_ O que significa a palavra retardado? (Eu fazia a apostila de língua portuguesa, mas minha cabeça só pensava nessa palavra problemática).
_ Tem essa palavra escrita na apostila? (O tutor dizia surpreso com aquela palavra).
_ N-não! Eu aprendi essa palavra com alguns colegas, mas penso que o significado dela, não é o mesmo que eu achei que fosse! (Eu dizia curioso para o meu tutor).
_ E o que você acha que significa? (O tutor não era igual Ahana, ele não me obrigava a falar em português, nem essas coisas todas o tempo todo).
_ Uma pessoa excêntrica! Excepcional.. sabe, uma pessoa diferente, mais um diferente bom! Agora eu penso, que essa palavra não tem um significado bom, eu fiz uma pessoa ficar com raiva de mim, por causa desta palavra! (Eu o encarava confuso).
_ Não é uma palavra muito boa mesmo de dizer a alguém! É uma palavra rude, ofensiva, ela acaba com a autoestima de alguém! (O tutor dizia a mim tão sério, e eu me sentia horrível com aquilo).
_ Qual o significado dela? (Não podia evitar, eu tinha que saber o que ela significava).
_ Deficiente intelectual! É um termo ofensivo, não deve ser usado! (Ele falou tão sério e eu senti nojo de mim).
_ Cac, an raibh orm é sin a insint dó? Screed mé suas, cad é an fuck! Na idiots sin, thug siad orm é sin a rá leis! I dtigh diabhail! _ Merda, eu disse isso a ele? Eu gritei essa porra para todo mundo! Esses idiotas, eles me fizeram dizer isso para ele! Vão para a casa do diabo! (Eu fiquei muito irritado com aquilo, meu rosto ficou franzido e um fervor queimou sentir de mim, eu iria resolver isso, independente de quanto tempo levaria).
Nisso peguei a apostila e comecei a ler, todas as palavras que aqueles idiotas me falaram, que os faziam rir, eu comecei a pesquisar o significado. E depois de tudo aquilo, e a minha insistência em aprender as concordâncias, e as regras daquela língua, me senti na obrigação de conversar com ele novamente, eu sabia que podia não ter uma resposta, mas eu tinha a necessidade de consertar a minha borrada de tê-lo ofendido e o fazer infeliz por todo aquele tempo que o xingava.
Na aula eu o via riscando seu caderno quieto, seu rosto sempre era neutro, parecia que ele não ligava para nada, às vezes o seu rosto pálido e neutro modificava e era nesse momento que meu corpo o correspondia de forma errônea, eu me excitava ao olhá-lo sorrindo levemente para o nada, suas bochechas ficavam rosadas e seus olhos esbugalhados fechavam levemente os deixando entre aberto e isso me fazia sentir coisas estranhas, um frio na barriga, uma felicidade tosca, mesmo sem ser tocado.
Ele fazia um movimento com os lábios, que me deixava louco, era bem simples, não era vulgar, ele simplesmente fazia um biquinho ou mordia o lápis fazendo um olhar distante e misterioso, um olhar inocente e fofo, que me fazia querê-lo.
Para piorar minha situação, Murilo me ignorava, mesmo eu pedindo desculpas por mensagens, ele não me respondia, então eu escrevia cartas de forma tradicional, mas eu também não tinha respostas, era complicado sabe o que ele pensava, eu não entendia o seu rosto que sempre era descontraído e sem emoção, ou às vezes sério demais quando ele mastigava o seu lápis fazendo alguma coisa e se assustava quando a professora batia na mesa o chamando, e ele não a respondia, Murilo era um pouco desengonçado também, eu já havia percebido que ele bateu muito nos objetos enquanto anda, talvez isso explicasse os seus pequenos hematomas nos braços e nos dedos que ele sempre colocava esparadrapos para não roer as unhas, o mais estranho que ele apareceu de um dia para o outro com o cabelo completamente esquisito, parecia que grudaram chicletes em seus cabelos e o próprio reitou com a tesoura, pois os seus cabelos negros escorridos estavam repicados e para cima, e o seu estilo de roupa, apesar de ser bem parecido com antigo, havia mudado, agora ele usava algumas camisetas de bandas punks por baixo da sua blusa de praia, e isso me incomoda leva de qualquer forma, já que não havia praia naquela cidade e ele teimava em usar uma roupa contrária as situações do seu cotidiano.
