Kaela olhou ao redor, absorvendo o ambiente simples e acolhedor da cozinha, mas suas perguntas não saíam de sua mente. Ela queria entender, precisava entender.
— Satella, poderia me explicar como eu e Nirai acabamos aqui? Aparentemente, este é o seu lar — perguntou, com a curiosidade crescendo, como uma chama que não podia mais ser ignorada.
Satella, sem hesitar, deu um sorriso discreto e se virou para pegar um copo de suco, sua expressão calma e tranquila, como se estivesse acostumada a responder a perguntas como aquelas.
— Sim, é a minha casa. E, bom, o que eu disse ao Nirai é o mesmo que diria a você. Eu os encontrei caídos na rua e os trouxe para cá — respondeu, enquanto se servia com uma calma quase desconcertante.
Kaela sentiu um leve alívio ao ouvir isso, mas a inquietação ainda permanecia. Havia mais na história, algo que Satella não estava dizendo. Como sempre, havia algo mais.
Satella, aparentemente em um momento de reflexão, olhou para Kaela com um leve franzir de testa, antes de perguntar:
— Além disso, eu ainda não perguntei ao Nirai, mas o que aconteceu para vocês ficarem assim?
As palavras de Satella pairaram no ar, provocando ainda mais perguntas em Kaela. Ela sabia que havia algo mais por trás dessa situação, algo que estava além de simples coincidência.
Kaela respirou fundo, seu olhar se tornando mais pesado com a lembrança da luta que a trouxe até ali. Cerrando os punhos, ela se permitiu reviver brevemente o peso daquela batalha, a tensão, o cansaço, a sensação de derrota que ainda ecoava em sua mente.
— Acontece que tivemos uma briga naquele dia. Uma batalha realmente difícil para nós dois — explicou, com a voz firme, mas com a dor ainda visível em seus olhos.
Satella notou o gesto, o modo como Kaela apertava os punhos, e algo nos olhos da jovem indicava a luta interna que ela ainda enfrentava. Mas, ao invés de continuar questionando, Satella simplesmente assentiu, como se compreendesse.
— Entendo — disse Satella, com uma calma que parecia um pouco distante, como se estivesse processando as palavras de Kaela. Ela se acomodou à mesa e começou a saborear o lanche noturno com a tranquilidade de quem já lidou com inúmeras noites como aquela.
Depois de um momento de silêncio, Satella se recostou na cadeira, parecendo mais séria, e, de forma inesperada, fez uma pergunta que fez o coração de Kaela acelerar.
— Mas tenho outra pergunta, uma que nem mesmo Nirai poderia responder.
Kaela olhou para ela, curiosa e cautelosa, esperando a pergunta que parecia prestes a desvendar algo mais profundo.
Kaela franziu a testa ao ouvir a pergunta de Satella. O tom da mulher era calmo, mas havia uma sutileza na forma como ela colocava a questão que a fez sentir uma pontada de inquietação. Ela se inclinou levemente para frente, a mente tentando processar o que estava sendo dito.
— E qual é? — questionou Kaela, sua curiosidade misturada com uma apreensão silenciosa. Ela sabia que a resposta a essa questão poderia mudar tudo.
Satella, por sua vez, não se apressou em responder. Em vez disso, fez uma pausa e olhou para Kaela com um sorriso enigmático, como se estivesse testando suas reações.
— Você não acha curioso que estamos conversando como se fôssemos amigas, sem nenhum sinal de desconfiança? — perguntou, a voz suave, mas carregada de um significado que Kaela não podia ignorar.
As palavras de Satella se arranharam no fundo da mente de Kaela, e, de repente, uma onda de clareza tomou conta dela. Ela abriu os olhos, percebendo a verdade na afirmação. Desde o início da conversa, algo estava errado, ou melhor, muito certo. Elas haviam interagido de maneira totalmente natural, como se já se conhecessem há muito tempo, como se o fato de estarem em situações desconhecidas não tivesse causado a mínima tensão.
