O estúdio estava mais silencioso do que o normal.
Normalmente, entre uma cena e outra, ouvíamos risadas da equipe, conversas baixas dos câmeras e produtores, até mesmo o som de passos apressados de assistentes de figurino e maquiagem. Mas hoje não.
Hoje era diferente.
As luzes já estavam ajustadas, banhando o quarto cenográfico de Jully com um brilho quente e intimista. A cama estava propositalmente desarrumada, o abajur projetava sombras suaves nas paredes e a playlist de fundo tocava uma melodia baixa, apenas para nos ajudar a entrar no clima da cena.
Eu já tinha gravado esse tipo de sequência antes, cenas intensas, apaixonadas, quentes. Mas nunca com Clara.
E esse era o problema.
Ela estava sentada na beirada da cama, mexendo nervosamente na barra do vestido claro que sua personagem usava. Seus olhos claros percorriam o cenário, como se absorvesse cada detalhe, e eu percebia o nervosismo na maneira como respirava fundo.
Miguel Rosa se posicionou ao lado do diretor, os braços cruzados enquanto observava tudo com atenção.
— Essa é uma das cenas mais importantes do filme. — Sua voz soou firme. — Os fãs esperam essa sequência desde que foi anunciado que o livro viraria um filme. Preciso que vocês entreguem verdade.
Clara engoliu seco ao meu lado.
Me aproximei um pouco mais e murmurei:
— Você está bem?
Ela soltou um riso nervoso.
— Sim. Quer dizer... mais ou menos.
Sorri de canto.
— Vai dar tudo certo. É só encenação.
Ela virou o rosto para me olhar, os olhos carregando um brilho que me fez prender a respiração por um segundo.
— Mas tem que parecer real.
— Exato. — Concordei.
O diretor se posicionou atrás das câmeras.
— Vamos começar. Luzes, câmeras... ação!
Dentro da cena
A porta do quarto se fechou atrás de Danniel.
Por um instante, apenas o som abafado da respiração de Jully preencheu o ambiente.
Ela estava ali, parada, olhando para ele com uma mistura de desejo e hesitação.
— Você tem certeza? — Perguntei, minha voz soando rouca.
Jully mordeu o lábio e deu um passo à frente.
— Eu nunca tive tanta certeza de algo na minha vida.
Havia uma tensão no ar, uma energia eletrizante entre os dois personagens. Eu podia sentir o calor do corpo de Clara tão próximo ao meu, e isso não era apenas atuação.
Meus dedos deslizaram lentamente pela cintura dela, puxando-a para mais perto. Seus olhos me encararam, e por um instante, eu esqueci completamente que estávamos cercados por câmeras e uma equipe inteira assistindo.
Era apenas ela.
Minha mão subiu até sua nuca, segurando-a com firmeza, e então nossos lábios se encontraram.
O beijo começou suave.
Depois, mais intenso.
O roteiro pedia paixão, desejo reprimido, o momento em que dois personagens finalmente se entregam um ao outro. Mas eu sentia muito mais do que isso.
O perfume de rosas que Clara sempre usava preenchia meu olfato. O toque dela contra minha pele, os dedos deslizando pelos meus cabelos, tudo parecia real demais.
Ela suspirou entre o beijo, um som baixo, quase inaudível, mas que ecoou dentro de mim como um choque elétrico.
Minha mão desceu para suas costas, pressionando-a ainda mais contra mim. A temperatura do quarto parecia ter aumentado vários graus.
Seus lábios deixaram os meus por um segundo, e meus instintos me guiaram sem que eu percebesse. Minha boca encontrou o pescoço dela, sentindo sua pele quente sob meus lábios.
Ela arfou.
Meus olhos se abriram por um instante e encontrei os dela, arregalados, as bochechas coradas.
E foi ali, naquele segundo, que percebi.
Não era só uma cena.
Eu estava sentindo cada toque, cada olhar, cada suspiro.
A química entre nós era inegável.
Clara puxou minha camisa com mais força, e minha reação foi automática. Meus braços a envolveram completamente, nossas respirações entrecortadas.
Foi só quando ouvimos um "Corta!" que nos afastamos bruscamente.
A equipe explodiu em aplausos, Miguel Rosa sorria satisfeito e o diretor fez um sinal de aprovação.
Mas eu mal conseguia raciocinar.
Minhas mãos ainda estavam na cintura dela.
Clara piscou algumas vezes, como se estivesse voltando à realidade. Sua respiração ainda estava acelerada, e suas bochechas, ruborizadas.
Nós realmente havíamos passado do limite naquela cena.
— Isso foi incrível! — O diretor elogiou, se aproximando. — Exatamente o que precisávamos!
Miguel Rosa assentiu.
— Essa cena vai deixar os fãs enlouquecidos. A química de vocês está impecável.
Clara riu sem graça e se afastou de mim, alisando a barra do vestido como se tentasse recuperar o controle da situação.
Eu não conseguia parar de olhá-la.
E, pela primeira vez, me perguntei se ela também tinha sentido o que eu senti.
[...]
O dia tinha sido exaustivo.
Após várias outras cenas, entrevistas curtas e reuniões de agenda, finalmente podíamos ir para casa.
Ofereci uma carona para Clara, e ela aceitou.
O trajeto até a casa dela foi silencioso, mas não desconfortável. De vez em quando, eu a via mordendo o lábio, perdida em pensamentos.
Assim que estacionei em frente à sua casa, ela soltou o cinto e se virou para mim.
— Obrigada pela carona.
— Sempre que precisar. — Sorri de canto.
Ela hesitou por um segundo, como se quisesse dizer algo, mas mudou de ideia e segurou a maçaneta da porta.
Antes que saísse, chamei seu nome.
Ela me olhou.
Respirei fundo.
— Eu... — Cocei a nuca, tentando encontrar as palavras certas. — Sobre hoje. A cena.
Clara ficou ainda mais vermelha.
— O que tem?
Segurei o volante com mais força e soltei, rindo baixinho.
— Eu acabei sentindo "coisas" demais.
Os olhos dela se arregalaram.
— O-o quê?
Me aproximei um pouco mais, apenas para ver sua reação.
— Parte da cena de hoje não foi encenação.
O rosto dela ficou absurdamente vermelho.
— B-bem, eu... eu preciso entrar.
Antes que eu pudesse dizer qualquer outra coisa, ela praticamente pulou do carro e correu para dentro do prédio.
Soltei uma gargalhada baixa, recostando-me no banco e balançando a cabeça.
— Fofa.
Dei a partida no carro e segui para casa, ainda sentindo o perfume de rosas impregnado na minha pele.
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Atualizado até capítulo 21
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