Eu sempre buscava uma forma de recompensá-lo, por minha maneira inconveniente e vulgar de tentar ser seu amigo, mas nada o fazia me olhar ou me corresponder, tudo era em vão, Murilo era impermeável e isso me afligia, já havia meses que mal nós comunicamos, eu só conseguia falar algumas vezes e mesmo assim não era um diálogo complexo ou envolvente, e talvez a sua negação a mim, me fazia sentir algo nele, eu estava delirando olhando aquele pequeno bochechudo, ou estava confuso por Henry e queria compará-lo em Murilo, mas eu não acreditava que seria a segunda opção, desde a primeira vez que o vi, eu senti algo inexplicável, inesperado, algo estranho que não havia acontecido comigo antes, nem quando Henry me beijava ou me esfregava eu sentia o que estava sentindo só de o olhar de longe.
Aí eu tive uma ideia, como Murilo sempre tinha uma rotina regular, eu usei aquilo a meu favor, no intervalo, ele sempre entrava na fila do lanche, posteriormente, sentava no mesmo banco e comia lá todos os dias sem exceção, quando Murilo acabava de lanchar, ele colocava o prato sobre a mesa, depois ia ao banheiro com o seu celular tocando o alarme sem parar e ele se limpava, só depois de limpo que ele desliga a o celular e voltava ao mesmo banco e ficava lá olhando o nada, até o intervalo terminar.
Ele sempre ficava sozinho, foi aí que eu fui até lá no seu banco e o encarei sério e o cutuquei, tentando pedir perdão e oferecer batatas, só que quando ele me encarou, Murilo parecia assustado, nisso eu tentei o seduzir com meu olhar sério lhe mostrando as batatas, o intimidando e o seduzindo com o meu olhar, quem sabe ele me notaria. Só que ao invés dele me olhar atraído, Murilo simplesmente levantou as mãos e fechou os olhos, e depois de alguns segundos o encarando confuso, ele abriu os olhos e aos poucos abaixou as mãos e se encolheu, quando eu sentei do seu lado e tentei o aproximar de mim com minhas batatas na mão lhe chamando atenção, eu via que ele gostava de comer!
_ Eu acho você excepcional, elegante, bonito, sedutor, grrrrraaaaaaauuuuu! Adoro-te! Perdoe-me, Murilo! Batatas, você quer? São as que mais gosto do mercado! (Eu grunhi para ele e o abracei firme, sorrindo tentando ser seu amigo novamente, eu já havia visto algumas garotas fazerem isso em outras, e alguns garotos chutando os outros como forma de amizade, como eu não queria o machucar, eu o abracei e sem querer o encostando, acabei deslizando minhas levemente em suas costas até certo ponto, no qual não deveria descer mais, eu não sei o que deu em mim em tentar encostá-lo).
_ Annn... É tudo que tenho! Por favor, só não me bate no rosto! (Ele me deu o seu dinheiro e cobriu o rosto, eu achei aquilo encantador e engraçado, eu não o entendia se ele sentiu vergonha, pois ficou muito esquisito e trêmulo).
Ele tinha um jeito tão peculiar de ser, eu o adoro, mesmo quando Murilo agia de forma estranha e desatenta, e como ele havia me dado o seu dinheiro e feito aquele gesto estranho, eu peguei a grana e o abracei novamente e sorri, acho que ele havia aceitado meu pedido de desculpas.
_ Eu quero dar presente para ti! Comprarei um, para ti bem bonito e trarei a você! Somos amigos!(Eu dizia batendo em seu braço, feito os garotos do futebol, éramos amigos novamente e iria fazer de tudo para não desentendermos de novo).
_ Dói! (Ele mexia tampando o rosto e se encolhendo, como Murilo era tímido, sua mãe deveria ver que ele era acanhado demais e comia seus dedos).
_ Os seus dedos estão melhores? (Peguei em uma de suas mãos destampando parte do seu rosto, e vi que ele fechava os olhos fazendo aquilo, era estranho).
_ Eu não tenho dinheiro, eu juro! (Ele era muito doido e engraçado, Murilo não dizia coisas com contexto, ele falava coisas soltas e isso era intrigante).
_ Seus dedos, parecem estar inchados! Sua mãe viu isso? (Alisei a sua mão e finalmente ele me olhou nos olhos).
