Narrado por Dante
A manhã passou em um piscar de olhos, e antes que eu percebesse, já era hora do almoço. Normalmente, eu almoçava sozinho em meu escritório, aproveitando o silêncio para revisar contratos ou planejar meus próximos passos.
Mas hoje, algo estava diferente.
Eu me peguei pensando na casa, nos bebês, em Aurora.
Desde que ela chegou à minha vida, tudo parecia estar saindo do controle. Eu sempre fui um homem prático, alguém que fazia o que precisava ser feito sem olhar para trás. Mas agora... agora eu tinha uma "família", mesmo que fosse tudo uma farsa.
E isso estava mexendo comigo.
— Dante? — Danilo chamou minha atenção.
Levantei o olhar para ele.
— O quê?
— Você está encarando esse relatório há cinco minutos sem virar a página. Está tudo bem?
Me endireitei na cadeira, pegando o relatório e folheando sem realmente absorver a informação.
— Estou apenas cansado.
Danilo soltou um riso baixo.
— Isso tem nome. Você está distraído.
Lancei um olhar duro para ele.
— Eu não fico distraído.
Ele ergueu as mãos em rendição.
— Certo, chefe. Como quiser. Mas se precisar falar sobre algo, sabe que estou aqui.
— Não preciso.
Danilo riu e saiu da sala, me deixando sozinho novamente.
O dia seguiu normalmente. Reuniões, decisões, problemas resolvidos. Mas no fundo da minha mente, a imagem de Aurora com os bebês insistia em aparecer.
Eu tentava ignorar. Mas não conseguia.
Quando o relógio marcou 19h, finalmente saí da empresa. O motorista me esperava na porta, pronto para me levar de volta para a mansão Morelli.
E, pela primeira vez, eu me peguei ansioso para voltar para casa.
Assim que o carro parou em frente à mansão. Passei a mão pelos cabelos, tentando afastar essa sensação estranha. Eu não era um homem de família. Nunca fui. Mas agora tinha uma mulher e dois filhos sob a minha responsabilidade, mesmo que tudo fosse uma mentira.
Respirei fundo e saí do carro.
— Boa noite, senhor Dante. — A governanta cumprimentou assim que entrei no saguão.
— Boa noite. Onde está Aurora?
Ela pareceu surpresa com minha pergunta, mas respondeu prontamente:
— No quarto das crianças.
Subi as escadas sem pensar duas vezes. Assim que me aproximei da porta, ouvi a voz suave de Aurora cantando baixinho.
Parei ali por um momento, observando pela fresta da porta entreaberta.
Aurora segurava Bella no colo, enquanto Bento já dormia no berço. Ela parecia tão natural, tão à vontade sendo mãe, mesmo diante de tudo o que passou.
Eu não deveria me sentir assim.
Mas me senti.
— Pode entrar se quiser?
A voz dela me pegou de surpresa. Aurora me olhava com um pequeno sorriso no rosto.
— Eu só… — Passei a mão pela nuca, sem saber o que dizer.
Ela riu baixinho.
— Nunca imaginei que Dante Morelli pudesse ficar sem palavras.
— Eu também não.
Caminhei até ela e olhei para Bella, que bocejou antes de fechar os olhos.
— Eles dormiram rápido.
— Sim. Mas não se engane, às vezes eles acordam no meio da noite.
— Você está conseguindo descansar?
Aurora franziu o cenho, como se minha pergunta a pegasse de surpresa.
— Estou… dentro do possível. Clara e Suzana me ajudam bastante.
Ficamos em silêncio por alguns segundos.
Então, sem pensar, estendi a mão para tocar no braço dela. Foi um toque leve, sem intenção alguma. Mas ainda assim, senti o calor de sua pele.
— Se precisar de algo… me avise.
Ela me olhou diretamente nos olhos.
— Por quê?
— Porque você e essas crianças agora estão sob a minha responsabilidade.
Aurora desviou o olhar.
— Só por causa do contrato, não é?
— Sim, exatamente — disse de forma séria. Eu não deveria estar aqui.
