Jasmim
A noite chegou, suave e tranquila, mas dentro de mim uma inquietação cresce como uma onda prestes a quebrar. Estamos todos na pequena igreja da cidade, a luz cintilando suavemente, refletindo a paz que a maioria parece sentir, mas que, ultimamente, tem me escapado.
O pastor Rodrigo conduziu um culto belo, cheio de palavras reconfortantes, mas algo dentro de mim não se aquieta. Eu ouvi a pregação, observei os rostos ao meu redor, mas não consegui me livrar dessa sensação crescente de vazio. Algo está faltando, algo que não sei exatamente como descrever.
Enquanto as pessoas ao redor começam a se dispersar, conversando animadas, meu olhar se fixa no pastor, que está indo em direção ao seu carro. Ele parece alheio à movimentação, calmamente guardando a Bíblia no banco do motorista, já prestes a entrar no carro e ir para casa.
Não sei o que me impulsiona, mas algo me força a me levantar de onde estou, e caminhar até ele, sem saber muito bem o que vou dizer, mas sentindo que não posso ir embora sem ter essa conversa.
— Pastor Rodrigo! Pastor Rodrigo, será que podemos conversar? — minha voz soa mais alta do que eu queria, carregada de uma urgência que eu não consigo controlar.
Ele interrompe seu movimento, a chave na mão, e se vira para mim com um sorriso gentil, como se já soubesse que algo estava pesando no meu coração. Seus olhos são tranquilos, serenos, como se ele fosse uma rocha diante de uma tempestade interna que parece estar se formando em mim.
— Jasmim, mas é claro, minha filha, o que quer compartilhar? — ele diz, a voz calma, acolhedora, sem pressa.
Ele se aproxima um pouco mais, colocando a chave no bolso e me dando total atenção. Eu paro na frente dele, o estômago apertado, e a sensação de estar prestes a me desnudar emocionalmente me deixa nervosa. Não sou dada a falar abertamente sobre o que sinto, principalmente sobre minhas dúvidas espirituais, mas sinto que preciso disso, mais do que nunca.
— É que, pastor... — começo, a voz falhando um pouco. Engulo em seco, tentando encontrar as palavras certas. — Ultimamente, tenho enfrentado dias difíceis. Não de uma forma física, mas mais emocional mesmo. Eu... eu não sei, pastor. Por mais que eu acredite em Deus, eu não estou conseguindo mais vê-lo aqui, sabe? Na igreja. Eu ouço as palavras, vejo as orações, mas não sinto mais a presença dele, entende?
Minhas mãos tremem ligeiramente, e eu as aperto com força contra o vestido, tentando me controlar. Olho para o pastor, procurando por alguma resposta, mas também me sinto vulnerável, como se tudo o que eu fosse estivesse à mostra.
— Eu sinto um desejo forte dentro de mim... — continuo, agora com mais firmeza, como se tivesse encontrado a chave para o que estou sentindo. — Um desejo não de crer nele, mas de sentir ele, sabe? Quando a brisa me acaricia, quando o sol me ilumina, quando os passarinhos cantam, quando a chuva cai molhando a grama, quando olho para uma criança, quando um idoso me traz sua paz... É em tudo isso que eu vejo Ele, pastor. Deus está em tudo para mim, em cada átomo, em cada partícula, por menor que seja. No grande, no pequeno, é ali que eu o encontro.
Enquanto as palavras saem, um peso parece se dissipar do meu peito. Eu nunca tinha falado assim, nunca tinha compartilhado com ninguém essa sensação de estar conectada a algo maior, a uma presença que não se manifesta em sermões ou rituais, mas na essência das coisas simples da vida.
E, à medida que falo, percebo que esse sentimento de busca, esse vazio que me consome, não é algo isolado. Talvez seja uma busca por algo que não se encontra nas paredes da igreja, mas em algo mais vasto, mais imersivo.
O pastor me observa em silêncio, o rosto sereno, mas com os olhos atentos, como se estivesse absorvendo tudo o que eu disse, compreendendo cada palavra sem pressa de oferecer uma resposta imediata. Ele é paciente, e isso me acalma.
Por um momento, nenhum de nós diz nada. O som da noite ao fundo, o canto suave de alguns grilos e o sussurrar da brisa nas árvores preenchem o silêncio, criando um espaço sagrado entre nós dois.
— Jasmim... — diz ele, por fim, com uma suavidade que me faz relaxar. — O que você descreveu, minha filha, é uma forma muito bonita de se conectar com Deus. Às vezes, a presença d'Ele não se manifesta da maneira que esperamos ou desejamos, mas isso não significa que Ele não esteja conosco. Ele está em cada pedacinho de criação, como você tão bem percebeu. Deus não está apenas nas palavras, nos templos ou nas cerimônias... Ele está na vida que pulsa ao nosso redor, na beleza dos momentos simples que você mencionou.
Eu o escuto atentamente, sentindo uma sensação de alívio, como se ele estivesse tocando algo profundo dentro de mim, algo que eu mesma não conseguia nomear. Então, ele continua:
— Talvez o que você esteja buscando, Jasmim, não seja uma resposta pronta ou uma sensação de segurança imediata. Mas talvez seja uma nova forma de se abrir para o que Ele está mostrando. Às vezes, a presença de Deus se revela na quietude, na simplicidade, no que não pedimos ou esperamos. Quando você percebe o divino no que está ao seu redor, você não está apenas crendo. Você está vivendo a fé.
Eu fecho os olhos por um momento, absorvendo as palavras do pastor. Elas ecoam dentro de mim, e algo se acende. Eu sempre pensei que minha fé dependia de respostas claras, de certezas inabaláveis, mas talvez a verdadeira fé esteja mesmo na busca incessante, na abertura para sentir, para ver Deus em cada parte do mundo.
Quando abro os olhos novamente, vejo o pastor me observando com um sorriso tranquilo, um sorriso de quem sabe que a jornada de fé é feita de altos e baixos, mas que cada passo dado na busca é valioso. E, ele prossegue:
— Você não está sozinha nessa jornada, Jasmim. A busca por Deus é algo pessoal, mas você nunca está distante d'Ele, mesmo quando parece não encontrá-lo. Ele está em você, na sua busca, na sua honestidade.
Eu dou um pequeno sorriso, aliviada, grata. Não é uma resposta definitiva, mas é exatamente o que eu precisava ouvir. Às vezes, o que nos falta não é a resposta, mas a coragem de perguntar e de continuar buscando.
— Obrigada, pastor. — Minha voz sai suave, mas com um toque de gratidão genuína. — Eu precisava ouvir isso.
Ele coloca a mão sobre meu ombro com um gesto paternal, e eu sinto um calor reconfortante.
— Deus te abençoe, Jasmim. E lembre-se: você já está no caminho.
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Atualizado até capítulo 52
Comments
Nannda Gomess 💋🍀
nossa eu me vir nesse capítulo, resumiu minha vida 🥰❤ amei esse capítulo
2025-01-21
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Luluzinha
quando ele te rejeitou por causa da missão ou vc renasceu em outro mundo ou então pagaram sua memória e deixaram a senhora com vc pra te proteger e manipularam as mensagens de todos ao redor dela pode ser isso e acho que ela precisa voltar de onde veio por que estão perecendo eu acho isso
2025-01-04
1
Maria Nice Grudgen
Que lindo 🤩
2024-12-05
1