O guardião da profecia

Feições assustadas permaneciam fixas em nossa direção.

Os olhos temerosos de Petter sobre mim, me deixavam com um certo pânico; O demônio apertava mais e mais meu pescoço conforme acentuava suas ameaças, deixando claro que me mataria a qualquer momento; mas lá no fundo, eu sabia, de alguma forma, se tratar de um blefe.

Ele não poderia me matar inopinadamente.

Como Derek insistia em falar; — Só quando chegar a hora.

E sim, eu morreria, de uma forma ou de outra, mas só na hora certa. E com certeza, não era aqui, nem agora.

O demônio se mantinha a apertar meu pescoço, suas longas unhas pontiagudas, já derramavam o meu sangue; e ele tratava se afundá-las ainda mais, sempre que algum movimento brusco era feito em minha direção.

Eu não podia mais ficar naquela situação, se eu quisesse cumprir meu destino, teria que abdicar do posto de donzela em perigo.

Então aproveitei sua leve distração com Petter e acertei com força sua barriga usando meu cotovelo; em seguida levei minhas duas mãos até sua cabeça, segurando massivamente, apoiei meu pé direito para frente, e inclinando meu corpo, o derrubei ao chão.

Ao cair, o demônio se transformou em uma fumaça preta, e voou ao nosso redor, parando bem atrás de mim.

Subitamente a luta começou.

O demônio sacou sua espada, e iniciou com um ataque bruto em minha direção; mas ao desviar, a espada acerta o chão com tamanha  força, que faíscas podiam ser vistas.

Petter saca sua espada, e parte para cima do demônio, e todos o acompanham; uma luta se iniciou ali, cinco contra um. Mas mesmo tendo a vantagem numérica, não estávamos ganhando.

Boutrix era forte e inteligente, seus golpes precisos e certeiros. Eu precisava pensar em alguma coisa rápido, antes que fosse tarde, e ele fugisse com o livro, e pior, comigo.

Durante a luta, algo me incomodava, como uma sensação, de que eu podia fazer bem mais que àquilo, mas não sabia como. Quando de repente, ouço aquela voz, a voz de Teledom a sussurrar em minha cabeça.

— Seus poderes Jimmy, use seus poderes. E não se preocupe com o controle, minha espada irá auxiliar você.

Espada?

Subitamente um clarão iluminou o céu, logo em seguida, um raio, caíra bem no centro da luta, jogando todos para longe, nos atordoando por alguns segundos, quando conseguimos perceber o que havia acontecido, percebo algo reluzente aos meus pés.

Todos ficaram espantados com o que viam

— Isso não é possível — Boutrix comenta indignado — Por que ele daria sua espada a um simples escolhido?

— A besta dourada — Derek fala sorrindo impressionado.

Ao me abaixar para pegá-la, sinto um poder incrível irradiar por todo o meu corpo; a espada com raios dourados era mais pesadas do que o imaginado.

Boutrix não perdeu tempo, sacou sua espada, e usando seu poder, possuiu os corpos desfalecidos dos elfos, os obrigando a lutar por ele, como um exército de mortos vivos. Meu primeiro ataque com a espada fora extremamente forte como um raio, partindo ao meio o corpo do elfo a minha frente.

Aproveitando que estávamos, ocupados, o demônio tratou de fugir com o livro; mas eu não ia deixar isso acontecer, então tirando os elfos de meu caminho, eu tentava correr em sua direção.

— Você não vai fugir!

Mesmo não sabendo como, ergui a espada, e direcionei um raio até Boutrix, fazendo o demônio cair ao chão; o livro antes em sua posse, voou para longe, então aproveitando  a oportunidade, corri para enfrentá-lo sozinho.

— Não, Jimmy não! — Petter grita enquanto luta com os elfos.

Boutrix me vendo correr em sua direção, pega sua espada, e virando fumaça novamente, me ataca sem que eu pudesse me defende; a força de seu ataque, me fizera bater com tudo em uma árvore.

— Você é fraco escolhido, não importa o quanto ele te ajude, vai morrer outra vez — Diz de pé a minha frente.

— Sim, eu vou morrer, mas você vai PRIMEIRO.

O ataquei repentinamente, cortando seu braço, seu sangue preto e viscoso escorre, manchando a manga de sua blusa.

— Olha o que você fez? Estragou meu terno

Ele parecia realmente bravo, e logo me ataca de volta

— Me desculpe, eu compro outro para o seu enterro.

— Acha mesmo que pode me vencer? É mas tolo que o meu sobrinho.

