— O que está acontecendo comigo? Eu me sinto tão estranho, tão… estranho, é como se eu soubesse que não estou aqui… eu não estou aqui! Eu devo estar louco, mas… definitivamente não estou em frente a praia, ao lado de um pássaro falante e com apenas esse short… espera… (observa o seu corpo) esse não sou eu! O que eu estou fazendo nesse corpo? Não…, não…, não… devo estar em um sonho, eu não posso acreditar que eu estou aqui e que eu sou assim! Eu não falo desse jeito e com certeza não falo com animais falantes! Se eu visse um animal falante na minha frente, certamente correria. O que eu estou fazendo nessa praia? Porque não consigo correr? Onde estão os meus verdadeiros pés, as minhas verdadeiras mãos e o meu verdadeiro corpo? Onde eu estou?
— Bem aqui ao meu lado… – responde o pássaro, que ouvia tudo o que garoto pensava em voz alta, ainda que fosse apenas sussurros. – Eu tenho uma boa audição, sabia? – com o susto, o menino corre a dar alguns passos para a frente, até perceber que o pássaro estava ali.
— Tinha esquecido que estava ao meu lado… (suspira aliviado) – o que aconteceu? – pergunta a coçar a cabeça sem entender.
— Eu é quem pergunto. Estávamos conversando e após isso, ficamos em silêncio até o sol repousar no horizonte, e de repente, você entrou numa crise. – Explica para ele e voa a dar uma volta em torno dele, e em seguida, retorna onde estava.
— Você ouviu o que eu disse, não foi? – (o pássaro balança a cabeça a indicar que sim, e logo após essa reação de resposta o menino continua) – Então, você pode entender o que eu quero dizer… eu estou em uma corpo que não é meu, em um lugar que não estou, e falando com uma ave que não existe! Porque nada existe, esse lugar não existe, você não existe… eu não existo! – De repente, a ave voa e com o seu bico fere a testa de garoto, que reage com um breve grito de dor, a esfregar a palma da mão na testa levemente.
— Porque fez isso? — pergunta o garoto irritado pelo que o pássaro tinha feito.
— Para trazê-lo novamente à realidade. — responde o pássaro a ser interrompido em seguida.
— Abrindo uma ferida em mim, com o seu bico? — questiona ele, ao olhar para os seus dedos das mão em que passavam levemente no ferimento, percebendo estarem com sangue.
— Algumas feridas são necessárias para nos trazer novamente à realidade. O que vê nos seus dedos não é somente o seu sangue, é a sua vida que saiu do seu corpo para que a veja e não esqueça que ela existe…, você existe! E que ela depende de você para continuar a existir. Você depende de si mesmo para continuar existindo.
— Mas, mas… (começa a chorar) eu não sei lidar com essas crises que tenho… os meus pais, eles… eles não entendem isso. – (lágrimas escorrem pelo seu rosto, sem parar) – O meu pai, ele… ele me culpa muito… – (começa a limpar o rosto das lágrimas enquanto elas continuam a cair. – … Pelo que aconteceu com a minha mãe… eu… eu não tive culpa! Mas eu sinto culpa… – por um instante, o garoto perde as forças das pernas e cai de joelhos.
— Eu confesso que por um momento, pensei em esperar que desabafasse tudo o que estava a encher o seu interior até transbordar pelos seus olhos, para então, o consolar. Porém, preferi deixar primeiro as lágrimas aliviarem a dor que sente em seu fragilizado e inocente coração, para depois, poder dizer o que penso sobre tudo isso, e você precisa estar calmo para me ouvir bem. – Então, o pássaro pega com o seu bico embaixo de uma das suas asas, um curativo e entrega na mão do garoto, que pega a ter parado de chorar.
— Qual é o seu nome? — pergunta curioso, enquanto colocava o curativo.
— Pardolome… não chore mais, essa crise já passou. Agora enxergue além do que irei dizer. – (Por um momento, o som das ondas diminui)
— Eu queria que essa dor não existisse. – expressa o garoto, já calmo do seu momento de crise.
— A dor é um dos únicos atributos que acompanham os seres vivos, até os seus últimos momentos, se entender isso, poderá sobreviver nesse mundo. Essa dor que você sente é necessária, ainda que não saiba a necessidade… – (de repente, Pardolome começa a sentir os seus ferimentos) — A dor sempre iremos sentir, ainda que seja insuportável, ainda que seja incômoda e o faça esperar e pensar o pior!... Mas a verdade é que a dor sempre iremos sentir, já a ausência dela, nunca. – (a dor intensifica e o faz perder as forças e cair na areia)
— Pardolome!... – grita o garoto que vai até a sua direção para o ajudar. – Eu vou ajudar você a ficar bem, não faça esforço… – coloca o seu curativo em um ferimento encontrado na asa esquerda dele. – posso me curar sozinho, você não… – Ao colocá-lo em seus braços, Pardolome permanece imóvel, a recuperar as suas forças.
— Não tenha tanta certeza…
— Jeremy!... Jeremy Olsen.
— Então esse é o seu nome… — diz surpreso ao retomar a palavra. — Não tenha tanta certeza, Jeremy. — Enquanto falava, por um momento, o garoto consegue ver por uma pequena fresta na venda cinza do pássaro, um olhar penetrante escondido nele.
— Somos amigos, não é? — Pergunta ansioso por um sim.
— O que você acredita ser um amigo, Jeremy? – Responde sem esperar ser respondido.
— Eu… eu não sei. — responde em seguida, ainda a tentar pensar em uma resposta.
— Já esperava que não conseguisse responder a minha pergunta, mas, ainda sim, quis perguntar. Não tenha pressa em querer responder todas as perguntas, muitas delas não tem a resposta que desejamos receber, e, algumas delas, não podem ser pressionadas a serem respondidas, quando ainda não estamos preparados para sabermos. Se insistir antes do tempo, irá frustrar-se e criar uma mentira a fim de preencher os seus questionamentos, e, consequentemente, o impedindo de saber e encontrar a verdadeira resposta.
Repentinamente, o som das ondas aumenta, a lua e as estrelas iluminam a extensa praia até o horizonte.
— E isso é mau? — pergunta Jeremy, querendo entender tudo o que o Pardolome dizia.
— É mau para si mesmo e as pessoas próximas a você. – E então o pássaro vira o rosto em direção ao mar, e o garoto o acompanha na mesma direção. — Não tenha medo do mar, Jeremy, aprenda a nadar…
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Atualizado até capítulo 37
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