Paulo.

Paulo de Tarso, 2009.

Finalmente estou na capital do estado, Paulo de Tarso. Apesar do nome de santo a cidade é pouco ou quase nada religiosa, o nome é de uma origem histórica, hoje algo como Judas Iscariotes faria mais sentido. Conforme combinado, minha tia veio ao meu encontro para que eu não me perdesse andando por aí em uma cidade tão grande e para mim desconhecida. E dá tudo certo e em mais uma hora desperdiçada por conta de trânsito e pelo fato de ser tudo longe de tudo finalmente chegamos à casa da tia Gabriela. Dizem que quando se termina um relacionamento se muda um pouco as características físicas, ou emagrecendo ou engordando, mas Gabriela continua igualzinha da última vez que a vi e isso já tinha um bom tempo.

Eu só tinha aquele dia livre antes que minha vida nova começasse e minha tia me levou para alguns lugares daquela grande cidade. Há belas áreas verdes em meio à floresta de prédios, isso me deixou estranhamente familiarizada, apesar de ser minha primeira vez ali, contudo procurei não filosofar, não agora, pelo menos.

No dia seguinte eu sou levada pela minha tia até a tal Universidade Paulo de Tarso e as coisas não começam bem. Um trote. Eu já tinha ouvido falar em trotes universitários, porém não esperava isso do meu curso. Com tinta e penas de galinha em meu corpo, fui levada para pedir dinheiro em um sinal de trânsito. É o auge da irracionalidade, promovida pelos veteranos do curso. Era como uma catástrofe e aproveitei esse péssimo momento para saber com quem eu iria me envolver. Certamente nenhum daqueles veteranos, todos idiotas, alguns claramente chapados, não sei se de erva ou de álcool, talvez uma mistura de ambos. Os novatos pareciam mais legais. Havia só mais três ou quatro meninas e o restante era de homens barbados, diferenciando-se apenas nas espessuras de suas barbas, o que denunciava parcialmente suas idades. Só havia dois garotos ali que pareciam de melhor aparência, mas não era o momento de me aproximar deles. Não fedendo a galinha e coberta de tinta - que nojo.

Também ouvi alguns babacas, veteranos e novatos, pedirem para eu “me alegrar”, “que só era aquela vez”, “que eu já poderia fazer o mesmo com os novatos do próximo semestre”, enfim... fiquei calada para não os mandar para as putas que os pariu.

Depois de um dos piores dias da minha vida, o dia seguinte - entenda-se noite - de fato é mais tranquilo, ao menos continuo com a pele limpa e o cheiro do meu perfume, porém alguns dos idiotas de antes vem me falar “está mais calma?”, “você estava estressada ontem” e “não fica assim, é só um trote”... eu esperava mais maturidade dessa galera. Mais racionalidade, sobretudo. Acham que vou me submeter nessas humilhações só para ser aceita? Pior é ver muitos novatos fazendo isso e se enturmando com alguns veteranos, achando muito legal o ocorrido. Trouxas.

Enfim, começou a primeira aula e meu sonho parecia que estava se tornando em um pesadelo. Com um grande atraso, o professor entra fumando um cigarrinho do diabo e apresentando como seria sua cadeira - ou seja, a disciplina. Olhei para o lado e, aqueles alunos que o olhavam como herói, já risquei mentalmente da lista de qualquer possibilidade de trocar um boa noite sequer. Conforme minha primeira observação, os dois mais arrumadinhos o olhavam com desprezo e havia também uma menina que claramente balançava a cabeça negativamente ao olhar para o “doutor”, nas palavras dele. Eu já encontrei minha galera.

Depois da aula, se é que dá para dizer isso, talvez aula de egocentrismo de virtudes ruins, aí realmente aquele cara é doutor, eu procurei fazer amizade com a menina que balançava a cabeça negativamente para aquilo. Seu nome é Anna Campos, inclusive é a mais bela da turma, talvez até do curso. Alguns daqueles idiotas vieram dar em cima de nós e foram prontamente desprezados. Fomos para outra sala para mais uma aula. São duas aulas todas as noites, ao menos nesse primeiro semestre.

E a aula seguinte foi bem mais promissora. “Agora sim, algo cult”, nas otimistas palavras de Anna. O professor, pelo que entendi, estava usando o método socrático para nos fazer refletir sobre algumas coisas. De repente achei estranho o fato de as respostas dos alunos serem as mesmas e o professor sempre responder que estava “estimulando o pensamento crítico”. Pensamento crítico? Sempre em concordância e pensamentos iguais? E quando um dos gatinhos do que queria como minha galera o confrontou em ideia ele claramente não gostou.

- Cult nada, amiga. Ele é só outro idiota - sussurrei em aviso.

- Pior viu, mas é menos ruim que o maconheiro - ela apontou e tive que concordar. Ao menos tinha algum conteúdo.

- Depois vamos falar com esse menino e com aquele outro?! - queria saber a opinião dela, mas dando a entender que eu iria fazer aquilo.

- Claro, mas o de olhos azuis é meu - ela respondeu com alguma malícia.

Inicialmente eu fiquei com cara de idiota, mas depois ela riu e entendi que falou brincando... certamente com fundo de verdade. Para a sorte dela, ou não, ainda não queria me envolver com ninguém. Na real, Anna é tão charmosa que eu sei que não poderia competir com ela.

Os dois meninos não eram próximos um do outro, então falamos primeiro com um e depois com o outro, isso após a aula. Ambos bem solitários e com jeitões sérios. O nome do primeiro é Victor Galvão - o de olhos azuis - e o do segundo é Bernardo Wein. Não trocamos muitas palavras por conta do horário e logo cada um foi para sua casa, porém era promissor que seria nossa galera.

No dia seguinte eu acordei levando bronca da minha mãe em uma ligação, afinal acordei tarde e nada ainda de emprego. Tiro o resto do dia para procurar alguma coisa. Até o momento nada de emprego, só algumas bobas esperanças e vou para mais uma aula de Filosofia, assim espero, ao menos. Julgando por ontem será outro dia tenso... duas novas cadeiras, quem sabe ao menos encontre alguma filosofia.

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