Discussão Com Amanda

Terminei meu café e permaneci sentada na cama assim como Raquel tinha me deixado, como não conseguia mover parte do meu corpo apenas retirei a bandeja de sobre minhas pernas e a coloquei sobre a cama ao meu lado. Minutos depois uma moça aparentando ter a mesma idade que eu, entrou no quarto sem ao menos bater na porta, abriu a porta de supetão e foi entrando carregando nos braços uma caixa, ela vestia uma camisa branca e uma calça jeans azul, a caixa de papelão alaranjada em seus braços parecia estar pesada.

— Olá!- Dispara a moça sem me olhar enquanto coloca a caixa sobre o criado mudo ao lado da cama.

— Me chamo Katia, mas pode me chamar Keti. Trouxe os livros que pediu.- Anunciou, logo em seguida começando a retirar os livros de dentro da caixa.

— Seus pais pediram que lhe entregasse isso também.- Disse Keti retirando um embrulho de presente do interior da caixa.

— Se é o que penso ser, estava esperando por isso.- Falo abrindo um sorriso quando Kátia colocou o embrulho colorido em minhas mãos.

— Seu pai disse que iria gostar, imagino que seja algo que goste.

No momento seguinte já havia desembrulhado o que havia no pacote e me deparei com uma caixa que em seu interior continha um celular novinho em folha.

Não era dos melhores, mas era superior ao meu, que assim como minha caminhonete foi avariado durante o acidente, no interior da caixa também encontrei um carregador e um fone de ouvido, aproveitei a presença de Kátia e pedi para que colocasse o aparelho carregar na tomada mais próxima.

— Poderia fazer a gentileza de colocá-lo carregar?- Pergunto entregando o aparelho e o carregador a Kátia.

— Claro querida.- Concorda Keti.

— A propósito.- Kátia aponta para a bandeja ao meu lado.— Posso levar a bandeja?

— Por gentileza. Se não for incômodo.

— Incômodo algum, na verdade, esse é o trabalho de Raquel, mas deve estar escutando alguma história de anos atrás na ala dos idosos

Sorri para Kátia enquanto eu entregava a bandeja em suas mãos.

— Pelo menos, os idosos têm alguém com quem conversar.- Digo fazendo um gesto com a cabeça em retribuição.

— Fique tranquila. Evandro me encarregou de lhe fazer companhia, pelo menos na parte da tarde quando não há muitos pacientes, então espero que você não enjoe de mim.

— Com toda certeza não irei.-Falo alegremente.

— Voltarei daqui a algum tempo, espero que tenha lido pelo menos metade dos livros.

Fala Kátia antes de passar pela porta e a fechar em suas costas.

Olhei para a pilha de livros e me esforcei para puxá-los para perto de mim, onde meu braço podia alcançar.

O primeiro livro, era grosso, chutei ter umas 500 páginas, tinha o título de "Condutas em neurologia", décima terceira edição, do doutor Agostinho Frigeri.

Meu chute passou perto, errei por 100. Este contava com um total de 600 páginas, contava com uma capa laminada que minha mãe adoraria usar em um de seus livros.

O próximo era mais grosso ainda, parecia uma wikipedia e tinha vários autores. Um título que me chamou muito a atenção, nomeado de "Neuro-hipnose: O Poder Oculto do Cérebro", confesso que por este me interessei e o deixei separado.

Levei a mão para o terceiro livro sem olhar. O terceiro livro o qual me fez retroceder na escolha de qual iria ler primeiro, este voltado a área da "Neurológica Pediátrica" de Simone P. Cavalcante.

Sobre a mesa, havia um último livro, me deparei com um livro fino que não continha mais de 20 páginas, este intitulado como: "Diagnósticos e Tratamentos da neurologia" de Ivan Valfredo. Deveria ser um livro bem básico pelo fato de o autor ser professor da Universidade Federal do Paraná e o livro não ter nem mesmo editora registrada, muito menos ISBN.

Lembrei de minha mãe que sempre dizia que um livro sem editora e sem ISBN é qualquer coisa, menos um livro. E de fato não era. Folgando as páginas, logo descobri que se tratava de uma cartilha, na verdade era mesmo um livro mas, um livro básico que chamamos de almanaque ou mesmo de cartilha. Serve para ensinar ou pode ser dado como uma revista.

O doutor Evandro tinha muitos mais livros de onde vieram estes, apenas me emprestou os que achou que iria ter mais interesse para mim.

Olhei para o relógio, eram dez minutos para às nove da manhã, achei estranho que nenhum dos meus pais deram as caras. Muito menos Amanda que Raquel disse que iria ser minha nova acompanhante.

Voltei minha concentração para o livro que escolhi e quando comecei a ler as primeiras palavras, eis que ouvi uma voz familiar vindo do corredor.

