Diante da porta de Kaela, Nirai estendeu a mão trêmula e tocou a fria maçaneta. O som sutil do metal girando preencheu o silêncio, mas seus passos vacilaram, e ele cedeu ao peso que carregava. Seu corpo tombou ao chão, ecoando um ruído abafado que se espalhou pelo quarto.
Kaela despertou sobressaltada, os olhos ajustando-se à penumbra. Ao virar o rosto, viu a silhueta caída junto à entrada. Um arrepio percorreu sua espinha. Sem hesitar, ela deixou os lençóis para trás e correu, descalça, o coração acelerado, até ele.
— Nirai, o que aconteceu com você? — murmurou Kaela, a voz trêmula como o som de folhas ao vento.
Ela se ajoelhou ao lado dele, seus movimentos delicados e apressados, como se temesse que ele desaparecesse a qualquer instante. Com cuidado, colocou a cabeça de Nirai em seu colo, os dedos deslizando suavemente por seus cabelos.
Seu coração batia descompassado, mas era o peso no olhar de Nirai que mais a preocupava. Algo havia se quebrado nele, e Kaela sentia a dor transbordar, silenciosa e profunda, entre os dois.
— Satella... Kaela, precisamos sair daqui o mais rápido possível. Ela não vai nos deixar escapar assim — sussurrou Nirai, a voz carregada de urgência e dor. Ele tentou se erguer, mas Kaela o deteve com mãos firmes e gentis, guiando-o de volta ao refúgio de seu colo.
Seus olhos se prenderam à ferida aberta na panturrilha de Nirai, o sangue escorrendo em linhas rubras que tingiam sua pele e manchavam o chão. O brilho escuro do ferimento parecia pulsar junto ao ritmo acelerado de seus pensamentos.
Kaela mordeu o lábio, sentindo o gosto metálico da preocupação, enquanto uma ideia audaciosa começava a tomar forma em sua mente, nascida da necessidade de protegê-los do inevitável.
— Não, eu não quero que você me cure. Você não vai se recuperar direito assim — protestou Nirai, sua voz carregada de fragilidade e preocupação. Ele conhecia o sacrifício que ela estava prestes a fazer e não podia suportar a ideia.
Kaela ergueu os olhos para ele, sua expressão firme, embora os lábios tremessem com a intensidade do momento. Sem dizer nada, ela balançou a cabeça em negação, como quem rejeita não apenas as palavras, mas também o medo que as alimentava.
O silêncio entre eles parecia denso, preenchido pela tensão de escolhas inevitáveis. Havia algo no olhar dela, uma determinação tão suave quanto devastadora, que fez Nirai sentir o peso de sua impotência.
— Considerando as nossas condições, você está em uma situação pior. Eu ainda estou me recuperando e não tenho forças para te carregar. Deixe-me cuidar de você — insistiu Kaela, sua voz suave, mas firme, como um sussurro que cortava o ar tenso.
As palavras dela reverberaram na mente de Nirai, carregadas de uma verdade que ele não podia ignorar. Ele sentiu o peso de sua dor e a fraqueza que se arrastava por seus membros, enquanto ela, apesar de tudo, permanecia ali, tão sólida quanto uma rocha.
Nirai olhou para ela, os olhos cansados, e em um lampejo de compreensão, percebeu que a única forma de sobreviver a tudo aquilo, de sair dali, seria permitir que ela o tratasse. O orgulho, a hesitação... tudo parecia se desvanecer diante da necessidade urgente de se salvar.
Kaela, mais uma vez, canalizou o poder da luz branca que corria em suas veias. Suas mãos, delicadas e firmes, tocaram a panturrilha ferida de Nirai, e uma luz intensa, suave como um sonho, começou a emanar de seus dedos. O brilho envolveu a ferida, iniciando o processo de cura. Cada segundo parecia se esticar, mas, ao final, a dor na perna de Nirai diminuiu, embora o cansaço se abatesse sobre Kaela como um peso insuportável.
Antes que ela pudesse vacilar e cair, Nirai a segurou, sentindo a fragilidade de seu corpo, e com um movimento cuidadoso, a colocou em suas costas. O calor de sua respiração, embora ofegante, ainda tinha força.
