Capítulo 09

Notei que o álcool ainda estava me afetando quando saí da banheira rapidamente e quase caindo peguei um roupão que havia alí. Na ponta dos pés fui até a porta do quarto para tentar ouvir a conversa, mas como a porta estava entreaberta pude ver Rafaela e Hanna sentadas no sofá. A irmã mais nova parecia chorar, algo estava errado, mas não era da minha conta.

— Será que estou ficando paranóica em relação a Mari? — murmurei olhando para o nada. Logo depois bocejei lembrando o sono que estava sentindo e aquela cama aparentemente confortável me chamou.

Deitei e dormi na mesma hora. Quando voltei a acordar sentia um incomodo em meu braço esquerdo, abri os olhos e me deparei com a visão de Rafaela dormindo bem próximo. O incomodo na verdade era o braço dela por cima do meu corpo, algo que me fez sorrir voltando a fechar o olhos aproveitando que aparentemente ainda era noite. Me concentrei na respiração dela até adormecer novamente.

A claridade que atravessava a cortina me fez despertar naquela manhã de domingo. Tentei abrir os olhos, mas uma chuva de lembranças veio como um golpe certeiro em minha cabeça. Cada palavra e ação do dia anterior me parecia um verdadeiro desastre.

Estava sozinha na cama, mas o cheiro nos travesseiros era inconfundível e isso me fez sorrir aproveitando um pouco mais, esquecendo completamente o que aconteceu no dia anterior. Nada poderia ser apagado e não tinha como voltar atrás, então só me restava lidar com as consequências.

Depois de um tempo entrei no banheiro para tentar melhorar minha situação e após um banho vesti minha roupa, tentando encontrar coragem para sair daquele quarto.

O apartamento estava silencioso até ouvir a voz vinda de uma direção que parecia ser a cozinha. Segui o som e após encontrar a cozinha vazia, notei que havia uma porta de onde vinha a voz de Rafaela. Me perguntei se deveria ou não me aproximar, mas ela apareceu antes.

— Sim, preciso para segunda... — falava ao telefone e parou ao me ver de pé em sua frente. — Certo, espero que esteja aqui nessa hora exata.

Continuou falando, mas mantendo os olhos em mim que apoiando o corpo no balcão desviei o olhar.

— Olha o café chegando! — anunciou Hanna entrando na cozinha com várias sacolas e sorriu quando me viu. — Bom dia, Gi!

— Bom dia — murmurei sem graça.

— Bem na hora — falou Rafaela desligando o celular. — Eu sei que você está louca para sair correndo, mas antes vai ter que tomar café com a gente.

Bom, quem era eu para recusar?

O que começou meio constrangedor acabou se tornando um momento agradável. Esclarecemos primeiro que era preciso evitar os assuntos minha bebedeira e o fato de Hanna ter brigado com o marido, assim comemos os pães e bolo como se não ouvesse amanhã. Literalmente éramos três gulosas tagarelas que não se davam conta do quanto haviam comido até que buscassem alimento e não mais encontrasse.

— Gente eu juro comi dois pedaços de bolo, só isso! Vocês são as gulosas aqui. — Apontou Rafaela.

— Rafaela você comeu quatro pedaços de bolo e três desses pãezinhos — delatei e ela me fuzilou.

— Eu me preocupei tanto com as duas ontem que acabei esquecendo de jantar, preciso ser perdoada. Descontei tudo nesse café da manhã. Agora preciso de umas horas de academia...

— Ai não vem com essa de comi um bolo preciso malhar pra perder caloria, você é gostosa de qualquer jeito Rafaela! — falou Hanna.

— Põe gostosa nisso — comentei pegando a xícara de café e notei os dois pares de olhos focados em mim. — O quê? Estou mentindo?

— Opa, desculpa se atrapalhei o casalzinho assumido ao ponto de trocarem elogios descaradamente.

— É bom que mantenha a língua dentro da boca, ok irmãzinha — alertou Rafaela. — A Giulia é mais difícil do que parece.

— Eu? Tem certeza? — questionei largando a xícara, coloquei os cotovelos sobre a mesa para apoiar o queixo nas mãos enquanto a encarava.

— Não venha dizer que sou eu... — Rafaela foi interrompida por Hanna pigarreando.

— Com licença, vou deixar vocês a sós para continuar essa DR matinal.

Eu e Rafaela sorrimos observando a outra sair, mas ao invés de continuar aquela conversa sem sentido, decidimos lavar a louça. Ela lavando e eu secando enquanto ouvia sobre os planos para a festa da agência.

