Bianca Vasquez

Foram meses de tratamento, mas em uma certa fase do tratamento, Miguel soltou um suspiro de sofreguidão. Devido à quimioterapia, o cabelo dela começou a cair aos poucos. Cecília perdeu o amor pela vida, a vontade de viver.

— Miguel, não precisa continuar. Eu entendo seu lado, não estou te cobrando nada - falo tocando suas mãos, sinto como estão suadas, o nervosismo, a dor das lembranças o machucam e não posso suportar vê-lo sofrer. Abraço ele, sinto meu ombro molhado, ouço seu choro baixinho.

Cecília não aguentava mais. Para ela, ver seu cabelo caindo, seu corpo perder a forma devido à perda de peso, sua pele sem brilho. Para uma mulher vaidosa como era, aquilo era o fim.

Um dia cheguei no hospital para ficar com ela durante a madrugada. Ela acordou, pediu um copo de água, fui e peguei. Quando entreguei o copo a ela, não soube como agir, ela não tinha forças no braço, aquilo nos destruiu. Vi seus olhos cheios de lágrimas mas nenhuma caiu. Cecília estava debilitada demais até para derramar lágrimas, ouço sua voz num sussurro.

“Miguel, você me ama?” - Pergunto.

— Olhei sem entender sua pergunta, e claro que eu a amava. Cecília era o amor da minha vida.

Por que está perguntando isso? - questionei.

— Olha pra mim, quem no mundo amaria um ser assim? Não aguento mais, só quero que isso acabe - ela diz quase sem voz.

— Vai acabar, amor, logo estará curada e assim sairá daqui - falo para alegrá-la, vejo ela balançar a cabeça em negativa, queria consolá-la, tirar a dor dela.

— Miguel, se me ama de verdade, acabe com meu sofrimento, descanse minha alma, não aguento mais isso.

Ouvi falar agitada, não quis dar ouvido a suas palavras, mas quando ela tirou a máscara de oxigênio, vi puxar o ar com força. Tentei colocá-la de volta no rosto dela, mas Cecília não deixou, pegou o travesseiro, me entregou botando no centro de seu rosto. Dei um passo para trás ao perceber o que ela pretendia, mas já era tarde demais.

Olhei nos seus olhos antes cheios de vida, sem nenhum pingo de cor, ouvi suplicar por favor acabe com isso. Ali, diante da mulher que amei com toda paixão, todo meu ser sorria para mim enquanto dava seu último suspiro.

— Meu deus - boto as mãos na boca em choque - como deve ter sido difícil para ele. Permaneço abraçada a ele, ouvindo seu desabafo, sentindo sua dor rasgar minha alma. Afasto-me dele para olhar em seus olhos. Sei que se sente culpado, mas não foi você, ela escolheu desistir. Cecília poderia lutar até o último momento, mas desistiu. Não se culpe pelo que ela fez, foi escolha dela.

— Você não entende, eu estava lá, eu deixei que ela fizesse isso. Ouço seu desespero, a dor em sua voz mostra o quanto ele amava.

— Entendo, por que não mereço nada de bom! Sou um assassino, Bianca, matei a mulher que amo.

— Respiro tentando controlar minhas emoções, ver o homem que amo, se culpar pela morte da mulher que ama. Fico de pé, observo o estado em que Miguel está, roupa amassada, olhos vermelhos, cabelo bagunçado, a dor em suas palavras.

Eu entendo, mesmo, entendo que você precisa de sentimento de culpa para manter vivo o amor que sente por ela. Entendo que precisa se sentir culpado pela morte dela para que assim tenha uma desculpa para mantê-la viva dentro de si.

Agradeço por tentar mefazer vê-lo como um vilão, quando no final, você também queria o fim do sofrimento de Cecília, mas não era capaz de admitir - falo sem rodeios.

Não importa o que faça, ou tente seguir em frente, quando ainda está amarrado ao passado.

Eu te amo, Miguel, mas não posso aceitar viver à sombra da sua dor. Tenho as minhas e aprendi a viver com elas e superá-las. Não posso viver remoendo se eu tivesse feito isso, e si, eu tivesse feito aquilo. Não importa o quanto se tenha na mente, nada vai mudar o que aconteceu.

Dois dias depois que vi o Miguel, depois da nossa conversa, ele foi embora. Diante da sua confissão, entendi que, não importa o quanto o ame, Miguel nunca sentirá o mesmo por mim.

"Bia, que bom que veio, nem acredito que vou para casa" - ouço Luísa falar, toda feliz por passar o final de semana em casa comigo. Agora que tenho meu cantinho, vim buscar Luísa para passar o final de semana comigo e ao final do semestre ela passa o dia na escola e depois voltará para casa, dormirá no quarto que arrumei para ela.

Andamos para fora do internato, caminhamos até o carro do aplicativo. No caminho para casa, Luísa fala pelos cotovelos, não sei se é por ansiedade ou nervosismo por finalmente ter uma casa para voltar. O carro para na frente do prédio que moro, descemos, pego a mala da minha irmã. "Lu, vamos", chamo ela. Luísa olha para mim com os olhos nublados pelas lágrimas. Andamos para dentro do prédio, não tem elevador, mas é bem cuidado e são apenas três lances de escadas.

Paro na porta, pego a chave e abro, entro e espero Luísa entrar, sorrio olhando para ver sua reação.

"Seja bem-vinda à sua casa", falo sorrindo. Luísa entra, se joga nos meus braços chorando e agradecendo por estar em casa. Ficamos abraçadas, choramos juntas pelas alegrias de estar no nosso cantinho, vivendo uma vida normal, livre.

Levo Luísa para seu quarto, vejo ela correr até sua cama, deitar e agarrar-se com o urso gigante que comprei para ela. O quarto é simples, mas bem a cara dela: uma cama de solteiro, um guarda-roupa, uma mesinha de estudos, uma prateleira com alguns porta-retratos dela pequena e na mesa de estudos, um porta-retrato com a foto dos nossos pais.

"Gostou?" - pergunto, vendo-a andar pelo quarto.

— Meu deus, não tenho nem palavras, é perfeito. Obrigado, irmã, amei tudo, ainda mais isto.

Sinto lágrimas descendo pelo meu rosto ao vê-la abraçada com o porta-retrato com as fotos dos nossos pais.

"Sinto falta deles" - ouço minha irmã falar.

— Eu também - falo, sentindo o vazio no peito, não importa quanto tempo passe, sempre sentirei falta deles. Prometi a eles que cuidaria da Luísa e continuarei até meu último suspiro.

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