|T01E09| As memórias de Jeremy - Parte 2

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...[12 de outubro — Dia da criança — sala de estar — manhã]...

Pardolome — Só os seus pais estão nessa memória.

Jeremy — Eu ainda não tinha chegado em casa, estava vindo da casa de um amigo, que era vizinho meu, tínhamos passado dias a pintar um quadro para a minha mãe. Era um presente atrasado que eu queria dar a ela... — Diz a sorrir com lágrimas a descer do seu rosto. — Eu estava tão feliz... — Limpa o rosto. — Eu ia entregar a ela no dia anterior, quando o meu pai ainda não havia chegado do trabalho, mas só teria como pegar o quadro na casa do meu amigo pela manhã. Era para ser o melhor dia da minha vida.

Sheila — Gregory, essa mesinha está bamba, vai acabar derrubando a garrafa e derramando o vinho.

Gregory — Isso não é problema meu, Sheila. Eu passo a semana inteira no trabalho, raramente tenho folga e com certeza eu não fico o dia todo nessa casa! Se essa mesinha está bamba e se essa garrafa de vinho cair e derramar nessa sala, será problema seu! — Diz enquanto assiste a seu jogo na televisão.

Sheila — Se você pelo menos se importasse com a minha situação... — Diz a estar atrás dele a limpar o corredor que dava na entrada da casa.

Gregory — O que você disse? — Vira para ela, sem se levantar do sofá. — Escuta aqui, se não fosse pelo meu dinheiro está pagando o seu tratamento, você nem estaria aqui! Porque não tem onde cair morta! Eu gasto rios de dinheiro para manter você viva, dessa doença que está te deixando horrorosa, e nenhum outro homem faria isso! — Revira para a televisão. — E o que eu ganho com isso? As suas reclamações e ingratidão!? — Chuta a mesinha.

Sheila — Eu não, eu não queria dizer... — Começa a sentir-se ameaçada.

Gregory — Sabe que eu não gosto de ingratidão, não sabe? — Continua a olhar para a televisão. — Diz... Diz que a culpa é sua, vamos, eu quero ouvir você dizer... Vamos! — Fala num tom alto com os dentes cerrados. — Não me deixe ficar esperando…

Sheila — A... A culpa é minha... — Diz com a voz embargada e com lágrimas nos olhos.

(Ele) — Mamãe! Mamãe! — Entra pela porta da frente com um sorriso no rosto a ir na direção dela.

Sheila — Oi! meu filho... Já chegou. — Limpa o seu rosto rapidamente, para ele não ver.

Gregory — Não sabe falar baixo, Jeremy! Está a atrapalhar o meu jogo. — Diz enquanto tenta colocar mais vinho no seu copo, e sem querer, derrubar um pouco de vinho na mesinha. — Droga... — fala em tom baixo para que eles não ouvissem, e põe novamente o pé na mesinha onde ficou a garrafa e o copo, sem dizer nada a eles.

(Ele) — Eu trouxe um presente para a senhora! — Diz empolgado. — Feliz aniversário! — E entrega o pequeno quadro embalado.

Gregory — O aniversário dela já passou, e o seu presente não vai valer nada agora, ainda mais se for aquelas porcarias de desenhos que você faz.

Sheila — Não liga para essas palavras, meu pequeno pintor. — Diz só para ele ouvir, ao pegar e abrir o presente com um sorriso, após ser o seu rosto retratado em detalhes únicos. — Oh! meu querido, ficou lindo... — O abraça a dar um beijo na sua testa.

Gregory — Para de dizer bobagens! Deixa eu ver o que você fez...

Quando ele se aproxima da mesinha para mostrar o seu quadro pintado, Gregory derruba discretamente com o pé a garrafa que cai a espalhar vinho pelo carpete branco.

Gregory — Olha o que você fez! O seu imprestável! — Grita ao levantar-se do sofá.

(Ele) — Desculpa... Eu não queria que isso acontecesse... — Diz a ficar com medo e a segurar com força o seu quadro.

