°•Capítulo 4•°

Enquanto dirigia de volta para casa, as rodas da caminhonete deslizando suavemente pela estrada de terra, minha mente permanecia fixa naquela mulher. Aurora. Era um nome que combinava perfeitamente com ela — brilhante, porém carregado de algo que parecia estar além do alcance da luz.

Eu não sabia o que esperava ao parar naquela estrada ao lado de um carro com o pneu furado. No início, achei que seria apenas mais um gesto simples, algo que eu faria sem pensar duas vezes. Mas, ao vê-la descendo do carro, segurando aquele garoto nos braços, percebi que não seria um encontro comum.

Seus cabelos ruivos, soltos e bagunçados pelo vento, combinavam com os olhos que, mesmo marcados por cansaço, carregavam determinação. E então houve aquele momento — um toque de mãos, simples, mas poderoso. Foi o suficiente para fazer algo em mim despertar, algo que eu já havia enterrado há muito tempo.

Aurora era diferente. Isso ficou claro na maneira como ela falava, como carregava o filho com um instinto protetor quase palpável. Luca, o garotinho adormecido, era a extensão dela, a razão para cada movimento cuidadoso que fazia. Havia força ali, mas também uma vulnerabilidade que ela tentava esconder.

Eu sabia que ela estava começando de novo. Não precisava perguntar. Eu reconhecia aquilo porque já tinha estado ali. Recomeçar, reinventar-se, tentar esquecer os pesos do passado... Era algo que exigia mais coragem do que a maioria das pessoas imaginava.

Enquanto a caminhonete avançava, senti um sorriso involuntário surgindo em meu rosto. Ela não fazia ideia, mas tinha deixado uma marca em mim. Não sabia se era a forma como me agradeceu, com aquele misto de alívio e hesitação, ou a intensidade silenciosa do nosso breve contato.

O destino gosta de brincar com a gente. Talvez fosse só isso: um encontro casual, um bom ato no meio de um dia comum. Mas algo me dizia que não era. Aurora e seu pequeno Luca eram o tipo de começo que a vida coloca no nosso caminho para nos lembrar que, às vezes, o inesperado tem mais significado do que qualquer plano.

Quando finalmente cheguei à minha fazenda, desci do carro e olhei para o horizonte. A casa grande parecia mais vazia do que o normal, e um silêncio profundo preenchia o ar ao meu redor.

Mas agora, de alguma forma, esse silêncio parecia diferente.

Aurora Bianchi havia cruzado meu caminho, e eu sabia, no fundo, que esse não seria o último encontro. Porque algo dentro de mim já ansiava por mais — mais daquele olhar, mais daquela força que ela não percebia que exalava.

Eu ainda não sabia como ou quando, mas o destino tinha nos cruzado por uma razão. E talvez, só talvez, essa fosse a primeira página de algo maior.

Enquanto a noite se aproximava, fui tomado por uma inquietação que não sentia há anos. Na varanda da minha casa, com um copo de vinho na mão, meus olhos vagavam pelo céu, mas minha mente estava presa em Aurora e Luca.

Por mais que tentasse racionalizar o que sentia, algo me puxava de volta à imagem dela, parada na estrada com o pequeno nos braços. Ela parecia carregar o mundo nas costas, mas o fazia com uma dignidade que eu não conseguia ignorar. Quem era Aurora Bianchi? Que histórias e cicatrizes a haviam moldado?

Eu suspirei, encostando o copo na borda da mesa de madeira ao meu lado. Minha vida tinha sido construída em torno de certezas — trabalho, rotina, controle. Eu sabia exatamente onde começava e terminava cada dia. Ocasionalmente, permitia-me um gesto altruísta, como ajudar um estranho na estrada, mas nunca isso deixava uma impressão tão profunda.

Aurora não era só uma mulher bonita que precisava de ajuda. Havia algo nela, algo que parecia espelhar meus próprios demônios. Quando nossos olhares se cruzaram, vi mais do que cansaço. Vi um passado complicado, escolhas difíceis. Talvez fosse apenas projeção minha, mas parecia que ela estava tentando se reconstruir da mesma maneira que eu havia feito tantos anos atrás.

A ideia de encontrá-la de novo me parecia inevitável. Não por capricho ou curiosidade, mas porque algo me dizia que nossos caminhos ainda estavam entrelaçados. E Luca... havia algo sobre aquele garoto. Ele parecia tão indefeso, tão inocente. O tipo de criança que faz você querer ser alguém melhor.