— Vai ser demitida se não voltar a trabalhar.

Desvio o olhar para confirmar se a voz que ouvi era mesmo de quem pensava.

Amanda se encontrava escorada no portal da porta.

— Amanda! Que bom te ver!- Falo abrindo os braços para um abraço.

— Quem será demitida será você se você ficar aqui.- falei.

— Não se preocupe. Troquei de lugar com sua mãe.- Fala Amanha estendendo os braços para outro abraço que não recusei.

— Nossa, isso aqui está uma chatice, não vejo a hora de voltar para casa, para a faculdade. E por falar nisso como está o pessoal do trabalho?- pergunto.

— Bom! Em questão de saúde todos bem, já em questão de preocupação está todo mundo aflito, o pessoal do trabalho vai gostar de saber que está acordada. E já o pessoal da faculdade não vai gostar de saber que esta pretendendo trocar de função.- Observa Amanda reparando nos livros.— Vai me dizer que mudou de ideia!- Termina Amanda mostrando a capa de um dos livros.

— Não pretendo trocar a faculdade de engenharia por medicina.- rebati.

— Neuro-hipnose… É sério!

— É que não tem nada para fazer.- Digo encolhendo os ombros.

— Tenho duas boas notícias para você.- Fala Amanda soltando o livro de lado.— Suponho que uma delas, se pudesse, daria pulos de felicidade.

— Ora, então me conte daqui a alguns meses, quando estiver com os ossos consertados.- Digo em tom sarcástico.

— Mesmo assim, vou contar.- Dispara Ana.—Conversei com seu médico hoje de manhã, ele afirmou que sua liberação será em dois dias.

— Nossa. Minha recuperação está sendo assim tão rápida. Ou para isso acontecer você deve ter subordinado o coitado do doutor.

— Eu bem que queria, mas não com dinheiro

Amanda respira fundo e revira os olhos.

— Nossa, não sabia que sentia atração por homens mais velhos.- Falo olhando para Amanda com os olhos cerrado.

— Caras mais velhos!- Rebate Amanda.

— Sim, não foi com o Dr. Evandro que você trocou ideia?

— Não… Foi com um tal de Marcos. Cabelos pretos olhos castanhos bíceps bem definidos um metro e oitenta, um pedaço de mal caminho.

Amanda descreve o médico se derretendo como um picolé de baixo de um calor de quarenta graus.

— Ainda bem! Pensei que estava apaixonada por Evandro, ele deve ter nossas idades juntas. E lamento informar que esse Dr. Marcos não é meu médico. Nunca esteve em meu quarto.

— Está maluca Jeisa, não estou apaixonada, só achei Marcos bonitinho. Achar bonito e se apaixonar tem muita diferença. Também achei que estava me dando informações sobre outra paciente. Mostrei uma foto sua e ele afirmou que estava falando sobre você.

— Então Marcos deve ser chefe geral do hospital. E sei que se apaixonar é achar bonito não é a mesma coisa mas, do jeito que falou dele tem todo indício que foi paixão à primeira vista, pelo menos de sua parte.

Digo mostrando os dentes em um sorriso largo.

— Nesse quesito você está certa. E por meu azar, ele já é comprometido.

Fala Amanda fingindo enxugar uma lágrima.

— Como sabe?- Pergunta segurando uma risada.

— Ele usa uma aliança de prata no dedo da mão direita.

— Pelo menos não é casado. E qual é a outra notícia?

— Calma aí filha. Não cheguei nem na primeira. Quer dizer, a primeira é que você vai sair daqui em dois dias.

— Então a segunda…

— Bom, essa por um lado não é tão boa assim, Marcos disse que você terá que usar uma cadeira de rodas por alguns meses.

— Óbvio né Amanda, se não percebeu ainda, estou com as duas pernas imobilizadas e um quadril deslocado.

— Não brinca! Nem perceberia se não falasse. Mas vamos ao que interessa. Como moro sozinha e meu apartamento tem elevador e rampa para cadeirante, me ofereci para cuidar de você, mas já vou avisando, não vou trocar suas fraldas, você já é bem crescidinha.- Fala Amanda em tom sarcástico, lançando seu dedo Indicador sobre mim.

— Falando desse jeito, até parece minha mãe.

— Literalmente vou ser.- Rebate Amanda imediatamente.

— É melhor não, vai deixar o trabalho e a faculdade para cuidar de mim. Eu me viro como puder lá em casa, e além do mais, são apenas alguns meses, vai passar como um relâmpago. Isso me lembra a vez em que Eduardo caiu de bicicleta e quebrou o braço. Coitado ficou com o braço engessado por quase quatro meses.

— Nada disso mocinha, sou sua amiga, e é para isso que os amigos servem, e para não deixar você sozinha, cuidarei de você durante durante a noite iremos para a faculdade.

