Assim que coloco meu pé no saguão do prédio eu respiro fundo e deixo Noa em um canto da minha mente. Estou gostando do jogo de flerte que estamos fazendo, e embora eu não tenha muita confiança ainda em mim e nessa coisa toda, acho que pode ser algo bom. Ele me olha com vontade, sabe? E é bom ser olhada assim, ser tratada diferente. Não parece ter mais ninguém na vida dele e Webster parece ser um homem centrado e sem nenhuma questão mal resolvida.
Então acho que não estou me enganando por uma terceira vez consecutiva.
Mas enfim, preciso me manter concentrada. Quero muito me sair bem nessa entrevista.
Ajeito meu vestido preto de oxford e respiro fundo quando chego ao sexto andar. É um editorial de moda importante, que tem uma presença forte nas mídias sociais, e que continua vendendo tiragens excelentes nas bancas, o que hoje em dia é algo raro.
Me apresento pra moça da recepção.
- Bom dia! Eu sou Alex Jhonson, vim para a entrevista ao cargo de assistente de redação.
Ela abre um sorriso pra mim.
- Bom dia Alex, eu sou Carly Frost. Seja muito bem vida, você pode seguir por esse corredor a direita e virar a primeira a esquerda. Vai encontrar algumas pessoas esperando já.
Agradeço e sigo pelo caminho indicado por ela.
Encontro algumas mulheres jovens como eu sentadas em cadeiras, me acomodo em uma e o tempo vai passando. Quando a penúltima garota sai, eu entro na sala pra fechar o dia de entrevistas.
Me deparo com um homem de meia idade, com uma barba cerrada, cabelo cortado bem baixo, bem vestido com um terno cinza acetinado e cheiroso. Ele abre um sorriso pra mim e seus olhos pretos são acolhedores. Abro um sorriso de volta e me sento reparando na argolinha cravejada de diamantes, com um pingente de cruz, que ele tem na orelha direita.
Ele olha no relógio.
- Já passamos do meio dia, então tenho que te dar boa tarde. Você é?
Estendo a mão pra ele em um aperto firme pra demonstrar segurança.
- Sou Alex Jhonson.
- Bom Alex, eu sou Lucas Leyman.
O homem me avalia por uns instantes e depois me pergunta se eu trouxe um currículo. Entrego a ele o envelope de papel pardo e aguardo que me diga algumas coisa.
- Hum, aqui diz que você é fluente em quatro línguas. De onde veio esse interesse todo por outros idiomas?
Ah, é sério essa pergunta?
O que vou dizer?
" Não, é que eu passei pouco mais de cinco anos em um relacionamento péssimo com um traficante de armas e drogas, e ele me obrigou a isso."
Abro um sorriso pra Lucas.
- Adoro culturas diferentes, fiz questão de aprender bastante coisa por aí antes de me formar em jornalismo.
Ele dá mais uma olhada no meu currículo.
- Você teve aulas com uma professora da Pierrefeu? Tipo, uma que veio lá da Suíça, e te ensinou particularmente?
É, e que aquele miserável teve um caso bem debaixo do mesmo teto em que eu morava. Eu ouvia os dois tr*ns*ndo. E ela ainda queria fazer com ele sem proteção, mas Will não era burro a esse ponto, sempre negava. Não tinha controle dela como tinha sobre mim, não podia arriscar. Ele não suportava crianças.
- É, tive acesso a uma boa educação em todas as áreas e aproveitei cada minuto. Tenho total consciência de que as coisas que pude ter não são comuns por aí.
Lucas deixa o papel na mesa e apoia os cotovelos na mesa juntando as mãos em frente ao rosto.
- E viagens internacionais? Se você tiver que ir na semana de moda em Paris por exemplo? Vai saber se virar?
Se eu tiver que fazer isso trabalhando aqui acho que eu vou surtar de novo. Isso sim!
- Já fui algumas vezes lá. Sei inclusive que a Sèvres é a melhor rua de moda daquela cidade.
Sei também que um banqueiro famoso de lá, que tem cara de bonzinho e é conhecido por seus atos de filantropia, é o maior filho da p*ta financiador de guerras por aí. Ele lucra alto com mineração em lugares devastados por confrontos, ninguém liga pra gente esquecida em lugares bombardeados, e ele pode ir lá e fazer o que bem entender. Então muitas vezes acaba colocando dinheiro na mão de rebeldes. Era amigo de Will, e os dois ficavam horas conversando sobre essas merdas, enquanto eu e a esposa dele tínhamos que pagar de bonequinhas de porcelana. Ela é quarenta anos mais nova do que ele e vivia me dizendo que sonhava com o dia que aquele velho babão ia infartar. Tenho fé em Deus que um dia vou ter essa notícia de que Anelise está viúva, vou fazer questão de dar um jeito de entrar em contato, pra nós duas comermos caviar e beber champagne juntas, comemorando a morte daqueles dois d*sgr*ç*dos.
Volto o foco para a entrevista.
Lucas suspira de maneira teatral.
- Uhum, e faz um rombo no meu cartão de crédito todos os anos na alta temporada. Pra quais países mais você foi, minha querida?
Olho pra cima tentando lembrar dos lugares que fui com Will.
- Hãn... Inglaterra, Marrocos, na própria Suíça, Cuba, Brasil, México, Holanda, Nepal, Belize que é fantástico, Omã e o último foi Alemanha, nas montanhas.
Todos lugares com a pior escória imaginável, mas muito lindos também.