Terminei o vinho e me levantei. A brisa da noite carregava um frescor que parecia sussurrar promessas de mudança.

Aurora Bianchi havia entrado na minha vida como uma tempestade calma, e eu não conseguia ignorar o impacto.

Antes de entrar, olhei uma última vez para o horizonte. Um novo dia estava para nascer, e eu sabia que ele carregaria algo diferente.

Aurora Bianchi havia acendido algo dentro de mim. E, pela primeira vez em muito tempo, eu me senti pronto para descobrir o que era.

Os dias seguintes foram uma mistura de trabalho e pensamentos vagando para Aurora. Na fazenda, tentei me concentrar nas responsabilidades de sempre: inspecionar os vinhedos, lidar com fornecedores e resolver os problemas inevitáveis que surgiam no negócio. Mas, por mais que me ocupasse, ela e Luca continuavam surgindo em minha mente.

Passei uma manhã organizando documentos no escritório da casa, mas meus olhos sempre acabavam se desviando para a janela, como se esperassem vê-la lá fora. Irritado comigo mesmo, levantei-me e saí para respirar o ar fresco. No caminho para o celeiro, decidi checar com os mecânicos locais se haviam levado o carro dela para conserto.

Foi quando ouvi o som de pneus esmagando o cascalho na entrada da minha fazenda. Olhei para trás e, para minha surpresa, vi um carro que reconheci imediatamente. Era o veículo alugado por Aurora, agora com um pneu novo.

Ela saiu do carro devagar, Luca em um dos braços e uma expressão hesitante no rosto. Meu coração bateu mais rápido ao vê-la, mas mantive a calma e caminhei até eles.

RAMÓN: (sorrindo) Não esperava te ver de novo tão cedo.

Aurora sorriu timidamente, ajustando Luca em seus braços.

AURORA: (quase sem jeito) Eu... é que queria agradecer por tudo. Disseram na oficina que foi você quem cuidou do carro.

Balancei a cabeça, gesticulando com as mãos.

RAMÓN: Não foi nada. Só fiz o que achei que precisava ser feito. Você e Luca estavam na estrada; não dava pra deixar vocês assim.

AURORA: Mesmo assim, obrigada. Foi muito gentil.

Houve um momento de silêncio entre nós, enquanto ela olhava ao redor, como se estivesse observando a fazenda pela primeira vez. Luca, ainda em seus braços, apontou para um dos cavalos no pasto e sorriu.

LUCA: Cavallo, mamma! (Cavalo, mamãe!)

RAMÓN: (rindo) Ele tem bom olho. Esse é o Tornado, nosso mais teimoso.

Aurora sorriu, olhando para o filho com carinho.

RAMÓN: Ele não fala português?

AURORA: Fala, mas só o básico. Estamos trabalhando nisso aos poucos.

Aurora riu suavemente, olhando para o filho com carinho.

AURORA: Ele adora animais. Onde morávamos antes, não tínhamos muito espaço para isso. Aqui é completamente diferente.

RAMÓN: (curioso) Está se adaptando à vida no campo?

Ela suspirou, pensativa.

AURORA: Ainda é tudo muito novo, mas... acho que é o lugar certo para recomeçar.

Aquela última palavra ficou no ar, como uma confissão velada. Recomeço. Era exatamente o que eu enxergava nela desde o início.

RAMÓN: (com suavidade) Se precisar de alguma coisa, sabe onde me encontrar.

Ela olhou para mim com um misto de surpresa e gratidão, como se não esperasse ouvir aquilo.

AURORA: (sorrindo) Obrigada.

Eu não sabia exatamente o que estava acontecendo entre nós, mas havia algo ali. Uma conexão que eu não conseguia ignorar. E, pela forma como seus olhos encontraram os meus antes de desviar, talvez ela sentisse o mesmo.

Enquanto ela colocava Luca de volta no carro e se preparava para partir, algo em mim queria pedir que ficasse, que conversássemos mais. Mas me contive. Haveria outras oportunidades, eu sentia isso.

Quando o carro de Aurora desapareceu pela estrada, fiquei parado por um momento, olhando para o horizonte. A sensação de que algo grande estava prestes a mudar na minha vida não me deixava.

E, pela primeira vez em muito tempo, eu estava disposto a deixar o destino tomar conta.

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Cristiane

Cristiane

Amando a leitura ❤️

2025-02-04

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