— Quer segurá-la? — ela perguntou, erguendo a bebê levemente.
Meu corpo ficou rígido.
— Não.
Meu tom saiu mais duro do que eu pretendia.
Aurora franziu as sobrancelhas e parecia prestes a questionar, mas desistiu. Apenas baixou o olhar para Bella novamente e a embalou devagar.
— Boa noite, Aurora. — Falei rapidamente, virando-me para sair do quarto.
Não olhei para trás.
Assim que entrei no quarto que agora dividia com ela, fui direto para o banheiro.
Joguei água no rosto, tentando afastar a confusão que se instalava dentro de mim.
Foi nesse momento que me lembrei dela.
A Regra Número 5.
Colei meus braços sobre a pia, sentindo meu peito subir e descer com força.
Cinco regras. Simples. Essenciais. Inquebráveis.
Eu as criei para me manter forte. Para me impedir de cometer os mesmos erros que outras pessoas já cometeram, me olhei no espelho.
Regras do Dante Morelli:
Regra número 1 - Nunca confie em ninguém.
— O primeiro erro de qualquer homem é confiar demais.
Regra número 2 - Esconda os seus pontos fracos.
— Mostrar fraqueza é dar ao inimigo uma arma contra você.
Regra número 3 - Não demonstre que se importa.
— Se eles acham que você se importa, vão usar isso contra você.
Regra número 4 - Não crie expectativas.
— Expectativas levam a decepções.
Regra número 5 - Não demonstre amor. O amor vai te matar.
Respirei fundo, sentindo meu peito pesar.
Essa última regra era a mais importante. A mais difícil.
Saí do banheiro e me joguei na cama. A cama que eu tenho que dividir com Aurora.
Mas ela não estava aqui. Ainda estava com os bebês.
Fechei os olhos.
Eu não podia me permitir quebrar nenhuma das regras.
Mas, de alguma forma, Aurora e essas crianças estavam começando a se infiltrar nas rachaduras que eu nem sabia ter.
Acordei com o som de passos leves no quarto.
Abri os olhos e vi Aurora caminhando lentamente até o closet. Ela não percebeu que eu estava acordado.
— O que está fazendo acordada a essa hora? — Minha voz saiu mais rouca do que eu esperava.
Ela parou no meio do caminho e me olhou por cima do ombro.
— Os bebês acordaram. Tive que alimentá-los. Agora vou trocar de roupa.
Seu tom era suave, mas carregado de cansaço.
— E por que não deixou a enfermeira fazer isso?
Aurora riu sem humor.
— Porque sou a mãe deles, Dante. Não importa quantas enfermeiras estejam por perto, sou eu quem precisa estar lá.
Fiquei calado.
Ela pegou uma blusa e um short e entrou no banheiro.
Passei as mãos pelo rosto, tentando afastar o sono. Meu corpo ainda estava quente, e a mente pesada pelas lembranças da noite anterior.
As cinco regras pulsavam na minha mente como um alerta.
Eu não podia me envolver.
Eu não devia me importar.
Mas, então, por que eu me sentia inquieto ao vê-la exausta daquela forma?
Aurora voltou do banheiro alguns minutos depois, já vestida com roupas mais leves. Ela foi até sua lateral da cama e se deitou.
O quarto ficou em silêncio por alguns minutos, até que a voz dela rompeu o vazio:
— Por que você tem tanta resistência a segurar as crianças?
Meu corpo ficou tenso.
— Não sou bom com bebês.
— Isso não é uma resposta de verdade.
Suspirei.
— Aurora…
— Você tem medo?
Franzi o cenho.
— Medo?
Ela virou-se na cama para me encarar.
— Sim. Medo de criar um vínculo, medo de sentir algo por eles.
Minha mandíbula se contraiu.
— Eu não sou um homem sentimental. Não preciso de vínculos.
Ela soltou um riso baixo.
— Todo mundo precisa de vínculos, Dante. Até você.
— Não eu.
