A manhã chegou lentamente, trazendo consigo o som suave de pássaros e o cheiro fresco de terra úmida. A luz do sol invadia o quarto através das frestas da janela, iluminando os móveis simples e as roupas cuidadosamente colocadas ao lado das camas. Rhaedrin já estava acordado, sentado perto da janela com a espada descansando sobre os joelhos. Seus olhos estavam fixos no horizonte, como se estivesse esperando algo.
Lyana, ainda se espreguiçando na cama, notou a postura de Rhaedrin e não conseguiu evitar a curiosidade.
— Já está de pé há quanto tempo? — perguntou, bocejando.
— O suficiente, — respondeu ele, sem desviar os olhos.
Ela se levantou devagar, lavando o rosto com a água de uma bacia ao lado da cama. O frescor a despertou completamente, e ela pegou o violão para guardá-lo na capa. Havia algo na expressão de Rhaedrin que a deixava inquieta.
— O que você está esperando? — insistiu ela, cruzando os braços.
Ele finalmente a olhou, seus olhos cinzentos carregados de calma.
— Mensageiros.
Ela franziu a testa.
— Mensageiros?
Antes que ele pudesse responder, um som distante chamou a atenção dos dois. Era um assobio alto e ritmado, vindo de fora. Rhaedrin levantou-se, colocando a espada nas costas e indo até a porta.
— Fique aqui, — disse ele, mas Lyana, como sempre, o seguiu.
Lá fora, na praça central, uma figura se destacava. Era um homem vestido com um manto cinza escuro, o capuz cobrindo grande parte de seu rosto. Ele segurava um pequeno cilindro de metal, e ao ver Rhaedrin, fez um leve aceno com a cabeça.
— O chamado chegou, — disse o homem, sua voz firme e profissional.
Rhaedrin assentiu, pegando o cilindro. Ele abriu o objeto com cuidado, revelando um pergaminho enrolado. Seus olhos percorreram o texto rapidamente, sua expressão permanecendo neutra.
— O que é isso? — perguntou Lyana, curiosa, aproximando-se para espiar.
— Contrato, — respondeu ele, guardando o pergaminho no manto.
— Só assim? Você recebe ordens e... vai? — Ela parecia surpresa, mas ao mesmo tempo intrigada.
— Não é uma ordem. É uma escolha, — corrigiu ele. — Mas quando aceitamos, não voltamos atrás.
O mensageiro não disse nada, apenas aguardou em silêncio. Depois de alguns instantes, Rhaedrin fez um sinal com a cabeça, indicando que aceitaria o trabalho. O homem retirou-se sem mais palavras, desaparecendo pela rua estreita.
Lyana observou a cena, cruzando os braços.
— Sempre assim? Eles aparecem do nada, deixam uma mensagem e somem?
— Funciona, — respondeu ele, começando a caminhar de volta à taverna.
Quando entraram, Lyana ainda estava inquieta. Ela o seguiu até a mesa onde haviam comido na noite anterior e o encarou enquanto ele revisava o equipamento.
— E se um dia você não estiver pronto? — perguntou ela, cruzando os braços.
Rhaedrin ergueu os olhos para ela, a sobrancelha ligeiramente arqueada.
— Eu sempre estou pronto.
Ela suspirou, irritada com a resposta, e sentou-se à sua frente.
— Mas e eu? Não estou pronta. Não estou pronta para nada disso.
— Você não precisa estar, — disse ele, voltando sua atenção à espada.
— Preciso sim, — insistiu ela, batendo a mão na mesa. Ele finalmente a olhou, surpreso com a determinação em seus olhos.
— Não quero ser um peso para você, Rhaedrin. Não quero que toda vez que algo acontecer, você tenha que me salvar.
O silêncio pairou entre eles por um momento. Ele finalmente suspirou, colocando a espada de lado.
— O que você quer, então?
Ela hesitou por um instante antes de responder, mas a convicção estava clara em sua voz.
— Quero aprender a lutar.
Ele a observou com cuidado, como se tentasse medir a seriedade de suas palavras. Depois de um momento, assentiu levemente.
— Isso não será fácil.
— Nada tem sido fácil desde que te conheci, — respondeu ela, com um leve sorriso.
Horas depois, enquanto caminhavam para o próximo destino, Lyana ainda sentia o peso da conversa. Ela sabia que havia dado um passo grande, mas a ideia de se tornar útil, de não depender apenas de Rhaedrin, era algo que começava a crescer dentro dela.
O contrato os levaria a uma vila nas montanhas, onde estranhos desaparecimentos estavam assustando os moradores. Enquanto Rhaedrin explicava os detalhes, Lyana observava a forma como ele caminhava — confiante, sempre atento, como se estivesse pronto para agir a qualquer momento.
Ela não sabia exatamente como, mas estava determinada a acompanhá-lo, não como uma carga, mas como alguém que pudesse enfrentar o perigo ao lado dele.
Rhaedrin e Lyana seguiram a trilha montanhosa enquanto o sol já se punha no horizonte, tingindo o céu com tons de laranja e dourado. O caminho era sinuoso e coberto de pedras soltas, mas Rhaedrin mantinha o passo firme, como se cada movimento fosse guiado por uma determinação inabalável. Lyana o seguia de perto, o cansaço evidente em seus passos, mas sua expressão era determinada.
