Capítulo 18

Calvin acordou e ficou um pouco mais na cama; parecia que quanto mais pensava, mais indeciso ficava. Ele decidiu se levantar, tomou banho e foi para a cozinha, passando por Hector, que ainda estava esparramado no sofá, mas estava apenas de cueca.

— Isso que dá dizer, sinta-se em casa; eles abusam.

A reclamação não foi ouvida pelo outro, que dormia tranquilamente e só começou a despertar quando ouviu os barulhos na cozinha, de pratos sendo colocados no balcão. Hector despertou e olhou para a cozinha, vendo Calvin se mover por ela, ainda sem camisa e com uma calça de moletom.

— Precisa fazer tanto barulho? — perguntou, pegando seu celular em seguida.

— Você deu sorte que não te joguei para fora do meu sofá. Ainda está reclamando do barulho? — Calvin respondeu, apoiando-se no balcão.

— O que temos para o café? — Hector perguntou e começou a vestir sua calça.

— Tá achando minha casa com cara de hotel, negão? Quer ser bem tratado, pague pela diária — respondeu e deu um leve sorriso.

— Não cobramos esse tipo de coisa dos nossos melhores amigos, onde está sua consideração? — Ele falou se aproximando do balcão.

Calvin colocou o prato que já havia preparado para ele no balcão, vendo o sorriso do amigo surgir.

— Sabia que não ia se esquecer de mim. — Sorriu e pegou seu prato, indo em direção ao sofá.

— Pode voltar aqui, o lugar de comer é aqui e não no meu sofá.

Hector teve que voltar e se sentar na banqueta que ficava no balcão. Calvin era bem organizado com suas coisas e não gostava que comessem no sofá, correndo o risco de derramar alguma coisa nele. Os dois começaram a comer, mas Hector não conseguia ficar quieto.

— O que vai fazer na sua folga estendida? — perguntou, vendo Calvin ficar pensativo.

Após alguns segundos, ainda ponderando o que faria, ele respondeu.

— Fazer meus exercícios como sempre, tentar relaxar e pensar no que vou fazer e qual a decisão vou tomar sobre essa situação. Talvez eu vá correr um pouco no parque — respondeu, continuando a comer.

— De que decisão está falando? — perguntou com uma expressão mais séria.

— Não sei como vai ser de agora em diante no quartel. Você ouviu as piadas, sem falar que todos podem se sentir desconfortáveis comigo durante o banho. Hector, esse era um dos motivos que evitei falar sobre minha sexualidade, o fato de deixar as pessoas desconfortáveis e, ao mesmo tempo, me deixar constrangido.

— Está com medo de que comecem a ter discriminação ou que façam piadas com você?

— Hector, me conheço e sinceramente, não sei como vou reagir quando começarem com as piadas. Sou uma pessoa calma apesar de tudo, mas quando se trata de homofobia e discriminação, isso me tira do sério.

— Então o que está passando por essa sua cabeça? — Hector queria saber mais.

— Isso vai depender de como as coisas vão seguir de agora em diante. Não vou mentir, Hector, prefiro sair do que ser expulso do quartel. Não vou manchar o nome do meu pai.

— Sair? Mas estar naquele quartel não era o seu sonho? — perguntou, parando de comer.

— O que acha que vai acontecer se eu perder a cabeça e bater em alguém lá dentro? O Frank não prestou queixa, mas não significa que outro faça o mesmo, além de que será uma reincidência. Não posso correr esse risco.

— Está pensando nisso por causa do preconceito ou por causa do Frank? — Tinha suas desconfianças.

— Não vou negar que ficar vendo ele todo dia não vai ajudar em nada. Olha, vai ser uma mistura dos sentimentos que eu estava começando a ter por ele, com a raiva que também sinto, tanto dele quanto de mim, por acreditar nele.

— Aquele quartel não vai ser o mesmo se você sair de lá. Tem pessoas ali de olho no seu posto. Se você desistir, apenas vai deixar o caminho livre para eles. Por outro lado, eu também entendo o que você quer dizer, não sei como se sente quando vê o Frank e nem quando ouve as piadas. Posso ficar do seu lado, mas apenas você pode saber a dor que isso causa — falou, demonstrando seu apoio.

— Exatamente, e se eu sair de outra forma de lá, vai doer mais ainda. Se eu tiver que sair, será de cabeça erguida, sabendo que não fiz nada de errado e nem desonrei a memória do meu pai.

— Seja qual for sua decisão, vou te apoiar. Se sair, posso ir te ver no quartel em que estiver ou posso pedir transferência. — Hector mostrou seu apoio e sorriu em seguida.

O assunto se encerrou ali, e eles falaram sobre outros temas até terminarem de comer. Calvin se vestiu, e foram para o estacionamento onde as motos estavam. Dali, Hector foi para o quartel, pois queria malhar antes de começar seu turno, e Calvin foi para uma academia que costumava frequentar.

Assim que chegou, Hector cumprimentou a todos e foi para a área dos aparelhos, começando seus exercícios. Pouco tempo depois, Frank apareceu, e Hector percebeu que ele queria falar com ele. Tirou os fones de ouvido e esperou que ele falasse.

— Como está o Calvin? — perguntou um pouco sem jeito.

— Bom dia, Frank, como vai? — respondeu de forma irônica — O Calvin está bem, por que a pergunta?

— Ele ainda está com raiva de mim?

Hector esboçou um sorriso de incredulidade.

— Você está mesmo me perguntando isso? Cara, você brincou com os sentimentos dele, queria que ele esquecesse disso da noite para o dia? Por que não para de rodeio e pergunta logo o que você quer saber? — Hector foi direto, imaginando o que ele estava querendo perguntar.

— A pessoa que estava com o Calvin, é mesmo alguém que ele está saindo? Os dois estão tendo alguma coisa, ou se conhecem há muito tempo?

Hector estava incrédulo com o que estava ouvindo. Ele não imaginava que Frank fosse ser tão cara de pau, ao ponto de questionar com quem seu amigo estava saindo, sendo que ele estava noivo, e foi ele quem pisou na bola. Pensar naquilo fez Hector querer continuar com a história que contou na boate, e era exatamente o que iria fazer.

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