Nossos assuntos eram bem aleatórios, surgiam do nada, coisa que nunca imaginei antes. Se me contassem que um dia estaria naquela cozinha, tendo algum tipo de assunto e vontade de ficar conversando com aquela mal educada que esbarrou em mim no Starbucks, eu não acreditaria. Ao meu ver éramos bem diferentes. Sem contar no fato dela ser CEO da agência.

Meu Deus, isso pra mim ainda é muito estranho.

— No quê está pensando? — perguntou enquanto dirigia em direção a minha casa.

Quando terminamos com a louça vi que haviam várias ligações perdidas, era minha mãe e como ao retornar ela não atendeu decidi ir embora logo, mas claro que Rafaela se ofereceu para me levar e por mais que tenha recusado, lá estavamos nós.

— Você costuma ir pra cama com as garotas da agência? — Soltei aquilo enquanto observava o trânsito lá fora, evitando olhar para ela

— Que pergunta é essa? — Rafaela riu com gosto.

— É sério. — Olhei para ela que parou no sinal no mesmo momento e me encarou.

— Lógico que não. — Senti seu toque em minha coxa seguido de um leve aperto. — Desculpa por ontem, a Hanna chegou e...

— Não tem que pedir desculpa, eu quem devo agradecer por ter me aturado. — Sorri sem graça.

— Não foi nenhum sacrifício — pronunciou aquela velha frase, voltando sua atenção para a pista. — Durante essa semana vou passar uns dias fora, me avisa se a Mari causar problemas.

— Meus assuntos com ela na agência não tem nada a ver com você, ok? — alertei.

Ficamos em silêncio, mas logo ri.

— O que foi? — questionou com rugas na testa.

— Eu não tenho medo do perigo não é? — Novamente ri. — Mas é que o fato de saber que você quem manda é... excitante — confessei.

— Bom saber... — Seu tom e olhar eram suficientes para me fazer desejar pular encima dela alí mesmo, mas Rafaela parou o carro e para minha surpresa já estávamos diante de minha casa. — Bom, é aqui que nos despedimos.

— Para onde vai essa semana?

— Fui convidada a participar de um evento da revista Work It.

— Sério? Essa revista é bem conhecida, isso é incrível — falei toda animada, mas parei quando percebi a forma que ela me olhava. — O que foi?

— Nada. — Deu de ombros, mas insisti que falasse o que se passava naquela cabeça. — Depois conversamos.

Naquele momento segui o olhar dela e vi que minha mãe e Mauro saíam da casa dele carregando algumas mudas para o jardim que haviam começado recentemente. Os dois encararam o carro e ao notar minha mãe claramente tensa, rapidamente saí do veículo.

— Bom dia! — falei forçando um sorriso na direção de Mauro, logo depois me inclinei para ver Rafaela pela janela. — Obrigada pela carona, diz a Hanna que mandei um beijo.

Praticamente corri para dentro de casa na tentativa de evitar qualquer mal entendido. Meu lance com a Rafaela estava seguindo por caminhos incertos, nós não sabíamos no que ia dar então não havia motivo para preocupações, mas eu não queria problema nem para nós, nem para minha mãe. Pelo menos não por enquanto.

Só depois percebi que exagerei um pouco e nem me despedi direito da Rafaela. Por sorte não demorei a perceber que ela havia mandando mensagem, provavelmente nem havia chegado em casa ainda.

...Rafaela: Você saiu fugindo, queria ter dado ao menos um beijo... Tenha em mente que agora está em dívida comigo. 11:27 AM...

...Giulia: Agi por impulso e me arrependi porque agora necessito desse beijo.11:28 AM...

...Rafaela: A Hanna ainda está aqui na bad então vou tentar animar um pouco ela hoje, mas você pode se redimir amanhã, antes de minha viagem vou passar na agência. 11:30 AM...

...Giulia: Na agência? Não acha meio arriscado? 11:31 AM...

...Rafaela: E por sinal ainda melhor. 11:31 AM...

...Giulia: Ai ai ai Bianchi, você... 11:35 AM...

...Rafaela: Está com medo, Giulia? 11:41 AM...

...Giulia: Não, não! Acho que vale o risco... 11:42 AM ...

Terminei de responder a mensagem dela e notei que haviam outras duas conversas. Uma era Jéssica perguntando sobre meu estado atual e respondi sem dar muitos detalhes. A outra era Mari, então relutei em abrir a conversa, mas quando o fiz vi que era um convite para encontrá-la naquela mesma noite.

Ok, dessa vez não é coisa da minha cabeça. O que diabos a Mari quer comigo?

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