A inquietação cresceu em seu peito. Kaela olhou para Satella, agora mais alerta, tentando entender o que estava realmente acontecendo entre elas.
Kaela refletiu sobre a pergunta por um momento, as palavras de Satella ainda ecoando em sua mente. O que elas estavam construindo era, de fato, difícil de explicar. Ela não podia negar que algo estava fora de lugar, mas não sabia o que era exatamente. Talvez fosse melhor não questionar mais por enquanto.
— Essa é uma pergunta bastante complexa e difícil de responder. Para ser sincera, não sei ao certo — admitiu Kaela, enquanto Satella mordia sua torrada, ouvindo atentamente.
Satella parecia compreender a resposta, e seus olhos brilharam com um reconhecimento silencioso. Ela deu um pequeno sorriso, como se tivesse previsto exatamente o que Kaela diria.
— Sim, eu entendo. Era isso que eu imaginei que você diria — disse Satella, levantando-se com um movimento suave e levando seu prato para a pia. Seu comportamento era casual, quase como se nada estivesse fora do normal.
Kaela observou enquanto Satella limpava a mesa, mas algo estava prestes a mudar. Satella se virou para ela com um tom mais firme, como se o assunto estivesse se encerrando.
— Bom, já terminei aqui. Você precisa voltar para o seu quarto antes que o Nirai acorde e não te encontre lá — disse ela, e Kaela percebeu que o tom de despedida estava ali, silencioso, mas claro.
Sem dizer mais nada, Satella passou por Kaela e saiu da cozinha, deixando a jovem sozinha com seus pensamentos, agora mais confusos do que nunca. O que havia naquele momento que as conectava tão facilmente? Por que, mesmo com tantas perguntas, Kaela se sentia mais tranquila perto de Satella, como se fosse natural? Essas questões pairavam em sua mente, mas não havia respostas imediatas.
Kaela caminhava lentamente de volta para o seu quarto, os pensamentos sobre a conversa com Satella martelando sua mente. Ela não conseguia compreender completamente o que havia acontecido entre elas. Havia algo estranho na forma como se sentiram tão à vontade uma com a outra, como se fossem antigas amigas, mas Kaela não conseguia se livrar da sensação de que algo estava sendo ocultado.
"Isso é estranho. Por que essa conversa? O rumo que tomou me surpreende e, honestamente, não me agrada. Não sei o que pensar sobre essa mulher," refletiu Kaela, com um nó de dúvida se formando no estômago, enquanto se afastava da cozinha e retornava ao seu quarto. A ansiedade crescia, mas ela sabia que precisava encontrar respostas, mais cedo ou mais tarde.
Na manhã seguinte, a luz suave do dia penetrou pela janela, e Nirai despertou. Seus olhos se fixaram em Kaela, adormecida ao seu lado, e por um instante, ele sorriu de forma suave, como se aquele momento fosse simples e perfeito. Mas, com um movimento tranquilo, ele se levantou da cama e deixou o quarto, sem fazer barulho, como se não quisesse interromper a paz do momento.
Kaela, ainda imersa no sono, não percebeu a saída de Nirai, mas seu espírito inquieto não se acalmou. Ela sentia que algo estava prestes a mudar.
Nirai parou, a mão ainda na maçaneta, sua mente correndo com perguntas. A porta trancada parecia um detalhe insignificante, mas algo sobre aquele momento o incomodava profundamente.
"O que é isso? Por que essa porta não abre?" pensou, franzindo a testa enquanto encarava a entrada à sua frente. O corredor silencioso parecia mais frio agora, como se o ar carregasse um peso invisível.
Antes que pudesse reagir ou tentar abrir a porta novamente, sentiu uma presença atrás de si. Um calafrio percorreu sua espinha, e então uma mão repousou suavemente em seu ombro. Ele congelou por um instante, antes de virar a cabeça lentamente para descobrir quem estava ali.
Nirai virou a cabeça lentamente, seus músculos ainda tensos, mas ao encontrar os olhos de Satella, um alívio imediato o tomou. A tensão que antes parecia pesar sobre ele se dissipou, como se a presença dela fosse suficiente para afastar o desconforto.
