Capítulo 04

Eu morava em Venice Beach, bem em frente à praia, num dos bairros mais badalados de Los Angeles. A vista era incrível, mas o apartamento fechado não me deixava sentir o vento fresco do mar como eu gostaria. Ainda assim, a sacada dava direto para a areia, o que fazia tudo valer a pena. Meus pais, por outro lado, moravam a 32 minutos de lá, em uma casa de frente para o mar em Malibu.

Como hoje era domingo, o ritual era sagrado: visitar a família. Estacionei o carro no pátio amplo da casa deles. O aroma salgado do mar preenchia o ar, enquanto o vento balançava as palmeiras ao redor. Mesmo morando na praia, havia algo especial em estar ali, naquela casa com espaço aberto e liberdade para sentir a brisa sem barreiras.

Assim que entrei na cozinha externa, onde minha mãe preparava o almoço, fui recebida com um sorriso caloroso e aquele tom teatral que só ela sabia usar.

— Olha só quem resolveu aparecer! — exclamou ela, me puxando para um abraço.

— Não seja tão dramática, mamãe. Conversamos ontem à noite! — retruquei, abraçando-a de volta.

Ela riu, me apertando ainda mais. Não importava o quanto eu crescesse ou quanto tempo passasse fora, para minha mãe, eu sempre seria a criança que corria por aquela mesma cozinha, atrapalhando enquanto ela cozinhava.

— Mesmo assim, é diferente ter você aqui. — Ela se afastou apenas o suficiente para me olhar nos olhos e ajeitar uma mecha solta do meu cabelo. — Vai querer ajudar ou prefere ficar no sofá esperando o almoço ficar pronto igual a Helena?

— Ajudo, claro. — Sorri, pegando um avental pendurado na cadeira próxima. — O que estamos fazendo hoje?

— Seu pai pediu frutos do mar. — Ela apontou para a grelha, onde já havia camarões temperados e fatias de limão grelhando. — Mas também fizemos sua salada favorita, só pra garantir que você coma algo saudável.

— Obrigada, mamãe. — Dei um beijo em sua bochecha antes de começar a mexer no molho que ela preparava.

Enquanto trabalhávamos lado a lado, o som do mar e o farfalhar das palmeiras criavam um pano de fundo tranquilo. Era um contraste tão grande com a agitação de Venice Beach que, por um momento, me perguntei se deveria passar mais finais de semana ali.

Logo meu pai apareceu, carregando uma cerveja e usando o chapéu de palha que ele sempre dizia ser “o segredo do sucesso” para suportar o calor.

— Minha menina! — Ele abriu os braços, e eu fui abraçá-lo.

— Oi, pai. Como estão as coisas?

— Do jeito que gosto: tranquilas. Mas agora estão melhores porque você está aqui. — Ele piscou, sempre o pai carinhoso e brincalhão.

Enquanto o almoço se desenrolava, com conversas leves e muitas risadas, percebi o quanto esses momentos com minha família eram preciosos. Por mais que a rotina e o trabalho tomassem conta dos meus dias, era ali, naquela casa em Malibu, que eu me sentia verdadeiramente em paz.

— Papai, a internet caiu! — Helena saiu do quarto bufando, o rosto franzido em reclamação, mas parou ao me ver. — Bela?

— Eu mesma! — Sorri, abrindo os braços enquanto ela corria até mim. — E você deveria largar esse celular e vir ajudar, hein?

— Até parece. — Respondeu, revirando os olhos, mas o sorriso entregava sua alegria.

— Ah, deixa de ser implicante. Eu tava morrendo de saudade de vocês. — Apertei-a em um abraço apertado, sentindo o perfume familiar dela.

— Eu não. — Helena brincou, tentando manter a pose, mas seus olhos brilhavam de felicidade.

— Sei... — Respondi com um olhar cético. — Fala isso, mas aposto que ficou marcando os dias no calendário pra me ver.

— Eu não. — Helena disse, com um sorriso travesso nos lábios, mas os olhos brilhando de alegria.

— Sei. — Revirei os olhos, apertando-a em um abraço forte. — Fala isso, mas aposto que ficou contando os dias pra me ver.

— Só nos primeiros dois... depois eu esqueci. — Ela deu de ombros, rindo enquanto se soltava de mim.

— Helena! — Mamãe a repreendeu, mas também riu da resposta. — Vá lavar as mãos e venha ajudar com a mesa.

— Tá bom, tá bom... — Helena fez um biquinho e saiu em direção à pia, ainda segurando o celular como se fosse uma extensão da mão.

— Vocês duas nunca mudam. — Papai disse, sorrindo enquanto observava a interação.

— E espero que nunca mudemos. — Respondi, colocando os últimos talheres na mesa externa.

O almoço foi animado, como sempre. Helena insistia em discutir as últimas tendências que descobriu no TikTok, enquanto papai fazia comentários engraçados sobre como ele "não entendia nada dessas coisas". Mamãe ria enquanto cortava mais limões para o peixe grelhado, e eu apenas apreciava a energia caótica e amorosa da minha família.

Depois de comermos, Helena me puxou pela mão até o balanço que ficava no jardim, perto da praia.

— E aí, como anda a vida? Tá famosa já? — perguntou, balançando-se de leve.

— Ainda não. — Sorri, jogando a cabeça para trás para sentir o vento no rosto. — Mas estou trabalhando nisso.

— Deve ser muito legal morar com a melhor amiga, trabalhar com um time grande como os Scorpions. Aposto que tem histórias incríveis.

— Tem seus altos e baixos, Heli. — Suspirei. — Às vezes sinto falta de casa, sabe? Da tranquilidade daqui.

— Então volta. — Ela deu de ombros, como se fosse a solução mais simples do mundo.

— Não é tão fácil assim. — Respondi, bagunçando seu cabelo. — Mas é bom saber que sempre posso vir aqui quando precisar recarregar as energias.

Ela sorriu, e ficamos em silêncio por um tempo, apenas ouvindo o som das ondas quebrando na areia.

— Ei, vamos dar uma volta na praia? — perguntei, me levantando.

— Só se você me carregar nas costas. — Helena disse, rindo e já se jogando em mim.

— Helena! — Protestei, mas não consegui conter o riso enquanto começávamos a correr em direção à areia, o sol dourando o final de mais um domingo perfeito em Malibu.

Fui filha única por longos treze anos. Quando meus pais anunciaram que eu teria um irmão, comecei a orar todas as noites, pedindo para que fosse uma irmãzinha. E então, veio Helena, o presente que eu nem sabia que precisava, mas que mudou minha vida para sempre.

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