Ponto de vista de Ítalo
Estou com um copo de whisky na mão enquanto olho pela janela da biblioteca na casa de campo dos meus padrinhos.
- E como vai a vida de casado?
Reviro os olhos enquanto levo a bebida até a boca.
- Nem vem, padrinho. O senhor sabe muito bem que tipo de casamento eu tenho.
Ele apaga o charuto que estava fumando e se levanta de onde estava sentado.
- Lio, você tem certeza absoluta do que está fazendo?
O encaro bem nos olhos.
- Absoluta.
Ele respira fundo.
- Muito bem, então. Só pegue leve com a garota.
Meu pensamento escorrega pra Ambra. Eu tinha uma idéia totalmente diferente dela, não sabia que era a melhor amiga da minha irmã. Achei que a sobrinha de Bruno seria uma garota fútil, e que me divertiria fazendo da vida dela um inferno até que não me fosse mais necessária. Me surpreendi muito quando na hora da cerimônia minha irmã me contou quem era a noiva. Pietra teve um susto quando viu o tio de Ambra.
Eu já sabia que ela tinha uma amiga que a ajudou em um momento de dificuldade e que viviam pra cima e pra baixo grudadas uma na outra. A inteligência rara aqui não fez questão nem de saber o nome da garota com quem se casaria. Juntou uma coisa com a outra e pronto!
Um perfeito desvio nos meus planos.
Mas nada que me atrapalhe demais. Eu só preciso me manter dentro dos limites com ela.
- Na hora certa eu vou liberar Ambra. Não se preocupe. Talvez até dê a ela uma casa e algum dinheiro. Ela assinou os papéis sem saber do contrato pré nupcial.
Óbvio que aquele documento tinha vantagens só pra mim.
- Ela é só uma menina, Ítalo. Praticamente uma criança. Ela tem a mesma idade de Pietra, você sabe o que significa...
Levanto a mão pra ele.
- Eu sei que ela é inocente, e sei que é só uma menina.
Uma menina linda, mas com um gênio péssimo.
Enfim...
- Então leve isso em consideração nas suas atitudes com ela.
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Ponto de vista de Ambra
Ítalo se arrumou mais cedo e me deixou sozinha. Pelo menos isso.
Estou terminando de ajeitar o meu cabelo em um coque baixo e bem feito.
Espero que a noite passe rápido. Nós não temos o costume de jantar juntos fingindo amor estando sozinhos em uma mesa.
Escolhi um nude, brilhante com mangas longas. Ele é trançado na frente e vai até meus tornozelos. A fenda central me permite caminhar sem parecer uma múmia enfaixada.
Solas vermelhas nos pés em um modelo combinando com a roupa e um sobretudo preto cobrindo tudo pra me proteger do frio até chegar lá.
Pego minha carteira social e confiro as perolas nas minhas orelhas antes de sair porta a fora do quarto.
Dou de cara com Andrea que vem acompanhada de uma empregada.
- Bom te encontrar, mia cara. Vou colocar cobertores extras no quarto de vocês. O telhado do depósito de lenha furou e está tudo molhado, não vamos ter lareira essa noite. Mas amanhã bem cedo um carregamento novo chega. Essa noite vai ter que ser de conchinha.
Eu cuspi na Cruz. Cuspi. CERTEZA!
É a única explicação plausível para as coisas que tem me acontecido.
Eu já estava preparada pra dormir feito um cachorro na frente da lareira pertinho do calor do fogo. Agora vou dormir como um de rua morrendo de frio.
Me lembro de dizer alguma coisa.
- Perfeito para o clima do lugar.
Sigo pra me encontrar com Ítalo e ele aparece junto com Lupo. Não vou dizer nada sobre a lareira, não quero dar a ele o gostinho de saber que minha noite vai ser mais difícil do que já está sendo.
Vamos de carro até a cidade e assim que paramos em frente ao restaurante, ele pega minha mão.
Abro um sorriso e entramos no estabelecimento.
É um ambiente meia luz bem confortável e romântico. As poltronas são de um couro envernizado vermelho escuro e as mesas tem toalhas brancas. As paredes são de tijolinhos e cada mesa tem um arranjo baixo de flores com uma vela em um copo.
Tem cheiro de comida boa e um senhor toca violonino em um banquinho no fundo do restaurante.
- Aí estão vocês.
Tchesco aparece e abre um sorriso pra nós dois. Ítalo e eu retribuimos o gesto e o homem mais velho se dirige a mim.
- Deixe o seu casaco, mia cara.
Desamarro o cinto e Ítalo me surpreende se posicionando atrás de mim pra me ajudar. Ele finge bem demais no papel de marido dedicado.
- Olha, Rizzo, você tirou a sorte grande. Jovem, bela e elegante. Espero que tenha consciência disso.
Seguro o revirar de olhos e me viro pra ver meu marido. Ele está sério me encarando.
- Que foi?!
- Nada.
- Hum... então vamos?
Ítalo concorda com a cabeça e nós seguimos Tchesco pelo salão.
- Vou trazer um vinho pra vocês dois. Podem beber de olhos fechados, é o melhor da província.
Não demora e um garçom traz uma garrafa de Lafond junto com um prato de entradas.