— Não diga que pediu demissão por minha causa.- Questiono com ar zangado.

— Não. Claro que não. Na verdade esse seria meu plano "B".- Comenta Amanda olhando levemente para o lado e mordendo os lábios.— Sabe que Flávio gosta de você. Por isso me deu folga pra cuidar de você.- Comenta Amanda.

— Só como amigo.- Retruquei friamente.

— Quem você pensa que deu a ideia de você ir para meu apartamento?

— Pera! Flávio lhe deu férias até eu estar recuperada?

— Sim. E a propósito. O hospital irá te disponibilizar uma cadeira na via…

— Eu acredito que vai. Não diga que Flávio se ofereceu para providenciar uma?

— Sim. Mas então falo que não irá precisar.

— Você sabe que não gosto dele, não do jeito que ele quer.- Falo cruzando os braços e fazendo uma cara de brava.

— Jeisa… Quem falou! Ele não gosta do jeito que você está pensando. É apenas uma amizade de trabalho, ele está tentando ajudar de alguma forma, pelo menos retribua.

— Retribuir com o que? Retribuir com um amor que não existe. Não! melhor não.

— Não existe amor entre vocês Jeisa, apenas amizade.

— Você sabe de quem eu gosto Amanda, e sabe que tenho esperanças de encontrá-lo.

— Qual é Jeisa. Acabou de falar dele. Sei de tudo o que vocês dois passaram e dos sentimentos que mantém por ele. As vezes acho que você está apegada a seu passado, desse jeito você não poderá viver.

— Não estou apegada ao passado, e sim a uma pessoa e estou vivendo, do meu jeito, estou vivendo. Que tem de mais nisso? É crime amar?

— Não foi isso que quis dizer!

— Também não quis falar dessa maneira.- falo em tom mais calmo.— Apenas quero que você entenda Amanda. Não quero me jogar nos braços de nosso chefe pelo fato dele estar tentando me ajudar.

— Claro que não. Eu também não quero. Sei o que você sente por Eduardo. Seria insensatez minha de concordar com isso, mas sei que você precisa ter sua vida. Fábio quer muito bem você.

— Sei disso, até julgo que Fabio me contratou não pelo fato de minha competência.

— Amiga, Flávio pediu para não lhe contar.- Dispara Amanda rapidamente com semblante sério.— Mas ele está pagando metade dos custos que você terá com sua recuperação.

Ana certamente não queria revelar essa informação. Porque assim que falou cobrou a boca com uma das mãos e depois apertou os lábios com as pontas dos dedos.

— Com certeza esse valor será descontado do meu salário.- Falei calmante.

— Não ficou brava? Não vai dar piti e surtar?

— Porque? Quando voltar a trabalhar a primeira coisa será passar no escritório para assinar um caminhão de empréstimos.

— Aí é que você se engana. Diferente de um sujeito que ouço todo tempo você falar que o ama e pelo visto não se importa e que pelo fato do tempo ter passado nem lembra mais de você...

— Se está falando de Eduardo, você sabe que perdi contato com ele.- Interrompo Ana com rispidez

— Você, perdeu... Sei de alguém que mantém contato constante com…

— Quem é essa pessoa? Alguém que eu conheça?

— Isso não interessa. Agora se não se importa...- Fala Amanda com voz trêmula tentando mudar de assunto.

— Cala a boca…! Sabe que tenho tentado encontrá-lo Desde que começamos a faculdade.- Interrompi Amanda outra vez com mais franqueza.

— Pelo que sei, seu amado viajou para o oriente médio a três meses atrás.

— Isso não tem nada a ver.

— Jeisa, você ainda não percebeu, Eduardo já esqueceu de você, deve estar em outra.

— E daí se estiver. Bom para ele.

— E isso é bom para você?

— Não! Mas se ele estiver bem eu estou bem.

Amanda suspira fundo e volta a falar em um tom de voz mais calmo.

— Jeisa, enquanto ele está curtindo a vida, se deitando com mulheres que falam outro idioma você está aí. Pensando em estudar e trabalhar e um dia encontrá-lo.

O tom de voz de Amanda podia ter mudado, mas o meu continuava áspero e agressivo.

— Minha vida. Meus planos.- Falo tentando retomar a calma.— Você não a pode mudar Amanda. Apenas uma pessoa sabe do meu destino, e essa pessoa é Deus, enquanto ele me manter viva, continuarei tentando encontrá-lo, nem que seja a última coisa que eu faça.- Falei fechando levemente os olhos.- Amanda, preciso descansar, por favor.- Finalizo apontando para a saída.

Amanda balança a cabeça em aprovação e sai do quarto deixando a porta entreaberta.

Depois de choramingar, fechei os olhos e mesmo sentada, mergulhei em minhas lembranças do passado.

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