Noa parte 3

Tenho pensado em Alex com uma certa frequência, ela me fascina. Tenho curiosidade por ela também.

Já faz um mês que eu não a vejo, não sei se ainda estava viajando ou se voltou e não quer me ver. Ela não é de sair muito, eu sempre estou esbarrando com os vizinhos no elevador, mas com ela é raro. Encontrei só quando chegou aqui e no dia do bar.

Quero vê-la de novo, conversar mais e matar minha curiosidade.

Estou aéreo e só me dou conta disso quando Morgan grita comigo.

- OLHA VOCÊ DEIXANDO O OVO PASSAR!

Só aí que percebo que o ovo de pato que eu estava preparando virou carvão. O "passar" foi gentileza dele.

Luigi sai de perto da bancada das sobremesas e se aproxima de mim.

- Sai de perto desse fogão Noa, você tem dado prejuízo ultimamente. Nunca foi de queimar nada, mas nesse último mês tem andado no mundo da lua. O que foi?

Me afasto balançando a cabeça de olhos fechados e tentando organizar as idéias.

- Nada, acho que estou precisando de férias.

Meu amigo estreita os olhos pra mim.

- Vai querer mentir pra mim? Dá um tempo Webster, quem tem povoado a sua mente? Tá na cara que é mulher, e sou capaz de apostar que é a Alex.

Contei a ele que Paco e Martín são policiais, então ele parou de achar que Alex é envolvida com alguma coisa errada.

Dou uma risada e balanço a cabeça.

- Não é nada disso, só estou meio pensativo com algumas coisas.

Ele estreita os olhos pra mim.

Me afasto do fogão e vou em direção ao salão ver como o movimento está hoje.

Circulo pelas mesas e quando estou quase voltando pra cozinha, avisto minha mãe entrando no restaurante.

Minha mãe foi criada de maneira ortodoxa, mas fugiu completamente à regra por amor.

Ela é uma mulher linda e elegante, bem jovem pra ter filhos na idade que tem, e o tempo foi generoso com ela.

- Hum senhora Esther Webster, qual é o motivo da visita?

Dou uma abraço nela e nós dois andamos até o escritório juntos enquanto ela fala.

- Vim ver você e comer uma boa comida.

Abro um sorriso pra ela junto com a porta.

- E Luigi, está bem?

- Aquele arremedo de italiano está na cozinha, me expulsou de lá hoje porque não estou muito bom pra pilotar as panelas.

Minha mãe ri enquanto se senta na cadeira deixando a bolsa de grife do lado e eu me sento atrás da mesa.

- E como o aba está? Deu notícias?

Dona Esther abre um sorriso enorme pra falar do meu pai, os dois são apaixonados um pelo outro há pouco mais de trinta anos já.

- Disse que chega daqui dois dias, e que faz questão de sair do aeroporto e vir aqui comer uma comida decente.

Jogo minha cabeça pra trás rindo de maneira alta.

- Se os papuasis ouvem ele falando isso, qualquer chance de interação vai por água abaixo.

Meu aba é diplomata. Está em Papua-Nova Guiné.

- Ah, coitado meu amor. Ele só está cansado de comer peixe com arroz e tomar suco de palmeira.

Pergunto a ela sobre Rebeca, minha irmã.

- Chega com Austin na semana que vem.

- Estou morrendo de saudade de Ayla.

Minha sobrinha é a garota de dez anos mais inteligente que eu já vi na vida.

Minha irmã se casou cedo, mas bem cedo mesmo. Felizmente teve esse rompante de loucura com um bom homem, e estão juntos há onze anos já. Até hoje eu me pergunto o quão liberais meus pais são pra permitir que uma garota de dezenove se casasse assim com o namorado de faculdade em supetão.