— Não fale assim de Petter, seu demônio sujo, ele é melhor que você.

— Oh! Fiquei magoado — Comenta sorrindo.

O tinir das nossas espadas dava para ser ouvido de longe, a luta se mantinha asserrada, até Boutrix, desviar de meu ataque, e com sua espada, cortar um pouco da minha face, logo em seguida, ele me chuta, me encurralando a uma árvore, com sua espada em meu pescoço.

— Foi divertido escolhido — Fala apertando minhas bochechar — Você é realmente tudo o que dizem — Ele prova meu sangue com o dedo — Eu o conheci antes, e posso lhe assegurar, que você está bem mais bonito agora.

— Do que está falando? — Pergunto confuso.

— Ora, ora, você não sabe — Ele gargalha brevemente — Que situação embaraçosa. Acho que você deveria escolher melhor seus amigos, não sabe nem da metade do que escondem de você, Petter, e principalmente seu herói, o Itaxhak, ele é o pior de todos.

— Eu não acredito em você, não vai me envenenar contra meu amigos — Digo tentando me livrar.

— Não, não! Não faça isso, eu ainda não quero matá-lo. Se não acredita, porquê não pergunta a ele o que realmente aconteceu com seu pai.

Meus olhos se arregalaram em instantâneo, como ele poderia saber disso? Não, não pode ser, Derek não sabe de nada, ele não pode saber.

Só pode ser mentira desse demônio maldito.

— O que foi? Está com medo de saber a verdade? Mais cedo ou mais tarde, você vira a mim, se quiser saber a verdade sobre a tua vida, é só dizer "Meu demônio" e eu virei correndo ao teu encontro.

Ele não esperou eu responder, sumiu repentinamente no ar, levando o livro consigo; mas isso não me importava, Boutrix conseguiu confundir minha mente, e me fazer duvidar de todos. 

Me mantive pensativo, sentado ao chão, ainda escorado aquela árvore por alguns longos segundos com a espada em mãos, até que um portal branco se abre do nada, e mesmo não sabendo como nem porquê, eu sabia exatamente o que era; então levei a espada até ele, a guardando lá, para que ficasse segura, até que eu precisasse dela novamente. E ainda pensativo, nem percebo os gritos de todos a me chamarem. Minha bochecha direita ainda sangrava, o corte havia sido um pouco profundo, o sangue escorria e manchava toda minha blusa branca.

Eu ainda estava no mesmo lugar quando ele apareceu, tentando estancar o sangue com sua própria blusa.

— JIMMY! Meus Deus você está bem? — Derek se espantar ao me encontrar — Ele está aqui! — Grita aos outros

Petter surge correndo, com olhos arregalados, ele não diz nada por alguns segundos. Mas logo se abaixa, me encarando, com olhos duvidosos

— Eu estou bem, não se preocupe.

Ele sorri levemente

— Não precisa se fingir de forte para mim, você está horrível — Ambos rimos — Vamos, temos que cuidar disso o mais rápido possível.

— Ele está certo, temos que nos preparar, agora que Boutrix está a solta — Bermac alerta.

Ao voltarmos, ficara decidido, que Leon e eu iríamos primeiro, Petter desaprovou a ideia mas aceitou, logo seguidos dele e do Bermac.

Já na Torre, nosso estado causou um certo pânico geral, todos queriam saber o que houve, e Leon se propôs a contar, enquanto nos subíamos. Já no escritório, todos nos aguardavam, apesar do espanto, não havia tempo para explicações, na outra sala, apenas eu, Petter e Derek adentramos.

Eu ainda estava com o mesmo pijama da noite passada, completamente manchado pelo meu sangue; então sem esperar, retirei minha blusa, e mesmo de costas, dava para sentir os olhos saltados de Petter para cima de mim.

— O que foi? — Disse me virando para olhá-lo.

— A-a n-nada — Ele responde cruzando os braços e virando para o lado.

Derek se aproxima, para cuidar dos meus ferimentos, e escorado em uma mesa me mantenho com ele a minha frente. Com um pano molhado, ele começa a limpar o ferimento em minha face.

— É um ferimento simples, eu posso curá-lo. — Disse com um largo sorriso

— Precisa ficar tão perto assim? — Petter comenta ríspido

Derek apenas sorri.

— Petter, não é hora para isso.

Após limpar o ferimento, não demorou muito até ele estar totalmente curado, restando apenas uma cicatriz. E logo Derek partiu, nos deixando a sós, e com um clima pesado no ar, um clima estranho que ninguém sabia dizer de onde viera.

