Capítulo 09 • Alessandro Pivani

– Você ainda está analisando esse relatório? – Mariano questiona, levantando a sobrancelha assim que entra na minha sala, enquanto eu jogo a pasta em cima da mesa.

– Droga, deve haver algo que nós não percebemos.

– Sobre a garota? – Ele franze o cenho.

– Sobre tudo, porra – Levanto-me tão rapidamente que a cadeira de rodinhas desliza e bate contra a parede de vidro atrás de mim.

Coloco ambas as mãos no vidro e olho para a paisagem de San Luca abaixo, me perguntando mais uma vez onde está escondido o infeliz que tirou a vida da minha filha.

– Nós vamos descobrir algo, Alessandro – ele promete com um tom mais decidido.

– Esse é o problema, Mariano – respondo enquanto me viro para encará-lo – Esse ‘vamos descobrir’ está ecoando na minha mente há tempo demais, e eu não sou exatamente uma pessoa paciente.

– Eu entendo, Alessandro. O que aconteceu nos afeta pessoalmente também. Todos nós estamos nos esforçando muito para resolver isso.

– Não parece estar sendo suficiente.

Ele baixa a cabeça, como se estivesse pensando a mesma coisa.

Já deveríamos ter capturado o infeliz traidor há bastante tempo, mas parece que quem está tramando contra nós conseguiu deixar poucos vestígios. Não encontramos nenhuma pista até agora.

–Você falou com a garota depois que ela acordou?

– Não – respondo, frustrado – De qualquer forma, não acredito que ela tenha algo novo para nos contar.

– Ela já se recuperou?

– Quase por completo – respiro fundo – Pelos relatórios que recebo, ainda há algumas escoriações pelo corpo e a perna continua imobilizada, mas aparentemente não vai demorar para que ela esteja completamente bem.

Já se passou quase um mês desde que a trouxemos. Nos primeiros dez dias, ela ficou sedada para que seu corpo pudesse se recuperar dos traumas. Em seguida, pedi aos médicos que suspendessem a sedação, pois não conseguia mais esperar para fazer as perguntas que precisava. Foi por isso que, quando ela abriu os olhos, eu estava sentado em uma poltrona ao seu lado e não as enfermeiras.

Após aquele dia, não a vi mais. As únicas informações que recebo sobre ela vêm dos relatórios médicos sobre sua condição de saúde.

– O que você fará com ela?

– Ainda não sei – respondo, e ele faz uma expressão confusa sem entender.

– Você está ciente de que tudo o que ela falou sobre sua relação com Mia é verdade, certo?

– É o que ela afirma – Rosno de volta, dando de ombros.

– Os novos relatórios que elaboramos sobre ela confirmaram isso, Alessandro. Você sabe tão bem quanto eu que a garota não tem culpa pelo que ocorreu. Basta olhar para ela para perceber que é uma sobrevivente, assim como nós fomos no passado. – Mariano tenta me levar a refletir com cautela. A ausência de alguém em quem eu possa descarregar minha raiva pode realmente estar obscurecendo meu julgamento em relação à menina.

Assim que chegamos à Itália, a vida de Vittoria virou de cabeça para baixo. O problema é que há algo na história dela, como uma criança solitária e sofrida, que não se encaixa.

Descobri que ela é filha de italianos que residem em Villa San Giovanni. Ela deixou a casa aos dezesseis anos e foi procurada pelos pais na época, mas ninguém conseguiu encontrá-la. Todos que conhecem os pais afirmam que ela é uma jovem rebelde, que saiu de casa com um marinheiro depois de desobedecer às ordens do pai, que a alertava para não se envolver com os homens que chegavam ao porto. Após esse episódio, seus pais a renunciaram por acreditarem que ela havia se tornado uma prostituta.

Uma parte da história dela e até mesmo o que pesquisei sobre seu passado se encaixa em um pedaço do quebra-cabeça. Descobri que ela desembarcou de um navio nos Estados Unidos pouco tempo após seu desaparecimento na Itália, o que coincide tanto com o período em que disse ter chegado ao país quanto com a época em que os pais informaram às autoridades sobre sua fuga com um marinheiro.

Durante o período em que esteve na América, a jovem praticamente se tornou um fantasma. Não existem registros de empregos, internações em hospitais ou matrículas em escolas com seu nome. Depois de muita investigação, descobri que ela morou com uma senhora já falecida e sobrevivia fazendo pequenos bicos até pouco antes de se mudar para a casa de Mia.

