dei a chance de ser invisível, Ronan. Isso me manteve viva. Mas agora… — Eu hesitei, o nó na garganta voltando com força. — Agora, você está aqui. E eu não sei o que fazer com isso.

Ele deu um passo à frente, lentamente, sem pressa de me tocar, mas com uma intensidade que eu não conseguia evitar.

— Não precisa fazer nada, Kaela. Só… só deixe-me estar aqui. Só deixe-me ajudar, se você puder. Não há pressa. Não há julgamentos. Só nós dois, e essa noite.

Eu o olhei por um longo momento, e finalmente, a tempestade dentro de mim começou a acalmar. Eu não sabia o que viria depois, mas talvez… talvez, finalmente, eu pudesse deixar alguém entrar.

E, no silêncio da noite, com a lua como testemunha, Kaela, a ômega rebelde, finalmente sentiu que poderia, por um momento, ser apenas ela mesma.

Às vezes, as verdades mais difíceis são as que nos libertam. Mas até mesmo a liberdade carrega seu preço.

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