— O que você está fazendo, Nirai? — perguntou Satella, a voz suave, mas com um toque de curiosidade.
— Estava procurando o banheiro — respondeu ele, tentando disfarçar o nervosismo enquanto soltava a maçaneta.
Satella ergueu uma sobrancelha, ligeiramente divertida, antes de apontar para o final do corredor.
— Entendo, mas essa porta não leva ao banheiro. A que você procura está lá no final do corredor.
Nirai seguiu o gesto dela com os olhos, percebendo a direção correta. Ele assentiu com um sorriso sem jeito, sentindo-se um pouco tolo por não ter perguntado antes.
— Obrigado, Satella.
Ela apenas balançou a cabeça, um sorriso leve nos lábios, antes de recuar alguns passos. Nirai respirou fundo e seguiu na direção indicada, ainda com o eco da mão dela em seu ombro, uma sensação estranhamente reconfortante que ele não conseguia ignorar.
Satella suspirou levemente, seus olhos ainda fixos no corredor enquanto Nirai desaparecia dentro do banheiro. Um pensamento passageiro cruzou sua mente, mas ela logo desviou sua atenção para o que precisava fazer. Com movimentos precisos, dirigiu-se à cozinha, onde já havia preparado uma bandeja adornada com o café da manhã. O aroma quente do café fresco e o perfume suave do pão torrado se entrelaçavam no ar, criando uma atmosfera aconchegante.
Com a bandeja firmemente equilibrada em suas mãos, Satella caminhou com passos leves pelo corredor. Ao chegar à porta do quarto onde Kaela repousava, parou por um momento, observando a madeira que parecia guardar o sono tranquilo da jovem. Com um toque suave, a porta cedeu, abrindo-se sem ruído.
A bandeja em seus braços parecia flutuar, sustentada pela delicadeza de seus movimentos, como se o ar ao seu redor conspirasse para tornar a cena ainda mais serena. Ao cruzar o limiar, a luz suave do dia filtrava-se pelas cortinas entreabertas, banhando o quarto em um brilho etéreo. O semblante de Kaela, ainda sereno no repouso, parecia em perfeita harmonia com aquela paz momentânea.
A voz aveludada de Satella atravessou o silêncio, chamando Kaela de volta ao mundo. Lentamente, seus olhos se abriram, como pétalas despertando ao primeiro toque do sol. Ainda sob o véu do sono, ela virou-se na cama e encontrou o olhar gentil da amiga. Havia algo no contraste entre o gesto carinhoso e o cenário incomum que a fez hesitar, mas antes que pudesse perder-se em pensamentos, Satella posicionou a bandeja sobre suas pernas com a graça de quem conduz um rito sagrado.
— Preparei este café da manhã especialmente para você. Espero que goste — disse Satella, sua voz suave e o sorriso em seus lábios aquecendo o ambiente mais que a luz do dia.
— Obrigada, Satella — respondeu Kaela, sua gratidão ressoando mais profunda do que as palavras poderiam traduzir. Pegou um pedaço de pão torrado e deu uma mordida lenta, mas não pôde deixar de perceber a presença fixa da amiga. Os olhos brilhantes de Satella, repletos de expectativa, pareciam pesar sobre ela de forma curiosa e constrangedora.
— Satella... — disse Kaela, hesitante, escolhendo cuidadosamente suas palavras. — Será que você poderia me dar um pouco de privacidade? Seus olhos estão me deixando... um pouco tímida.
Um rubor suave tingiu o rosto de Satella, que deu um passo para trás, os gestos súbitos quase traindo sua habitual compostura.
— Claro, desculpe! Não foi minha intenção — murmurou, a voz carregando um toque de embaraço enquanto se apressava para sair do quarto. A porta fechou-se atrás dela com um sussurro, deixando Kaela novamente sozinha, envolta em um silêncio que parecia ainda mais denso após a saída da amiga.
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Atualizado até capítulo 25
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