Ela ficou me olhando por um longo momento. Seus olhos pareciam tentar me ler, decifrar algo dentro de mim.
Mas não havia nada para ser lido.
Porque eu não permitia que houvesse.
Aurora suspirou.
— Eu só espero que um dia você perceba que está errado.
Ela se virou de costas para mim e fechou os olhos.
Eu fiquei olhando para o teto.
Eu não estava errado.
Mas, pela primeira vez em muito tempo, eu me perguntei…
E se eu estivesse?
O relógio marcava 6h quando saí da cama. Aurora dormia profundamente ao meu lado, o rosto relaxado e os cabelos espalhados pelo travesseiro.
Por um instante, me peguei observando-a.
O que estava acontecendo comigo?
Balancei a cabeça, afastando os pensamentos e fui para o banheiro. Depois de um banho frio, vesti um terno escuro e ajeitei a gravata. Quando saí do quarto, Clara já estava acordada no corredor, com um dos bebês no colo.
— Bom dia, senhor Dante.
Assenti, mantendo a expressão fechada.
— Bom dia. Não acorde a Aurora.
— Tudo bem. Ela ficou acordada até tarde cuidando das crianças.
Óbvio. Ela não sabia delegar.
— E os bebês? Como estão? — Perguntei, sem pensar muito.
Clara sorriu de leve.
— Bento e Bella estão bem. Mas Bento parece um pouco agitado hoje. Talvez seja cólica.
Assenti de novo, sentindo algo estranho no peito ao ouvir seus nomes. Não demonstrei.
— Se precisar de algo, peça à Alina. Estou indo para a empresa.
Antes que Clara pudesse responder, desci as escadas, e a casa ainda estava silenciosa.
Cheguei à empresa e encontrei Danilo já me esperando na minha sala.
— Temos um problema. — Ele foi direto ao ponto.
Larguei a pasta na mesa.
— Que tipo de problema?
Danilo respirou fundo.
— A auditoria encontrou inconsistências em algumas transações da filial de Milão. Parece que alguém está desviando dinheiro.
Minha expressão se fechou.
— Quem?
— Ainda não sabemos. Mas há fortes indícios de que seja alguém de dentro.
Sentei na minha cadeira, tamborilando os dedos na mesa.
— Quero um relatório completo em minha mesa até o fim do dia. Alguém está jogando comigo, e eu vou descobrir quem.
Danilo assentiu.
— Ah, e mais uma coisa… Seu avô mandou cancelou todos os seus compromissos.
Levantei o olhar.
— O que ele quer agora?
— Ele quer um jantar em família hoje à noite.
Soltei um suspiro impaciente.
— Ótimo. Mais uma encenação.
Danilo riu baixo.
— Você já se acostumou a fingir, não é?
Minha expressão endureceu.
— A questão não é fingir. É manter o controle.
Ele cruzou os braços.
— E Aurora? Como ela está lidando com isso?
Minha mandíbula se contraiu.
— Ela não precisa lidar com nada. Eu cuido disso.
Danilo me olhou de forma suspeita.
— Tem certeza de que está no controle, Dante?
Fiquei em silêncio por um momento antes de me levantar.
— Sempre estive.
Mas, por alguma razão, naquele dia, as palavras soaram menos convincentes.
***Faça o download do NovelToon para desfrutar de uma experiência de leitura melhor!***
Atualizado até capítulo 85
Comments
Berê
Dante, se você relaxar, tentar ser menos controlador, revisar os gatilhos que te tornaram e te tornam um ser frio, sem sentimentos, fechado, convencer o vovô será menos complicado. Se permita através do simples...
2025-04-05
1
Ebila Ferreira
ele mesmo não percebeu que já está envolvido e muito só ainda não percebeu que tá gostando dela e das crianças o coração gelado tá ficando aquecido
2025-04-03
0
Cleides Silva
Espero que ele nao tenha que viajar,pra nao deixar ela sozinha,sendo massacrada pelo avô e primos.Nada haver eles irem morar na mansao desse velho.
2025-03-10
17