Capítulo 9

Ponto de vista de Ítalo

Estamos na beira do lago pescando e eu tenho que admitir que embora eu não tenha muita paciência, até que estou gostando disso aqui.

Pra ser bem honesto eu não viria nessa viagem, mas a minha madrinha acha que meu casamento com Ambra é algo real. A verdade é que Andrea se realizou muito quando Pietra e eu chegamos na casa dos Guarnieri. Ela projetou, e projeta ainda, todos os sonhos de maternidade que não foi possível ter com meu padrinho. Ele é o estéril da relação.

A minha dívida de gratidão com esses dois é imensa, principalmemte com ela que abdicou de noites e noites de sono com minha irmã que era apenas um bebê quando ela nos adotou. Então sim, eu vou fazer o possível e o impossível pra ver essa mulher feliz. E se a felicidade dela consiste em achar que agora eu faço parte desse clube seleto dos casados por amor, que fazem coisas de casal com amigos casais, eu vou embarcar no Teatro e vou.

- Obrigado por ter vindo com Ambra.

Olho pra meu padrinho.

- Não precisa agradecer. Estava mesmo precisando de uns dias de descanso.

Ele faz um instante de silêncio, mas depois diz:

- Eu sei que você nos tem como pais, então me permita te dar um conselho como um, não como seu Consiglieri.

Digo a ele que estou ouvindo.

- Cuidado pra não endurecer seu coração a ponto de não enxergar mais nada a não ser o objetivo pelo qual se casou com Ambra. As pessoas por aí afora nos pintam como bandidos da pior espécie... bom, tá certo que a gente faz coisas que um cidadão cem por cento honesto não faz, mas nós somos honrados também e você tem bem essa essência ainda. Não deixe o dinheiro e o poder tirarem de você o seu caráter, Lio.

Olho pro espelho d'água e respiro fundo.

- Eu penso nisso todos os dias, padrinho. Quando o senhor me iniciou nesse negócio eu sabia que tinha preceitos pra seguir. Não vou abrir mão deles, de maneira nenhuma.

Lupo toca no meu braço e me obriga a olhar pra ele.

- Então seja justo. Eu não tenho direito de te pedir pra parar, jamais faria isso, mas eu só te peço: seja justo...

Eu sei bem o que ele quer me dizer.

- Já te disse que eu tenho total consciência com ela, padrinho. E eu tenho que admitir que já observei que Ambra tem caráter. Eu vou cuidar dela dentro dos meus limites. Ela não vai ficar desamparada quando eu acabar, eu prometo.

***********

Depois de tomar um banho de gelar os ossos, nós voltamos pra casa.

- Essa é a melhor parte. Ganhar um beijo e carinho das nossas mulheres.

Quem fala isso é Giacomo, ele não é muito mais velho que eu. Tem um casal de gêmeos de seis anos. Se casou cedo e pelo visto é fascinado pela mulher.

Mas essa fala dele me preocupa um pouco.

Qual será a atitude de Ambra?

Ela é imprevisivel.

Nós passamos pela janela da cozinha pra pegar as alianças delas e eu fico por último na fila de entrar em casa. Quero dar a minha esposa rebelde a chance de se preparar para o que tem que fazer.

Vejo Ambra abrindo um sorriso pra me receber. Ela tira meu casaco e pendura junto com os outros, ela vai ficando sem jeito e sei que não vai fazer tudo. É quando eu me adianto depois da minha madrinha questionar sobre o beijo: Dou um selinho em Ambra que não tem tempo de reação.

É algo bem rápido. Logo em seguida eu enfio o anel no dedo dela e nós dois trocamos meia dúzia de desaforos de maneira sussurrada.

Tá... confesso que não sei porquê citei o infeliz do cara do bombom. Eu sou meio territorialista, vamos assim dizer, fiquei um pouco incomodado de saber que tem gente que ronda um espaço que tecnicamente é meu. Prezo muito pela minha dignidade, e ela seria reduzida a zero dependendo do atrevimento daquele infeliz com Ambra.

Mas a pergunta dela me deixou irritado.

Ciúmes dela já é demais.

*********

Mais um dia dividindo a cama com Ambra. Ela deixou de ser cabeça dura e parou de dormir no chão, então estamos ainda na muralha de travesseiros.

Estou conferindo algumas coisas no meu email pelo celular quando ela sai do banheiro. Ambra tem um cheiro de jasmim, não sei quais os cosméticos que ela usa e nem me importo em saber, mas são bem bons ao que parece.