Gregory — Você vai se arrepender de ter estragado o meu carpete e o meu vinho! — Arranca o quadro das mãos dele, e caminha até a entrada.

Sheila — Por favor, Gregory. Não faça Isso! — Tenta o impedir de sair com o quadro.

Gregory — Não se meta nisso! — Diz a soltar o braço no rosto dela com violência, a fazê-la cair no chão com o nariz a sangrar. — Essa palhaçada de pintura acaba hoje! Se depender de mim, você nunca mais vai pintar! — Vai até o quintal na frente da casa e quebra o quadro, e após isso, ao pegar um galão de gasolina e jogar em cima da pintura, ele ateia fogo.

Tudo enquanto eles observavam dentro da casa, pois, a porta tinha ficado aberta e podia ser vista aquela cena.

Pardolome — Era para ter sido uma memória afetiva, se ele não tivesse feito tudo isso.

 Jeremy — Com ele, eu só consigo criar traumas... — Diz a olhar para a Sheila em seguida. — Foi a primeira vez que eu vi a minha mãe apanhar.

Pardolome — Eu sinto muito, Jeremy. — Segura no ombro dele. — Você é um ótimo pintor...

Jeremy — É, mas o meu sonho de ser pintor foi queimado no fogo... — Diz a olhar novamente para fora da casa onde estava o seu quadro a queimar.

Eles então caminham até às escadas para o segundo andar, onde estava um corredor com portas de ambos os lados, uma de frente para outra, e assim a memória encerra-se.

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[14 de fevereiro — Dia dos Namorados — quarto de Jeremy — noite]

Eles entraram em um dos quartos do corredor, que era de Jeremy, onde ele passava boa parte da sua vida trancado, e onde ele o viu deitado na cama acordado, com a luz acesa e com uma expressão de medo no rosto, sem parar de olhar para a porta, após eles entrarem e fecharem.

Pardolome — Quer contar o que aconteceu? — Observa o ambiente. — Você aparenta estar muito assustado naquela cama, e não para de olhar para a porta.

Jeremy — Eu tinha ido dormir cedo naquele dia, mas no meio da noite eu acordo com os gritos da minha mãe e do meu pai, e não parecia ser só mais uma discussão, como era de costume. E então, acabei por não conseguir voltar a dormir, e ficar com muito medo dele fazer alguma coisa contra ela.

Então, eles conseguem ouvir o som da discussão vindos do quarto à frente, que era do casal.

Gregory — Eu não quero você conversando com mais ninguém! Nem mesmo com a sua família! Se depender de mim, nem de casa você vai sair!

Sheila — Eu já disse que só conversei com o entregador, para decidir onde ficariam todas as encomendas que você pediu! — Som de tapa. — Eu não fiz nada de mais!

Gregory — Se tivesse chegado as minhas encomendas, era para você ter me chamado! E não ficar de conversa com entregador nenhum! Você é só minha! — Som de tapa novamente. — E só conversa com quem eu quero!... — Som de algo a ser arrastado. — E como punição pelo que você fez... — Som da gaveta a ser aberta.

Sheila — Você estava ocupado! Gregory!... — Diz a chorar. — Por favor, eu imploro... Isso de novo não... Por favor, Gregory!... Não!!!

(Ele) — Não, mamãe!... — Se levanta da cama do seu quarto ao corredor, a ver a porta do outro quarto aberta, e aquela cena que o assunta, Sheila de joelhos a segurar Gregory que usava um soco-inglês em uma das suas mãos.

Sheila — Jeremy... Meu amor, eu te peço... Volta para o quarto... — Diz enquanto se esforça para segurá-lo.

(Ele) — O que ele está fazendo com você, mamãe? — Pergunta assustado ao perceber os hematomas no braço dela junto a um inchaço do seu rosto.

Gregory — Sai daqui, Jeremy! — Não se meta em uma briga de casal!... Eu mandei você sair! — Avança para fechar a porta.