Os olhos de Nirai se voltaram para a janela do quarto, percebendo que, ali, talvez estivesse sua única chance de fuga. A porta principal, ele sabia, poderia ser uma armadilha mortal. O ar ao redor parecia espesso, denso, mas a janela oferecia uma possibilidade, uma luz tênue de esperança. Ele não pensou duas vezes. Era o único caminho.
Com agilidade, eles escaparam pela janela, mergulhando na escuridão da floresta que os aguardava do lado de fora. Os pés de Nirai tocavam o solo com pressa, mas sem pressa demais, como se o medo de ser seguido estivesse sempre à sua cola.
Enquanto corriam, a tensão entre eles aumentava, e logo Nirai percebeu algo estranho. O Reino da Lua, aquele cenário familiar que ele acreditava ter visto das janelas da casa, não passava de uma ilusão, uma teia de mentiras tecida por Satella. As casas, os contornos da cidade, tudo era um reflexo distorcido, uma criação fantasmagórica.
Porém, no fundo, ele sabia que não havia tempo para refletir sobre isso. O que importava agora era a fuga, a densa escuridão da floresta à frente, o terreno desconhecido que se abria à sua frente como uma promessa de liberdade, embora também fosse uma armadilha. Cada passo que davam os afastava da mentira e os aproximava de um futuro incerto, mas, por enquanto, não havia outro caminho. Eles tinham apenas a noite como aliada.
Perdidos na vastidão da floresta, o ambiente parecia se fechar ao redor deles. Nirai, apesar da fuga e da pressa, não conseguia encontrar um rumo. Cada árvore parecia idêntica, cada sombra um reflexo da anterior, e a sensação de desorientação o dominava. A frustração e o medo se entrelaçavam, tornando o ar espesso e pesado.
Foi então que Kaela, com o olhar atento, percebeu a mudança no semblante de Nirai. Sua expressão, antes focada e determinada, agora transparecia cansaço e desesperança.
— Nirai, talvez eu possa te ajudar — disse ela, a suavidade da voz contrastando com a urgência da situação.
Ele parou por um instante e virou-se para olhá-la por cima do ombro, o coração batendo rápido, mas com um fio de esperança acendendo em seu peito.
— Como? — perguntou ele, a ansiedade clara em cada palavra, como se fosse a última chance de encontrar uma saída.
— É simples: basta seguir o brilho da lua. Esse é o caminho de volta para o Reino da Lua — respondeu Kaela, com a certeza de quem conhece a verdade oculta na noite.
Nirai, inicialmente atônito pela revelação, olhou para o chão e, pela primeira vez desde que haviam fugido, seus olhos encontraram algo concreto. A luz suave da lua refletia sobre a terra, desenhando um caminho prateado que serpenteava pela floresta. A visão era quase etérea, como se o próprio céu estivesse guiando seus passos.
Sem hesitar, Nirai deu o primeiro passo, e logo os outros seguiram com urgência. O som de seus pés batendo contra o solo era abafado pela densa vegetação ao redor, mas o brilho da lua os conduzia com precisão. Era a única luz, a única esperança. Ele correu, guiado pela promessa de liberdade que a luz prateada oferecia, como se a própria noite estivesse se abrindo para eles, oferecendo um escape.
A visão da saída da floresta trouxe um alívio imediato a Nirai, como se o peso da noite inteira fosse dissipado em um único suspiro. Ele podia ver a clareira à frente, um espaço aberto, onde o ar parecia mais fresco e a escuridão da floresta menos ameaçadora. A liberdade estava ao alcance, e por um momento, ele se permitiu acreditar que o pesadelo estava chegando ao fim.
Mas, ao dar um passo adiante, a sensação de familiaridade o atingiu como um choque. Seu olhar se fixou na casa à distância, e o terror tomou conta de seu corpo. Era a mesma casa da qual eles haviam fugido. A ilusão havia os levado de volta, como se estivessem presos em um ciclo interminável.
Nirai girou em círculos, tentando entender o que acontecia, mas ao olhar para a entrada, lá estava ela. Satella. Seu sorriso era sádico, e nos olhos brilhava uma diversão macabra, como se ela tivesse esperado pacientemente por este momento. O calor do alívio evaporou, substituído por uma sensação de armadilha iminente, e a noite, que antes parecia oferecer liberdade, agora se fechava sobre eles com uma intensidade sombria.
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Atualizado até capítulo 25
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