— Como você está? E não me diga que está bem, eu vejo no seus olhos que é mentira — Diz me abraçando forte.

— É claro que eu não estou bem, tanta coisa de uma única vez, eu nem tive tempo de trocar de roupa ainda.

Petter sorri malicioso.

— Acho que eu posso te ajudar com isso.

Ele me beija repentinamente, segurando em minha cintura com uma mão, enquanto a outra, deslizava pela pele do meu rosto.

— Para, eu ainda estou todo sujo de sangue — Ambos rimos

— Eu não me importo.

Ele sorria e me beijava ao mesmo tempo, deslizava suas mãos pelos fios dos meus cabelos, e logo para, da um último beijo demorado em minha testa, e fala em seguida.

— Vamos, eu vou pegar uma roupa para você.

Nós saímos de mãos dadas, até um pequeno quarto a esquerda dali; o interior da torre era maior do que eu pensava.

— É aqui que você dorme? — Perguntei olhando pelos cantos

— Não, é aqui que nós dormimos — Ele responde com um largo sorriso

Logo pega uma de suas roupas, e me entrega; e como esperado, aparentavam serem muito maiores que eu.

— Ah! Meu Deus, você ficou tão fofo — Diz sorrindo bobo.

— Não tem a menor graça, isso parece um vestido.

— Meu amor, você está tão lindo.

— Eu não posso sair por aí desse jeito Petter

Essa situação me deixou indignado

— Não mesmo, eu jamais permitiria, você só vai ficar assim comigo — Ele sorri antes de continuar — Deve ter algo que te sirva.

Ficamos quase uma hora atrás de uma roupa que coubesse em mim, até finalmente encontrarmos; e logo saímos, pois haviam muitas coisas a serem resolvidas ainda.

Derek e os outros conversavam, e quando perceberam nossa presença, Derek virou sua atenção para mim, e falou

— Agora que já está pronto, preciso te falar algumas coisas, não temos muito tempo, você precisa saber sobre a profecia, e aprender a ler as escrituras.

— Do que está falando agora? Que escrituras

— Precisamos ir a Oldport o mais rápido possível, procurar a Catedral Santa Shell, e falar com o guardião da profecia, ele vai lhe contar tudo

— Oldport? — Todos falam juntos.

— Oldport!

E mais uma vez, íamos nós, de volta a Oldport, procurar um desconhecido que ninguém sabe se ainda vive, em busca de uma suposta profecia a qual fora imposta a minha vida; e toda essa situação, me fazia lembrar das coisas que Boutrix dissera outrora.

Será mesmo que Derek tem algo haver com a morte de meu pai? O que será que ele esconde? Isso não seria possível, não é? Quer dizer, ele não faria isso. E Petter, o que ele estaria escondendo de mim?

Muitas dúvidas ficavam no ar, e apesar de eu não querer acreditar no demônio, não conseguia evitar, a dúvida só crescia toda vez que eu olhava os rostos sereno dos dois, sempre parecia ter algo a mais, ou era apenas um complexo meu.

Fosse o que fosse, nos iríamos para Oldport de qualquer jeito; e a essa altura, eu já não ouvia nada que Derek dizia

— Jimmy? Jimmy? Você ouviu o que eu disse?

— O que? Me desculpa, eu ouvi sim, Oldport, não é? Eu entendi, me avise quando for a hora — Terminei saindo do local sem falar mais nada.

Voltei novamente ao quarto, passando a mão nos cabelos, suspirei pesado ainda pensando no que o demônio disse. Eu deveria mesmo ir até ele? Deve ser uma armadilha, mas, eu não consigo ficar em paz com essa maldita dúvida só aumentando.

— Hey, o que aconteceu? — Petter chega me abraçando por trás.

— Não é nada.

— Qual é, eu percebi que você ficou inquieto desde que lutou com aquele demônio. O que aconteceu lá?

— Nada, nos só lutamos e eu perdi.

— Não precisa ficar bravo só por causa disso, eu já perdi muitas vezes, você mesmo já me deu uma surra umas duas vezes — Sorriu se lembrando do fato.

— Obrigado — Sorrio de volta.

Oldport, Catedral Santa Shell

O céu estava nublado, o clima se mantinha tenebroso e pesado, e adentrando rapidamente a Catedral, o padre Autero caminha por entre o corredor mal iluminado em direção ao confessionário, se arruma sem ligar para quem estava do outro lado, e logo ouve uma voz familiar.

— Perdoe-me padre, pois eu pequei.

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