Narrado por Dante
Eu não devia me importar.
Não devia sentir nada além da obrigação de manter essa farsa funcionando. O acordo era claro: um casamento por conveniência, uma estrutura segura para os bebês e para ela, e, no final, seguiríamos caminhos opostos sem olharmos para trás.
Mas, por algum motivo, quando vi ela ali, deitada na cama, dormindo com uma expressão serena depois de dias exaustivos, algo dentro de mim hesitou.
Não era a primeira vez que isso acontecia.
Eu tentei ignorar, tentei seguir a rotina como sempre fazia. Acordei cedo, treinei na academia particular da mansão, tomei um banho e voltei para o quarto. Era para ser um dia como qualquer outro.
Mas, quando entrei no quarto e a vi ali, os lençóis bagunçados ao seu redor, o rosto relaxado... uma sensação estranha me atingiu.
Por que eu estava prestando atenção nisso?
Revirei internamente essa questão enquanto pegava minha camisa de botão e a vestia, abotoando-a sem pressa. Eu estava concentrado no movimento automático, no ritmo normal da minha vida... até que ela se mexeu e abriu os olhos.
Eu não queria acordá-la.
— Desculpe, não queria te acordar. — minha voz saiu mais grave do que eu esperava.
Ela piscou algumas vezes, sonolenta, antes de se sentar na cama, ainda com os cabelos bagunçados e a roupa amassada. Era estranho ver alguém tão vulnerável ao meu lado.
— Eu pensei que você já tinha ido trabalhar. — sua voz ainda estava rouca de sono.
Me sentei na beira da cama e passei as mãos pelo cabelo, deixando escapar um suspiro.
— Não. Hoje malhei cedo.
Silêncio.
Ela apenas me observou, e eu odiei a forma como aquele olhar parecia me enxergar além do que eu queria mostrar.
— Dante, você realmente se preocupa com alguma coisa? — a pergunta dela foi direta, e por um momento, não soube o que responder.
Sim, eu me preocupava. Com a minha família, com os negócios, com o legado que precisava manter. Mas me preocupar com ela?
Esse era um terreno perigoso.
Respirei fundo antes de responder.
— Claro que me preocupo. Comigo mesmo, com minha família... e com você.
Ela não parecia convencida.
— Você se preocupa comigo?
O jeito que ela repetiu a pergunta me irritou.
Eu me inclinei um pouco, cruzando os braços, e mantive minha expressão impassível.
— Sim. Mas isso não muda nada. Não estou aqui para me envolver emocionalmente.
Ela ficou em silêncio por um tempo, e então murmurou:
— Então tudo bem, Dante. Eu entendo.
Mas havia algo na sua voz, algo que indicava que talvez ela não entendesse completamente... ou que já não esperasse mais nada de mim.
E isso me incomodou.
Eu não sabia por que queria que ela acreditasse em mim. Não fazia sentido.
Ela se levantou e começou a se arrumar. Cada movimento dela era calculado, contido, como se estivesse tentando não demonstrar que algo a afetava.
E eu conhecia bem essa tática.
Era a mesma que eu usava há anos.
Quando ela se virou para sair, algo em mim se moveu sem que eu pudesse controlar.
— Você não precisa se esconder, sabe? — ela disse, sem me encarar diretamente.
A frase foi um golpe que me pegou de surpresa.
— Esconder? Do que você está falando? — perguntei, confuso.
Ela se virou e me olhou nos olhos.
— Você não é esse cara insensível que tenta mostrar. Eu vejo isso, mesmo que você não queira admitir.
O choque percorreu meu corpo como um choque elétrico.
Eu poderia ter rebatido. Poderia ter rido e dito que ela estava imaginando coisas. Poderia ter saído do quarto e encerrado aquela conversa ali mesmo.
Mas, pela primeira vez em muito tempo, eu hesitei.
Fiquei parado, sem saber como responder.
E então, antes que eu pudesse dizer qualquer coisa, ela saiu do quarto, me deixando sozinho com minhas próprias dúvidas.
Eu não pretendia procurá-la, mas algo me fez parar diante da porta do quarto dos bebês, antes de ir trabalhar.
Pela brecha da porta vi a cena.
Ela estava ali, sentada em uma poltrona, com Bento no colo e Bella dormindo ao lado, enquanto sussurrava palavras suaves para eles. Era uma imagem tão serena, tão diferente do mundo em que eu estava acostumado, que me pegou desprevenido.
Fiquei ali, observando sem ser notado.
Por algum motivo, naquele momento, senti um aperto no peito.
