Partido.

Paulo de Tarso, 2009.

Minha rotina de primeiro dia é para conhecer as pessoas que vou conviver. Era mais ou menos como eu realmente esperava. Alguns sorrisos nitidamente falsos, outras expressões de ingenuidade jovial - e foi incrível notar que não tem muito meia idade, eram mais jovens de nível estagiário e alguns de experiência - e, os poucos “cobras” que conheci, os mais experientes e que estão no ramo a mais tempo, com aquele jeito corruptível - ativa e passivamente - só na forma de falar já dava para perceber que eram como ilusionistas. Eu nunca me importei muito em “ler pessoas”, contudo esse pessoal deixa traços claros de que não devemos confiar neles. Em nenhum deles, seja maldade, burrice ou qualquer outro motivo. E há muitos indícios facilmente perceptíveis: Um pela aparência, um bigode fino e que fica esquisito com o restante da face. Outros pelo tom de voz, seja falsamente tentando falar manso e outros forçando, tentando parecer forte, e até eu que sou juvenil vejo que não é nada disso.

Quando finalmente sento em meu lugar para trabalhar - diga-se organizar a bagunça da agenda de José Cubas que a antiga estagiária deixou - começo a pensar nos motivos das pessoas fecharem os olhos para a realidade e levar a sério qualquer palavra que esse pessoal possa dizer. Uma parte deles mente. Outra parte fala com confiança aquilo que não faz ideia do que significa. E uns e outros que falam a verdade, ao menos algumas vezes por deslize ou por excesso de confiança na alienação popular, o povão não entende que aquelas palavras são prejudiciais.

De qualquer forma procuro não me aprofundar em nada disso no momento e trato apenas de organizar a tal agenda. Descubro que José Cubas tinha um compromisso em cima da hora e trato de ligar para ele. Nada. Apenas na segunda vez que tento novamente ligar que o patrão atende. Na ligação ainda ouço uma voz familiar e tenho a sensação - quase certeza - que era da aluna que vi saindo com ele. Certamente - seja com aquela universitária ou não - estou tirando-o de um motel e isso me deixa feliz, como que me vingando, retribuindo uma maldade com outra - embora apenas faça parte do trabalho - ... eu não era assim, já estou me corrompendo ou é só senso de justiça?

De qualquer forma recebi até um elogio do chefe por ter insistido com a ligação, pois ele realmente precisava ir. Prestei atenção ao conteúdo do evento e vi que era uma reunião com lideranças locais. Fiquei curiosa e procurei por mais papeis que complementassem as informações. Afinal de contas, quem eram as tais lideranças locais? Eu não fazia ideia e queria saber alguma coisa para não estar totalmente desprevenida.

Vasculhando e olhando para os lados com discrição, tinha na ponta da língua uma desculpa caso alguém me flagrasse, simplesmente diria que estou procurando outros papeis para confirmar a agenda do José e finalmente encontro um pequeno caderno.

Eu olho melhor e, na verdade, parecia mais uma agenda. Obviamente olhei os nomes e me surpreendi: Havia nomes de lideranças políticas de outros partidos e não apenas partidos aliados, como também partidos que eram oposição... ou melhor, que se dizem oposição e, agora que estou dentro do jogo, vejo que são parceiros.

Que sujeirada. Fechei um pouco os olhos e foi como sentir minha família dizer “Leila, olha onde está entrando”... mentalmente respondi que “calma, é só por um tempo, só para ganhar algum dinheiro”.

- Ei, tudo bem? - uma voz fala por trás de mim.

- Sim, sim, apenas dor de cabeça em organizar a agenda do senhor José - respondi fazendo massagem com os polegares na minha testa.

Era um desconhecido, que logo tratou de se apresentar antes que eu pudesse notar mais de suas características.

- Eu sou o Fernão Andrade, prazer - e estendeu a mão para mim.

Notei seu sorriso safado e a aliança no dedo, apertei a mão e falei:

- Leila, estagiária do senhor José Cubas - e tratei logo de soltar aquela mão de aperto fraco.

Senti nojo. Meu pai sempre me alertou com tipos que “apertam” a mão assim, tirando todo o peso. E só de olhar para ele eu sentia repulsa. Não. A presença dele já era mais que suficiente para eu querer vomitar e sair dali. E ele falou:

- Você deu sorte, menina - ah sim, uma humilhaçãozinha, estava já sentindo falta - se fizer seu trabalho direito crescerá muito rapidamente, Cubas é enorme aqui dentro - e senti inveja da parte de Fernão. Típico. Não esperava nada diferente.

- Entendo... sabe dizer o porquê, então, da antiga estagiária ter saído? - aproveitei que o bobão parecia saber das coisas e pedi para ele me dizer, afinal é meio estranho um emprego assim do nada, mesmo que eu tenha aceitado.

- Eu até sei o motivo, só que as coisas não funcionam assim... você tem que dar para receber, entende? - Fernão posta as mãos, entretanto só vejo malícia em seu rosto. Acho que é uma expressão religiosa que está sendo usada de forma sacrílega por esse verme.

Fico pensativa... vale a pena? Já que é um jogo eu resolvo jogar com sabedoria.

- Essa informação é muito pouco comparado ao “dado” que você quer - respondi com cara fechada, indicando que tinha entendido bem sua proposta.

- Amanhã conversamos mais... eu estou precisando de uma nova amante... vou pensar em como te retribuir, mas... só posso retribuir mesmo se você for boa - o mascarado vai mostrando mais claramente sua outra face.

- Então até amanhã, eu preciso mesmo ir agora, tenho aula - e ainda jogo o cabelo para trás, fazendo tipo.

Percebo pelo reflexo do celular em minhas mãos que ele olha para meu bumbum com desejo. Sinto que posso estar bem nesse jogo, ao menos com peças valiosas.

Vou para a aula e tudo vai seguindo normalmente. Comento um pouco com Anna sobre o primeiro dia e minha amiga apenas repete uma única palavra: Cuidado.

Vou dormir pensando em tudo aquilo... aquela palavrinha de Anna não fica muito em minha mente, que trata apenas de recapitular todo o ocorrido durante o dia.

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