Capítulo 4

Papo vai, papo vem e eu continuo fingindo costume. Pietra está estupefata com o irmão também.

Ele não tem a menor vergonha na cara.

De repente me dá um beijo na lateral direita da minha cabeça e sussurra no meu ouvido:

- Parabéns, senhora Rizzo. Está se saindo muito bem.

Respiro fundo e finjo não ter ouvido o que ele falou. Acho que Ítalo tem prazer em me t*rturar. Não faz sentido isso.

Depois de mais de uma hora fazendo o casal feliz, nós vamos embora. Ele vai no mesmo carro que eu.

- Bombom de Amaretto?

Olho pra minha mão com a pequena embalagem amarela de papel laminado envolvendo o chocolate.

- É, comprei esse daqui. É o meu preferido.

Não vou dizer nunca que foi Tarcio que me deu esse bombom. Sei lá o que esse doido vai fazer. Sem contar que pode achar que eu estava dando mole pra alguém na frente de todo mundo.

Ítalo me olha por uns instantes e faz um gesto de cabeça concordando. Depois ele diz:

- Quero você pronta às dezenove e trinta, nós temos um compromisso hoje.

Ai, que droga!

- Eu tenho mesmo que ir?

Ítalo me rebate de pronto.

- Tem sim.

Murcho ouvindo isso.

- Tudo bem.

Não tem o que fazer mesmo.

- Espero que você seja agradável hoje como eu fui com seus amigos e até mesmo como você estava sendo na mesa.

Opto pela minha velha e boa estratégia de guerra: Fico em silêncio.

Mas o infeliz não respeita minha vontade.

- Que foi? Não vai dizer nada? Nem uma gracinha?

Acho que foi uma péssima idéia ter ido naquele cinema hoje. Só serviu pra esfregar na minha cara a vida legal que eu tinha e que não tenho mais agora que me casei. Nunca mais vou fazer as coisas que garotas da minha idade fazem porque literalmente queimei etapas inteiras da minha vida.

- Não tem o que dizer, maridinho. Vou desempenhar bem o meu papel, pode deixar que no que depender de mim você vai conseguir se tornar um Don rapidinho.

Ele ri de um jeito debochado.

- Quem te disse que eu já não sou um? Não me casei com você pra conseguir status, Ambra, isso eu já tenho de sobra. E venhamos e convenhamos, sua família já nem tem tanto prestígio assim pra isso...

Essa informação me pega de surpresa.

Ítalo é jovem demais pra isso. Quando ele me disse que se casou comigo porque era vantajoso pra ele, eu achei realmente que fosse pra alcançar um patamar elevado dentro do sindicato.

-... Você não conhece o homem que eu sou verdadeiramente mia cara. Existem pessoas lá fora que se depararam com uma versão minha que você jamais vai querer se deparar, e eu sei que você deve me achar o pior cara possível, mas acredite, eu sou um doce mais doce do que esse bombom de licor com você.

Engulo em seco com o olhar duro que ele dirige a mim. Não senti que ele me ameaçou, mas me deu um aviso e isso é fato.

- Está certo. De qualquer forma, não se preocupe.

- Ótimo! Se arrume bem bonita, já mostrou que consegue isso.

**********

Escolhi um seda verde esmeralda de alças finas e que tampa meus joelhos. Ele é justo no corpo e tem um decote levemente drapeado. Fiz uma maquiagem basica, com um batom nude na boca e soltei meu cabelo.

Os acessórios são os mesmos de hoje mais cedo e Acho uma pena não poder usar o tênis, então enfiei um salto agulha preto nos pés.

Desço as escadas e encontro Ítalo me esperando no hall de entrada da casa. Está usando uma calça jeans escura, camisa de botão branca e blazer preto.

Filho de uma boa mãe não gosta que eu use jeans, mas ele pode.

- Tudo pronto?

Confirmo com a cabeça.

- Ótimo. Quero só reforçar que o únicos que sabem que nosso casamento não é convencional são o meu padrinho e Pietra.

- Pode deixar, a esposa perfeita vai sair por aquela porta agora.

**********

Nós vamos até uma casa clássica com um jardim belíssimo na frente. Noto alguns carros parados na entrada e constato que não vai ser um jantar só com pessoal da família.

Saímos do carro juntos e Ítalo coloca a mão nas minhas costas me conduzindo. Me retraio um pouco porque sou pega de surpresa com esse gesto dele, ainda não tem ninguém perto pra ver, não é como se fosse lá no shopping hoje. Não estava preparada pra isso.

- Algum problema?

Nego com a cabeça.

- Não, nada, só... Só não estava pronta.

Ítalo me ignora e bate a campainha.

Não demora e uma mulher com um cabelo curto platinado e olhos acinzentados abre a porta. Ela é elegante ao extremo e usa brincos grandes de diamantes. Está vestida inteiramente de preto e abre um sorriso caloroso nos vendo.

Tenho a impressão de já tê-la visto antes. Acho que foi no casamento.

- Ah, bambino mio! Que bom te ver!

Algo inédito acontece. Ítalo abre o sorriso mais sincero que o vi abrindo desde que nos conhecemos.

- Oi madrinha, digo o mesmo.

Ele dá um abraço na mulher e ela volta a atenção pra mim.

- Estava louca pra te conhecer mesmo, no dia do casamento não interagimos muito.

Abro meu melhor sorriso.

