Capítulo 20 – Noite de Sangue e Confissão
A noite caiu pesada sobre a cidade, como se o próprio céu tivesse mergulhado em chumbo. O vento soprava com força pelas vielas estreitas, espalhando jornais, folhas secas e um presságio que Haru sentia desde o fim da tarde.
Akira não estava em casa.
Ele dissera que precisava “resolver algo” com um antigo contato da gangue — nada demais, nada perigoso, segundo ele. Mas Haru sabia. O jeito como ele evitava os olhos dele, a forma como tocou no ombro de Kaori antes de sair — como se fosse a última vez —, tudo aquilo dizia mais que qualquer palavra.
Haru andava de um lado ao outro do quarto, com o celular nas mãos. Nenhuma mensagem. Nenhuma ligação.
Kaori já dormia, e o silêncio da fundação fazia tudo parecer ainda mais frágil.
Às 23h12, o celular finalmente vibrou. Mas não era Akira.
Era uma mensagem anônima. Apenas um endereço e uma palavra:
"Vem."
O sangue de Haru gelou. Ele não precisava de mais informações. Sabia que Akira estava em perigo.
Vestiu o casaco preto, pegou o canivete de emergência escondido na gaveta da cozinha e saiu sem fazer barulho, deixando um bilhete para Kaori: “Volto logo. Não se preocupe.”
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O local indicado era um galpão abandonado no setor industrial. Chegando lá, Haru já sentia o cheiro metálico no ar — ferro velho, óleo, e... sangue.
Avançou pelos escombros, ouvindo vozes abafadas. Gritos.
Quando virou a última esquina de entulho, viu.
Akira estava ajoelhado no centro do galpão, com os pulsos amarrados atrás das costas, o rosto coberto de hematomas. Três homens o cercavam. Um deles, alto e magro, segurava uma barra de ferro.
— Vai dizer onde tá a droga ou quer mais uma visita do meu brinquedo? — perguntou o agressor.
Akira cuspiu sangue, sorrindo com desprezo.
— Vocês são patéticos.
O homem ergueu a barra de ferro.
— Ei! — a voz de Haru ecoou pelo galpão como um tiro.
Todos se viraram ao mesmo tempo. O homem alto riu.
— Olha só... o namorado chegou.
Haru avançou com o canivete em punho, os olhos ardendo de fúria.
— Soltem ele. Agora.
— Ou o quê?
Haru não respondeu. Apenas correu.
Pegou o primeiro desprevenido, cravando o canivete no braço do homem e o empurrando contra as caixas enferrujadas. O segundo tentou atacá-lo, mas Haru foi mais rápido: usou o peso do corpo para desequilibrá-lo, derrubando-o com um chute no joelho.
O terceiro — o da barra de ferro — foi mais difícil.
Eles lutaram no chão, a barra escapando das mãos dele e rolando longe. Haru levou um soco forte na costela, mas não parou. A adrenalina era mais forte que a dor.
Conseguiu derrubar o homem com um golpe certeiro no maxilar, fazendo-o desmaiar.
Ofegante, cambaleou até Akira e cortou as cordas que o prendiam.
— Você é maluco — disse Akira, a voz rouca. — Devia ter corrido.
— E te deixar aqui? — Haru o ajudou a ficar de pé. — Nunca.
Akira o olhou com um brilho estranho nos olhos. Algo entre dor, espanto e... amor.
— Você veio por mim.
— Claro que vim.
— Mesmo sabendo que podia morrer?
Haru respirava com dificuldade, o sangue escorrendo de um corte na testa.
— Eu... não consigo mais imaginar te perder.
Silêncio.
Depois, Akira tocou o rosto dele com uma das mãos machucadas.
— Haru, escuta... se algo acontecer comigo, você precisa—
— Cala a boca.
— O quê?
— Não fala como se fosse morrer. Eu te salvei. Você está aqui.
Akira deu um riso fraco, mas sincero.
— E você também está. Mesmo depois de tudo.
— Mesmo depois de tudo.
Haru segurou o rosto dele com ambas as mãos.
— Akira... você é a pior coisa que podia ter acontecido comigo.
Akira ergueu as sobrancelhas, confuso.
— Obrigado?
— Mas também é a única coisa que me faz querer continuar.
Akira não respondeu com palavras.
Ele apenas se inclinou e o beijou.
Foi um beijo intenso, mas delicado. Cheio de sangue, suor e verdade. Nada de promessas vazias. Apenas dois corações que, apesar de tudo, se encontravam no meio do caos.
Quando se separaram, Akira encostou a testa na de Haru.
— Eu te amo.
Haru ficou em silêncio.
Mas não fugiu. Não desviou. E isso dizia tudo.
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Horas depois, com os ferimentos limpos e Kaori ainda dormindo, Haru voltou ao caderno.
Escreveu, com as mãos tremendo:
“Na noite mais escura, ele sangrou por nós dois. E mesmo assim, me beijou como se a dor não existisse. Se isso não for amor, então não sei mais o que é.”
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Atualizado até capítulo 42
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