Aqueles bebês não eram meus, e eu me lembrava disso todos os dias. Mas, ao vê-los ali, tão indefesos nos braços dela, não pude evitar o pensamento incômodo:
Como teria sido se fossem?
Desviei o olhar e me afastei antes que ela pudesse perceber minha presença.
Eu não queria me envolver.
Eu não podia me envolver.
Mas algo dentro de mim já começava a desmoronar.
E eu odiava isso.
•
O resto do dia foi um inferno.
Ninguém na empresa ousava me desafiar.
Eu tinha uma reputação construída com trabalho duro, decisões implacáveis e uma presença que fazia qualquer um pensar duas vezes antes de cruzar meu caminho. Na Morelli Corp., eu era o homem que todos temiam e respeitavam.
E eu gostava assim.
Quando cheguei ao prédio da empresa naquela manhã, Danilo já estava lá me esperando. Ele era meu braço direito, o único que eu confiava para resolver qualquer problema sem precisar de supervisão constante.
— Bom dia, chefe. — Danilo me cumprimentou, me acompanhando até o elevador privativo.
— Alguma novidade? — perguntei enquanto as portas se fechavam.
Ele segurava um tablet e começou a me atualizar.
— Temos uma reunião com os investidores às nove, a apresentação do novo projeto às dez, e o Sr. Morelli quer falar com você no final do dia.
Eu bufei.
— O que meu avô quer agora?
Danilo deu de ombros.
— Ele não especificou, mas imagino que seja sobre a fusão com os franceses.
Suspirei e esfreguei a mandíbula. Negociar com investidores já era um desafio, mas lidar com meu avô era ainda pior.
Quando as portas do elevador se abriram no último andar, minha secretária, Renata, estava me esperando com uma expressão séria.
— Bom dia, Sr. Morelli. Sua primeira reunião está prestes a começar.
Assenti e entrei direto na sala de conferências.
A mesa estava cheia de acionistas, cada um esperando minha chegada. Todos sabiam que eu era direto e não perdia tempo com conversa fiada.
Me sentei na ponta da mesa e encarei cada um deles.
— Vamos ao que interessa.
A reunião durou uma hora e, como esperado, saímos com um plano estratégico definido. Eu não aceitava menos que a excelência, e todos ali sabiam disso.
Assim que voltei para minha sala, Danilo entrou com mais atualizações.
— Tem um problema no setor de logística. O contrato com a transportadora pode não ser renovado.
Franzi o cenho.
— O que aconteceu?
— Eles querem renegociar os termos. Disseram que os custos aumentaram.
Revirei os olhos.
— Marque uma reunião com eles. Se não quiserem seguir com o contrato, achamos outra empresa.
Danilo sorriu.
— Sabia que ia dizer isso. Já estou providenciando.
Olhei para ele e cruzei os braços.
— E quanto ao relatório financeiro?
Danilo ficou sério.
— Temos um leve declínio nas ações desde o anúncio da fusão. Mas nada alarmante. O mercado está apenas observando nossos próximos passos.
Assenti.
— Vamos garantir que esse acordo saia perfeito. Não podemos demonstrar fraqueza.
Danilo riu.
— Fraqueza? Você? Acho que ninguém no mundo te considera fraco, Dante.
Soltei um suspiro e olhei pela janela.
— Talvez seja melhor assim.
Danilo me observou por um momento antes de perguntar:
— Está tudo bem com você? Desde que casou, parece um pouco... diferente.
Minha expressão endureceu.
— Nada mudou.
Ele arqueou uma sobrancelha.
— Certo... se você diz.
Não respondi. Apenas voltei minha atenção para o trabalho.
Mas, no fundo, eu sabia que algo dentro de mim estava começando a mudar.
E eu não tinha certeza se gostava disso.
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Atualizado até capítulo 85
Comments
Fabiola Piazza
Pra mim a vida da Aurora está parecendo tão vazia, não fala nada sobre em que ela é formada, se tem expectativas sobre trabalho, dorme exausta e acorda mais exausta ainda. A maternidade pra ela está um horror. Pra mim está um ar de vida vazia sem propósito, sem destino.
2025-03-06
32
Denise
Fiquei preocupada quando DANILO comentou com DANTE acerca da fusão da empresa com os franceses e também que teria uma reunião com os investidores franceses. Será que o ex-namorado de AURORA (o pai dos bebês) estará nesta reunião? Se for ele, será que ele vai frequentar a mansão e vai dar de cara com AURORA e vai chantageá-la?
2025-03-29
1
Diva
Eita!!!
O pai ou alguém relacionado a ele?
2025-04-08
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