- Claro! Vamos conversar muito nessa noite.

Ela faz um gesto pra mim apontando pra entrar e eu me adianto.

- Deixa eu me apresentar, mia cara. Sou Andrea, madrinha de Ítalo e Pietra.

Nós duas vamos conversando e eu vou dando atenção pra ela na medida que tento observar o ambiente. Consigo ver pelo canto do olho Ítalo cumprimentando Lupo.

Guarnieri abre um sorriso quando aparece mesmo no meu campo de visão.

- Seja bem vinda a nossa casa, Ambra.

Espera... Ele que é o padrinho?

Tinha me dito que e era um amigo.

Sigo o roteiro.

- Muito obrigada, senhor Guarnieri.

Lupo nega com a cabeça.

- Só Lupo, bambina.

Mais uma vez meu marido coloca uma não atrás das minhas costas.

- Vamos pra sala de jantar.

É um cômodo grande e tem uma mesa retangular com doze lugares. Somente quatro estão vagos, estavam esperando por mim e Ítalo.

Me sento ao lado de Pietra.

- Você está linda.

Minha amiga veio usando um macacão branco trançado na frente. E prendeu o cabelo em um rabo de cavalo.

- Você também está.

Não conheço a fundo as pessoas sentadas à mesa pro jantar. Ja vi algumas em eventos do sindicato, mas nunca troquei nem um boa noite. Isso aqui é uma chatice sem fim.

Me esforço pra ser simpática, mas não consigo manter o papel por muito tempo. E enquanto uma empregada serve o prato principal depois da salada de entrada, Ítalo deixa cair um guardanapo no chão.

Ele se abaixa pra pegar.

- Onde está o sorriso, minha esposa?

Essa pergunta é feita cochichando atrás de mim enquanto ele se levanta com o guardanapo na mão. Deixou cair só pra me questionar.

- Já vou dar.

Estico a cara ao máximo.

A noite passa se arrastando e quando a sobremesa acaba, Ítalo vai tomar uma bebida com os homens e mulheres mais velhos.

Pietra e eu andamos pelo jardim conversando um pouco.

- Estou te achando tão diferente. Ítalo está te tratando mal?

Nego com a cabeça pra minha amiga.

- Ele só é ranzinza. Não é pior que meu tio, eu estou acostumada. A diferença é que meu tio não me obrigava a agir feito uma marionete.

Pietra faz uma careta.

- Está assim, é?

Digo um "Uhum".

- Tenho medo de te perder um pouquinho a cada dia até minha amiga nunca mais voltar.

Meus olhos enchem de água vendo os dela assim também.

- E eu tenho medo de me perder um pouco a cada dia até nunca mais voltar.

Minha amiga abre a boca pra me dizer algo, mas somos interrompidas pelo irmão inconveniente dela.

- *Coccinella*, deixa eu e Ambra sozinhos um pouco*?

Estranho o tom de voz doce dele e o apelido carinhoso, mas o vi sendo gentil e afetuoso com a madrinha. Ja entendi que são comportamentos destinados a pouquíssimas pessoas.

- Claro, Lio. Pega leve com a minha amiga, tá? Ela está sendo uma ótima esposa essa noite.

- Pode deixar que vou.

Assim que a irmã dele está longe o bastante, eu me adianto.

- Fiz algo de errado?

Ítalo coloca as mãos nos bolsos.

- Não.

Menos mal. Eu ainda tenho a impressão de que ele pode virar a chave do nada e me esbofetiar a cara.

- Estava chorando?

Coloco os dedos nos cantos dos meus olhos.

- Não foi nada demais.

Ítalo franze a testa.

- Por que está escondendo alguma coisa de mim?

Cruzo meus braços em sinal de defesa.

- Não estou escondendo nada, Ítalo.

- Está sim, Ambra. Eu ouvi a conversa de vocês duas, está tão infeliz assim?

Como é que é?!

- Você estava ouvindo a minha conversa com a sua irmã? Cadê o respeito que você disse que ia ter comigo?!

Ele dá de ombros.

- Escuta, eu fiz o meu papel direitinho hoje cedo. Fui educado e interagi com todos os seus amigos, inclusive com aquele que te deu um bombom. Aceitei sua mentira pra mim pra ficar na paz, o mínimo que eu esperava era você sendo cem por cento simpática hoje.

Abro e fecho a boca duas vezes antes de conseguir formular uma frase.

- *Você estava me espionando? Vai me colocar um cabresto? Meu Deus, Ítalo, por que isso? Por que você me escolheu pra fazer esse inferno? Eu não tenho nada pra te oferecer, você mesmo fez questão de jogar isso na minha cara hoje cedo, eu sou só uma órfã f*dida que virou prisioneira de repente. Menti sim sobre o bombom, mas não precisa me encher desse jeito. Eu vou voltar lá e fazer o que tem que ser feito*.

Saio andando sem olhar pra trás e entro na casa novamente. Respiro fundo e abro meu melhor sorriso pra me sentar junto das pessoas.

- Seu jardim é lindo, Andrea!

Logo as mulheres interagem comigo e acabamos em uma conversa sobre plantas. Nada a ver comigo, mas qualquer coisa é melhor do que Ítalo no meu pé.

Ele entra na sala e estreita os olhos pra mim, eu finjo não ver e continuo falando sobre flores.

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* Joaninha.

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