- Ah que ótimo! Uma mulher jovem, bem instruída, com etiqueta profissional suíça e viajada. Vamos dar uma volta comigo pela redação querida, você vai conhecer seu novo ambiente de trabalho.
Ah, eu nem acredito! Pelo menos pra alguma coisa aquele miserável prestou!
Me deu a oportunidade de um currículo decente.
Abro um sorriso pra Lucas e o acompanho pelos corredores.
Dou uma boa olhada nas pessoas ao redor, todas muito bem vestidas, com roupas caras. O pessoal aqui respira moda.
💭 É Alex, você vai ter que mexer nos seus rendimentos e ir na bendita Quinta Avenida se não quiser passar vergonha aqui💭
Ele vai me explicando onde é o quê e para em frente a uma grande sala com varias amostras de tecidos.
- Isso aqui Alex se chama sala de giro. A cada estação os tecidos mudam, nós colocamos aqui tudo que é tendência. Cores, estampas, texturas, cortes nos manequins e etc. Tudo pra ser material de escrita de matérias. Os redatores precisam ver como cada tecido e tendência são na prática, antes de escrever. Com o tempo você vai aprender que as cores, por mais parecidas a primeira vista que sejam, são completamente diferentes, e que um tom na escala pode mudar completamente um visual inteiro. Está tudo nos detalhes.
Dou uma conferida dentro da sala e vejo duas pessoas mexendo em alguns tecidos.
Nós andamos mais um pouco enquanto ele continua falando.
- Por mais que uma pessoa não seja ligada em moda, e que até mesmo diga que é absolutamente contra esse mercado, todo mundo acaba envolto nela. O que muita gente não sabe é que tudo que elas compram por aí, absolutamente tudo, até a roupa mais cafona que você possa imaginar, foi porque alguém, com uma certa influência, lançou a moda. Por isso não é raro que a gente veja um bando de gente desmiolada por aí, vestindo igual as merdas que qualquer subcelebridade apareça usando.
Seguro a risada. Ele tem razão, é cada coisa horrorosa que esse pessoal inventa.
- Existem coleções inteiras em lojas de departamento baseadas em alta moda das passarelas. Moda, aquela cara, que vira burburinho pelo mundo a fora na mídia, e que você vê as pessoas ignorantes metendo o pau nas redes sociais porque não agrada aos olhos delas, é conceito. Quando você senta o bumbum numa cadeira pra acompanhar um desfile da Balenciaga, por exemplo, e vê aquele bando de gente tampada da cabeça aos pés, andando parecendo que estão pendurados em cabides, você está alí não pra admirar o desenho da roupa, que muitas vez é feia mesmo, você está alí pra admirar as tendências. Os tecidos, os tipos de corte, de caimento, as cores e até o jeito da costura. É isso que acaba sendo "coado" pela grande industria têxtil e que vai parar nas grandes massas. Por isso, até um suéter que foi produzido em larga escala e que você compra baratinho na Old Navy, tem muito de alta moda por trás.
Acho graça da retorcida de nariz que Lucas dá pra falar do nome da loja de departamentos, porque é uma das minhas preferidas, se não for a mais. Ele com certeza acha que é um crime aquela loja existir.
Me pergunta o que eu achei do ambiente.
- Achei ótimo! Ansiosa pra começar.
Nós paramos em frente a uma sala com duas mulheres e um homem trabalhando. É a sala do RH.
- Tom, você pode me dar uma ficha daquelas?
O homem se levanta e entrega a Lucas o que ele pediu, e ele me dá o papel.
- É essa a documentação que você tem que trazer até a sexta. Você começa na segunda.
Agradeço a ele e saio em busca de arrumar coisas decentes pra vestir no trabalho depois de almoçar em algum lugar.
Três horas depois, e alguns milhares de dólares a menos, que tive que tirar da minha carteira de investimentos, eu já tenho o suficiente pra mesclar com as coisas mais simples e ajeitadas do meu closet.
**********
Chego em casa e vou direto ao quarto de Sharon.
- Melhorou?
Ela faz um gesto de mais ou menos com a mão.
- Como foi a entrevista?
- Foi ótima! Estou empregada!
Ela dá um gritinho e eu digo que vou pedir alguma coisa pra gente comemorar.
- Pede pizza!
Dou uma travada na hora e ela percebe.
- Ah amiga, me desculpa.
Nego com a cabeça.
- Eu vou pedir, está na hora de deixar mais um trauma pra trás. Não posso passar o resto da vida sem pedir uma pizza em casa, com medo do tal do Egon vir do inferno pra entregar.
Faço a ligação e espero na sala, quando o porteiro anuncia que chegou, eu sinto um suor brotando nas minhas mãos.
💭 Respira fundo Alex💭
É isso que eu faço. Abro a porta com um sorriso no rosto e passo o cartão na máquina de um jeito controlado.
Assim que o entregador vai embora, eu fecho a porta e sinto o alívio percorrer meu corpo.
Acabei de vencer mais uma barreira no meu psicológico, Frank vai ficar feliz por mim.
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Atualizado até capítulo 62
Comments
Renascida das cinzas
Na moda, prefiro a ignorância mesmo. Acho totalmente desnecessário, absurdo, sem noção... desde os modelos aos preços absurdos. O que me intriga ainda é a cambada de boi que segue e paga as produções do surtado que cria aquelas loucuras horrendas!!!
2024-08-09
1
Renascida das cinzas
kkkk seria contratada na mesma hora... 😅🤭
2024-08-09
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Júlia Caires
isso só Alex, um passo de cada vez
2024-06-17
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