Primeiro Contato

Giorgia

Acordei me sentindo exausta e enjoada, como se minha cabeça tivesse passado a noite toda centrifugando numa máquina de lavar. Me sento na cama, estranhamente macia, escondendo meus olhos da claridade que os invadiu e tateando em busca da mesinha de cabeceira, onde deveria estar meu celular. Mas não encontro nada do lado da minha cama, me dou por vencida e desisto de tatear abrindo meus olhos. Não estou no meu quarto. Já ia me levantar quando algumas lembranças da noite anterior atingiram em cheio minha mente e me desespero um pouco.

"Calma! Preciso me acalmar."

Chacoalho minha cabeça para afastar os pensamentos negativos.

" Se tivessem me sequestrado, eu estaria amarrada e amordaçada em algum galpão escuro e úmido e não teria acordado numa cama - olho ao meu redor - em um quarto luxuoso e de camisola." Paro meus olhos no tecido. " Por que estou de camisola?" Me desvencilho dos lençóis e pulo da cama já me apavorando novamente. Sigo em direção a primeira porta que vejo e dou de cara com o banheiro, resolvo lavar meu rosto na esperança de que a água fria me acalme um pouco. Funcionou.

Controlo minha respiração olhando meu reflexo no espelho a minha frente. Pelo menos a camisola é bonita. Seda fina e renda francesa no busto. Toda preta, descendo alinhada ao meu corpo até a altura dos joelhos, mas nada muito colado. A fenda na perna direita também não é nada exagerada. Levanto a barra procurando alguma evidência que confirme minhas suspeitas. Bingo! É de grife europeia, como eu imaginava, muito mais cara do que sou disposta a pagar numa peça de roupa. Retorno ao quarto observando melhor o ambiente. Peças escuras e artigos de decoração que indicam o gosto dessa pessoa por rock, fotografias, viagens e livros. Em uma parede havia vários deles distribuídos em algumas prateleiras pretas. Saio de meus devaneios quando escuto vozes se aproximarem da porta, meu coração dispara novamente e corro para perto da cama, pensando se devo ou não me esconder debaixo dela.

A porta abre e dou um pulinho de susto, me virando em direção dela com os ombros um pouco encolhidos.

- Bom dia bela adormecida! - O rapaz bem vestido entra no quarto me cumprimentando e fica na outra ponta da cama, de frente para mim. - Achei que ainda estaria dormindo, senão teria batido na porta antes de entrar. Me desculpe.

Não sei o que fazer, apenas junto minhas mãos na frente de meu corpo e entrelaço os dedos.

- Bom dia. - respondi por fim, surpresa por não ter gaguejado e minha voz saído normal, apesar de mais baixa que o habitual.

- Eu não soube o que fazer quando você desmaiou ontem, então te trouxe para a casa de meus pais. Aqui é meu antigo quarto, não moro aqui mas mamãe o mantém intacto para eventuais casualidades. - Encolhi os ombros e alisei a camisola na altura das coxas. - Essa camisola era de minha irmã, ela disse que é da coleção do ano passado e que você pode ficar com ela. As sua roupas estavam sujas e ...

- Você que me trocou? - Cortei a fala dele rapidamente, minha voz saiu esganiçada e fiquei corada.

Ele sorriu de canto.

- Não. Não tiro a roupa de uma mulher sem seu consentimento. - Ele disse calmamente e minhas bochechas arderam em meu rosto. - A senhora Filomena quem trocou. - Mantive a expressão de que não estava muito contente e ele continuou a se explicar. - E minha mãe a acompanhou, enquanto eu estava resolvendo o assunto daquela tentativa fracassada de assalto.

Meu coração falhou uma batida e apertei o tecido da camisola em minhas mãos.

- Você deve estar assustada com tudo o que aconteceu ontem, não é mesmo? - balanço a cabeça concordando e olho para meus pés descalços no tapete felpudo, enquanto algumas cenas da noite passada voltam a minha mente. - É normal se sentir assim, qualquer pessoa que não esteja acostumada com sangue, em uma situação daquelas, ficaria assustada. Ver uma pessoa morrer diante de seus olhos não é fácil...

Um zunido invade meus ouvidos e já não escuto o que ele diz, como se estivesse novamente na noite passada, vejo aquele cara cair diante de mim, num baque surdo, de encontro ao asfalto, com seus olhos abertos, vidrados em mim, enquanto sangue respinga em meu rosto. Mesmo que eu saiba que ele não estava realmente do meu lado, estava perto demais. Sinto meus joelhos vacilarem, apoiei na escrivaninha que estava sim, perto da cama. Não foi o suficiente para me sustentar de pé e antes que eu tocasse o chão, senti braços em volta de minha cintura, mas não consigo esboçar nenhuma reação no momento.