Tchesco se junta a nós dois depois de um tempo bebendo uma taça também.
- E então, como se conheceram?
Hãn... nunca ensaiamos essa parte.
- Ambra é amiga de Pietra.
O homem mais velho sorri pra mim.
- Você tem o nome lindo. Bem forte.
É, eu gosto do meu nome.
- Era o nome da minha vó, mãe do meu pai.
Ele me pergunta quantos anos tenho e quando digo, ele levanta as sobrancelhas ligeiramente.
- Que é jovem dá pra perceber, mas não pensei que fosse tanto. Seus pais não acharam loucura se casar tão nova assim?
Ah, Tchesco não sabe que Ítalo faz parte do sindicato. É comum meninas se casando aos dezoito pra gente, para os demais é loucura.
- Não tenho meus pais comigo desde que era um bebê. Eles partiram em um acidente. Mas acho que estariam felizes de me ver tão bem amada e cuidada com Ítalo.
Tchesco ri de um jeito genuíno.
- Achou mesmo uma boa mulher. Agora se me dão licença, vou comandar aquela cozinha.
Ele sai nos deixando sozinhos outra vez. Me pego admirando o arranjo na mesa e levo um pequeno susto ouvindo Ítalo.
- Que tipo de acidente seus pais sofreram?
Pisco algumas vezes focando no rosto dele.
- Eles foram velejar e o barco virou.
Ele concorda com a cabeça enquanto leva o vinho até a boca.
- Os seus sofreram um de carro, não foi?
- Pietra te contou?
- Uhum, ela tinha a mesma idade que eu quando vocês ficaram órfãos.
Ítalo deixa a taça na mesa.
- É, ela não tem lembrança deles a não ser fotos.
Sorte a dela.
- Nem isso eu tenho. Se perderam com o tempo lá em casa. O engraçado é que eu me lembro de ter uma só dos meus pais e outra deles comigo, isso até uns cinco anos de idade, mas elas sumiram. Bruno me garantiu que foram comidas por traças, mas eu era tão nova que não tenho certeza se foi isso mesmo.
O prato principal chega e eu fico mais do que feliz por ver que é uma carne que eu gosto. Coelho é uma delícia.
- Não pensou em fazer nada depois do colégio?
Esse homem tá bem?
- Por que esse interesse todo em mim?
- Não seja boba, Ambra. Estamos aqui como recém casados, jantar mudos não é opção, temos que convencer. Em casa nós nos fazemos de desconhecidos, aqui não.
Me ajeito na cadeira e bebo um pouco de água.
- Estava prestes a meter o pé. Subir em uma moto e rodar por aí sem nunca mais voltar pra casa.
Ele me olha surpreso.
- Então eu estraguei seus planos.
Não seguro o revirar de olhos.
- Não se sinta importante a esse ponto, senhor Rizzo. Meu tio estragou meus planos. Por mais que ele não goste de mim eu tenho uma dívida de gratidão com ele, não viveria bem sabendo que o deixei afundado na lama e se arrastando na sarjeta.
Ítalo sorri enquanto olha pra carne que corta. Ele deixa pra falar comigo quando espeta o coelho com o garfo pra levar até a boca.
- Gratidão com pessoas erradas pode te levar para o buraco, esposinha.
Faço uma careta discreta pra ele.
Debochado.
Eu sei que esse casamento é meu buraco.
- Não, maridinho, isso diz muito mais sobre mim do que sobre ele. É sobre meus valores e quem eu não abro mão de ser.
O peguei de surpresa com isso.
- É, não nega o sangue que tem. Seu pai era honrado no nosso meio. Um verdadeiro Don.
Tá legal... Agora eu fui pega de surpresa.
- Já ouviu falar do meu pai?
Ele dá de ombros.
- Qualquer um que se preze já ouviu falar do seu pai. Uma pena ter partido tão cedo.
Estou curiosa.
- Você me disse que já é um Don, mas de qual sindicato? Meu tio é do sindicato do Norte, então você tem que ser de outro.
Ítalo pausa os talheres.
- Seu tio deixou o imperio do Norte ruir. Ele achou que era só pôr um anel de Don no dedo e tudo ok. Eu vim do Sul, Ambra, assumi o lugar do meu padrinho já que ele não teve filhos. Hoje Lupo é meu Consiglieri.
Coço a minha nuca.
- Então você se casou comigo pra unir o Norte e o Sul?
Ele sorri sem mostrar os dentes. Não quer me dar a certeza dessa informação.
Decido mudar de assunto.
- Onde está seu anel de Don?
Ítalo puxa o ar com força.
- Ainda não me considero pronto para usá-lo. Na hora certa ele vai estar aqui no meu dedo. Agora chega de perguntas.
Nossa, ele mudou de repente. Esse cara é bipolar.
Me concentro outra vez no Coelho e ficamos em silêncio até o final do jantar.
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Atualizado até capítulo 79
Comments
Nicole Rossales
kkkkkkkkkk eu amo essa menina
2024-11-27
1
Nicole Rossales
hum que estranho
2024-11-27
0
Fatima Gonçalves
também quero saber
2024-10-03
1