_ Eu fechei a porta da minha casa na minha mão, eu estava olhando para a televisão enquanto varria a casa e fechava a porta, eu me distrai com a televisão e bati a porta nos meus dedos, ele doem ainda! Eu não consigo fechá-los! Você já machucou os dedos assim? Dói demais, eu quase chorei quando senti ela batendo com força nos meus dedos, se o meu avô estivesse visto ele iria rir de mim e me obrigaria a tocar com os dedos enfaixados, porquê meu avô é muito louco e velho! Um dia ele estava tocando com os seus amigos velhos que antes eram novos, e ele acabou fazendo o meu pai com os seus dedos! Meu avô é muito louco, quem faz filhos com os dedos? (Eu realmente não o compreendia).
_ E-eu não sei! (Eu ri sem graça, ele falava rápido demais, ele dizia coisas sem nexo, e parecia se perder em suas histórias e linhas de raciocínio, eu gostava muito dos seus delírios, mas eu gostaria de saber como ele era, quando parava de criar cenários e ficasse normal, eu ainda não havia visto ele agindo normalmente feito os outros, talvez isso que me fazia sentir interessar nele.
E conversando com Murilo durante o intervalo, o sinal tocou e fomos para a sala, aquele garoto era tão pálido, falador e ao mesmo tempo tímido, deveria ser por isso que não tinha muitos amigos na escola, então eu fazia questão de ficar do seu lado, para que ele não se sentisse sozinho e mexia um pouco para descobrir seus pontos sensíveis e ver se ele gostava de mim como eu gostava dele, eu queria que fossemos amigos igual o primeiro dia da minha aula, eu gostei tanto de me comunicar com ele e da sua paciência em falar os nomes dos objetos para mim.
Eu queria entendê-lo, só que era tão complicado saber o que se passava em sua cabeça, ao mesmo tempo que estávamos juntos, ele parecia estar distante do mundo, e isso me incomodava, porquê por algum motivo, aquele garoto esquisito me atraía, sem ao menos me tocar, me olhar, me seduzir ou fazer qualquer tipo de coisa, aquele garoto era completamente diferente de Henry!
_ Está disperso novamente! A mestra pode brigar, ao lhe ver postergar a aula! (Eu dizia isso, enquanto ele abaixou a cabeça a escondendo, quando a professora de português chegou tirando os seus pertences de dentro da bolsa).
_ Postergar? O que é isso? (Foi a primeira vez, que ele parecia se interessar em algo que eu o dizia).
_ Ann... eu acredito que enrolar! Enrolar para estudar! (Eu não sabia fazer as concordâncias direito, mas já sabia falar pequenas frases corretamente).
_ Meu pai enrolava cigarro quando me trazia para escola e fumava escondido! Ele não gostava que eu visse ele fumando, mas eu sabia que ele fumava! Ele pensava que eu não prestava atenção nele, mas ele era o único que eu tentava não perder o foco, antes da minha mãe o fazer ir embora! Se a minha mãe não tivesse o feito quase se suicidar de novos talvez ele e o Hugo estivessem morando com a gente ainda, é muito injusto Hugo ficar o tempo todo com meu pai e meu avô, e eu poder os vê-los somente nos fins de semana! Foi horrível quando meu pai foi embora e nos levou juntos e depois a minha mãe me tirou dele com aquele papel esquisito na mão, falando que ele não tinha condições mentais de cuidar da gente, por ser depressivo e suicida! (Murilo dizia com a cabeça deitada na mesa e parecia estar em outro mundo).
_ O seu pai foi embora? (Eu não entendi muito bem o que ele disse, pois ele sussurrou muito rápido).
Aí ele olhou para mim cabisbaixo e
acenou a cabeça afirmando o que ele tinha dito, depois eu notei que ele sempre riscava algo com cigarro na mão, e eu o encarando, fiquei pensando em quem seria o meu pai verdadeiro? Eu sabia que minha mãe tinha morrido, mas para se ter uma criança é preciso de duas pessoas do sexo diferente para gerar uma criança, Henry me ensinou aquilo, então quem era o meu pai?
Depois da fala de Murilo, eu o deixei quieto e fiquei pensativo o resto da aula, eu também não sabia quem era a minha mãe de fato, nem o que ela fazia, nem como ela morreu, eu já tinha 14 anos e não fazia ideia de quem eram os meus pais biológicos e nem o que faziam, eu queria saber isso também, eu gostava muito de meus pais, mas eu também queria saber da minha origem e do porquê meu pai me deixou no orfanato e não quis saber de mim.
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Atualizado até capítulo 71
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