- Ei garota, calma, está tudo bem agora. - Ele passou meu braço esquerdo em seu pescoço me apoiando e nos sentou na cama, enquanto dava leves tapinhas em meu rosto, para me chamar de volta à realidade. - SIMOOON. - Ele se virou para a porta gritando e me assustei, estremecendo em seu braço. - Desculpe, não quis lhe assustar.

- Não foi nada, eu que não estava esperando. - Fui sincera.

Um homem alto, grande e careca entrou no quarto e eu me encolhi um pouco.

- Simon, poderia trazer um copo d'agua para senhorita? - o homem apenas confirmou movimentando a cabeça e saiu - Esse brutamontes é Simon, não precisa ter medo dele, é um de meus seguranças que estavam presentes ontem. Se desejar, ele poderá te acompanhar até a delegacia para você prestar queixa, ou então, te levar para casa. Ele está à sua disposição, é de minha inteira confiança, e claro, da família também. - arqueei uma sobrancelha, " que família?' pensei e ele pareceu adivinhar minha pergunta imaginária. - Perdoe-me pela indelicadeza, não nos apresentamos, me chamo Matteo Caccini, muito prazer.

Ele estendeu a mão para mim e só então percebi que ainda estávamos "abraçados". Me desvencilhei educadamente de seu braço e retribuí o aperto de mão.

- Me chamo Giorgia Ginevra, lamento muito ter nos conhecido nessa situação, mas é um prazer conhece-lo Matteo. Lhe agradeço por tudo que fez por mim ontem e hoje, agradeço-lhe pela atenção em dispor Simon para me acompanhar, porém, irei recusar a companhia. Não pretendo ir à delegacia e ligo para meu motorista vir me buscar, não precisa se incomodar mais por minha causa. Sou grata por toda ajuda.

- Não gostaria de nos acompanhar para o desjejum?

Desjejum? Quem ainda fala assim? Ah sim, a alta sociedade da qual eu ignoro todo santo final de temporada.

- Agradeço o convite, mas gostaria de tomar café em minha casa. - Talvez eu tenha dado ênfase na palavra, mas não foi propositalmente. - Meus avós devem estar morrendo de preocupação, não sou de dormir fora de casa, muito menos ficar sem dar notícias por muito tempo.

Alguém bateu na porta e ele respondeu "Pode entrar Simon" e era mesmo o brutamontes. Trouxe uma garrafa de água cara.

- Não precisava ter se importado tanto, senhor Simon, poderia ter trago da torneira mesmo, mas muito obrigada. - Disse ficando em pé e indo até ele. - Eu já estou melhor.

Peguei a garrafa das mãos dele, que pareciam ser três vezes maiores que as minhas, tentei abrir mas não consegui e só então percebi que tinha pequenos ferimentos nas mãos. Esfolados na palma da mão direita e alguns arranhões dos dedos da mão esquerda, comecei encará-los tentando me lembrar, quando que me machuquei. Matteo pegou a garrafa de minha mão, abriu-a e me devolveu em seguida.

- Você entrou em choque e engatinhou no asfalto até o assaltante, tentando tampar os ferimentos dele com as mãos, para conter o sangramento. Mesmo ele já estando, claramente, morto. Afinal, com um tiro certeiro no coração, um na cabeça e mais outro no peito, quais as chances dele estar vivo, não? Foi assim que suas roupas de sujaram. Estão na lavanderia, ao contrario de você, mamãe tem pavor de sangue por aqui, me passa seu número, depois entro em contato e mando lhe entregarem. - Continuei olhando para a mão livre, esfolada. - Eu te tirava de cima dele, mas você se debatia e voltava, mas quando se deu conta do sangue em suas mãos e nas roupas, ou que ele já estava morto, desmaiou e finalmente saímos daquele local. Você é teimosa, não é? E corajosa também. Nem se importou com os barulhos dos tiros trocados e foi tentar ajudar a pessoa que ia te assaltar.

Finalmente eu olhei para o rosto dele. Não parecia estar debochando de mim.

- Não me lembro de muita coisa de ontem. - Fechei os meus olhos com força. - Me lembro do sangue escorrendo enquanto ele caía no asfalto e de seus olhos abertos, vidrados em mim. - Abri e o encarei. - Você falando desse jeito, me faz pensar que está acostumado com essa situação.

- A situação toda em si, não. Mas estou acostumado com ferimentos, sangue e situações estressantes quase todos os dias na minha boate. E com esse meu ramo de trabalho, acabei me tornando mais frio e controlado nessas ocasiões.

- Você tem uma boate? Como assim? Quantos anos você tem? Sua aparência me diz que parece ter quase a mesma idade que eu. - Disse evidentemente chocada com a informação.

- Você não me conhece mesmo?

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Oliver Queen

Oliver Queen

Cute

2023-10-07

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