Quando as coisas dela chegaram na minha casa eu olhei pra tudo e pensei: Como uma garota fútil que nem ela deve ser se veste feito uma trombadinha desse jeito? Aí fiquei sabendo quem ela era e liguei os pontos de que seria uma adolescente largada. Nem em um milhão de anos pensei que se adaptaria aos meus termos e condições tão facilmente. Todos os elogios que ganhou foram genuínos. Ela parece uma modelo fotográfica quando se arruma pra sair e graças a Deus tem boa educação pra se portar por aí.

Mas sabe, isso é um ponto a se refletir.

Que tipo de criação e convivência ela teve com Bruno pra extravasar as coisas no temperamento e estilo?

Eu vi ele repreendendo ela no casamento e isso meio que ficou na minha mente.

Será que sempre foi condicionada à agir de determinada maneira?

- Vou apagar a luz do meu lado, você se importa?

Ambra interrompe meus pensamentos.

- Não.

Não diz mais nada. Se vira e desliga o abajur de modelo antigo puxando uma cordinha, depois se deita e se cobre ficando de lado.

***********

Já estamos de volta em casa e eu preciso tomar providências sobre um assunto em particular que chamou minha atenção durante a viagem.

Tenho um escritório na minha empresa de comunicações, é o que eu uso pra lavar dinheiro. Internet e telefonia.

Aqui eu sou apenas Ítalo Rizzo. Só, nada mais.

Lá fora nas ruas são outros quinhentos.

Aqui eu tenho um assistente que se chama Jerônimo. Eu já tive mulheres nesse cargo, mas sempre acabava com elas na cama e não era algo bom depois, tinha que desembolsar dinheiro em recisão. Aí dej jeito nessa questão e coloquei um homem no lugar. Zero dor de cabeça agora.

Ele bate na porta e entra.

- Senhor Rizzo, o Senhor Romano está aqui.

- Pode deixar entrar, Jerônimo.

Bruno surge alguns minutos depois.

- Quer falar comigo?

Indico pra ele a cadeira na frente da minha mesa.

- Ambra está te dando trabalho?

O encaro de maneira ostensiva.

- Não, ela é perfeita.

Bruno não precisa saber que a sobrinha dele e eu não temos um casamento de verdade.

A minha fala parece deixar ele surpreso. Não esperava isso.

- Te chamei aqui porque quero as fotografias que pegou dela.

O infeliz ainda tenta me enrolar.

- Quais fotografias?

Comprimo meus lábios em uma linha fina. Ele está testando a minha paciência.

- Não me irrita, Bruno. Você sabe do que estou falando.

- Por que você está cobrando isso de mim?

Deixo a caneta cair na mesa e gesticulo com as mãos.

- Estou fazendo meu papel de marido. É casado há tantos anos e ainda não aprendeu que um homem zela pelo bem da sua mulher? Ela quer as fotos e eu vou dar a ela essas fotos. Algo me diz que você tem capacidade o suficiente de ter escondido de uma criança a única lembrança que ela tinha dos pais, por pura maldade.

Bruno tem a cara de pau de me perguntar o que ganha em troca pelas fotos.

- Já está ganhando. Vendeu sua sobrinha pra não morrer de fome. Se tem como manter o teto sobre a cabeça e a geladeira cheia, é graças a mim.

- Ganhei?! Você me reduziu a quase nada, Ítalo. Se casou com Ambra na segunda e na terça eu já era empregado na minha própria empresa. Sequer tomo decisões mais no Norte. Meus homens não obedecem mais ordem alguma minha se não passar por você antes. As boates, os cassinos, nada me dá dinheiro mais.

Não seguro o riso de escárnio.

- Por que você acha que me chamam de Diavolo, Bruno? Hein... me diz. Você vendeu a sua alma pra mim no instante em que me vendeu Ambra. E eu sugiro que não me irrite e faça logo o que eu estou mandando, se não quiser que eu te despeje do lugar que mora.

Já é fim de tarde quando um envelope chega na minha mesa. Abro e encontro duas fotos amareladas pelo tempo. Um casal bonito segurando um bebê no meio dos dois. Ambra parece muito com a mãe. A outra é dos dois no casamento deles.

Pego o fixo da minha mesa.

📞 - Jerônimo, você ainda tem o contato daquele profissional que restaurou uma fotos pra mim?

Eu tenho um porta retrato com uma dos meus pais na minha mesa.

📞 - Tenho sim, senhor.

📞 - Ótimo. Vou te entregar esse envelope que chegou aqui e você manda pra ele, por favor. Peça agilidade.

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