Uma Família para o Advogado Arrogante
JÚLIO...
"Você nunca será pai!"
Acordo suando frio, e essa frase não sai dos meus pensamentos. É um pesadelo que sempre retorna quando penso que superei o fato de não conseguir ser pai. Talvez eu tenha sido egoísta, talvez eu tenha esse desejo pelo fato de não ter tido uma boa relação com meu pai, mas era algo que eu desejava com todas as minhas forças.
Desde que eu era bem pequeno, lembro do meu pai chegando bêbado. Ele batia em mim e na minha mãe, depois pedia desculpas e voltava a agir como se nada houvesse acontecido. Minha mãe, iludida, sempre acreditava em suas promessas e o perdoava. Eu, ao contrário, estava sempre pedindo para ela me levar embora daquela casa. Por mais difícil que fosse, qualquer lugar seria melhor que ali.
Porém, ela nunca atendeu aos meus pedidos, por mais que eu implorasse. Mas até que posso dizer que ele fez algo de bom por mim, por mais que eu não gostasse de seus métodos. Estudei incansavelmente para ter uma vida diferente e ir embora sozinho, já que eu não podia contar com minha mãe.
O que aconteceu até mais cedo do que eu imaginava. Eu já havia passado no curso de direito e tinha começado a procurar empregos de meio período para poder alugar um apartamento pequeno ou até mesmo um quarto e ter o básico para sobreviver até terminar meu curso.
Por sorte, ter passado em primeiro lugar me garantiu alguns benefícios, como usar o dormitório no campus da faculdade e refeições de graça no refeitório. Então, eu só precisaria de dinheiro para comprar roupas, entre outros itens, para ter uma vida minimamente confortável.
No entanto, um mês antes de começar as aulas, meu pai chegou novamente embriagado e tentou me bater. Entretanto, já com 18 anos, eu não iria deixar ele encostar um dedo sequer em mim. Tentei não ser agressivo e apenas contê-lo, mas ele não me deixou escolha, e acabei revidando. No final, talvez eu tenha pegado um pouco pesado demais. Não me orgulho disso, principalmente por não querer ser igual a ele. Todavia, não me senti nem um pouco culpado por tê-lo feito parar no hospital.
— Mãe, por favor, vamos embora. Eu vou terminar meus estudos e te dar uma vida melhor — pedi, depois que a ambulância levou meu pai, mantendo uma pequena fagulha de esperança, desejando que ela aceitasse vir comigo.
— Do que você está falando, meu filho? Você precisa pedir perdão para o seu pai. Olha o pecado que você cometeu! Jamais um filho deve levantar a mão para um pai — disse ela chorando, e me sinto fraco diante daquela situação.
— Eu jamais vou pedir perdão a ele, não tenho motivos para isso — disse com um misto de raiva e decepção.
— Então pegue suas coisas e vá embora. Eu te amo muito, mas preciso cuidar de seu pai — disse ela com a voz firme. — Espero que Deus te perdoe e que você possa ver o erro que está cometendo.
— Já que você quer assim, mamãe, já que você escolheu continuar nessa vida de merda ao lado do meu pai, esqueça que sou seu filho, e eu vou esquecer tudo que vivi nessa casa — disse, subindo para o meu quarto para arrumar minhas malas.
Eu sei que falei algo que um filho não deveria dizer para uma mãe, mas eu estava com o coração partido. Por mais que ela aceitasse o que meu pai fazia, eu jamais imaginei que ela fosse dizer isso para mim. Ela diz que me ama, mas suas ações não demonstram isso.
— Que Deus te abençoe, meu filho. Eu vou falar com seu pai e convencê-lo a não dar queixa, ok? — disse ela quando voltei com a minha mala.
Ela continua me colocando como culpado. Ela não viu que eu também fiquei machucado na briga? Ela não viu o quanto sofri durante todos esses anos? E se viu, será que se importa o suficiente com as cicatrizes que carrego? Eu tentava encontrar respostas para essas perguntas, mas não conseguia. Por fim, segurei para que nenhuma lágrima caísse, dei um beijo em sua testa e fui embora. Se ela quer isso para a vida dela, não serei eu a impedir.
Saio andando sem rumo. Graças ao meu pai, eu acreditava não ter ninguém para me apoiar. Ele me mantinha trancado no quarto por dias, forçando-me a estudar, e nunca permitia que eu interagisse com outras crianças. Na escola, era ainda pior.
Como ele era o zelador da escola, estava sempre me vigiando, certificando-se de que eu estivesse estudando e impedindo qualquer interação com os outros alunos, exceto quando se tratava de estudos. As únicas crianças com quem tive algum contato foram Amanda e seus irmãos, e isso aconteceu apenas uma vez.
Entretanto, após aquela breve diversão, apanhei tanto que as marcas levaram semanas para desaparecer. Quando Amanda passava em frente à minha casa, eu a via pela janela, e ela acenava com um sorriso. Nesses breves instantes, parecia que ela era o próprio sol brilhando só para mim.
Sento em um banco da praça e coloco minha pequena mala no chão. Não tinha muitas coisas, e ainda eram velhas. Fico um tempo lá, olhando para o nada, como se esperasse por um milagre. E esse milagre chegou com meu pequeno sol radiante.
— O que aconteceu com seu rosto, Júlio? — perguntou Amanda, tocando meu rosto.
Ao sentir suas mãos, sinto um misto de dor pelos ferimentos e conforto pela sua presença. Sem saber o que dizer, apenas a abraço forte e acabo chorando. Ela simplesmente retribui o abraço e me permite ficar ali, e foi como se o mundo inteiro desaparecesse, restando apenas nós dois.
Depois de um tempo, explico o que aconteceu, e, sem me dar tempo de reagir, ela pega minha mala, dizendo que eu ficaria na casa dos pais dela. Pergunto se eles não se importariam, mas ela garante que brigariam com ela se não me oferecesse ajuda. Mesmo que, na prática, ela estivesse me obrigando a segui-la ao carregar minha mala, uma fagulha acendeu no meu coração, e eu senti que não estava mais sozinho.
Aquele mês foi, talvez, um dos mais importantes para me impedir de me tornar alguém que eu não queria ser. Pela primeira vez, entendi como uma família de verdade funcionava. Eu estava amando cada momento, pois, finalmente, sentia que estava em casa e já não precisava temer a chegada do meu pai.
Júlio
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Atualizado até capítulo 41
Comments
Solaní Rosa
no outro livro critiquei o Júlio mas agora tô com pena dele
2024-11-21
1
Fatima Gonçalves
é muito triste não ter amor próprio e nem ao filho
2024-10-25
1
Vanildo Campos
que triste 😢 😢 😢 😢 😢
2024-10-19
1