A missão os levaria a um vilarejo no alto das montanhas, onde estranhos desaparecimentos vinham ocorrendo. O mensageiro dos Highlanders havia deixado poucos detalhes, mas o suficiente para que Rhaedrin entendesse que algo estava errado.
— O que exatamente vamos enfrentar? — perguntou Lyana, quebrando o silêncio que durava desde a saída do último vilarejo.
— Não sei ao certo, — respondeu ele, sem desviar os olhos do caminho. — Mas se chamou a atenção da organização, não é algo simples.
Ela engoliu em seco, ajustando o violão nas costas.
— E você acha que eu vou... atrapalhar?
Ele parou abruptamente, virando-se para encará-la. Seus olhos cinzentos estavam mais suaves do que o habitual.
— Não. Mas você ainda não está pronta para lutar. Fique atrás de mim.
Lyana assentiu, sentindo uma mistura de alívio e frustração. Ela sabia que ele estava certo, mas odiava a ideia de ser apenas uma espectadora.
Quando chegaram ao vilarejo, a escuridão já havia tomado conta. As casas eram pequenas e simples, com telhados inclinados e chaminés que soltavam fumaça fina. Não havia luzes nas janelas, e a praça central estava deserta. O silêncio era tão profundo que até mesmo o som dos passos parecia invasivo.
Rhaedrin parou na entrada do vilarejo, observando cada detalhe com cuidado.
— Algo não está certo aqui, — murmurou ele, a mão indo automaticamente para o cabo da espada.
Lyana ficou atrás dele, os olhos varrendo o ambiente. Havia algo opressor naquele lugar, como se o próprio ar estivesse pesado.
De repente, um som baixo veio de uma das casas próximas. Um sussurro, ou talvez um murmúrio. Rhaedrin seguiu em direção ao som, seus passos leves apesar do tamanho. Ele parou em frente à porta, que estava entreaberta, e fez um sinal para Lyana ficar onde estava.
Ele empurrou a porta devagar, a madeira rangendo em protesto. O interior da casa estava escuro, mas o cheiro era inconfundível: sangue.
Lyana se aproximou, incapaz de ignorar sua curiosidade.
— O que você viu? — sussurrou.
— Fique aqui, — ordenou ele, entrando sozinho.
O interior estava vazio, mas os sinais de luta eram claros. Uma mesa estava virada, cadeiras quebradas espalhadas pelo chão, e manchas escuras cobriam as paredes de madeira. No centro da sala, havia marcas de arranhões profundos, como se algo tivesse sido arrastado.
Quando Rhaedrin voltou, seu rosto estava sério.
— Vamos continuar. Isso é pior do que eu pensava.
Enquanto investigavam o vilarejo, eles começaram a notar um padrão. As casas próximas à floresta mostravam sinais de invasão, mas nenhuma delas tinha sobreviventes. Apenas a última casa, localizada no limite do vilarejo, parecia intacta.
— Quem quer que esteja fazendo isso, está se escondendo, — disse Rhaedrin, olhando para a floresta sombria que cercava o vilarejo.
Antes que pudessem tomar qualquer decisão, o som de passos rápidos e pesados ecoou ao longe. Algo estava vindo, e estava se aproximando rapidamente.
— Fique atrás de mim, — disse ele, sacando a espada.
A criatura que emergiu da floresta era grotesca, uma mistura de humano e besta. Seu corpo estava coberto de pelos, mas os olhos brilhavam com uma inteligência cruel. Ela soltou um grito que ecoou pela noite antes de avançar contra eles.
Rhaedrin não hesitou. Ele bloqueou o primeiro ataque com um movimento preciso, a lâmina negra de sua espada emitindo um som metálico ao encontrar as garras da criatura. Cada golpe era calculado, e ele movia-se com a graça de alguém que havia lutado contra coisas assim muitas vezes antes.
Lyana observava de perto, o coração batendo acelerado. Ela viu como Rhaedrin desviava, atacava e bloqueava com uma precisão quase sobre-humana. Mesmo assim, a criatura era feroz, e cada golpe parecia mais violento do que o anterior.
Finalmente, com um movimento rápido, Rhaedrin desferiu o golpe final. A criatura caiu ao chão, seu corpo começando a se desintegrar em uma fumaça escura.
Ele respirou fundo, limpando a espada antes de guardá-la.
— Missão cumprida, — disse ele, olhando para Lyana.
Ela assentiu, mas seu olhar estava fixo na espada dele.
— Um dia, quero lutar assim. Quero ser capaz de ajudar de verdade.
Ele a observou por um momento antes de responder.
— Você terá sua chance. Mas primeiro, precisa aprender a sobreviver.
De volta ao vilarejo, enquanto arrumavam seus equipamentos para partir, um novo mensageiro apareceu. Ele entregou um pergaminho a Rhaedrin, mas desta vez o conteúdo era diferente.
— Reconhecimento por serviços prestados, — leu Lyana por cima do ombro dele. — Férias?
Rhaedrin balançou a cabeça levemente, surpreso.
— Um mês. Parece que me deram tempo para respirar.
Lyana sorriu.
— Tempo para me ensinar, talvez?
Ele a olhou, um leve sorriso surgindo no canto dos lábios.
— Veremos. Primeiro, precisamos encontrar um lugar seguro. Depois, começamos.
Enquanto saíam do vilarejo, Lyana sentia algo diferente. Pela primeira vez, não era apenas uma seguidora. Estava se tornando parte de algo maior.
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Atualizado até capítulo 20
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