Rebeca é completamente fora da casinha como a minha mãe. Se casou com dezenove, teve Ayla aos vinte, e disse que era pra quando fosse engatar no mundo dos negócios, a filha já estivesse pronta. Além é claro, de ter planos de ser uma "coroa enxuta" como mamãe. Mas o mais surpreendente é que ela levou Ayla em absolutamente todas as viagens para trabalho. Ela e o marido tem uma empresa juntos e eles viajavam bastante enquanto estavam se lançando no mercado, mas agora estão voltando das férias.

Minha mãe fica comigo até o almoço e depois vai apressada, dizendo que a maratona de beleza dela pra receber meu pai começa hoje.

*********

- Chegou tarde hoje. Vai querer jantar?

Assim que ponho os pés em casa Sabine vem falar comigo.

- Não, eu comi no restaurante já. Pode ir se recolher meu bem.

Sirvo uma dose de conhaque e me sento no sofá.

Inevitavelmente meu pensamento escorrega para uma certa loira do oitavo andar.

Ah, essa mulher tem me dominado e olha que eu quase não a vejo.

Mas vai ver que é por isso também, a expectativa é um tempero e tanto pra essas coisas. Talvez eu devesse distribuir meu foco para outras também, nunca tive dificuldade nisso, não vai ser agora.

Só que parece que Alex é teleguiada a aparecer nas horas certas. Me manda uma mensagem e eu mais que depressa, feito um cachorrinho, respondo.

📲 - Que bom que voltou. E não se preocupe, sua reserva está garantida, nem que eu tenha que expulsar alguém pra você entrar. Esse sábado?

Fico na expectativa mas ela me deixa no vácuo.

💭 Ah Noa, dá um tempo!💭

Tomo um banho e quando me jogo na cama me sinto frustrado. Quero me aproximar mais dela, mas Alex parece ser muito difícil.

Que ela é traumatizada com alguma coisa eu não tenho dúvidas, me lembro de Sharon falando que queriam matar ela, mas se fosse uma pessoa ruim não teria tanta proteção assim de policiais.

*********

Entro no elevador de volta da corrida na sexta de manhã e aproveito que não tem ninguém junto pra tirar a camiseta. Corri por mais de uma hora e meia e estou puro suor, mas eu precisava pegar pesado hoje pra distrair a mente. Tem os assuntos do restaurante que estão borbulhando com os preparativos pro Michelin, e tem ela...

A caixa de metal para no oitavo andar e ela aparece. Usando um vestido nude, até um pouco abaixo dos joelhos e mangas três quartos.

Alex se assusta comigo sem camisa, a noto momentaneamente interessada no meu abdômen.

Que ótimo!

Dou um sorriso de canto pra ela.

- Bom dia, esse aqui está subindo primeiro.

Ela pisca algumas vezes.

- Vou esperar pelo outro então. Tenha um bom dia, Noa.

Ah, não vai fugir de mim não. Preciso dar um jeito de fazer esse negócio sair desse chove não molha, antes que eu perca o bom senso e a compostura. Paro na porta do elevador pra impedir que ele se feche e olho bem nos olhos dela.

- Estou esperando por sua resposta.

Alex passa a língua pelos lábios antes de me responder.

- Que resposta?

Ela nem abriu minha mensagem?!

- Sobre a reserva pra amanhã, te perguntei ontem.

Ela faz uma cara de surpresa, não abriu mesmo a mensagem que mandei. Isso me deixa um pouquinho desanimado, talvez eu esteja criando expectativas demais com essa mulher.

- Bom, pode ser. Lá pelas sete e meia?

Abro um sorriso pra ela.

- Tudo bem, Luigi e eu esperamos por vocês.

Alex me dá um sorriso sem mostrar os dentes e eu libero a porta do elevador. Ela não entra nele mesmo e eu acho até bom, está bem arrumada para ir em algum lugar e se entrasse aqui comigo ia correr um grande risco de não chegar nesse compromisso.

Agora tenho que esperar até amanhã.

Esperar de novo... isso me irrita.

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