(Ele) — Não! — Segura a porta para não ser trancada.

Gregory — Está me desobedecendo, Jeremy? — Empurra Sheila para trás e sai para o corredor, onde ele estava. Ao perceber ela se aproximando, ele fecha a porta do lado de fora, a trancando lá dentro.

Sheila — Não machuca o meu filho! — Bate na porta. — Não machuca o meu filho! — Continua a bater na porta. — Ele é só uma criança... — As batidas diminuem. — Não machuca ele... — O som das mãos sendo arrastadas na porta pôde ser ouvida. — Ele não tem culpa…

Gregory — Eu fui muito paciente com você, por que ainda era pequeno... — O agarra a arremessar ele na parece do final do corredor. — Mas já está grande o suficiente... está até me desobedecendo... — Se aproxima dele. — Mas vai ter que aprender que tudo nessa vida há consequências! — Pisa no peito dele e começa a pressionar com força. — Agora eu vou descontar todo o meu ódio em você! — Começa a pisotear ele ainda no chão, e após isso, começar a esmurrá-lo várias vezes.

Pardolome — Isso é cruel demais... até para um pássaro como eu.

Jeremy — Ele só parou quando eu urinei nas calças e desmaiei em seguida. — Diz a pontar para o chão. — Essas manchas do meu sangue ficaram semanas naquele piso. Eu não conseguia olhar para aquele canto do corredor... até a minha mãe falecer…

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...[12 de maio — Dia das mães — quarto do hospital — Dia]...

Jeremy e Pardolome perceberam que as batidas na porta do quarto onde Sheila estava, cessaram. Então, Jeremy abre a porta e encontra-se no quarto de um hospital, onde ela estava na maca, sem o cabelo e a usar cânulas nasais:

Pardolome — Não estamos mais na sua casa.

Jeremy— Estamos no hospital onde ela foi internada às pressas, esse era um dos poucos momentos que eu podia visitá-la. Eu estou ali do lado dela, a desenhar nós dois numa praia... — Começa a sorrir. — Ela adorava o mar... — E começa a chorar também, não conseguindo mais resistir.

Pardolome — Não precisa dizer mais nada, Jeremy. Já está a sofrer demais aqui. Vamos terminar essas memórias o quanto antes.

(Ele) — Terminei! — Entrega uma pequena folha com o desenho para ela.

Sheila — Já, meu amor...— Pega o desenho enquanto deixa ele deitar ao seu lado e inclinar a cabeça no seu ombro. — Que desenho mais lindo! E quem é esse aqui? — Aponta no desenho.

(Ele) — Esse aqui sou eu... — Também aponta no desenho. — E esse aqui é a senhora! — Aponta novamente no desenho. — Estamos sentados na praia, vendo as ondas passarem, como você tanto queria.

Sheila — Ah!... Mas onde está a sua capa, meu pequeno herói? — Pergunta sorrindo a beijá-lo e abraçá-lo enquanto ele também sorri de felicidade.

(Ele) — Eu esqueci de colocar... Estava com pressa para terminar, aí esqueci. Mas a senhora eu fiz direitinho, não foi?

Sheila — Sim, meu pequeno herói. — Olha para o teto a sorrir. — Foi o maior presente que eu tive em toda a minha vida…

(Ele) — O desenho que eu fiz? — Pergunta a olhar para ela.

Sheila — Não só o desenho... Você ter nascido foi o melhor presente que já recebi em toda a minha vida! — Olha para ele, a sorrir.

(Ele) — Sério, mãe?... — Começa a derramar lágrimas de emoção.

Sheila — Muito mais que a praia e as ondas... — Diz a enxugar as lágrimas dele. — Você é o meu herói, o pequeno Jeremy... — Diz a acariciar o cabelo dele. — Eu te amo para sempre, está ouvindo? — Pergunta a passar com carinho a mão no seu rosto.

(Ele) — Eu também amo a senhora, para sempre! — Diz para ela com toda a certeza, como se estivesse a prometer que isso não mudaria.