Ainda não consigo aceitar que os seguranças de Mia e Antonietta esconderam o fato de que minha filha acolheu uma estranha em sua casa. Vittoria não apenas entrou na vida de Mia, mas também na vida de todos ao seu redor. Aparentemente, essa garota com aparência inocente tem o dom de atrair pessoas para perto dela, mas isso não funciona comigo.

Ela está ocultando algo sobre seu passado, e eu preciso descobrir do que se trata. Por outro lado, realmente não consigo imaginar uma conexão dela com o atentado que tirou a vida de Mia e Antonietta.

Consigo perceber a dor em seus olhos quando fala sobre as duas mulheres. É como se houvesse uma ligação muito profunda formada durante o tempo que passaram juntas. Talvez seja isso que me incomoda nela: ela viveu momentos intensos com minha filha em um ano, muito mais do que eu consegui ao longo da minha vida inteira.

– Vai mantê-la em sua casa?

– Pelo tempo que for necessário.

– O que você realmente está procurando, Alessandro? – pergunta ele com um tom mais suave.

– Vá se danar com tantas perguntas, Mariano – eu explodo, ciente de que ele e meus outros coronéis são os únicos que, apesar de me respeitar, não têm medo de mim. – Eu não vou deixá-la ir até ter certeza de que ela não tem ligação com o atentado à Mia. De qualquer forma, você sabe que se eu a deixar ir embora, ela será capturada e morta por aquele desgraçado, pois ele não vai querer deixar nada pendente.

– Então está protegendo-a?

– Talvez eu esteja realizando o último desejo da minha filha. – Respondo com mais calma, pois se Mia pediu à garota que viesse até nós em busca de ajuda, ela deve ter sido alguém importante. Naturalmente, quero investigar a fundo para ter certeza de que não há ligação dela com a tragédia, mas, no momento, não sei como lidar com a menina.

– Compreendo. Se precisar de algo, estarei sempre por perto. É só chamar. – Ele menciona e, ao acenar em sinal de concordância, muda o foco da conversa.

Ele veio ao meu escritório para discutir uma grande operação financeira planejada para os próximos dias. Lucca fez uma entrega considerável de armas e, após a morte de Mia, acabamos acumulando alguns valores recebidos que precisamos lavar antes de movimentá-los legalmente nas nossas empresas.

Desta vez, ele pretende usar a compra de criptomoedas para disfarçar a operação. Estou certo de que ele conseguirá fazer o dinheiro retornar rapidamente às nossas mãos, mais rápido do que posso imaginar. Mariano é um expert no que faz. Assim que coloca seus óculos e passa os dedos nervosamente pelos teclados do computador, a mágica acontece instantaneamente.

Depois que finalizamos a breve reunião, eu me organizo para voltar para casa, pois preciso pensar nos próximos passos e, depois da conversa com Mariano, sei que preciso decidir o que farei com a garota.

Essa merda já se arrastou por tempo demais.

– Boa noite. Posso ter um momento da sua atenção, Senhor? – Assim que entro em casa, minha governanta se apressa para me acompanhar até a escada.

– Fale, Raquel – respondo de forma impaciente.

– É sobre a jovem que está hospedada aqui – ela inclina a cabeça, mas capta toda a minha atenção.

– Ela está causando problemas? – questiono, já irritado.

– Não, senhor – responde, movendo as mãos rapidamente à frente do rosto.

– Então o que é?

Raquel comenta: – Ela saiu do quarto pela primeira vez hoje à tarde. – Não fico surpreso com essa informação, já que meus seguranças haviam me alertado. Em seguida, ela continua: – A menina me pediu para falar com o senhor e, como não conseguiu encontrá-lo, solicitou que eu lhe transmitisse a mensagem. – Ela baixa a cabeça mais uma vez, enquanto eu reflito sobre a audácia da jovem em pedir uma reunião comigo.

– Está bem, Raquel. Vá até o quarto dela e diga que estou esperando para o jantar – respondo, subindo as escadas sem aguardar qualquer retorno dela.

Fico pensando no que poderá ser tão importante que a garota queira conversar comigo. Talvez seja bom que ela tenha decidido me procurar. Estou com tempo livre e poderei descobrir mais rapidamente o que ela esconde sobre seu passado.

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