Capítulo 16 – O Inimigo da Esperança
O céu estava coberto por nuvens densas naquela manhã. Haru caminhava até a fundação com a gola do casaco erguida e as mãos nos bolsos, tentando ignorar a sensação crescente de que algo estava prestes a desmoronar. Havia se passado apenas dois dias desde a tarde em que ele, sem querer, sorriu para Akira. E ainda assim, aquele momento parecia ter alterado tudo dentro dele.
Ele não conseguia parar de pensar nisso.
No sorriso. No chá. No modo como Akira olhava para ele como se estivesse vendo algo valioso — mesmo quando Haru só enxergava cicatrizes.
Mas a paz breve não duraria.
Ao chegar à fundação, percebeu o clima pesado assim que entrou. Os voluntários estavam reunidos em um canto, sussurrando. Kaori desenhava sozinha, com as sobrancelhas franzidas.
— O que aconteceu? — perguntou ele a Yumi, uma das monitoras.
Ela hesitou antes de responder.
— A fachada da fundação foi pichada durante a madrugada.
— Pichada?
— Com símbolos de gangues. Marcas do clã Ōkami.
Haru sentiu o estômago afundar.
Os Ōkami. Rivais do grupo de Akira. Um nome que ecoava nos becos mais sombrios da cidade. Eram conhecidos pela crueldade, pela forma impiedosa de marcar território — e de retaliar.
— Isso... tem a ver com o Akira?
Yumi o olhou, tensa.
— Não sabemos. Mas alguém deve ter visto ele por aqui. E se estão tentando mandar uma mensagem, não é boa.
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Naquela noite, Akira apareceu. Haru o encontrou parado na esquina próxima ao portão da fundação, com as mãos nos bolsos da jaqueta escura e o olhar sombrio. Não havia o leve charme de dias anteriores — havia tensão. Fúria contida.
— Foi você que os atraiu até aqui? — disparou Haru, sem rodeios.
Akira ergueu o olhar, surpreso com a agressividade.
— Achei que já tivéssemos superado esse tipo de acusação.
— Me responde.
— Eu nunca colocaria a Kaori em risco.
— Mas colocou a mim. E por tabela, ela também.
Akira passou a mão pelos cabelos, impaciente.
— Os Ōkami não me atacam diretamente há meses. Mas se viram que tenho algum tipo de... ligação com esse lugar, podem usar isso como isca.
— E você acha que isso me tranquiliza?
— Claro que não. Mas se você me deixar fora disso, eles podem voltar atrás. Se acharem que não significa nada.
Haru sentiu o estômago revirar. Ele não queria que Akira se afastasse. Mas, ao mesmo tempo, a segurança de Kaori vinha em primeiro lugar. Sempre.
— Então vá embora — disse com frieza.
Akira travou o maxilar.
— Você quer que eu desapareça?
Haru hesitou. As palavras estavam presas na garganta. Mas, por fim, disse:
— Se isso significa proteger quem eu amo... sim.
O silêncio entre eles durou longos segundos. E então Akira assentiu devagar.
— Tudo bem.
E virou-se, desaparecendo na escuridão da rua.
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Os dias seguintes foram estranhamente silenciosos. Akira não apareceu mais. Nenhum bilhete. Nenhuma mensagem. Nenhum chá.
Haru se pegou olhando para a porta várias vezes, esperando por algo. Uma sombra, uma voz, um indício de que ele ainda estava ali. Mas nada veio.
As pichações foram apagadas, mas a ameaça pairava. A tensão entre os voluntários aumentava. Haru tentava manter Kaori distante de tudo, mas ela sentia.
— O que aconteceu com o Akira? — perguntou certa noite, enquanto escovava os dentes.
— Ele teve que resolver algumas coisas.
— Ele vai voltar?
Haru engoliu seco.
— Não sei.
Kaori olhou para ele pelo espelho. Tinha um olhar sério demais para alguém da idade dela.
— Você fica triste quando ele não vem.
Haru desviou o olhar.
— Vai dormir, Kaori.
Ela obedeceu, mas deixou as palavras no ar como um fantasma.
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Na noite seguinte, Haru saiu para caminhar. Precisava pensar. Respirar. Sentia-se dividido entre a razão e o desejo — e odiava isso.
Foi parar perto do antigo santuário abandonado. Um lugar onde ele ia quando criança, com os pais. Um lugar que agora parecia mais fantasma do que abrigo.
Lá, encontrou algo inesperado.
Pichado na lateral de um dos pilares de pedra estava um novo símbolo.
Duas garras entrelaçadas, como um aviso.
Era uma marca dos Ōkami. Mas também... uma provocação direta.
E então, ouviu passos atrás de si.
Virou-se, em alerta, e viu um homem encapuzado, alto, o rosto parcialmente coberto.
— Você é o garoto do Akira, né?
Haru deu um passo atrás.
— Não sou de ninguém.
— Mas está sob a sombra dele. E a sombra de Akira... é um lugar perigoso pra ficar.
O homem avançou devagar.
Haru tentou correr, mas o estranho foi mais rápido, empurrando-o contra o pilar. O impacto foi forte, arrancando-lhe o ar.
— Manda um recado pra ele — o homem rosnou. — Da próxima vez, a irmãzinha é quem paga.
E então o soltou, desaparecendo entre os arbustos e a escuridão.
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Haru chegou em casa com os joelhos ralados e o coração disparado. Trancou todas as portas. Verificou as janelas três vezes. Kaori dormia, alheia ao terror que se aproximava.
E naquele momento, ele soube.
Não podia enfrentar aquilo sozinho.
Não podia protegê-la sem ajuda.
Ele precisava de Akira.
Mesmo que isso o destruísse.
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No caderno, escreveu:
“A esperança é frágil. E o inimigo dela veste muitas máscaras.”
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Atualizado até capítulo 42
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