Sheila — A mamãe precisa descansar agora... — Diz ao ver a enfermeira chegar com alguns acessórios numa bandeja.

(Ele) — Eu não quero te deixar! — Abraça ela sem soltar.

Sheila — Eu sei meu amor, mas precisa entender o meu lado. Eu também não quero te deixar, por você eu viveria para sempre, mas... A mamãe não aguenta mais sofrer dessa doença incurável, que só se agrava ainda mais. Eu preciso descansar.

(Ele) — A senhora vai me deixar? — Pergunta a olhar para ela com medo de perdê-la.

Sheila — Nunca... Porque eu sempre vou viver no seu coração. — Diz ao retribuir aquele apertado abraço de Jeremy.

Pardolome — Você não merecia perdê-la.

Jeremy — Ninguém merece perder quem mais ama, Pardolome... Essa foi a última vez que eu vi ela... Foi a nossa última conversa.

Pardolome — Vamos sair daqui... parece que essa é a última memória.

E então, ao saírem do quarto do paciente para o corredor onde tinha os bancos de espera, eles viram Jeremy sentado com a cabeça baixa, apenas a soluçar, e vindo ao final do corredor numa expressão séria e orgulhosa, Gregory que chega até ele a agachar na sua frente e encará-lo:

Gregory — Ainda continua a chorar? Vai ficar sentado lamentando por quem já morreu, enquanto eu fico a esperar você no carro? — Segura as mãos que ele limpava o rosto. — Escuta aqui, Jeremy. Eu também estou sofrendo por ela, mas não estou a choramingar pelos cantos como alguém fraco faria! Como você está fazendo! Você é igual a ela... (suspira)

(Ele) — Para, para onde vamos? — Diz triste e com medo.

Gregory — Isso não é da sua conta! Apenas vamos embora logo... E limpe esse rosto direito! Você não deveria estar chorando tanto por ela, se você sabe que é o culpado pela morte dela! Você é o culpado por ela querer dar à luz, mesmo sabendo que teria complicações na saúde! Olhar para a sua cara me dá raiva! Você nunca fez parte da minha família! E a única coisa que te mantinha dentro da minha casa era ela! Mas agora ela morreu... E você está sozinho. E provavelmente não vai durar muito, porque você é só um garoto fraco e medroso que nunca será um "Olsen"!

(Ele começa a chorar novamente)

Gregory — Diz, Jeremy... Fala que você é o culpado por ela ter morrido. — Preciosa ele contra a parede. — Eu estou esperando você dizer... Diga! — Desfere uma tapa no rosto dele. — Vamos!... — Desfere outra tapa no rosto dele. — Eu quero que diga, vamos! — Desfere uma tapa pela terceira vez. Até que ele diz:

(Ele) — Eu... Sou o culpado pela morte dela...

Gregory — De quem, Jeremy? Termina a frase!

(Ele) — Pela morte da minha mãe...

Pardolome — Você sabe que é mentira, Jeremy? Ela não morreu por sua causa.

Jeremy — Eu não sei... Tudo isso é muito difícil para mim. Esse também foi o último dia que eu fiquei com ele.

Pardolome — Estar a dizer que ele te mandou para algum orfanato?

Jeremy — Ele financiava um dos orfanatos para onde ele me enviou. Eu não o vi depois disso.

Pardolome — Então, você não quer voltar para a casa, mas sim, para um orfanato.

Jeremy — Qualquer lugar é melhor que estar com ele.

Pardolome — Quando nos encontramos pela primeira vez, havia dito que os seus pais estavam a esperar.

Jeremy — Eu disse aquilo porque não te conhecia. Mas agora, você conhece um pouco da minha história. — (Um portal abre atrás deles) — Podemos ir agora, não há mais nada para ver aqui.

Pardolome volta a sua forma de pássaro, e eles entram no portal que fecha-se em seguida. E aquela memória se encerra.

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Atualizado até capítulo 37

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